PHILIP

VIII
Quando o dia chegou, Philip sentia-se cansado como
se estivesse tentando alcançar as nuvens. Nem
conseguia lembrar a última vez que havia se
alimentado. Ontem, talvez.
Procurara se preparar para a chegada
do dia como se com ele viessem
todos os esclarecimentos.
Porém, o que a claridade lhe trouxe foi muito
diferente do que esperava: lá estava a
comissão de pássaros, mas menos cerimoniosa
e sem perguntas.
Não se sabe direito qual deles falou,
pois nem o sol interrompe
a passividade mórbida dos
infelizes inquisidores:
Philip, você está preso.
IX
Era impossível calcular quantos dias estava ali.
Os dias são mais longos quando não podemos gozar
sua claridade, sua natural euforia.
Muitas vezes tentava entender o que estava
acontecendo, mas seus pensamentos caminhavam
sempre pelos mesmos caminhos, não levando
a nada. Queria acreditar que aqueles pássaros
tinham razão para não pensar que a justiça
não existia.
Talvez seu erro tenha sido voar tão distante.
Philip conhecia bem sua distração. Quando começava
a voar com o dia lindo e uma canção no
pensamento não havia distância que o intimidasse.
Lembrou-se de uma vez que se apaixonou
pela espiga mais linda de um milharal.
Pousava sempre perto dela para sentir
sua beleza e aos poucos sentir-se invadido
pela paixão. Às vezes, a gente se
arrisca a sofrer para experimentar o
coração palpitante de amor.
Aquela espiga era diferente das demais.
Tinha uma elegância radiante e
os fios, como cabelos loiros, espalhavam-se
com o vento.
Todos os dias, Philip reservava a ela o
anoitecer e o amanhecer.
Ah... Os pássaros ganham nova vida
quando estão apaixonados.