Edição 9 - Revista Aquaculture Brasil
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aquaculturebrasil.com<br />
EDIÇÃO<br />
9<br />
NOVEMBRO/<br />
DEZEMBRO<br />
2017<br />
ISSN 2525-3379<br />
1<br />
AquaScience:<br />
A revolução<br />
continua<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
3
Editorial<br />
“Sessenta por cento dos jovens estão aprendendo profissões que vão deixar de<br />
existir”. “65% das crianças que hoje estudam vão trabalhar em funções e profissões que<br />
não existem hoje”. “Mais de 800 milhões de trabalhadores vão perder seus empregos<br />
graças à automação”.<br />
Provavelmente você já leu estes cenários futuros e projeções em algum portal online.<br />
Sempre que uma notícia destas aparece em meu feed eu corro para abrir a notícia e<br />
saber o que dizem os especialistas sobre as profissões relacionadas com a aquicultura.<br />
Quem nunca?<br />
A verdade, como bem retrata o título da coluna Empreendedorismo Aquícola, do<br />
nosso grande André Camargo, é que “O que é nosso está guardado”. Conecto esta<br />
percepção à marca da empresa Camanor para 2018, capa e artigo especial de nossa<br />
9ª edição impressa: “A revolução continua”.<br />
A aquicultura brasileira está se estruturando (ou se reestruturando!) para dar um salto gigantesco de produção<br />
nos próximos anos. Ainda que não tenhamos plena convicção de que espécies ou sistemas serão os carros-chefes de<br />
nossa “Aqua” daqui há 20 anos.<br />
Serão os bioflocos? Será o tambaqui, ou quem sabe o panga? E os RAS, não vingarão? E os cultivos orgânicos,<br />
porque não se fala mais nisso? (o mercado de orgânicos movimentou R$ 3 bilhões no <strong>Brasil</strong> em 2016... não queremos<br />
uma fatia?). E os peixes marinhos? Ninguém vai dar a devida atenção e ajudar de verdade os esforços e o pioneirismo<br />
da Redemar Alevinos? Não vamos criar em grande escala nenhuma espécie de clima frio? A despeito de Jorge Ben Jor<br />
que dizia morar num País Tropical, temos um bom pedaço do <strong>Brasil</strong> que não é bem assim...<br />
Mas ter tantas dúvidas sobre questões tão básicas e estratégicas, como qual espécie cultivar, significa que o<br />
<strong>Brasil</strong> está sem rumo? Em minha opinião, não necessariamente.<br />
Os negócios do futuro são pautados hoje num cenário de dúvidas e incertezas. Logicamente, falando em<br />
espécies, também não dá para sermos um “zoológico de peixes” (palavras do nosso entrevistado Geraldo Bernardino...<br />
adorei!).<br />
Se a aquicultura está entre os principais agronegócios do futuro? Podemos apostar nela? Sim, ela será o<br />
principal agronegócio do futuro... No <strong>Brasil</strong> e no mundo, disso temos certeza!<br />
Ótimo 2018 a todos...<br />
Giovanni Lemos de Mello<br />
Editor<br />
4<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Fala Gringo!<br />
O MAIOR PORTAL DA<br />
AQUICULTURA BRASILEIRA!<br />
Comitê Editorial<br />
“Caminhante não há caminho, se faz caminho ao andar”<br />
Parágrafo do poema de Antonio Machado e cantado por Juan Manuel Serrat<br />
E o Fala Gringo é assim mesmo<br />
Caminhando pela orla de Ponta Negra em Natal<br />
Pensando...<br />
Escrevi no celular:<br />
“A Aquicultura, apesar dos ataques dos conservacionistas extremos, das doenças,<br />
das dificuldades do dia a dia, apesar de tudo isso, vem crescendo e fazendo seu<br />
caminho, fazendo seu caminho ao andar”.<br />
Como a <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong>.<br />
EDITOR-CHEFE:<br />
Giovanni Lemos de Mello<br />
redacao@aquaculturebrasil.com<br />
EDITORA-EXECUTIVA:<br />
Jéssica Brol<br />
jessica@aquaculturebrasil.com<br />
EDITORES ASSISTENTES:<br />
Alex Augusto Gonçalves<br />
Artur Nishioka Rombenso<br />
Maurício Gustavo Coelho Emerenciano<br />
Roberto Bianchini Derner<br />
Rodolfo Luís Petersen<br />
COLUNISTAS:<br />
Alex Augusto Gonçalves<br />
Andre Muniz Afonso<br />
André Camargo<br />
Artur Nishioka Rombenso<br />
Eduardo Gomes Sanches<br />
Fábio Rosa Sussel<br />
Luís Alejandro Vinatea Arana<br />
Marcelo Roberto Shei<br />
Maurício Gustavo Coelho Emerenciano<br />
Ricardo Vieira Rodrigues<br />
Roberto Bianchini Derner<br />
Rodolfo Luís Petersen<br />
Santiago Benites de Pádua<br />
As colunas assinadas e imagens são de<br />
responsabilidade dos autores.<br />
Instrução aos autores: www.aquaculturebrasil.com/submissao-artigos<br />
Rodolfo Luís Petersen<br />
Coeditor<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
5
Bem-vindo<br />
E<br />
screvo essa nota enquanto meus alunos fazem o exame final. Não<br />
parece, mas o ano está terminando e essa é a última BEM-VINDO de<br />
2017. Um ano atrás, quando escrevia pela primeira vez no Editorial,<br />
estávamos em um momento complexo e repleto de incertezas, mas com muita<br />
motivação, trabalho e postura otimista passamos por tudo e agora vivemos num<br />
cenário bem diferente. Então, o que esperar para 2018? Com base no meu<br />
otimismo e no contexto atual, acredito que a aquicultura continuará a crescer,<br />
principalmente em relação a formação de recursos humanos e disseminação<br />
e aplicação de conhecimento e tecnologias, e que começaremos a ver os<br />
resultados no aumento do volume e da qualidade da produção.<br />
Não sou muito fã de retrospectivas, mas gosto de reflexões. É bom refletir<br />
sobre o ano que está quase no final e assim colocar tudo em perspectiva: os<br />
ápices, os pontos baixos, os êxitos ou não de 2017, em resumo, tudo o que<br />
ocorreu. É interessante fazermos uma autoavaliação (não só como indivíduos mas também como parte de<br />
um todo, ou seja, como nos situamos, por exemplo, na empresa, no instituto, no departamento, no Estado,<br />
no País e no mundo) para que possamos traçar e atingir nossos objetivos de maneira mais fácil e eficiente.<br />
Gosto de pensar que apesar de faltar pouco tempo para completar esse ano ainda temos tempo suficiente<br />
para dar continuidade e finalizar o que colocamos como metas e objetivos. Recomendo que vejam essa reta<br />
final com ânimo, otimismo e motivação para fechar tudo da melhor forma possível e em seguida descansar<br />
para iniciar 2018 com energia renovada e sensação de dever cumprido.<br />
Também gostaria de parabenizar a <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong> por um ano excelente. Está cada vez mais<br />
atingindo um número maior de pessoas de formas diversas e inovadoras, disseminando conhecimento e<br />
informação de qualidade e contribuindo para o desenvolvimento e aprimoramento da aquicultura.<br />
Por fim, gostaria de agradecer o apoio de todos que utilizam e usufruem de qualquer serviço da<br />
plataforma <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong>. Não estaríamos aqui sem vocês! Desejo também boas festas e um 2018<br />
repleto de realizações!<br />
Artur Nishioka Rombenso<br />
Coeditor<br />
6<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
R<br />
Opinião<br />
Alma renovada!<br />
ealmente a capital potiguar<br />
merecia o retorno do maior evento<br />
da aquicultura nacional: Fenacam!<br />
E não decepcionou! Presenciei<br />
piscicultores e carcinicultores animados nos<br />
corredores da feira, lotando não somente<br />
os stands mas as inúmeras palestras<br />
técnico-científicas. Ótimo sinal! Ampliar<br />
o conhecimento nunca é demais e novas<br />
experiências e informações são sempre bemvindas.<br />
Neste sentido destaco as brilhantes<br />
palestras dos colegas Oscar Henning, Oliver<br />
Decamp, Sergio Zimmermann, Fabrizzio<br />
Vanoni, entre muitas outras, que nos enchem<br />
de entusiasmo e levam-nos a acreditar que<br />
certamente estamos no caminho certo.<br />
A indústria também estava aquecida,<br />
novas empresas debutaram nos stands<br />
da FENACAM. Se tivesse que escolher apenas uma palavra para resumir o<br />
sentimento da feira seria “amadurecimento”. Ainda, vale ressaltar a excelente<br />
programação da sessão especial do Recarcina, a rede nacional de pesquisas<br />
de carcinicultura financiada pela FINEP. Nela foram apresentados os resultados<br />
dos últimos 4 anos de pesquisas em diversas temáticas como manejo, genética,<br />
nutrição, sanidade, etc. Foi nítido como avançamos e amadurecemos. Parabéns<br />
aos envolvidos e em especial aos organizadores da sessão!<br />
Outro ponto que me chamou atenção foram as diversas barreiras<br />
geográficas que foram quebradas. Quem imaginaria atuais e “futuros”<br />
carcinicultores de Goiás, Paraná e Mato Grosso? E ainda, as cativantes<br />
experiências vividas pela cooperativa Copacol do Paraná. Uma aposta de<br />
mais de 2 anos de trabalho duro que resultou em uma das mais admiradas<br />
experiências do setor aquícola nacional: o sistema de integração nos moldes da<br />
avicultura. Parabéns! E ainda a Camanor nos presenteando com mais resultados<br />
do sistema Aquascience. É louvável o empreendedorismo da empresa, sobretudo<br />
apostando e mostrando que a P&D dentro de uma fazenda pode dar resultados<br />
sim! Com ajuda das tecnologias atrelada aos novos manejos, escolha correta<br />
de insumos e coerência na hora das decisões, vamos trilhando um caminho<br />
ainda mais sustentável da atividade.<br />
Como mensagem final, deixo meus agradecimentos a toda a equipe da<br />
<strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong> por mais um ano de muito aprendizado e companheirismo!<br />
Parabenizo também aos piscicultores, malacocultores e carcinicultores desse<br />
<strong>Brasil</strong>zão que acreditam, lutam e investem na atividade ao qual somos todos<br />
apaixonados: a Aquicultura! O ano de 2017 se foi. Quantas emoções!!! Que<br />
venha 2018!<br />
Sucesso a todos e ótima leitura!<br />
Maurício Gustavo Coelho Emerenciano<br />
Coeditor<br />
O MAIOR PORTAL DA<br />
AQUICULTURA BRASILEIRA!<br />
DIREÇÃO DE ARTE:<br />
Taiane Lacerda<br />
taiane@aquaculturebrasil.com<br />
DIREÇÃO COMERCIAL:<br />
Diego Molinari<br />
diego@aquaculturebrasil.com<br />
COLABORADORES DESTA<br />
EDIÇÃO:<br />
Antonio Glaydson Lima Moreira,<br />
Artur Nishioka Rombenso, Bruno<br />
Cavalheiro Araújo, Delano Dias<br />
Schleder, Diego Molinari, Elenise<br />
Gonçalves de Oliveira, Fabrício<br />
Menezes Ramos, Francisco das<br />
Chagas Medeiros, Gabriel Teixeira<br />
Pinto, Ivã Guidini Lopes, Jéssica Brol,<br />
José Reges da Silva Lobão, Leopoldo<br />
Melo Barreto, Mara Cristina Pessôa<br />
da Cruz, Renato Teixeira Moreira,<br />
Rose Meire Vidotti e Sergio Alberto<br />
Apolinario Almeida.<br />
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A revista AQUACULTURE BRASIL<br />
é uma publicação bimestral da<br />
EDITORA AQUACULTURE BRASIL<br />
LTDA ME.<br />
(ISSN 2525-3379)<br />
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A AQUACULTURE BRASIL não se<br />
responsabiliza pelo conteúdo dos<br />
anúncios de terceiros.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
7
SUMÁRIO<br />
AQUACULTURE BRASIL<br />
10 FOTO DO LEITOR<br />
12 MÉTRICAS DA FANPAGE<br />
14 Algas pardas como aditivo alimentar na dieta<br />
do camarão-branco-do-Pacífico<br />
20 Tanques-rede de grande volume: nova<br />
fronteira da piscicultura brasileira<br />
»»<br />
p.14<br />
24 Aquicultura ornamental de<br />
água doce –Parte II<br />
»»<br />
p.20<br />
»»<br />
p.24<br />
30 Importância dos ácidos graxos ômega<br />
3 e seus níveis no pescado brasileiro<br />
38 AquaScience: a revolução continua<br />
46 O açude Castanhão e a cadeia<br />
produtiva da tilápia<br />
52 O dia a dia da compostagem orgânica:<br />
Manejo, relação C/N e aplicação<br />
58 A importância da Segurança do Trabalho na<br />
Atividade Aquícola<br />
64 ARTIGOS PARA CURTIR E COMPARTILHAR<br />
65 CHARGES<br />
66 BIOTECNOLOGIA DE ALGAS<br />
68 GREEN TECHNOLOGIES<br />
»»<br />
p.30<br />
»»<br />
p.46<br />
69 empreendedorismo aquícola<br />
8<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
»»<br />
p.86<br />
»»<br />
p.92<br />
70 nutrição<br />
72 atualidades e tendências na aquicultura<br />
»»<br />
p.38<br />
73 Ranicultura<br />
74 aquicultura de precisão<br />
76 aquicultura latino-americana<br />
77 piscicultura marinha<br />
78 rECIRCULATING AQUACULTURE SYSTEMS<br />
»»<br />
p.52<br />
80 tecnologia do pescado<br />
82 DEFENDEU<br />
86 entrevista - gERALDO BERNARDINO<br />
91 NOVOS LIVROS<br />
92 ELES FAZEM A DIFERENÇA<br />
96 ESPÉCIES AQUÍCOLAS<br />
»»<br />
p.58<br />
98 despescou<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
9
FOTO DO LEITOR<br />
Despesca com presença de<br />
tambaqui amarelo<br />
(Ariquemes, RO)<br />
Autor: Jenner Bezerra de<br />
'Menezes - Biofish<br />
Fazenda Barra de<br />
Mamanguape (Aquafer)<br />
(Rio Tinto, PB)<br />
Autor: Fernando Gonçalves de<br />
Souza Filho<br />
Alevino de pirarucu<br />
(Rio Verde, GO)<br />
Autor: Hugo - Alevinos Rio Verde<br />
10<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Sunset na fazenda<br />
(Paraipaba, CE)<br />
Autor: Augusto César<br />
Camarão nativo do Rio Madeira<br />
(Porto Velho, RO)<br />
Autor: João Roberto F. Garcia<br />
Futuras larvas de trairão<br />
(Não-Me-Toque, RS)<br />
Autor: Cleiton André Kissmann<br />
Envie suas fotos mostrando a aquicultura no seu dia-a-dia e participe desta seção.<br />
redacao@aquaculturebrasil.com<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
11
.<br />
.<br />
Métricas<br />
Começou o<br />
AquaOnline!<br />
Aquaponia como<br />
solução para produção<br />
sustentável de<br />
alimentos<br />
11 de setembro<br />
13.804 Pessoas alcançadas<br />
24 Comentários<br />
32 Compartilhamentos<br />
1.182 Curtidas<br />
19 de setembro<br />
10.618 Pessoas alcançadas<br />
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aquaculturebrasil<br />
15 de setembro<br />
8.838 Pessoas alcançadas<br />
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47 Compartilhamentos<br />
184 Curtidas<br />
Liberado o cultivo de<br />
tilápias em tanques-rede<br />
no Mato Grosso<br />
20 de setemnbro<br />
10.887 Pessoas<br />
alcançadas<br />
19 Comentários<br />
116 Compartilhamentos<br />
472 Curtidas<br />
Dica de leitura<br />
12<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
.<br />
da Fanpage<br />
Vítimas da tragédia<br />
em MG contarão<br />
com banco de pele<br />
de Tilápia da UFC<br />
Curso online e ao<br />
vivo: Como criar<br />
camarões marinhos<br />
em água doce<br />
13 de outubro<br />
44.014 Pessoas alcançadas<br />
39 Comentários<br />
266 Compartilhamentos<br />
1.252 Curtidas<br />
51.806 Pessoas<br />
alcançadas<br />
56 Comentários<br />
81 Compartilhamentos<br />
2.437 Curtidas<br />
22 de outubro<br />
21 de setembro<br />
12.362 Pessoas<br />
alcançadas<br />
16 Comentários<br />
647 Curtidas<br />
18 de outubro<br />
18.868 Pessoas<br />
alcançadas<br />
49 Comentários<br />
86 Compartilhamentos<br />
556 Curtidas<br />
<strong>Edição</strong> nova!<br />
. .<br />
Inscrições abertas para mestrado<br />
e doutorado<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
13
Algas pardas como aditivo<br />
alimentar na dieta do<br />
camarão-branco-do-Pacífico<br />
Prof. Dr. Delano Dias Schleder<br />
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Catarinense - IFC, Campus Araquari<br />
delano.schleder@ifc.edu.br<br />
14<br />
© Ian Wallace<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Artigo<br />
As algas pardas possuem alto valor nutricional e<br />
uma ampla diversidade de compostos bioativos. Por estas<br />
razões, a aplicação desse grupo de algas como ingrediente<br />
nutricional e funcional para alimentação humana<br />
e animal tem crescido nos últimos anos (Fleurence et<br />
al., 2012; Miyashita et al., 2013; Thanigaivel et al., 2016).<br />
Além disso, algas pardas, particularmente as oriundas<br />
de ambientes frios, demonstraram a capacidade de promover<br />
a resistência contra o estresse térmico em animais<br />
e plantas (Kandasamy et al., 2011; Kandasamy et al.,<br />
2014; Nair et al., 2012).<br />
O estresse por frio impõe múltiplas disfunções<br />
fisiológicas nos organismos ectotérmicos, tais como o camarão,<br />
incluindo perda da integridade de proteínas e das<br />
membranas celulares, mau funcionamento da respiração<br />
celular na mitocôndria, estresse oxidativo e desordens na<br />
homeostase de íons e coordenação neuromuscular (Hayward<br />
et al., 2014). Na carcinicultura, estresses ambientais<br />
desta natureza podem levar a perdas de produtividade,<br />
devido a problemas de crescimento, supressão da resposta<br />
imune e ao aumento da suscetibilidade a doenças<br />
(Kautsky et al., 2000). Neste sentido, o setor de produção<br />
de camarões do <strong>Brasil</strong> tem experimentado perdas<br />
econômicas expressivas com surtos de enfermidades,<br />
especialmente no Sul do <strong>Brasil</strong>. O clima desta região do<br />
<strong>Brasil</strong> é bastante instável, mostrando alta flutuação de<br />
temperatura durante os ciclos de produção, podendo<br />
servir como importante gatilho natural para tais surtos.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
O objetivo<br />
deste trabalho foi Algas pardas,<br />
avaliar o uso da biomassa<br />
seca das algas<br />
particularmente<br />
pardas Sargassum<br />
as oriundas<br />
filipendula e Undaria de ambientes frios,<br />
pinnatifida como aditivo<br />
alimentar para<br />
demonstraram a capacidade<br />
de promover<br />
o camarão-branco-do-Pacífico<br />
e seu a resistência contra<br />
efeito sobre o desempenho<br />
zootécnico, em animais e<br />
o estresse térmico<br />
morfo-fisiologia digestiva,<br />
microbiologia<br />
plantas.<br />
do trato digestivo, status<br />
imunológico e resistência ao choque térmico e infecção<br />
com vírus da Mancha Branca (WSSV).<br />
Este trabalho representa uma síntese da tese<br />
“Algas pardas como ingrediente bioativo na dieta do<br />
camarão branco do pacífico”, defendida em 2017 pelo<br />
autor do presente artigo, orientado pelo Prof. Dr. Edemar<br />
Roberto Andreatta e coorientado pela Profa. Dra.<br />
Leila Hayashi, no âmbito do Programa de Pós-Graduação<br />
em Aquicultura da Universidade Federal de Santa<br />
Catarina – UFSC. Um dos capítulos foi premiado como<br />
melhor trabalho da América Latina, no programa “Alltech<br />
Young Animal Scientist”.<br />
15
Materiais e métodos<br />
Ao longo da tese foram realizados<br />
quatro experimentos. No primeiro,<br />
foram avaliados os parâmetros hemato-imunológicos,<br />
microbiologia do intestino<br />
e a resistência dos camarões ao choque<br />
térmico, após 15 dias de alimentação com<br />
dietas contendo 0,5, 2 e 4% da alga parda<br />
Sargassum filipendula (S) e 0,5, 2 e 4% da<br />
alga parda Undaria pinnatifida (U), e uma<br />
dieta controle (sem adição), totalizando<br />
sete dietas experimentais.<br />
No segundo experimento foi<br />
analisado o perfil de lipídeos e proteínas<br />
dos hemócitos de camarões alimentados<br />
durante 15 dias com 0,5% de S. filipendula<br />
e dieta controle, antes e após 15 min do<br />
choque térmico, utilizando a técnica de espectrometria<br />
de massa denominada MAL-<br />
DI-TOF MS (do inglês Matrix-Assisted Laser<br />
Desorption/Ionization – Time of Flight,<br />
mass spectrometry), com o intuito de identificar<br />
os possíveis mecanismos responsáveis<br />
pela resistência dos animais alimentados<br />
com 0,5% de S. filipendula frente ao choque<br />
térmico. No terceiro experimento, avaliouse<br />
o desempenho zootécnico, histologia do<br />
intestino, atividade de enzimas digestivas<br />
e a resistência dos camarões alimentados<br />
com os três diferentes níveis das algas pardas<br />
e dieta controle frente ao desafio com<br />
WSSV, após cultivo experimental de 38<br />
dias.<br />
Com base nos resultados positivos<br />
dos tratamentos 0,5S e 4U nos experimentos<br />
anteriores, foi realizado um quarto experimento<br />
avaliando o efeito combinado<br />
de ambas espécies de algas pardas na dieta<br />
(0,5%:1%, 0,5%:2% e 0,5%:4% de S. filipendula<br />
e U. pinnatifida, respectivamente)<br />
sobre a resistência ao choque térmico e ao<br />
desafio com WSSV. Adicionalmente, foram<br />
realizada análises de MALDI-TOF MS para<br />
avaliar perfil de lipídeos e proteínas dos<br />
hemócitos antes e 15 min após o choque<br />
térmico, e antes e 24 h após ao desafio com<br />
WSSV, com objetivo de identificar possíveis<br />
mecanismos responsáveis pela resistência<br />
dos animais ao estresse térmico e à infecção<br />
viral.<br />
Análise e equipamento MALDI-TOF<br />
16<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Resultados<br />
De forma geral, os camarões do tratamento<br />
4U apresentaram melhora nos parâmetros imunes e<br />
redução da contagem de Vibrio spp. no intestino. Os<br />
animais dos tratamentos 0,5S e 2S apresentaram maior<br />
sobrevivência após o choque térmico, já os níveis crescentes<br />
de U. pinnatifida (0,5U, 2U e 4U) reduziram a<br />
sobrevivência.<br />
As análises de MALDI-TOF MS revelaram<br />
que camarões do tratamento 0,5S, após o choque<br />
térmico, apresentaram maior diferença nos perfis de<br />
lipídeos (Figura 1) e proteínas dos hemócitos em comparação<br />
aos demais tratamentos. Após a identificação<br />
dos lipídeos e proteínas, constatou-se que a resistência<br />
ao choque térmico observada nestes camarões estava,<br />
pelo menos em parte, relacionada ao aumento da fluidez<br />
da membrana e da defesa antimicrobiana, associado<br />
à redução do estresse oxidativo e da morte celular<br />
causada por estresse, e à modulação diferencial do metabolismo<br />
energético.<br />
Ao final do cultivo experimental, foi constatado<br />
o aumento da área de superfície de absorção do intestino<br />
dos camarões alimentados com os menores<br />
níveis de adição das algas (tratamentos 0,5S e 0,5U),<br />
bem como o incremento da atividade da enzima digestiva<br />
amilase (tratamentos 0,5S, 2S, 4S e 4U) e lipase<br />
(tratamento 4U). No entanto, não foi observada<br />
diferença significativa no desempenho zootécnico.<br />
Além disso, foi observada uma redução de<br />
26% da mortalidade dos animais do tratamento 4U em<br />
relação ao controle, após o desafio com WSSV.<br />
Por fim, a combinação das algas pardas incrementou<br />
a resistência dos animais contra ambas<br />
condições avaliadas, especialmente ao desafio. A<br />
adição de 0,5% de S. filipendula evitou o efeito negativo<br />
dos crescentes níveis de U. pinnatifida na resistência<br />
dos animais ao choque térmico, no entanto, não foi suficiente<br />
para reduzir significativamente a mortalidade<br />
dos tratamentos em relação ao controle. As análises<br />
de MALDI-TOF revelaram que a mortalidade dos camarões,<br />
observada em todos os grupos após o choque<br />
térmico, pode estar relacionada à redução na defesa<br />
antimicrobiana e antioxidante, à indução da apoptose<br />
e problemas no ajuste da fluidez da membrana.<br />
Interessantemente, os tratamentos 0,5S/2U e<br />
0,5S/4U apresentaram mortalidade significativamente<br />
menor (28% e 30%, respectivamente) em relação ao<br />
grupo controle (76%) após a infecção com WSSV,<br />
demonstrando um efeito sinérgico entre ambas algas<br />
sobre a resistência dos camarões ao WSSV (Figura<br />
1). As análises de MALDI-TOF relacionaram essa resistência<br />
ao incremento de peptídeos antimicrobianos<br />
específicos, indução precoce da apoptose nos hemócitos<br />
e diminuição do suprimento de lipídeos requeridos<br />
para montagem dos virions de WSSV.<br />
Figura 1. (a) Espectro médio de massas<br />
por MALDI-TOF MS, referente ao perfil<br />
de lipídeos do sobrenadante do lisado de<br />
hemócitos do camarão-branco-do-Pacífico<br />
alimentado com dieta controle, sem suplementação,<br />
antes e 15 min depois do choque<br />
térmico (C e C-TS, respectivamente), e com<br />
dietas contendo 0,5% de Sargassum filipendula,<br />
antes e 15 min depois do choque<br />
térmico (0,5S e 0,5S-TS, respectivamente);<br />
(b) Diagrama da análise dos componentes<br />
principais dos perfis de lipídeos do sobrenadante<br />
do lisado de hemócitos dos quatro<br />
tratamentos (vermelho – C; verde – C-TS;<br />
azul – 0,5S; amarelo – 0,5S-TS).<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
ARTIGO<br />
17
Figura 2. Mortalidade cumulativa<br />
de Litopenaeus vannamei<br />
alimentados com dietas contendo<br />
0,5%:1%, 0,5%:2% e 0,5%:4%<br />
de Sargassum filipendula (S) e<br />
Undaria pinnatifida (U) respectivamente,<br />
e a dieta controle<br />
sem suplementação, em 96 horas<br />
pós-infecção (h.p.i.) com WSSV.<br />
Houve diferença significativa<br />
na mortalidade dos tratamentos<br />
0,5S:2U (p=0,0001) e 0,5S:4U<br />
(p=0,0006) em relação ao grupo<br />
controle. Não houve diferença<br />
(p>0,09) entre o tratamento<br />
0,5S:1U e o grupo controle.<br />
Conclusão<br />
As algas pardas S. filipendula e U. pinnatifida causaram diversos efeitos fisiológicos benéficos aos camarões<br />
sem afetar o desempenho zootécnico dos animais. Em especial, a adição combinada dessas algas pardas<br />
na dieta apresenta enorme potencial no combate à doença da Mancha Branca, pois pode melhorar não só a<br />
resposta dos camarões à enfermidade, mas também a resistência frente aos seus mecanismos desencadeadores,<br />
tais como a variação de temperatura.<br />
© Delano Dias Schleder © Lestaxinomes.org<br />
Figura 3. (a) Sargassum filipendula; (b) Undaria pinnatifida.<br />
Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/artigos<br />
18<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
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Artigo<br />
© Francisco Medeiros<br />
20<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Tanques-rede<br />
de grande<br />
volume:<br />
nova fronteira da<br />
piscicultura brasileira<br />
Francisco das Chagas Medeiros<br />
Diretor Presidente da Associação<br />
<strong>Brasil</strong>eira de Piscicultura (Peixe BR)<br />
Sócio-Proprietário da<br />
Empresa Manso Aquicultura<br />
peixando@gmail.com<br />
Tanques-rede ou gaiolas,<br />
como também são chamados,<br />
são estruturas flutuantes utilizadas<br />
para criação de peixes em altas<br />
densidades. Podem ser tanques<br />
pequenos ou de grandes volumes e<br />
tem sido um dos sistemas de produção<br />
que mais cresce no mundo.<br />
Possui algumas vantagens quando<br />
comparado ao sistema tradicional,<br />
como a alta produtividade, melhor<br />
gerenciamento e controle, baixo<br />
custo de implantação, facilidade na<br />
despesca com pouca mão de obra e<br />
o fato de serem técnica e economicamente<br />
viáveis em praticamente<br />
qualquer escala.<br />
Os primeiros trabalhos<br />
com criação de peixes em tanques-rede<br />
no <strong>Brasil</strong> chegaram<br />
através de uma publicação da Associação<br />
dos Produtores de Soja dos<br />
Estados Unidos (ASA), por volta de<br />
1997. Na época, esses relatos preconizavam<br />
a criação de peixes em<br />
tanques-rede de pequeno volume<br />
existe<br />
“vida”<br />
além dos<br />
pequenos<br />
tanques-rede.<br />
(1m x 1m) e alta densidade (PVAD).<br />
Muitos produtores e alguns pesquisadores<br />
nacionais acreditaram por<br />
alguns anos que essa era, de fato,<br />
a melhor maneira para criar peixe<br />
em tanques-rede, resultando no<br />
que temos hoje, praticamente 99%<br />
dos peixes de água doce produzidos<br />
no <strong>Brasil</strong> são cultivados nestas<br />
pequenas gaiolas, geralmente com<br />
volumes de 8m³ (2m x 2m x 2m) ou<br />
pouco mais que isso.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
21
Mudança de paradigmas<br />
Com a participação da internet na vida das pessoas,<br />
não só nos computadores, mas recentemente também<br />
de fácil acesso através dos celulares smartphones, foi possível<br />
perceber que existe “vida” além dos pequenos tanques-rede.<br />
Em um primeiro momento desta descoberta foi<br />
perceptível que os produtores procuravam motivos, e por<br />
incrível que pareça encontravam, para justificar a utilização<br />
dos pequenos tanques-rede.<br />
Entretanto, nos últimos seis anos houve grande<br />
participação de produtores brasileiros na feira AquaSur,<br />
uma das maiores feiras de aquicultura do Hemisfério Sul,<br />
que ocorre a cada dois anos no Chile. Neste grande evento<br />
internacional os piscicultores do <strong>Brasil</strong> tiveram os primeiros<br />
contatos com os tanques-rede de grande volume,<br />
amplamente utilizados na salmonicultura e no cultivo de<br />
outros peixes de importância comercial. Porém não foi o<br />
suficiente para uma mudança que os levasse a experimentar<br />
um novo modelo de produção.<br />
Neste meio tempo houve a ocorrência do mexilhão<br />
dourado (Limnoperna fortunei), principalmente nos estados<br />
de São Paulo e Paraná, onde se concentra grande parte<br />
da produção nacional de peixes em tanques-rede. Com a<br />
necessidade de retirar as gaiolas para limpeza das telas, uma<br />
vez que tal incrustação dificulta a circulação de água dentro<br />
destas estruturas, resultando na queda dos parâmetros<br />
de qualidade de água e assim aumento do nível de estresse<br />
dos animais cultivados, ficava definitivamente mais difícil a<br />
quebra de paradigma e implantação das gaiolas de grande<br />
volume.<br />
Contudo, na mesma época, houve um grande<br />
avanço principalmente com a adoção dos tanques-rede de<br />
dimensões 6m x 6m, que não são de grandes volumes, mas<br />
o fato indicava uma mudança no ponto de vista produtivo.<br />
© Manso Aquicultura<br />
Figura 1. Em um tanque-rede de 18 m x 18 m é possível produzir 50 toneladas de peixes.<br />
Surgem os primeiros projetos no <strong>Brasil</strong><br />
O conceito de tanque-rede de grandes volumes<br />
persistiu e os primeiros projetos começaram a aparecer.<br />
Tanques-rede circulares de PEAD (polietileno de alta densidade),<br />
com 20 metros de diâmetro e os tanques metálicos<br />
com dimensões de 20 m x 20 m, e volumes que variam<br />
de 1.400 a 2.000 m³, já foram implementados em algumas<br />
regiões do <strong>Brasil</strong>. Atualmente esses tanques são utilizados<br />
para produção tanto de tilápia, quanto de peixes nativos<br />
como pintado, tambaqui e matrinxã ou híbridos como a<br />
tambatinga (cruzamento da fêmea de tambaqui com macho<br />
de pirapitinga).<br />
O passo inicial foi dado e este é um processo<br />
irreversível. O <strong>Brasil</strong> deverá caminhar como as principais<br />
pisciculturas mundiais, aumentando gradativamente as escalas<br />
de produção e melhorando a competitividade, o que<br />
significa principalmente, redução de custos. Aliás é isso<br />
que atualmente torna o <strong>Brasil</strong> competitivo no agronegócio<br />
mundial.<br />
Desse modo, a piscicultura brasileira terá até o final<br />
de 2020 uma mudança substancial no modelo de produção,<br />
pois não adianta somente ter um tanque-rede de grande<br />
volume, é necessário máquinas de despescas, de seleção,<br />
alimentação mecanizada e principalmente frigoríficos com<br />
maiores volumes diários de abate, e isso também já vem<br />
ocorrendo.<br />
22<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Conclusões<br />
Houve uma mudança muito rápida do negócio de<br />
criação de peixes em tanques-rede e pela experiência já observada<br />
nas demais cadeias de proteína animal, o modelo<br />
brasileiro estará mais próximo da tecnologia do Chile do<br />
que do modelo asiático.<br />
Existe atualmente uma demanda reprimida de<br />
cessão de Águas da União para uma produção da ordem<br />
de 3 milhões de toneladas, segundo levantamento da<br />
Associação <strong>Brasil</strong>eira de Piscicultura, o que torna praticamente<br />
impossível implantar uma produção desta monta<br />
com tanques-rede de pequenos volumes. A competitividade<br />
poderia ser perdida em função da grande demanda de<br />
mão de obra exigida nesta situação e esta é talvez, uma das<br />
grandes vantagens dos tanques-rede de grandes volumes.<br />
O crescimento da produção traz consigo a mesma<br />
ordem de grandeza para os equipamentos. Os tanques rede<br />
de grande volume são um futuro que já está entre nós.<br />
© Francisco Medeiros<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
23
Parte II<br />
Prof. Dr. Leopoldo Melo Barreto<br />
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB)<br />
leopoldo.barreto@ufrb.edu.br<br />
Aquicultura ornamental<br />
de água doce<br />
Prof. Dr. Fabrício Menezes Ramos<br />
Instituto Federal do Pará (IFPA)<br />
fabricio.ramos@ifpa.edu.br<br />
24<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Artigo<br />
No artigo anterior provocamos<br />
a curiosidade sobre a aquicultura<br />
ornamental, e agora iremos falar um<br />
pouco sobre as estruturas de cultivo<br />
utilizadas, as estratégias reprodutivas<br />
e pincelar sobre qualidade de água,<br />
pois sabemos que os peixes são diretamente<br />
influenciados por parâmetros<br />
bióticos e abióticos, os quais devem<br />
estar ajustados para a espécie, assim<br />
levando-os ao ápice biológico, a reprodução.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
25
Estruturas de cultivo<br />
© Fabrício Menezes Ramos<br />
Figura 1. Aquário residencial confeccionado com piso cerâmico.<br />
A produção de peixes ornamentais pode ser realizada<br />
em diversos tipos de estruturas (viveiros, tanques<br />
e aquários) e diferentes condições de manejo. O valor intrínseco<br />
da espécie alvo é que irá determinar o nível de<br />
intensificação. Assim, o bom senso e experiência do produtor<br />
(contratar consultoria se necessário) devem orientar<br />
na projeção e construção da estrutura, reduzindo os<br />
custos de implantação, fornecendo condições de bem-estar<br />
aos peixes e facilitando as rotinas operacionais.<br />
Os viveiros se destacam na produção comercial<br />
de peixes ornamentais por serem a estrutura mais utilizada<br />
(Vidal Junior, 2006). São depressões naturais no terreno,<br />
reservatórios escavados ou elevados na terra, possuindo<br />
abastecimento e drenagem de água individualizado<br />
(Oliveira, 2013). Têm como principal vantagem o baixo<br />
custo de construção. Por outro lado, apresentam dificuldade<br />
no manejo da água e dos peixes, assim empregados<br />
mais na produção de peixes de baixo valor comercial,<br />
baixo padrão genético e baixa exigência nos cuidados,<br />
como os Poecilídeos (Espada e platy - Xiphophorus spp.,<br />
guppy e molinesia - Poecilia spp.), Cyprinídeos (Barbos<br />
- Barbus ssp. / Barbonymus ssp. / Puntius ssp., carpas<br />
- Cyprinus carpio, kinguios - Carassius auratus e paulistinha<br />
- Danio rerio) e alguns Ciclídeos, como o acará<br />
bandeira (Pterophyllum scalare).<br />
Outras estruturas comumente utilizadas são<br />
tanques, que diferem de viveiros por serem revestidos<br />
e não haver contato com o solo. Exemplo clássico são<br />
26 ARTIGO<br />
caixas plásticas ou<br />
de fibra e piscinas<br />
de lonas ou manta.<br />
Essas estruturas suportam<br />
cultivos mais<br />
intensivos, pois há<br />
maior controle da<br />
qualidade de água e<br />
facilidade na despesca.<br />
Até o maior custo<br />
inicial, fator que<br />
poderia ser levado<br />
em consideração, é<br />
afiançado pela alta<br />
produtividade por<br />
área. De forma análoga, havendo melhor controle na<br />
produção, podemos seguramente produzir peixes de<br />
alto valor agregado, como kinguios e guppy’s de alto padrão,<br />
Anabantídeos (peixe de briga - Betta splendens) e<br />
Ciclídeos de forma geral.<br />
Os aquários, construídos com placas de vidro<br />
ou acrílicos, são também utilizados como unidades reprodutivas.<br />
Trabalhos recentes, como o de Fujimoto e<br />
colaboradores (2014), mostram redução nos custos de<br />
produção de aquários, em torno de 62%, utilizando o<br />
piso cerâmico nas laterais e fundo do aquário (Figura 1).<br />
Os aquários facilitam a observação do comportamento<br />
reprodutivo dos espécimes e promovem o controle das<br />
condições ambientais. O acará disco (Symphysodon sp.)<br />
é um forte candidato para reprodução em aquários, inclusive<br />
mantendo-se nessa estrutura na fase de crescimento<br />
até o momento da venda.<br />
Quaisquer das estruturas devem fornecer<br />
aos peixes boas condições para sua manutenção, pois<br />
nenhum animal poderá expressar seu desenvolvimento<br />
e reprodução em condições estressantes (Galhardo;<br />
Oliveira, 2006). Desta forma, conhecer e compreender<br />
os processos que determinam a reprodução dos animais<br />
é parte primordial no sucesso de qualquer cultivo.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
Trabalhos recentes,<br />
como o<br />
de Fujimoto e<br />
colaboradores (2014),<br />
mostram redução nos<br />
custos de produção de<br />
aquários, em torno de<br />
62%, utilizando o piso<br />
cerâmico nas laterais<br />
e fundo do<br />
aquário.<br />
Estratégias reprodutivas:<br />
Os peixes desenvolveram diversas formas de<br />
reprodução que são divididas basicamente em<br />
quatro (França, 2007):<br />
(1) ovulíparos;<br />
(2) ovíparos;<br />
(3) ovovivíparos;<br />
(4) vivíparos.
Nos ovulíparos a fecundação é externa, machos e fêmeas soltam seus gametas<br />
(óvulos e espermatozoides) na água. Após a fecundação os ovos são<br />
levados pela correnteza na maioria das espécies de piracema, como tambaqui<br />
- Colossoma macropomum e piau - Leporinus spp., ou podem ficar aderidos<br />
à superfície sem o cuidado dos pais (cuidado parental), como nas carpas e<br />
kinguios, ou ainda ficarem aderidos à superfícies, como na maioria dos Ciclídeos<br />
(Acará bandeira e disco), os quais praticam o cuidado parental.<br />
Quando as fêmeas liberam ao meio os ovos após fecundação interna,<br />
são denominados de ovíparos. Pode ser observado em algumas espécies<br />
de tubarões e raias (Condrictes). Neste os embriões desenvolvem-se<br />
dentro dos ovos, mas fora do corpo da mãe, e se nutrem<br />
das reservas presentes no ovo.<br />
Nos ovovivíparos o desenvolvimento embrionário é realizado dentro do<br />
corpo materno, se alimentando apenas da reserva nutritiva existente no<br />
ovo, sem nenhuma ligação com a progenitora. Após o desenvolvimento<br />
eclodem no oviduto da fêmea e são expelidos ao meio já como alevinos.<br />
Estratégia encontrada comumente nos Poecilídeos (Guppys, Lebistes,<br />
Platis etc).<br />
Já nos peixes vivíparos os embriões se desenvolvem dentro do corpo<br />
da mãe, dentro de uma placenta com os nutrientes essenciais para<br />
seu desenvolvimento. O representante mais conhecido deste grupo é o<br />
tralhoto (Anableps sp.), porém sem muito interesse para aquicultura<br />
ornamental, a não ser pelo fato de possuir a córnea dividida em duas,<br />
parecendo assim ter quatro olhos.<br />
4<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
ARTIGO<br />
27
Dimorfismo sexual<br />
Para reprodução é necessário, muitas vezes,<br />
reconhecer o macho e a fêmea (dimorfismo sexual), logo<br />
formar casais ou grupos reprodutivos, principalmente<br />
quando se pretende realizar um trabalho de melhoramento<br />
genético. A observação das características morfológicas<br />
em exemplares maduros sexualmente geralmente<br />
fornece evidências para este procedimento. Os<br />
machos dos ovovivíparos apresentam um órgão copulador<br />
denominado gonopódio. Nos Condrictes este órgão<br />
é denominado de clasper. Os tetras machos (Ex. mato<br />
grosso - Hyphessobrycon spp., e neon - Paracheirodon<br />
spp.) apresentam espículas na nadadeira anal. Já nas carpas<br />
e kinguios, além da nadadeira anal, os machos apresentam<br />
espículas na nadadeira peitoral e nos opérculos,<br />
bem destacados na fase reprodutiva. Os Ciclídeos, de<br />
forma geral, apresentam um aumento na porção frontal<br />
da cabeça nos machos por deposição de gordura. Nos<br />
cascudos ou acaris (Loricarídeos) o dimorfismo sexual é<br />
realizado pela observação de espículas (odontódeos) na<br />
nadadeira peitoral e/ou no opérculo e prolongamentos<br />
de escamas em machos de Baryancistrus spp., Hypancistrus<br />
spp. e Peckoltia spp., por exemplo. Nos Ancistrus<br />
spp. o macho apresenta tentáculos próximos aos olhos e<br />
boca, em maior quantidade, e mais alongados do que nas<br />
fêmeas.<br />
Geralmente os machos em peixes ornamentais<br />
são mais coloridos e com padrões corporais mais chamativos,<br />
como destacado na família Rivulidae (Killifishes).<br />
Quando o dimorfismo sexual não é evidente, como em<br />
acarás bandeiras, discos e peixe folha, a melhor estratégia<br />
é a disposição de vários exemplares maduros em<br />
aquários ou tanques para a formação de casais e posterior<br />
separação destes.<br />
Outra questão importante no processo reprodutivo<br />
é o conhecimento da biologia da espécie, inclusive<br />
sobre os fatores abióticos (temperatura, pH, salinidade,<br />
condutividade, dureza carbonatada, etc.) que regulam a<br />
maturação sexual, logo a reprodução. Sem a representação<br />
fiel desses parâmetros, não importa a estrutura de<br />
cultivo ou o tipo de alimento, dificilmente haverá reprodução.<br />
© Fabrício Menezes Ramos<br />
Figura 2. Dimorfismo sexual – Machos: aumento na porção frontal da cabeça em Citrinelos - Amphilophus citrinellus (seta amarela) e espículas<br />
no opérculo de kinguios - Carassius auratus, variedade telescópio (seta vermelha).<br />
Aquicultura ornamental, por onde começar?<br />
Se o leitor nos perguntar: Qual a família de peixe é mais fácil para iniciar um cultivo? Com certeza,<br />
respondendo de forma simplificada, proporíamos os Poecilídeos (Lebiste, barrigudinho, etc) por possuírem fácil<br />
dimorfismo sexual, cores vibrantes, desejadas pelos aquaristas, protocolo reprodutivo simples e bem definido e sem<br />
fase larval. Assim, seria a primeira família a indicarmos para o empreendedor iniciante que deseja empregar pouco<br />
capital e, mesmo tendo pequeno retorno, conseguir pagar os custos de produção, escolhendo as variedades corretas<br />
e estudando o mercado consumidor da região.<br />
Para desfechar, no próximo (e último artigo desta série) abordaremos estratégias de alimentação para larvas<br />
e matrizes, citaremos estratégias para o bom crescimento de algumas espécies, levando-as até o momento da comercialização,<br />
tema que também será comentado, incluindo as dicas de transporte, do produtor ao consumidor. Até<br />
breve!<br />
Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/artigos<br />
28<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
ARTIGO
Artigo<br />
30<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Importância dos ácidos<br />
graxos ômega 3 e<br />
seus níveis<br />
no pescado brasileiro<br />
Bruno Cavalheiro Araújo<br />
Laboratório de Genética de Organismos Aquáticos e<br />
Aquicultura<br />
Núcleo Integrado de Biotecnologia<br />
Universidade de Mogi das Cruzes (UMC);<br />
Laboratório de Metabolismo e Reprodução<br />
de Organismos Aquáticos<br />
Instituto de Biociências<br />
Universidade de São Paulo (USP)<br />
brunocavar@usp.br<br />
Artur Nishioka Rombenso<br />
Laboratório de Nutrição e Fisiologia<br />
Digestiva de Organismos Aquáticos<br />
Instituto de Investigaciones Oceanológicas<br />
Universidade Autônoma de Baja Califórnia (UABC)<br />
artur.nishioka@uabc.edu.mx<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
31
O pescado em geral é uma<br />
excelente fonte nutricional, sendo<br />
recomendado um consumo mínimo<br />
semanal para assegurar um bom<br />
desenvolvimento e estado de saúde<br />
adequado. Nele existe uma série de<br />
nutrientes importantes, porém alguns<br />
são vistos com maior relevância<br />
devido a sua limitada disponibilidade,<br />
como por exemplo os ácidos<br />
graxos poliinsaturados de cadeia<br />
longa da família n-3, os famosos ácidos<br />
graxos ômega 3.<br />
De acordo com dados da<br />
FAO (Food and Agriculture Organization<br />
of the United Nations,<br />
2014), aproximadamente 16,7% de<br />
toda proteína animal consumida no<br />
mundo é composta por espécies de<br />
peixes, e dentro desta perspectiva<br />
a aquicultura já é responsável por<br />
mais de 50% do pescado consumido<br />
mundialmente. 32<br />
Este crescimento do<br />
setor é significativo e talvez não seja<br />
maior em virtude da nutrição, sendo<br />
este processo o mais custoso para a<br />
produção de espécies de peixes de<br />
interesse comercial, representando<br />
até 70% dos custos totais. Este fato<br />
se dá principalmente pela inclusão<br />
de ingredientes de custo elevado,<br />
como o óleo de peixe, que além do<br />
alto valor agregado, quando provindos<br />
dos estoques naturais podem<br />
ser considerados altamente impactantes,<br />
com composição nutricional<br />
variável e de produção instável.<br />
Devido a estes fatores, a indústria<br />
busca incessantemente ingredientes<br />
alternativos (normalmente<br />
provindos de espécies vegetais e de<br />
animais terrestres), que não afetem<br />
a performance de crescimento dos<br />
animais e que reduzam os custos<br />
produtivos. Com esta redução na utilização<br />
de óleo de peixe e o aumento<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
da inclusão de óleos alternativos nas<br />
dietas, o perfil de ácidos graxos do<br />
produto final quando negligenciado,<br />
pode ser drasticamente alterado,<br />
dado principalmente por uma redução<br />
significativa nos níveis de nutrientes<br />
importantes como os ácidos<br />
graxos ômega 3.<br />
Atualmente são poucos os<br />
trabalhos publicados no <strong>Brasil</strong> que<br />
abordam diretamente este tema e<br />
que também reportem os níveis<br />
desses nutrientes nos principais<br />
produtos aquícolas nacionais. Na<br />
realidade, apenas poucos estudantes<br />
de pós-graduação por todo país trabalham<br />
com nutrição lipídica com<br />
foco principal nos ácidos graxos e<br />
qualidade nutricional do produto<br />
aquícola final. Assim, nesse artigo<br />
ressaltamos a importância desse<br />
tema para conhecimento geral.
O que são os ácidos graxos ômega 3?<br />
Os ácidos graxos são as<br />
unidades básicas mais comuns dos<br />
lipídios, formadas por uma cadeia<br />
de carbonos que possuem de um<br />
lado da molécula o grupo metil<br />
(-CH 3<br />
) e do outro o grupo carbóxilo<br />
(-COOH). Os ácidos graxos podem<br />
ser classificados de acordo com<br />
sua estrutura química e funções<br />
fisiológicas, e entre outras formas.<br />
Os ômega 3 formam um<br />
grupo de ácidos graxos que possuem<br />
ao menos três ligações duplas sendo<br />
que a primeira está localizada no terceiro<br />
carbono do lado metil, por isso<br />
tal denominação. A nomenclatura<br />
mais utilizada para caracterizar a<br />
composição bioquímica da molécula<br />
de ácido graxo é a numérica, por<br />
exemplo, o ácido docosaexaenóico<br />
(DHA; 22:6n-3; Figura 1). Neste<br />
caso o primeiro número (22) consiste<br />
no número total de carbonos da<br />
molécula, o segundo número (6) se<br />
refere ao número de ligações duplas<br />
da molécula, e o terceiro número (3)<br />
indica o carbono da primeira ligação<br />
dupla a partir do lado metil.<br />
Todos os ácidos graxos ômega 3 são importantes?<br />
Existem vários exemplos<br />
de ácidos graxos ômega 3 como:<br />
18:3n-3, 18:4n-3, 20:4n-3, 20:5n-3,<br />
22:5n-3, 24:5n-3, 24:6n-3 e 22:6n-3.<br />
Porém alguns são fisiologicamentes<br />
mais importantes que outros, como<br />
é o caso do DHA (22:6n-3) e EPA<br />
(20:5n-3). Diversos estudos atestam<br />
a importância do DHA e EPA para<br />
nutrição humana, principalmente na<br />
prevenção e tratamento de doenças<br />
cardiovasculares (o consumo adequado<br />
pode reduzir em até 65% as<br />
chances de infarto do miocárdio),<br />
neurológicas como Alzheimer, depressão<br />
e transtorno de déficit de<br />
atenção e hiperatividade (TDHA),<br />
dentre outras. Além disso são fundamentalmente<br />
importantes para<br />
um adequado desenvolvimento neurológico<br />
e visual, sendo ainda considerados<br />
importantes precursores<br />
de compostos bioativos bastante<br />
relevantes para o sistema imunológico.<br />
Dessa forma torna-se impressindível<br />
diferenciar qual tipo<br />
e qual quantidade de ácido graxo<br />
ômega 3 estamos consumindo em<br />
nosso pescado.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
33
© Intechopen<br />
Figura 1. Estrutura química do ácido graxo poliinsaturado de cadeia longa ômega 3 DHA (ácido docosaexaenoico; 22:6n-3).<br />
Ácidos graxos ômega 3 vs. ômega 6<br />
Alguns benefícios dos ácidos<br />
graxos ômega 3 são ressaltados<br />
quando comparados com os ômega<br />
6. De forma geral, os ômega 6 possuem<br />
propriedade pró-inflamatória,<br />
porém o excesso dos mesmos pode<br />
resultar em uma exaltação do processo<br />
inflamatório, como ocorre<br />
por exemplo nas dietas Ocidentais<br />
que utilizam frequentemente óleos<br />
vegetais (ricos em ômega 6, principalmente<br />
18:2n-6), aumentando assim<br />
o consumo de ômega 6 e desequilibrando<br />
a importante relação<br />
ácidos graxos ômega 3/ômega 6. Já os<br />
ômega 3 possuem propriedades anti-inflamatórias,<br />
seu valor nutricional<br />
se torna mais importante nesse<br />
contexto. Atualmente é recomendado<br />
o consumo 300-500 mg de DHA<br />
+ EPA por dia, sendo que alguns trabalhos<br />
recomendam um consumo<br />
de até 2g de DHA + EPA por dia.<br />
Vale ressaltar que a recomendação é<br />
para DHA + EPA e não para outros<br />
ômega 3.<br />
Enquanto o setor aquícola<br />
luta para reduzir a utilização de ingredientes<br />
contendo níveis adequados<br />
de DHA e EPA nas dietas dos<br />
animais em cultivo (visando principalmente<br />
a redução de custos produtivos),<br />
outros segmentos como a<br />
indústria de laticínios e de ovos, investem<br />
massivamente na produção<br />
de alimentos “enriquecidos” com altos<br />
níveis destes importantes nutrientes.<br />
Podemos afirmar então que a<br />
aquicultura (em especial a produção<br />
de animais dulciaquícolas) caminha<br />
no sentido oposto destes outros segmentos,<br />
ignorando seu principal fator<br />
de marketing, o de alimento rico<br />
em ômega 3 (DHA e EPA).<br />
A aquicultura (em<br />
especial a produção<br />
de animais<br />
dulciaquícolas) caminha<br />
no sentido oposto<br />
destes outros segmentos,<br />
ignorando seu principal<br />
fator de marketing,<br />
o de alimento rico em<br />
ômega 3 (DHA<br />
e EPA).<br />
Nível de ômega 3 nos produtos aquícolas brasileiros<br />
Como dito anteriormente,<br />
informações relacionadas com o<br />
perfil de ácidos graxos das principais<br />
espécies cultivadas nacionalmente<br />
são escassas. Apesar de resultados<br />
prévios apontarem para uma baixa<br />
concentração (muitas vezes ínfima)<br />
de DHA e EPA nas nossas principais<br />
espécies produzidas, de fato definir o<br />
perfil destes nutrientes no nosso pescado<br />
é realmente uma missão árdua,<br />
uma vez que a composição do produto<br />
final é diretamente influenciada<br />
pelas condições de cultivo (como<br />
temperatura e frequência alimentar),<br />
composição da dieta, forma de<br />
armazenamento do pescado, dentre<br />
outras variáveis. Sendo assim torna-se<br />
necessário um grande esforço<br />
amostral em mercados, portos de<br />
descarregamento de pescado, pisciculturas,<br />
feiras-livres, dentre outros<br />
pontos.<br />
34<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
35
Quais as espécies produzidas no <strong>Brasil</strong> com maior potencial<br />
de se tornarem um produto rico em ômega 3?<br />
Esta é uma questão realmente<br />
complexa e que necessita de<br />
muita investigação para ser respondida.<br />
No geral espécies com maior<br />
potencial de deposição de gordura<br />
intramuscular, como alguns peixes<br />
redondos (exemplo o tambaqui,<br />
pacu, tambacu), são mais propícios<br />
ao aumento de DHA e EPA, dado<br />
principalmente pela manipulação<br />
da composição da dieta. No entanto<br />
alguns estudos apontam para<br />
uma melhora significativa na concentração<br />
destes ácidos graxos em<br />
espécies consideradas “magras”,<br />
como a tilápia e algumas espécies<br />
de camarão. Com isso, além da importância<br />
da incorporação de maior<br />
percentual de DHA e EPA na dieta,<br />
o investimento em programas de<br />
melhoramento genético que visam<br />
um aumento no percentual de gordura<br />
intramuscular destes animais<br />
torna-se essencial para a produção<br />
de um pescado rico nestes ácidos<br />
graxos.<br />
Projetos de pesquisa<br />
Atualmente<br />
existem<br />
poucos<br />
centros de pesquisa e universidades<br />
focadas nos estudos de ácidos graxos<br />
na aquicultura, a grande maioria<br />
investiga sobre a importância das<br />
proteínas na nutrição animal. No<br />
<strong>Brasil</strong>, o Laboratório de Metabolismo<br />
e Reprodução de Organismos<br />
Aquáticos – LAMEROA (Instituto<br />
de Biociências da USP)<br />
em conjunto com o<br />
Laboratório de<br />
Genética<br />
d e<br />
Organismos Aquáticos e Aquicultura<br />
– LAGOAA (Núcleo Integrado<br />
de Biotecnologia da UMC) e o<br />
Laboratório de Nutrição e Fisiologia<br />
Digestiva de Organismos Aquáticos<br />
(Instituto de Investigaciones<br />
Oceanológicas – UABC / México),<br />
iniciaram um projeto que visa<br />
caracterizar o perfil de ácidos graxos<br />
das principais espécies consumidas<br />
nacionalmente. Os resultados permitirão<br />
traçar estratégias adequadas<br />
para a produção de um pescado mais<br />
saudável, devido principalmente,<br />
pela maior concentração de DHA<br />
e EPA na musculatura destes<br />
animais.<br />
36<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
37
AquaScience:<br />
A revolução<br />
continua<br />
Jéssica Brol<br />
Diego Molinari<br />
AQUACULTURE BRASIL<br />
*jessica@aquaculturebrasil.com<br />
38<br />
© <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong><br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Artigo<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
39
Introdução<br />
A fazenda Cana Brava, localizada<br />
no município de Canguaretama, litoral<br />
Sul do Rio Grande do Norte, foi fundada<br />
em 1983, sendo a primeira unidade de<br />
produção da empresa Camanor Produtos<br />
Marinhos. A propriedade operou no<br />
modelo semi-intensivo com excelentes<br />
resultados até meados de 2011, quando<br />
o vírus da síndrome da mancha branca<br />
(WSSV) atingiu o Estado e, como é<br />
característico desta enfermidade, ocasionou<br />
mortalidades massivas. Na época, a<br />
sobrevivência despencou para 5 a 10% e<br />
a fazenda obteve os menores resultados<br />
produtivos de sua história, representando<br />
apenas 50 toneladas de camarões despescados<br />
ao longo de todo o ano.<br />
Tabela 1. Dados produtivos da Fazenda Cana Brava antes de ser acometida pelo vírus da Síndrome da Mancha Branca, em 2011.<br />
*Média dos três últimos anos antes da mancha branca.<br />
* Média dos três últimos anos antes da mancha branca.<br />
Primeiros ensaios intensivos<br />
De toda forma, antes mesmo do<br />
vírus atingir os cultivos, dentro da empresa<br />
já se pensava em um modelo diferenciado<br />
de produção. Os primeiros experimentos<br />
seguiram o chamado “modelo asiático”,<br />
caracterizado por viveiros cujo solo<br />
é recoberto com geomembrana, além do<br />
aumento da aeração e da densidade de povoamento<br />
(100 camarões/m²). A ideia deu<br />
certo, sendo realizados quatro ciclos produtivos<br />
de sucesso. Com isso, projetava-se<br />
fazer a transição deste sistema em escala<br />
experimental para o restante da fazenda.<br />
Contudo, isto não foi possível, uma vez<br />
que a mancha branca também atingiu a<br />
unidade experimental.<br />
Para continuar a produzir foi<br />
preciso pensar além, experimentar novamente,<br />
mas desta vez com foco total no<br />
sistema intensivo e acrescentando elementos<br />
que o modelo asiático não preconizava,<br />
como por exemplo a tilápia (Oreochromis<br />
niloticus), o recobrimento dos viveiros<br />
(inicialmente com sombrites) e o sistema<br />
de recirculação. Após 10 ciclos consecutivos<br />
de tentativa e erro, foi possível encaixar<br />
um modelo de produção que apresentava<br />
sucesso do início ao fim, sem mortalidades<br />
ocasionadas pelo WSSV. Os 10 mil quilos<br />
que constam no gráfico de produção (Figura<br />
1) foram resultado deste primeiro sucesso,<br />
a partir de 100 camarões/m² e peso final<br />
de 10 gramas.<br />
40<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Após 10 ciclos<br />
consecutivos de<br />
tentativa e erro,<br />
foi possível encaixar um<br />
modelo de produção que<br />
apresentava sucesso do<br />
início ao fim, sem<br />
mortalidades<br />
ocasionadas<br />
pelo WSSV.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
© <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong><br />
41
Figura 1. Evolução da produtividade da Fazenda Cana Brava, pertencente à empresa Camanor Produtos Marinhos, ao longo de 4 anos. Fonte: Camanor<br />
“Foi aí que encontramos o caminho”, comenta Luiz Henrique Peregrino, Engenheiro de Pesca<br />
e um dos mentores do sistema AquaScience.<br />
O nascimento do “AquaScience”<br />
Naquele momento faltavam ainda alguns aspectos<br />
para que o sistema se encaixasse no modelo AquaScience,<br />
mas a ideia principal estava concebida: tentar equilibrar<br />
o ambiente de cultivo, proporcionando bem-estar aos<br />
animais. Dessa forma, mesmo que a doença estivesse presente,<br />
os camarões não iriam manifestá-la, porque estavam<br />
saudáveis.<br />
A ideia partiu da percepção dos animais em ambiente<br />
natural, convivendo com a presença de doenças. A<br />
chave estaria em como é possível se manter essa relação.<br />
Depois, a observação voltou-se para unidades de tratamento<br />
de água e efluentes. Era preciso que a água se mantivesse<br />
por vários ciclos recirculando no sistema, sem a necessidade<br />
de troca. Juntando os fatos e muita engenharia, surgiu<br />
o AquaScience.<br />
A lógica do sistema AquaScience<br />
O princípio básico do sistema AquaScience é manter<br />
a água com os parâmetros de qualidade estáveis, em<br />
constante movimento e recirculação, reaproveitando todos<br />
os nutrientes e matéria orgânica dentro do próprio sistema.<br />
Para isso, extinguiu-se a ideia de viveiros de cultivo, para a<br />
concepção de módulos de cultivo.<br />
A estrutura do AquaScience é composta de módulos<br />
que contemplam:<br />
Dois viveiros de camarão (3500 a 5000m²) com dreno central;<br />
Uma estação de recirculação;<br />
Dois viveiros de tilápia também com dreno central.<br />
42<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
A recirculação dentro do módulo é dupla, tanto<br />
saindo dos viveiros para a estação e retornando aos viveiros,<br />
quanto do viveiro para a estação, indo para o berçário de<br />
tilápia e, após, voltando para o viveiro de camarão. Esse processo<br />
é dinâmico, funcionando 24 horas por dia e impede<br />
o acúmulo de material orgânico, uma vez que todo resíduo<br />
sólido é bombeado aos tanques de tilápia, justamente para<br />
que estes animais filtrem e consumam todo esse material,<br />
que acaba sendo uma fonte de alimento. Nas fases finais do<br />
cultivo de camarão onde o arraçoamento é maior, as tilápias<br />
são alimentadas com apenas 20% de ração. Todo o restante<br />
da energia necessária à sua manutenção e crescimento é obtido<br />
através da filtração dos sólidos. O AquaScience produz<br />
tilápias com o mínimo de ração fornecida aos peixes!<br />
Na água há a predominância de bactérias que contribuem<br />
para a manutenção da qualidade de água, como<br />
as nitrificantes, através da assimilação dos compostos nitrogenados,<br />
e as bactérias heterotróficas que realizam a degradação<br />
da matéria orgânica convertendo-a em biomassa<br />
bacteriana, que também serve de alimento aos animais. Há<br />
também a presença de microalgas que atuam na remoção<br />
do fósforo e adicionalmente no tratamento do material<br />
orgânico.<br />
Figura 2. Modelo explicando o funcionamento do Sistema Aquascience. Fonte: Camanor<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
ARTIGO<br />
43
Modelo em constante evolução<br />
Quanto maior a capacidade de<br />
ciclagem dos nutrientes maior é a capacidade<br />
de estocar animais/m² e consequentemente<br />
maior a produtividade.<br />
Baseado nisso, a Camanor vem evoluindo<br />
constantemente o sistema Aqua-<br />
Science e desde que foi concebido, em<br />
2013, passou por três melhorias, denominadas<br />
de G1, G2 e G3. Este último,<br />
G3, é o modelo atual que está em ampliação,<br />
mas já há estudos para um G4,<br />
a ser implantado dentro dos 25 ha que<br />
a Camanor projeta expandir. O recorde<br />
de produção alcançado em novembro de<br />
2017 com 73,6 t/ha produzidas, já é fruto<br />
das novas experiências de ampliação<br />
utilizando densidades mais altas.<br />
Em todas as gerações a sobrevivência<br />
é próxima aos 90% e é possível<br />
realizar 3 ciclos de produção por ano,<br />
despescando camarões com peso entre<br />
17 e 18 gramas.<br />
Com a tilápia é possível realizar 2 ciclos por ano,<br />
com peso final entre 1000 e 1500 gramas. Em cada tanque<br />
de tilápia é produzido de 2 a 2,5 t. Antes atuando somente<br />
como componente do sistema, agora as tilápias passaram<br />
também a ser comercializadas.<br />
Objetivos futuros<br />
*Média dos três últimos anos antes da mancha branca.<br />
Tabela 2. Dados zootécnicos das diferentes gerações do sistema AquaScience.<br />
Gerações do sistema AquaScience<br />
Geração 1 Geração 2 Geração 3 Geração 4*<br />
Animais/m² 170 a 180 270 a 280 380 a 410 500 a 700<br />
Produtividade<br />
(t/ha)<br />
Número de<br />
viveiros<br />
Área de<br />
produção (ha)<br />
25 a 30 35 a 45 45 a 55 80 a 90<br />
7 20 14**<br />
5,99 7,85 5,22 -<br />
* Projeções.<br />
**Encontra-se em fase de construção mais 8 viveiros da Geração 3 com 3,84ha de área de produção.<br />
Dentre as metas futuras comentadas pela equipe da Camanor para a <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong> estão:<br />
Construção de um laboratório para produção<br />
própria de pós-larvas de camarão, adaptadas ao<br />
sistema AquaScience;<br />
Implantação de um sistema bifásico de produção<br />
para os camarões dentro do novo projeto de ampliação.<br />
Atualmente os crustáceos entram no sistema<br />
como PL 10<br />
permanecendo até o final do cultivo;<br />
Como os alevinos de tilápia são produzidos pela<br />
própria Camanor em uma unidade denominada<br />
Núcleo de Peixes, há estudos visando o melhoramento<br />
genético da linhagem para uma maior tolerância a<br />
salinidade;<br />
Criar um centro de treinamento para capacitação<br />
dos funcionários;<br />
Criar um centro de pesquisas especificamente<br />
voltando à produção. Atualmente os ensaios são<br />
desenvolvidos diretamente nos módulos de produção.<br />
Questionados sobre metas de produtividade, o<br />
sócio e superintendente da Camanor, Luiz Henrique afirma<br />
não terem metas, pois, uma vez que se estabelece uma<br />
meta, se estabelece um fim, e se estivessem estabelecido um<br />
fim, a produtividade teria parado nos valores do G1. Aqua-<br />
Science, continuando a revolução...<br />
44<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
O recorde de<br />
produção<br />
alcançado em<br />
novembro de 2017 com<br />
73,6 t/ha produzidas, já é<br />
fruto das novas<br />
experiências de<br />
ampliação<br />
utilizando<br />
densidades<br />
mais altas.<br />
© <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong><br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
ARTIGO<br />
45
Artigo<br />
46<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
O açude Castanhão<br />
e a cadeia<br />
produtiva da tilápia<br />
Profa. Dra. Elenise Gonçalves de Oliveira<br />
Departamento de Engenharia de Pesca<br />
Universidade Federal do Ceará (UFC)<br />
elenisego@yahoo.com.br<br />
Prof. Dr. Sergio Alberto Apolinario<br />
Almeida<br />
Curso de Engenharia de Aquicultura<br />
Instituto Federal do Ceará, Campus de Morada Nova<br />
sergio.alberto@ifce.edu.br<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
47<br />
© Elenise Gonçalves
O açude Padre Cícero, conhecido pelo nome<br />
de açude Castanhão, teve a sua construção iniciada<br />
em 1995 e concluída em 2003, com a finalidade precípua<br />
de drenar as águas da bacia hidrográfica do Médio<br />
Jaguaribe/CE e receber as águas da transposição<br />
do Rio São Francisco. O Castanhão, cujo complexo é<br />
administrado pelo Departamento Nacional de Obras<br />
Contra as Secas (DNOCS), é apontado como o maior<br />
açude para usos múltiplos da América Latina, estando<br />
à aquicultura entre as finalidades para ele projetadas.<br />
O Castanhão possui uma bacia hidráulica de<br />
44.800 km², vindo sua barragem a ser construída no<br />
leito do principal rio do Ceará, o Rio Jaguaribe. Em<br />
junho de 2004 o açude já acumulava 4,99 bilhões de<br />
m 3 de água (74,58% de sua capacidade). Em 2008 o<br />
açude registrou o seu segundo maior volume (6,01<br />
bilhões de m 3 = 89,73% de sua capacidade) e em maio<br />
de 2009, o maior (6,55 bilhões de m 3 = 97,82 % de sua<br />
capacidade).<br />
Implantação dos primeiros projetos de piscicultura<br />
Enquanto os primeiros projetos aquícolas<br />
do Castanhão se instalavam (Estação de Piscicultura<br />
Rui Simões de Menezes - DNOCS; o projeto Curupati-Peixe<br />
de iniciativa da Secretaria Especial de Aquicultura<br />
e Pesca da Presidência da República – SEAP/<br />
PR; e o projeto Piscicultura Castanhão, de iniciativa<br />
do SEBRAE), a piscicultura cearense se consolidava<br />
em outras localidades do Polo de Produção Aquícola<br />
do Médio Jaguaribe e nos demais Polos de Produção<br />
(Alto Jaguaribe; Baixo Jaguaribe; Curu; Região<br />
Metropolitana e Região Norte). Em todos os Polos, a<br />
produção tinha como foco a tilápia do Nilo (Oreochromis<br />
niloticus), linhagem chitralada.<br />
Em 2013 a Agência Nacional de Águas (ANA),<br />
outorgou ao Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA<br />
– hoje extinto), as áreas de três parques aquícolas<br />
(Alto Santo, Jaguaribara e Jaguaribe/Jaguaretama), estabelecendo<br />
uma capacidade de suporte de 10.800 t de<br />
peixes/ano, e uma carga diária de ração da ordem de<br />
47.342,5 kg de ração.<br />
Os produtores de tilápia em tanques-redes, escolhidos por meio de processos<br />
licitatórios com vigência de 5 anos, foram subdivididos em duas categorias:<br />
não onerosa (674 lotes, sendo 337 para o parque aquícola de Jaguaribara,<br />
199 em Alto Santo e 138 em Jaguaribe/Jaguaretama) - concedida a produtores<br />
locais, sem aporte de recursos; e o restante de forma onerosa - concedida a<br />
empresários, os quais obrigam-se a pagar pelo uso da água.<br />
48<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Migração de produtores e mudanças<br />
Na metade da década atual (2013-2014), houve<br />
grande expansão da tilapicultura no açude Castanhão,<br />
expansão essa que pode ser atribuída à redução do<br />
volume de água dos demais reservatórios do Ceará,<br />
maioria dos Polos Aquícolas do Estado. Assim, para não<br />
paralisar as atividades, os piscicultores migraram para o<br />
Castanhão, se instalando em fazendas com “base terrestre”,<br />
para atender as demandas de alevinos, e com “base<br />
aquática”, para realizar a recria e terminação (engorda)<br />
em tanques-rede.<br />
O influxo de produtores fortaleceu a cadeia produtiva<br />
da tilápia no Castanhão, mas exigiu do setor o<br />
enfrentamento de grandes desafios, dentre os quais podem<br />
ser citados: implantação de estradas, energia elétrica,<br />
galpões, residências e laboratórios; convivência com<br />
a falta de saneamento básico no local; readequação das<br />
instalações de cultivo, substituindo os tanques-redes de<br />
Não obstante aos desafios enfrentados, em 10<br />
anos de atividade o setor piscícola do Castanhão investiu<br />
em capacitação, incorporou tecnologias inovadoras, adquiriu<br />
novas linhagens genéticas de tilápia (Chitralada,<br />
GIFT, SUPREME e Spring) e desenvolveu protocolos<br />
alimentares mais eficientes, utilizando ração com melhor<br />
balanço nutricional. Também passou a monitorar de forma<br />
sistemática o oxigênio dissolvido e temperatura da<br />
água, adotou programas de imunização dos peixes e de<br />
aproveitamento de resíduos sólidos e o uso de softwares<br />
para o gerenciamento da produção. Isso contribuiu para<br />
a melhoria de índices zootécnicos e econômicos, de forma<br />
que em condições de normalidade é possível obter<br />
taxas de sobrevivência entre 82 a mais de 95%; produção<br />
pequeno volume (6 a<br />
9 m 3 ), pelos de médio<br />
e grande volume<br />
(15 a mais de 150<br />
m 3 ); construção de<br />
plataformas flutuantes<br />
para suportar<br />
operações de estocagem,<br />
classificação,<br />
repicagem, vacinação<br />
e despesca<br />
de grandes volumes<br />
de peixes; atração<br />
de fornecedores de<br />
insumos e serviços<br />
O influxo de<br />
produtores<br />
fortaleceu a<br />
cadeia produtiva<br />
da tilápia no<br />
Castanhão, mas<br />
exigiu do setor o<br />
enfrentamento<br />
de grandes<br />
desafios.<br />
para a região; mortalidades repentinas e de forma massiva<br />
dos peixes cultivados.<br />
Profissionalização do setor<br />
que pode superar 50 kg/m 3 ; conversão alimentar entre<br />
1,4 e 1,8:1; duração do ciclo de cultivo de 140 a 220 dias,<br />
para tilápia com peso médio final de 1,0 kg, com rendimento<br />
acima de 70% para peixes dessa classe de peso; e<br />
lucratividade de R$ 0,50 a 1,00 por kg de peixe produzido.<br />
Graças a isso, Jaguaribara entrou nas estatísticas<br />
como o município com a segunda maior produção de<br />
peixes no <strong>Brasil</strong>, por três anos consecutivos (2014=16,92<br />
mil toneladas; 2015=13,80 mil toneladas; 2016=17,36<br />
mil toneladas), produção essa absorvida, na maior parte,<br />
pelos mercados da grande Fortaleza e região metropolitana,<br />
com destaque para o mercado do Carlito Pamplona,<br />
redes de supermercados e comércio varejista.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
49<br />
© Sergio Almeida
Jaguaribara: Terra da tilápia!<br />
Jaguaribara, município sede do<br />
açude Castanhão, conta com uma população de pouco<br />
mais de 10.000 habitantes, sendo que a cadeia produtiva<br />
da tilapicultura envolve direta e indiretamente<br />
cerca de 2.000 pessoas, cerca de 80 empreendimentos<br />
entre pequeno e médio porte e centenas de produtores<br />
não onerosos, organizados em associações ou<br />
produzindo de forma individualizada. Além disso, a<br />
cadeia produtiva da tilápia envolve: 12 associações de<br />
piscicultores, 01 cooperativa de produtores de tilápia,<br />
cerca de 80 produtores privados não associados; 08<br />
empresas produtoras de alevinos de tilápia, 02 unidades<br />
de pequeno porte para beneficiamento do pescado,<br />
02 fábricas de gelo, 03 metalúrgicas fabricantes<br />
de tanques-rede e equipamentos diversos para auxiliar<br />
a produção, 08 empresas que trabalham com a revenda<br />
de ração e 01 empresa especializada no recolhimento<br />
de resíduos e transformação em óleo de peixe a partir<br />
das vísceras do pescado abatido. Importante destacar<br />
que todos os empreendimentos mantêm pelo menos<br />
um profissional com Graduação na área de conhecimento<br />
das Ciências Agrárias, e alguns dos empreendimentos<br />
mantem parcerias com instituições de ensino<br />
e pesquisa, recebendo alunos em programas de estágios<br />
e de pesquisas.<br />
50<br />
© Elenise Gonçalves<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Início dos problemas<br />
As características do açude, com períodos de<br />
ausência de ventos, dias nublados, entrada de água<br />
nova, temperaturas elevadas (acima dos 30°C) e ocasionais<br />
mudanças da qualidade da água, além de manejo<br />
inadequado de comportas do açude, são apontadas<br />
como os principais responsáveis por mortalidades repentinas<br />
de peixes. Esse fato se agravou nos últimos<br />
anos, em função da redução drástica do volume de<br />
água do açude (31/12/2011 = 73,62%; 15/11/2017 =<br />
2,92% da capacidade de armazenamento).<br />
Em 2015, o setor registrou uma mortalidade<br />
de aproximadamente 2.500 toneladas de peixes, o que<br />
suspendeu a atividade em várias fazendas e levou alguns<br />
produtores a transferirem suas atividades para<br />
reservatórios dos vizinhos Estados da Paraíba, Piauí,<br />
Pernambuco e Bahia.<br />
A espera das chuvas...<br />
Em 2017 os tilapicultores do Castanhão<br />
entraram em compasso de espera para colocar o Ceará<br />
de volta ao ranking dos maiores produtores de peixes<br />
do <strong>Brasil</strong>. Para isso aguardam as águas da transposição<br />
do Rio São Francisco (a previsão inicial era para 2012<br />
e a atual é para 2018), uma vez que são cada vez menores<br />
as expectativas de recuperar o nível das águas do<br />
açude com as poucas chuvas de 2017.<br />
Enquanto aguardam a recuperação do nível<br />
do açude, os tilapicultores vem buscando tecnologias<br />
que diminuam o consumo de água (sistemas de recirculação<br />
de água – RAS; Bioflocos – BFT; cultivos integrados<br />
– Aquaponia, etc). Outra medida importante<br />
diz respeito à realização de estudos técnicos para um<br />
reordenamento dos parques aquícolas e o estabelecimento<br />
de novas diretrizes para o setor. Essa medida<br />
envolve uma parceria entre o DNOCS (órgão que<br />
gerencia o Castanhão), o setor produtivo e os profissionais<br />
da iniciativa privada e do setor público.<br />
Figura 1. Volume de água acumulado no açude Castanhão, no período de janeiro de 2004 a maio de 2017.<br />
Fonte: Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (COGERH)/Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (FUNCEME).<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
ARTIGO<br />
51
Artigo<br />
52<br />
© Elisandra Pereira<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
O dia a dia da<br />
compostagem<br />
orgânica:<br />
Manejo, relação C/N e<br />
aplicação<br />
Me. Ivã Guidini Lopes<br />
Laboratório de Compostagem<br />
Centro de Aquicultura da Unesp (CAUNESP)<br />
ivanguid@gmail.com<br />
Dra. Rose Meire Vidotti<br />
Polo Regional Centro Norte<br />
Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios<br />
Profa. Dra. Mara Cristina Pessôa da Cruz<br />
Laboratório de Fertilidade do Solo<br />
Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV/UNESP)<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
53
Minimizar impactos ambientais, aumentar o<br />
caráter sustentável da produção aquícola e possibilitar<br />
o incremento da geração de renda com um novo produto.<br />
Esses são apenas alguns dos múltiplos benefícios<br />
da adoção da compostagem orgânica em empreendimentos<br />
aquícolas, sejam eles piscicultura (alevinagem<br />
e engorda), frigorífico ou mesmo centros de pesquisas<br />
na área. O fato é que não podemos mais ser negligentes<br />
com os resíduos que geramos, pois mesmo quando<br />
o impacto não é visível prontamente, é certo que cedo<br />
ou tarde ele será sentido por todos.<br />
Por ser um método de baixo custo e de fácil<br />
implementação, além de se adequar a praticamente<br />
todos os resíduos sólidos gerados na cadeia,<br />
a compostagem orgânica vem ganhando importância<br />
e maior visibilidade entre aquicultores, os quais, em<br />
sua maioria, não costumam incluir em seus projetos<br />
iniciais a gestão dos resíduos. A falta de planejamento<br />
leva os produtores a iniciarem o projeto de gestão<br />
de resíduos com certa desconfiança e desânimo, pois<br />
estes, de imediato, podem pensar apenas nos gastos<br />
e nas horas de dedicação ao processo que serão subtraídas<br />
das atividades consideradas principais. No<br />
entanto, a gestão dos resíduos gerados em qualquer<br />
produção animal possui tanta importância quanto<br />
qualquer outra atividade típica do empreendimento e<br />
deve ser realizada da forma mais adequada e consciente<br />
possível.<br />
© Elisandra Pereira<br />
Figura 1. Resíduos dispostos em uma pilha de compostagem.<br />
54<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Materiais utilizados e relação C:N<br />
Os resíduos de animais aquáticos variam significativamente<br />
de acordo com o tipo de empreendimento<br />
e incluem, de modo geral, carcaças de peixes<br />
mortos naturalmente em pisciculturas, resíduos do<br />
processamento de diferentes organismos ou mesmo<br />
carcaças oriundas de pesquisas científicas (Vidotti e<br />
Lopes, 2016). Esses resíduos podem ser destinados à<br />
compostagem da maneira como são gerados (p. ex.<br />
carcaças inteiras) (Figura 1), sendo desnecessária<br />
sua moagem. Além destes, para a compostagem<br />
é necessária também a inclusão de um substrato<br />
vegetal, o qual servirá primordialmente como agente<br />
estruturante das composteiras. Existem muitas possibilidades<br />
de substratos vegetais, como por exemplo,<br />
poda de árvores, serragem, cascas e palhas de grãos<br />
(p. ex. arroz, amendoim, milho), que não precisam<br />
estar secos para serem utilizados, pois a umidade<br />
desses materiais contribui de forma significativa para<br />
o bom andamento do processo de compostagem.<br />
Os resíduos de animais servem como fornecedores<br />
de um nutriente importante, o nitrogênio,<br />
enquanto os resíduos vegetais são fontes principais<br />
de carbono. Assim, é importante saber ao menos a<br />
relação carbono: nitrogênio (C: N) dos materiais que<br />
estão sendo utilizados, dado que auxiliará no planejamento<br />
dos manejos a serem feitos nas composteiras.<br />
Por exemplo, a relação C: N de resíduos de animais<br />
aquáticos (carcaças de peixes, camarões e rãs)<br />
pode variar entre 5,0 e 6,5, enquanto a serragem e a<br />
casca de amendoim possuem relações C: N de 257,9 e<br />
38,4, respectivamente. Com isso, é possível planejar a<br />
relação C: N inicial de uma composteira no momento<br />
da montagem.<br />
Em diversos materiais didáticos é possível<br />
encontrar recomendações para a montagem de leiras<br />
com a relação C: N inicial de 30: 1, ou seja, 30 partes<br />
de carbono para 1 parte de nitrogênio (Inácio e<br />
Miller, 2009). No entanto, o cálculo dessas proporções<br />
não se enquadra<br />
para todos os tipos<br />
de resíduos<br />
existentes, como<br />
no caso da compostagem<br />
com<br />
resíduos de animais<br />
aquáticos,<br />
na qual é muito<br />
difícil atingir esse<br />
critério, mesmo<br />
sabendo a quantidade<br />
de C e N<br />
dos resíduos uti-<br />
A gestão dos<br />
resíduos gerados<br />
em qualquer<br />
produção animal possui<br />
tanta importância<br />
quanto qualquer outra<br />
atividade típica do empreendimento<br />
e deve<br />
ser realizada da forma<br />
mais adequada<br />
e consciente<br />
possível.<br />
lizados. Mesmo<br />
assim, é possível<br />
trabalhar com proporções específicas de resíduos de<br />
animais e vegetais e verificar o andamento normal do<br />
processo de compostagem, obtendo-se um composto<br />
orgânico de boa qualidade (Lopes et al., 2017).<br />
Com o passar dos anos, fomos aprimorando<br />
os métodos de compostagem de animais e estabelecendo<br />
procedimentos essenciais, como a necessidade<br />
de altura mínima da leira de 55 cm para<br />
a temperatura atingir os valores recomendados, de<br />
revolvimentos periódicos e da manutenção da umidade<br />
no interior da composteira. Um dos aprendizados<br />
mais importantes foi que a relação C: N é de<br />
difícil equilíbrio. Contudo, vale destacar que apesar<br />
das dificuldades, o andamento da compostagem depende<br />
significativamente do “olho” do responsável<br />
pelo manejo, pois a cada dia surgem problemas novos,<br />
sem procedência, e que devem ser resolvidos<br />
prontamente. Tratando-se da compostagem orgânica,<br />
não há melhor aprendizado do que colocar a mão<br />
na massa e acompanhar o processo com seriedade. O<br />
acompanhamento de uma composteira deve ser feito<br />
diariamente, quanto à:<br />
Temperatura;<br />
Aspecto da pilha (exposição de carcaças ou vazamento de chorume); e<br />
Umidade dos materiais dispostos.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
ARTIGO<br />
55
© Elisandra Pereira<br />
Figura 2. Adição de água em uma composteira com 10 dias de compostagem, para manutenção da umidade no interior e na superfície da pilha.<br />
A temperatura pode ser verificada com a<br />
inserção de um vergalhão de ferro no interior da<br />
composteira, o qual deverá estar quente após a inserção.<br />
Já a exposição de carcaças e o vazamento<br />
de chorume devem ser evitados, adicionando mais<br />
substrato caso necessário. O parâmetro mais difícil<br />
de manter em níveis adequados, sem o uso de<br />
equipamentos específicos é a umidade, a qual dependerá<br />
muito do olho do observador (Figura 2).<br />
Uma composteira com baixa umidade possui<br />
grande quantidade de pó, o qual é levantado no ar<br />
quando se revolve a pilha, enquanto materiais úmidos<br />
não causam esse fenômeno. Além disso, é perceptível<br />
quando o material está úmido pelo seu aspecto geral,<br />
mas essa percepção só é obtida com o tempo. A umidade<br />
da composteira estará visualmente acima dos<br />
níveis recomendados (acima de 60%) quando a temperatura<br />
não atingir altos níveis (próximos a 65 °C) no<br />
primeiro ou segundo dia após a montagem da mesma,<br />
ou quando for perceptível um excesso de chorume<br />
sendo gerado na pilha. Para evitar o vazamento excessivo<br />
de chorume e o excesso de umidade, é recomendada<br />
a adição de mais substrato na composteira, até<br />
que esses eventos parem de ocorrer. Vale ressaltar que<br />
a temperatura no interior da leira estável com a temperatura<br />
ambiente, é o indicativo de que a compostagem<br />
está finalizada, desde que os manejos periódicos<br />
tenham sido realizados corretamente.<br />
56<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Aplicação do composto orgânico no solo<br />
Compostos orgânicos de carcaças de animais<br />
podem ter uso direto, puros ou em mistura com outros<br />
materiais, para composição de substratos utilizados na<br />
produção de mudas de espécies frutíferas e ornamentais,<br />
que já são mercados consumidores de compostos<br />
orgânicos. Além do uso direto, os compostos podem ser<br />
aplicados no solo.<br />
A composição do composto depende da combinação<br />
dos materiais utilizados, entretanto, compostos<br />
produzidos a partir de carcaças de peixes são, de modo<br />
geral, ricos em nitrogênio e fósforo. Uma característica<br />
obrigatória do composto é que ele deve apresentar<br />
relação C: N menor do que 20. A aplicação e incorporação<br />
ao solo de materiais ricos em carbono e pobres em<br />
nitrogênio (com alta relação C: N) não é recomendável,<br />
pois no processo de transformação do composto aplicado<br />
pode haver consumo do nitrogênio mineral do solo<br />
por microrganismos, o que pode resultar em deficiência<br />
temporária de nitrogênio para as plantas e perda de produtividade.<br />
No entanto, obedecendo aos princípios da<br />
compostagem e fazendo manejo adequado do produto<br />
no solo, a aplicação de compostos é altamente benéfica<br />
não só pelo fornecimento de nutrientes às plantas, mas<br />
pelo potencial de aumento do teor de matéria orgânica<br />
do solo. Aumentar o teor de matéria orgânica do solo<br />
não é um processo fácil, mas quando ocorre, o solo<br />
ganha qualidade: melhora a estrutura e a capacidade<br />
de armazenar água e nutrientes, o que é extremamente<br />
importante para manter e melhorar a produtividade das<br />
culturas.<br />
© Elisandra Pereira<br />
Figura 3. Setor de compostagem do Caunesp.<br />
Conclusão<br />
A compostagem dos animais mortos, além de resolver o problema da destinação do resíduo, pode, com<br />
algum investimento, resultar em um produto que permite reciclar nutrientes e melhorar a qualidade do solo, com<br />
geração de renda extra para o aquicultor.<br />
Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/artigos<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
ARTIGO<br />
57
Artigo<br />
Segurança do trabalho é<br />
o conjunto de medidas técnicas,<br />
educacionais, médicas e psicológicas,<br />
empregadas para prevenir<br />
acidentes, quer eliminando as<br />
condições inseguras do ambiente,<br />
quer instruindo ou convencendo<br />
as pessoas da implantação de<br />
práticas preventivas (Chiavenato,<br />
2002).<br />
Manter um ambiente<br />
de trabalho seguro e saudável é<br />
obrigação de todos os empregadores<br />
do <strong>Brasil</strong>, independente<br />
do ramo de atividade. Segundo o<br />
Artigo 7º da Constituição Federal<br />
<strong>Brasil</strong>eira, são direitos dos trabalhadores<br />
urbanos e rurais, a<br />
redução dos riscos inerentes ao<br />
trabalho, por meio de normas de<br />
saúde, higiene e segurança. Esta<br />
obrigação constitucional, em muitos<br />
casos, é desrespeitada por algumas<br />
empresas, já que nelas as<br />
normas de saúde e segurança do<br />
trabalho não são postas em prática.<br />
Neste artigo iremos<br />
abordar sobre a segurança do trabalho,<br />
aplicando-a a situações do<br />
dia a dia de quem trabalha com<br />
aquicultura.<br />
58<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
A importância da<br />
Segurança do<br />
Trabalho na<br />
Atividade<br />
Aquícola<br />
Prof. Dr. Renato Teixeira Moreira*<br />
Prof. Dr. Antonio Glaydson Lima Moreira<br />
Prof. Dr. José Reges da Silva Lobão<br />
Instituto Federal do Ceará – IFCE, Campus Morada Nova<br />
*drrtm234@gmail.com<br />
Prof. Esp. Gabriel Teixeira Pinto<br />
Instituto Federal do Ceará – IFCE, Campus Fortaleza<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
© Pedro Haack<br />
59
©brianskerry.com<br />
60<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
O que diz a legislação?<br />
Segundo a Lei 8.213/1991, em<br />
seu artigo 19, o acidente do trabalho<br />
é o que ocorre pelo exercício do trabalho<br />
a serviço de empresa, provocando<br />
lesão corporal ou perturbação funcional<br />
que cause a morte, a perda ou<br />
redução, permanente ou temporária,<br />
da capacidade para o trabalho. Os colaboradores<br />
estão expostos a cortes no<br />
manuseio de equipamentos utilizados<br />
na aquicultura e utensílios como facas,<br />
facões dentre outros, a quedas e<br />
escorregões, choques elétricos, caso os<br />
equipamentos não estejam instalados<br />
e/ou aterrados de forma correta, presença<br />
de plantas urticantes e cortantes,<br />
presença de animais peçonhentos e/ou<br />
insetos nocivos e na manipulação dos<br />
próprios organismos cultivados.<br />
Este último pode ser exemplificado<br />
no cultivo da tilápia-do-Nilo<br />
(Oreochromis niloticus), onde a espécie<br />
apresenta espinhos ósseos nas<br />
nadadeiras, e no cultivo do camarão<br />
Litopenaeus vannamei, que apresenta<br />
uma estrutura pontiaguda na extremidade<br />
da cauda denominada telson.<br />
Ambas estruturas corporais destes<br />
animais, podem provocar cortes,<br />
perfurações e outros ferimentos nos<br />
técnicos que inadvertidamente os manipulam<br />
sem a devida proteção.<br />
Ainda sobre a Lei 8.213/1991,<br />
em seu artigo 21, também considera<br />
como acidente de trabalho, o acidente<br />
de trajeto. Este é ocorrido no percurso<br />
entre a residência e o local de trabalho<br />
ou do local de trabalho para a<br />
residência do trabalhador e também as<br />
doenças (artigo 20) que os empregados<br />
possam adquirir no exercício de suas<br />
funções. A empresa deve comunicar o<br />
acidente do trabalho à Previdência Social<br />
até o primeiro dia útil seguinte ao<br />
dia do ocorrido. Essa Comunicação de<br />
Acidente de Trabalho – CAT, garante<br />
aos trabalhadores os benefícios<br />
previdenciários que porventura lhes<br />
sejam devidos (Lei 8.213/1991, artigo<br />
22).<br />
Os trabalhadores que laboram<br />
tanto em empreendimentos aquícolas<br />
de água salgada, salobra e/ou em ambientes<br />
de água doce, estão constantemente<br />
expostos a outros riscos que<br />
podem comprometer sua segurança<br />
e principalmente sua saúde. Devido<br />
às condições de trabalho, o ambiente<br />
pode tornar-se insalubre. Por<br />
definição, insalubre é considerado<br />
aquele ambiente que, por sua natureza,<br />
condições ou métodos de trabalho,<br />
exponham os empregados a agentes<br />
nocivos à saúde, acima dos limites de<br />
tolerância fixados em razão da natureza<br />
e da intensidade do agente e do tempo<br />
de exposição aos seus efeitos (Art.<br />
189 da CLT). No entendimento geral<br />
da Norma Regulamentadora Nº 15<br />
(NR-15), do Ministério do Trabalho<br />
e Emprego – MTE, insalubridade fica<br />
definida como sendo a exposição a<br />
riscos físicos, químicos e biológicos.<br />
Os trabalhadores de empreendimentos<br />
aquícolas estão constantemente<br />
realizando suas atividades à céu<br />
aberto, em algumas situações expostos<br />
ao sol, consequentemente, submetidos<br />
aos riscos físicos de radiação não ionizante<br />
(raios UV) e calor. Eles também<br />
estão expostos ao risco físico umidade,<br />
caso permaneçam em contato com<br />
a água do ambiente de cultivo sem a<br />
devida proteção, como por exemplo<br />
em procedimento de despesca por arrasto.<br />
Já em relação aos riscos<br />
químicos, estão expostos a materiais<br />
particulados (poeira) característico<br />
de ambientes rurais e sem cobertura<br />
vegetal, e ao pó proveniente dos “finos<br />
da ração” e outros produtos como os<br />
materiais calcários. O uso de conservantes<br />
para manter a qualidade do<br />
pescado pós-despesca, também pode<br />
ser considerado de risco químico. Em<br />
relação aos riscos biológicos, de acordo<br />
com a NR-15, em seu anexo 14, o<br />
trabalhador desta atividade só estará<br />
exposto a este risco caso tenha contato<br />
permanente com carnes, glândulas,<br />
vísceras e sangue de animais que estejam<br />
acometidos com doenças infectocontagiosas.<br />
Isso ocorre devido ao<br />
contato com vírus, bactérias, fungos<br />
ou qualquer outro microrganismo que<br />
possa afetar sua saúde, onde uma simples<br />
lesão ou corte superficial pode levar<br />
a infecção cruzada provocada pelo<br />
agente infeccioso.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
ARTIGO<br />
61
Levantamento dos acidentes de trabalho na aquicultura brasileira<br />
De acordo com o mais recente anuário estatístico<br />
de acidentes do trabalho, divulgado pela Previdência<br />
Social, entre os anos de 2013 e 2015 foram comunicados<br />
221 acidentes (Tabela 1), incluindo os típicos, de trajeto<br />
e doenças, envolvendo trabalhadores na atividade de<br />
aquicultura em água salgada e salobra. Já em aquicultura<br />
de água doce foram comunicados à Previdência Social<br />
291 acidentes, incluindo os típicos, de trajeto e doenças<br />
(Tabela 2). Um outro risco a qual os trabalhadores<br />
estão expostos é o ergonômico. Segundo a Norma<br />
Regulamentadora Nº17 (NR-17) do MTE, não deverá<br />
ser exigido nem admitido o transporte manual de cargas,<br />
por um trabalhador cujo peso seja suscetível de comprometer<br />
sua saúde ou sua segurança. Isso muitas vezes não é<br />
respeitado na aquicultura, já que é constante o manuseio<br />
de peso excessivo, como por exemplo a movimentação<br />
manual de vários sacos de ração ao longo da jornada de<br />
trabalho, fazendo com que os trabalhadores possam ter<br />
problemas (doenças) na coluna vertebral.<br />
De acordo com a NR 06 do MTE, toda empresa<br />
é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente,<br />
Equipamento de Proteção Individual (EPI) adequado<br />
ao risco e em perfeito estado de conservação e funcionamento,<br />
orientações e treinamentos quanto ao uso<br />
adequado destes equipamentos. Já na NR 31, que, entre<br />
outros ramos de atividade, cita obrigações sobre saúde<br />
e segurança do trabalho na Aquicultura, o empregador<br />
rural, de acordo com as necessidades de cada atividade,<br />
deve garantir ao empregado, equipamentos de proteção<br />
individual, dos quais podemos destacar para atividades<br />
aquícolas, chapéu ou outra proteção contra o sol, chuva<br />
e salpicos; protetores faciais contra lesões ocasionadas<br />
por partículas, respingos, vapores de produtos químicos<br />
e radiações luminosas intensas; óculos contra a ação da<br />
poeira e do pólen; protetores auriculares para as atividades<br />
com níveis de ruído prejudiciais à saúde; proteção<br />
das vias respiratórias, luvas e mangas de proteção contra<br />
lesões ou doenças provocadas por materiais ou objetos<br />
escoriantes ou vegetais, abrasivos, cortantes ou perfurantes<br />
e picadas de animais peçonhentos; botas impermeáveis<br />
e antiderrapantes para trabalhos em terrenos<br />
úmidos e/ou lamacentos; botas com solado reforçado,<br />
onde haja risco de perfuração; calçados fechados, jaquetas,<br />
aventais, entre outros.<br />
Tabela 1. Acidentes notificados na atividade aquícola praticada em ambientes de água salobra ou salgada nos anos de 2013 a 2015.<br />
Tipo<br />
Tipo<br />
de<br />
de<br />
Acidente<br />
Acidente<br />
Aquicultura<br />
Aquicultura<br />
em<br />
em<br />
água<br />
água<br />
salgada<br />
salgada e<br />
salobra<br />
salobra<br />
2013<br />
2013<br />
2014<br />
2014<br />
2015<br />
2015<br />
Típico<br />
Típico<br />
56<br />
56<br />
48<br />
48<br />
55<br />
55<br />
Trajeto<br />
Trajeto<br />
17<br />
17<br />
23<br />
23<br />
19<br />
19<br />
Doenças<br />
Doenças 0 3 0<br />
Total<br />
Total<br />
73<br />
73<br />
74<br />
74<br />
74<br />
74<br />
Tabela 2. Acidentes notificados na atividade aquícola praticada em ambientes de água doce nos anos de 2013 a 2015.<br />
Tipo de Acidente Aquicultura em água doce<br />
2013 2014 2015<br />
Típico 115 76 63<br />
Trajeto 12 12 12<br />
Doenças 1 0 0<br />
Total 128 88 75<br />
62<br />
ARTIGO<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Conclusões<br />
Para finalizar é importante ressaltar o comprometimento<br />
em cumprir as normas de saúde e segurança<br />
do trabalho, não só para as atividades aquícolas, mas<br />
para todas as atividades realizadas em ambiente rural.<br />
Assim como é muito importante que os empregadores<br />
comuniquem, de forma oficial, todos os<br />
acidentes de trabalho, seja ele típico, trajeto ou doenças<br />
adquiridas no trabalho. Esta comunicação, além de garantir<br />
aos empregados seus direitos previdenciários,<br />
mantém os dados estatísticos de acidentes de trabalho,<br />
que ocorrem na atividade aquícola atualizados. Essa não<br />
é uma forma de punir o empresário, mas sim de possibilitar<br />
o desenvolvimento de melhores práticas laborais<br />
e construir uma atividade mais responsável, segura e<br />
saudável.<br />
Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/artigos<br />
©thebalance.com
A rt i g o s pa r a cur t i r<br />
e compa rt i l h a r<br />
Aquaponia em RAS!<br />
Editada pelo brasileiro Wagner Cotroni Valenti, em parceria com os pesquisadores A. A. Van Dam e W.<br />
Zhang, a revista científica <strong>Aquaculture</strong> Reports é mais um periódico científico superinteressante e disponível online<br />
para consultas em geral.<br />
Em seu 7º volume (páginas 77-82, agosto de 2017), foi publicado o artigo “Valuation of vegetable crops<br />
produced in the UVI Commercial Aquaponic System”, de autoria de Donald S. Bailey e Rhuanito S. Ferrarezi. O<br />
trabalho está na lista dos mais baixados da <strong>Aquaculture</strong> Reports e, de fato, vale a pena a leitura!<br />
O sistema “UVI Commercial Aquaponic” foi projetado<br />
com intuito de produzir peixes e vegetais<br />
em um sistema de recirculação aquícola;<br />
Os aquicultores podem produzir uma variedade<br />
de culturas ou se especializarem nas culturas<br />
mais valiosas para aumentar a lucratividade;<br />
Cada ciclo produz um valor diferente por unidade<br />
de área. Neste contexto, a seleção de variedades é<br />
importante visando o maior retorno do investimento.<br />
Confira os resultados do trabalho e o artigo completo no link:<br />
https://doi.org/10.1016/j.aqrep.2017.06.002<br />
64<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
C h a r g e s<br />
Fonte de cálcio?<br />
Brincadeira tem hora!<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
65
BIOTECNOLOGIA DE ALGAS<br />
Sistemas de Cultivo de<br />
Microalgas – Parte II<br />
Dr. Roberto Bianchini Derner<br />
Laboratório de Cultivo de Algas<br />
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)<br />
Florianópolis, SC<br />
roberto.derner@ufsc.br<br />
S<br />
eguindo com o assunto sobre a produção de microalgas,<br />
a escolha do sistema de cultivo a ser implantado<br />
deve ser feita levando em consideração o<br />
produto a ser obtido e/ou a sua aplicação. Na literatura<br />
são encontrados artigos apontando tanto as vantagens<br />
e desvantagens dos sistemas abertos quanto dos sistemas<br />
fechados, entretanto, é consenso que os sistemas<br />
abertos têm menores custos de implantação e<br />
de operação e manejo simplificado, no entanto, não<br />
permitem o controle dos parâmetros ambientais que<br />
implicam no crescimento das culturas e na qualidade<br />
da biomassa. Tanto em sistemas abertos quanto em<br />
sistemas fechados é possível a aplicação de diferentes<br />
Métodos de Cultivo: Estacionário (batelada ou<br />
“batch”), Semicontínuo ou Contínuo; que podem implicar<br />
em grandes variações na produtividade das culturas,<br />
no valor nutricional da biomassa e nos custos de<br />
produção. Quase como uma regra, nos cultivos para a<br />
alimentação dos organismos de aquicultura (rotíferos,<br />
copépodes, artêmias, cladóceros, larvas de camarões e<br />
moluscos etc.) a produção de microalgas é desenvolvida<br />
com o emprego do Método Estacionário, no qual<br />
um recipiente (garrafa, bolsa plástica, cilindro, tanque<br />
etc.) é enchido com água tratada (através de filtração,<br />
cloração, UV ou ozônio, p. ex.), logo são adicionados<br />
os nutrientes e na sequência é feita a inoculação (geralmente<br />
uma cultura com menor volume). Esta cultura<br />
é mantida por algum tempo - sem qualquer manejo,<br />
enquanto as microalgas se multiplicam por sucessivas<br />
divisões mitóticas, e após alguns dias é integralmente<br />
66<br />
COLUNA<br />
Figura 1. Curva de crescimento de uma cultura de microalgas em cultivo do tipo/método estacionário (batelada ou “batch”).<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
empregada na alimentação dos organismos, ou pode servir<br />
de inóculo para o desenvolvimento de culturas com maior<br />
volume. Neste método de cultivo o crescimento das culturas<br />
pode ser representado por uma Curva de Crescimento<br />
(Figura 1) que apresenta (teoricamente) cinco fases distintas:<br />
1) Fase de Aclimatação (Indução ou Lag),<br />
na qual as células microalgais recém inoculadas podem<br />
sofrer temporariamente alguma forma de estresse por conta<br />
das novas condições ambientais (irradiância, concentração<br />
de nutrientes, pH, temperatura etc.), e até ocorrer a morte<br />
de parte das células em casos de estresse extremo - na prática,<br />
isto ocorre por falta de atenção ou de conhecimento do<br />
microalgicultor;<br />
2) Fase Exponencial (Log), na qual a multiplicação<br />
celular é intensa e constante. Ao final desta fase<br />
(Fase Exponencial Tardia) as culturas alcançam elevada<br />
densidade celular e as células têm significativos teores de<br />
proteínas e de ácidos graxos poli-insaturados, assim apresentam<br />
a melhor qualidade nutricional para uso na alimentação<br />
em aquicultura. Além disso, em geral a contaminação<br />
microbiana - sempre presente em culturas em maior escala<br />
– ainda permanece em baixo nível. Cabe apontar que o<br />
crescimento das culturas decorre da assimilação (ou consumo)<br />
dos nutrientes do meio de cultura e, recomendamos<br />
o desenvolvimento de estudos da nutrição das microalgas<br />
visando que os nutrientes sejam integralmente consumidos<br />
até o final desta fase;<br />
3) Fase de Redução do Crescimento<br />
Relativo, onde, por conta da diminuição da passagem da<br />
luz para o interior da cultura causado pelo autossombreamento<br />
- e não necessariamente pela falta de nutrientes –<br />
ocorre redução na taxa de divisão celular;<br />
4) Fase Estacionária, na qual, devido ao agravamento<br />
do autossombreamento e da depleção dos nutrientes,<br />
a taxa de divisão celular é contrabalançada pela taxa<br />
de morte, assim, a densidade celular permanece constante<br />
por algum tempo. A limitação do crescimento da cultura<br />
causa intensas alterações metabólicas que refletem na composição<br />
bioquímica da biomassa, e que podem levar à perda<br />
do valor nutricional, mas isto pode ser interessante se o<br />
objetivo é a extração de alguns pigmentos, ácidos graxos<br />
saturados e outros produtos de valor comercial;<br />
5) Fase de Morte, quando as condições de cultivo<br />
já não mais permitem o desenvolvimento da cultura.<br />
Apesar da informação geral sobre o cultivo de<br />
microalgas, é incomum que nos laboratórios tenham sido<br />
desenvolvidos estudos para o conhecimento da máxima<br />
densidade celular (ou biomassa) possível de ser alcançada<br />
nos sistemas de cultivo – é ainda menos comum que<br />
seja conhecido o momento em que a biomassa apresenta<br />
o maior valor nutricional para os organismos a serem<br />
alimentados. Em geral, alguém decidiu (sem conhecimento<br />
aprofundado) que as culturas em cultivo estacionário<br />
estão “prontas” em três dias, por exemplo, e daí aquela<br />
informação é propagada ad aeternum. Ocorre que, na<br />
maioria dos casos, neste tempo de cultivo as culturas ainda<br />
não atingiram a maior densidade celular possível de ser<br />
alcançada naquelas condições de cultivo, podendo levar<br />
a um gasto desnecessário de água e de nutrientes. Dentre<br />
diversos pontos que precisam ser considerados, um muito<br />
importante é que o nitrogênio do meio de cultura (usualmente<br />
nitrato) quando não corretamente dosado pode levar<br />
a um consumo luxuriante (excessivo e sem vantagem<br />
para o desenvolvimento da cultura) e, pior, caso ainda esteja<br />
em elevada concentração no momento de uso da cultura<br />
na alimentação dos organismos pode se tornar tóxico<br />
(nitrogênio amoniacal) para estes organismos. Portanto, o<br />
profundo conhecimento dos sistemas de cultivo e, principalmente,<br />
do metabolismo das microalgas é fator determinante<br />
nos laboratórios, quando devem ser considerados os<br />
custos de produção, e principalmente a qualidade das culturas<br />
e da biomassa.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
COLUNA<br />
67
Green Technologies<br />
A<br />
Bioflocos:<br />
todas as espécies são aptas?<br />
no após ano depois de diversas visitas, cursos e<br />
treinamentos realizados no <strong>Brasil</strong> e fora dele, cada vez<br />
mais venho escutando nas rodas “informais” de conversas<br />
sobre o potencial e aplicação do sistema de bioflocos para<br />
diferentes espécies de organismos aquáticos. Mas afinal, quais<br />
seriam os fatores que devem ser levados em consideração<br />
antes de escolher uma espécie? Durante muito tempo, precisamente<br />
desde 2011 no meu primeiro curso ministrado<br />
sobre BFT realizado no México, sempre indago e questiono<br />
• Hábito alimentar filtrador e/ou detritívoro: neste<br />
sentido haveria um melhor aproveitamento dos<br />
agregados microbianos, com consumo direto dos<br />
bioflocos e consequentemente redução na conversão<br />
alimentar e economia com rações;<br />
• Aparato morfológico adequado: como rastros<br />
branquiais mais desenvolvidos nos peixes<br />
e maxilípedes diferenciados nos camarões, onde<br />
facilitaria a apreensão das partículas suspensas e/<br />
ou aderidas em algum substrato (biofilme);<br />
• Tolerantes a níveis intermediários dos compostos<br />
nitrogenados: visando um melhor enfrentamento<br />
dos picos de amônia e nitrito que normalmente<br />
ocorrem durante os ciclos produtivos;<br />
• Tolerantes aos sólidos suspensos: presentes<br />
nos sistemas e que devem ser monitorados e, se<br />
necessário, controlados, visando o bem-estar da<br />
espécie e a manutenção da qualidade de água do<br />
cultivo;<br />
• Tolerante a altas densidades de estocagem: item<br />
importante para uma correta formação dos bioflocos<br />
e ajudando a viabilizar o sistema;<br />
• Preferencialmente de ciclo curto de produção:<br />
“fugindo” dos riscos inerente de qualquer cultivo<br />
intensivo;<br />
• Possuir bom valor de mercado: justificando os<br />
altos custos de investimento necessários para o<br />
sistema.<br />
Dr. Maurício Gustavo Coelho Emerenciano<br />
UDESC, Laguna, SC<br />
mauricioemerenciano@hotmail.com<br />
os participantes sobre quais seriam os fatores que devem ser<br />
levados em consideração antes de escolher uma espécie apta.<br />
Muitas vezes nossas “fronteiras” são limitadas às tilápias e aos<br />
camarões marinhos Litopenaeus vannamei. Mas em diversas<br />
regiões do <strong>Brasil</strong> e também em outros países, outras espécies<br />
desempenham papel fundamental na aquicultura regional e<br />
o sistema BFT poderia ser uma alternativa, ao menos em alguma<br />
etapa de produção. Neste sentido alguns pontos devem<br />
ser atendidos ou levados em consideração, tais como:<br />
Figura 1. Exemplos de espécies alternativas como piracanjuba Brycon orbignyanus e pacu<br />
Piaractus mesopotamicus sendo testadas no Laboratório de Aquicultura da Universidade do<br />
Estado de Santa Catarina (UDESC), Campus Laguna-SC.<br />
Estes são apenas alguns fatores, mas certamente com<br />
o avanço da ciência nas Universidades e Centros de pesquisa,<br />
somados às experiências da iniciativa privada, vamos ampliar<br />
os horizontes do conhecimento e poder aplicar com maior<br />
segurança este desafiador sistema (BFT) nas espécies alternativas<br />
brasileiras e mundiais. É ver para crer! Nas próximas<br />
colunas iremos relatar algumas experiências que deram certo<br />
e perspectivas para o futuro do sistema BFT para espécies alternativas!<br />
© Tayna Sgnaulin<br />
68<br />
COLUNA<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Empreendedorismo<br />
Aquícola<br />
André Camargo<br />
Escama Forte<br />
andre@escamaforte.com.br<br />
Q<br />
ue temos os maiores potenciais do mundo para<br />
produção de peixes tropicais de água doce, todos<br />
já estamos cansados de saber, porém muito pouco<br />
se fala nos enormes potenciais que temos para a<br />
produção de peixes tropicais de água salgada. Falamos<br />
pouco pois trata-se de um potencial ainda mais distante.<br />
O mar oferece uma realidade distinta da água<br />
doce que torna o processo muito mais difícil de se<br />
transformar em realidade produtiva.<br />
Se pensarmos em pacote tecnológico, a piscicultura<br />
marinha encontra-se um pouco atrás, pois a<br />
alevinagem comercial, por exemplo, somente há poucos<br />
anos foi dominada de forma a garantir a instalação<br />
de unidades de engorda em todo o País. Contamos<br />
com apenas duas espécies com volume comercial, o<br />
bijupirá (Rachycentron canadum) e a garoupa (Epinephelus<br />
marginatus), enquanto na água doce temos<br />
mais de 20 espécies em produção. Mas serão estes os<br />
motivos pelos quais a atividade ainda não deslanchou?<br />
Não! A piscicultura marinha possui um dificultador<br />
maior que torna o processo muito mais complicado: o<br />
Mar. Este ambiente exige mais em todos os pontos de<br />
vista: investimentos, instalações, tecnologia, logística<br />
e assim por diante. Se na água doce já é difícil viabilizar<br />
pequenos projetos, na água salgada isso passa<br />
a ser praticamente impossível. Os investimentos<br />
necessários em processos básicos como embarcações,<br />
tanques-rede, fundeio das estruturas, entre outros, são<br />
caros e devem ser planejados de forma extremamente<br />
profissional para que o dinheiro investido não se perca.<br />
Projetos como os das empresas Redemar<br />
Alevinos, da Fazenda Marinha Ilha de Búzios e da<br />
Maricultura Costa Verde, devem e com certeza serão<br />
extremamente valorizados pela aquicultura brasileira,<br />
pois o pioneirismo empenhado por estes empresários<br />
é digno de reverência por todos aqueles que sabem o<br />
quanto foi difícil chegar até aqui. Não podemos deixar<br />
de citar também os esforços realizados pelos pesquisadores<br />
de universidades e institutos de pesquisa, com<br />
destaque para UFSC, FURG, UFC, Instituto de Pesca,<br />
entre outros.<br />
Agora, uma coisa é fato, este pioneirismo<br />
ajudou o <strong>Brasil</strong> a caminhar e a estarmos cada vez mais<br />
O que é nosso está<br />
guardado<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
próximos de encontrar o caminho para investimentos<br />
de maior porte que venham a originar a indústria<br />
da piscicultura marinha brasileira. Indústria que tem<br />
tudo para ser muito grande e forte, levando para o<br />
<strong>Brasil</strong> e o mundo um pescado de alto valor agregado<br />
que não pode mais ser ofertado pela indústria da pesca<br />
extrativa. Portanto caros leitores, o que é do <strong>Brasil</strong><br />
está guardado e quando se tornar realidade será feito<br />
de forma triunfal.<br />
COLUNA<br />
69<br />
© André Camargo
NUTRIÇÃO<br />
Manejo alimentar<br />
Parte II:<br />
Taxa de arraçoamento<br />
Dr. Artur Nishioka Rombenso<br />
Laboratório de Nutrição, Instituto de Oceanografia,<br />
Universidade Autônoma de Baja California, Ensenada, México.<br />
artur.nishioka@uabc.edu.mx<br />
N<br />
a coluna passada apresentei o conceito de<br />
manejo alimentar e abordei com maiores<br />
detalhes a frequência alimentar. Se você<br />
ainda não teve a oportunidade de lê-la, recomendo<br />
que busque a edição número 8! Hoje continuarei<br />
no mesmo assunto, porém tratando sobre a taxa de<br />
arraçoamento. Vale ressaltar novamente que existe<br />
uma sinergia entre a frequência alimentar e a taxa<br />
de arraçoamento, portanto, para resultados mais<br />
precisos, recomendo avaliar esses dois parâmetros<br />
em conjunto através de um desenho experimental<br />
fatorial. A taxa de arraçoamento consiste na<br />
quantidade (em unidades de peso como kg e g) de<br />
alimento ofertado diariamente, que pode ser: (1)<br />
preestabelecida em função da porcentagem de biomassa<br />
de um tanque que, para muitas espécies de<br />
peixes, por exemplo, pode variar entre 3% e 7%; ou<br />
(2) baseada na saciedade aparente, a qual é definida<br />
pela redução do frenesi alimentar dos organismos,<br />
porém é algo subjetivo, variando de acordo com o<br />
bom senso de cada um. Ambas têm suas vantagens<br />
e desvantagens, e são utilizadas dependendo do objetivo<br />
da alimentação, sistema experimental ou de<br />
criação, espécie em questão, fase do ciclo de vida,<br />
entre outros fatores.<br />
É fato que quanto mais alimentarmos um<br />
organismo, mais ele crescerá, porém isso ocorre até<br />
certo ponto. O mais importante a ser considerado<br />
é o quão eficiente será o crescimento, pois o excesso<br />
de alimento pode alterar a composição proximal<br />
(principalmente acúmulo de gordura no filé e na<br />
região intraperitoneal), aumentar o fluxo gastrointestinal<br />
(aumento de fezes), aumentar o desperdício<br />
de alimento e ainda aumentar a entrada de nutrientes<br />
no sistema de criação, deteriorando a qualidade<br />
da água do mesmo.<br />
Como ilustração, cito um experimento<br />
realizado com juvenis de 3g do peixe marinho<br />
enxada (Chaetodipterus faber, de potencial aquícola<br />
comercial e ornamental) alimentados com duas frequências<br />
alimentares (1 e 3 vezes ao dia) e três taxas<br />
de arraçoamento (3, 5 e 7% da biomassa). Foi utilizada<br />
uma ração comercial de 1,4 mm para peixes<br />
marinhos com 50% de proteína bruta, 10% de lipídio,<br />
3% de fibra e 16% de cinzas. Após 39 dias, observamos<br />
que quanto maior a taxa de arraçoamento<br />
maior o crescimento, e quanto mais frequente<br />
a alimentação maior o crescimento, independente<br />
da taxa de arraçoamento. Assim, para essa espécie,<br />
tamanho de organismo, tipo de alimento e sistema<br />
de criação, a melhor frequência alimentar foi de 3<br />
vezes ao dia. Já em relação a taxa de arraçoamento,<br />
vale ressaltar que apesar do maior crescimento<br />
dos peixes alimentados a 7% da biomassa, o mesmo<br />
é menos eficiente que 5% da biomassa. Nesse mesmo<br />
estudo foram observados acúmulo de lipídio<br />
e redução de proteína na composição proximal de<br />
peixes inteiros conforme o aumento da taxa de arraçoamento.<br />
Para mais informações, sugiro a leitura<br />
do artigo Trushenski et al., (2012).<br />
O intuito dessas duas últimas colunas foi<br />
demonstrar a importância do regime alimentar<br />
na aquicultura e sua influência na produção,<br />
na qualidade nutricional do produto final, na<br />
sustentabilidade e viabilidade da fazenda.<br />
70<br />
COLUNA<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Figura 1. Crescimento (peso final individual) de juvenis de peixe enxada alimentados<br />
com diferentes frequências alimentares (1 e 3 vezes ao dia) e taxas de arraçoamento<br />
(3, 5 e 7% da biomassa) por 39 dias. (Trushenski et al., 2012).<br />
Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/colunas<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
71
ATUALIDADES & TENDÊNCIAS<br />
NA AQUICULTURA<br />
Fenacam 2017:<br />
um mar de otimismo<br />
Fábio Rosa Sussel - Zootecnista, Dr.;<br />
Pesquisador científico da Apta - UPD<br />
Pirassununga, SP.<br />
sussel@apta.sp.gov.br<br />
A<br />
té já tinha um outro artigo começado para esta<br />
edição, porém, após ter participado da Fenacam<br />
2017 achei mais pertinente deixar registrado o<br />
meu relato sobre o evento. Tecnicamente impecável<br />
e comercialmente fantástico. Recorde de público<br />
e de negócios concretizados. Palestras da programação e<br />
eventos paralelos disputados. Entre outras observações,<br />
estas listadas representam bem o que foi o evento.<br />
Notou-se ainda uma postura diferente do público<br />
presente. Tanto estudantes quanto produtores,<br />
extremamente interessados em novas informações, tecnologias.<br />
Fazendas enviaram seus funcionários para<br />
conhecer o evento e as novidades do setor. O otimismo<br />
estava estampado no rosto de todos.<br />
Com todos os expositores que conversei, a<br />
reação foi a mesma: “Superou a melhor das expectativas.<br />
” E com uma particularidade bem interessante:<br />
preferência por produtos e marcas mais conceituadas,<br />
tecnificadas. Ou seja, estão captando a mensagem que o<br />
novo momento da aquicultura exige profissionalismo e<br />
dedicação. É possível sim conviver com a mancha branca<br />
e é viável financeiramente investir, mas é necessário<br />
mudar a postura para produzir.<br />
Me chamou a atenção ainda a participação expressiva<br />
da piscicultura no evento. Paralelamente ao<br />
XIV Simpósio Internacional de Carcinicultura ocorria<br />
também o XI Simpósio Internacional de Aquicultura,<br />
onde as palestras eram mais voltadas para a parte de<br />
peixes. Piscicultores de todas as regiões do país estavam<br />
presentes no evento. Aliás, que bela iniciativa da ABCC<br />
abrir mão de qualquer vaidade e pensar na aquicultura<br />
como um todo. É de iniciativas assim que precisamos<br />
cada vez mais.<br />
Por sinal, está mais que na hora de pensarmos<br />
em uma associação nacional que represente a aquicultura<br />
como um todo. Não tenho dúvidas que seria muito<br />
mais estratégico levar nossas reivindicações por meio<br />
de uma representação nacional bem consolidada (e temos<br />
condições pra isto) que continuarmos vinculados<br />
(e sem representatividade) a pesca extrativa. Por que não<br />
a fusão da Peixe BR e ABCC? Precisamos urgentemente<br />
pensar na aquicultura como um todo. Por casualidade,<br />
no intervalo de uma semana tive a grata oportunidade<br />
de conversar sobre este assunto com Itamar Rocha<br />
(Presidente da ABCC) e Ricardo Neukirchner (Presidente<br />
da Peixe BR). Ficou claro para mim o entendimento<br />
e o desejo de fusão entre as duas entidades. Peixe<br />
BR tem muito a agregar com a ABCC e vice-versa.<br />
Algumas “vaidades” (não sei se seria este o termo<br />
mais adequado) precisam ser superadas. O mais<br />
importante é que ambos os lados possuem o entendimento<br />
da importância disso. Uma associação nacional<br />
forte com seus respectivos representantes estaduais.<br />
Lembrando da necessidade urgente de conscientizar<br />
todos os associados e envolvidos que associação não é<br />
para ajudar produtores em suas particularidades. E sim<br />
representatividade dos interesses comuns. Associação é<br />
para reivindicar e não reclamar. Vale a pena refletir sobre<br />
o assunto.<br />
Voltando a Fenacam 2017, sem sombra de dúvidas<br />
o maior evento da aquicultura brasileira dos últimos<br />
anos. Evento técnico e objetivo, que conciliou transferência<br />
de tecnologias e negócios. Fica o exemplo para<br />
todos os outros eventos técnicos e científicos a serem<br />
realizados no <strong>Brasil</strong>: quanto de dinheiro público será<br />
usado, qual a abrangência do evento e qual o resultado<br />
prático esperado/obtido?<br />
72<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
Figura 1. Vista a partir do Centro de Convenções de Natal - Fenacam 2017
RANICULTURA<br />
MONITORAMENTO DA<br />
QUALIDADE DA ÁGUA:<br />
CONCEITOS INICIAIS<br />
Dr. Andre Muniz Afonso<br />
Universidade Federal do Paraná (UFPR), Palotina, PR.<br />
andremunizafonso@gmail.com<br />
C<br />
aros leitores, pode parecer surreal, mas existe um<br />
grande grupo de produtores que nunca avaliou<br />
a qualidade da água que abastece a sua propriedade.<br />
O mesmo pode ser extrapolado para a quantidade,<br />
também conhecida como vazão. A produção aquícola<br />
tem a sua base na água, ela é, sem sombra de dúvida, o<br />
elemento mais importante da aquicultura. As soluções<br />
e os problemas passam por ela, inclusive, a causa destes<br />
pode estar nela. Sendo assim, a pergunta é: “-Por que<br />
isso ocorre?” Falta amadurecimento no setor produtivo<br />
aquícola nacional. Quando vemos as notícias recentes da<br />
proibição da importação do pescado brasileiro por mercados<br />
tradicionais, nos deparamos com essa triste realidade.<br />
O país ainda não amadureceu para o que pode ser<br />
uma das suas grandes riquezas econômicas!<br />
Para começar a falar da água de abastecimento,<br />
assim como faço com meus alunos, antes de entrar no<br />
detalhamento dos quesitos de qualidade da água, é importante<br />
falar sobre a quantidade disponível. Pelo que foi<br />
exposto no início, quando não se sabe a vazão, principalmente<br />
na época de secas, não se tem a real dimensão<br />
do quanto de água disponível existe para a execução do<br />
projeto aquícola. Ainda que existam modernos sistemas<br />
Figura 1. Exemplo de filtro mecânico e biológico compartimentalizado.<br />
de recirculação e de reaproveitamento de água, e acredito<br />
que o caminho seja aprimorá-los e adotá-los mesmo, a<br />
noção da quantidade de água disponível para o sistema<br />
por dia é fundamental para iniciar qualquer aquicultura.<br />
Outro fator de importância se refere à fonte da<br />
água de abastecimento, que pode limitar todo o planejamento<br />
inicial de uma ranicultura. Normalmente encontramos<br />
ranários que utilizam água proveniente de<br />
poço semiartesiano ou artesiano, de rios, de córregos, de<br />
represas e de nascentes na própria propriedade. Poucos<br />
são aqueles que se utilizam de água encanada tratada,<br />
principalmente por conter cloro, prejudicial a girinos<br />
e a reprodutores. Em todos os casos, ao se elaborar um<br />
projeto de ranicultura, deve-se atentar para o volume<br />
de água que será utilizado por dia, prevendo-se as futuras<br />
expansões e estimando-se um reservatório de pelo<br />
menos três vezes esse valor, de modo a evitar aqueles imprevistos<br />
que acontecem na sexta-feira à noite e que não<br />
poderão ser resolvidos no final de semana.<br />
Uma vez estabelecido o volume, o segundo passo<br />
é a análise fisicoquímica e microbiológica da água,<br />
realizada em laboratórios da rede privada ou pública.<br />
Ainda que esses valores sejam compatíveis com uma<br />
boa qualidade de água, recomenda-se a instalação de filtros,<br />
que podem ser construídos pelo próprio produtor<br />
e irão servir como grandes aliados na manutenção da<br />
qualidade da água e como barreiras físicas à entrada de<br />
problemas externos ao ranário. A água, por ser veículo<br />
de patógenos, por exemplo, pode determinar o sucesso e<br />
o fracasso de um ranário muito bem estruturado.<br />
Os filtros mais comuns podem ser do tipo<br />
mecânicos, químicos, biológicos, um misto de dois ou<br />
mais de dois desses fatores, ou ainda purificadores. Têm<br />
como propósito a separação e a eliminação de partículas<br />
físicas, químicas ou biológicas da água, tais como sólidos<br />
de argila em suspensão na água, ferro e ovos de parasitas,<br />
respectivamente. Ainda que existam argumentos<br />
para invalidá-los, são sempre bem-vindos, uma vez que<br />
seu custo-benefício se prova na eficiência produtiva dos<br />
modelos que o adotam, independentemente da escala<br />
utilizada.<br />
O assunto da água ideal para a ranicultura se<br />
estende, portanto, esses comentários iniciais são apenas<br />
uma introdução ao assunto, que será desbastado em futuras<br />
colunas... até breve!<br />
SAUDAÇÕES RANÍCOLAS!<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
COLUNA<br />
73
Aquicultura de Precisão<br />
“Precisão nas pesquisas aplicadas”<br />
Dr. Eduardo Gomes Sanches - Instituto de Pesca / APTA/SAA, Ubatuba, SP<br />
esanches@pesca.sp.gov.br<br />
R<br />
ecentemente li um editorial de Carole R. Engle, editor<br />
do Journal of the World <strong>Aquaculture</strong> Society, intitulado<br />
“High-Impact Research: The Critical Need for<br />
Strong Engagement with <strong>Aquaculture</strong> Producers” (traduzindo:<br />
Pesquisas de alto impacto: as críticas necessárias<br />
para um forte envolvimento com o setor produtivo da<br />
aquicultura) e resolvi escrever esta coluna baseado nas<br />
discussões sobre este assunto que tive com minha colega, a<br />
Dra. Vanessa Villanova Kuhnen. O editor discorre sobre a<br />
importância em produzir pesquisas que gerem resultados<br />
com potencial para publicação em periódicos científicos<br />
de elevado fator de impacto (termo relacionado com o<br />
número de citações que recebe um artigo). Ele destaca a<br />
importância dos pesquisadores ao realizarem pesquisas<br />
não apenas em seus laboratórios, mas nos empreendimentos<br />
comerciais de aquicultura. Acho que seria “chover no<br />
molhado” discutir a relevância destas afirmações. Mas<br />
onde podemos chegar com esta abordagem simplificada<br />
do problema? E o que está acontecendo hoje no <strong>Brasil</strong>?<br />
Há mais de duas décadas trabalho com pesquisa<br />
em aquicultura. Desde minha graduação sempre fui ligado<br />
ao segmento produtivo da aquicultura, seja implantando<br />
cultivos, realizando atividades de assessoria e consultoria<br />
e até mesmo produzindo peixes. O que tenho visto,<br />
ao longo do tempo, foi realmente um significativo distanciamento<br />
entre as necessidades do setor produtivo e as<br />
pesquisas realizadas pela academia (onde podemos incluir<br />
as universidades e outras instituições de ensino, pesquisa<br />
e extensão). Mas posso garantir, por experiência própria,<br />
que este distanciamento nem sempre ocorre por vontade<br />
das partes mas sim pelas necessidades ditadas por entidades<br />
diversas que estabelecem as “regras do jogo”. Existe<br />
uma expressiva dificuldade de publicar, em periódicos de<br />
elevado impacto, artigos que apresentem pouca precisão<br />
estatística (ex. poucas réplicas) e que não abordem fronteiras<br />
do conhecimento. Por outro lado, as demandas do<br />
segmento produtivo apresentam muitas interfaces que<br />
exigem estudos em períodos de tempo mais prolongados,<br />
com indivíduos de maior peso, o que consequentemente,<br />
exigirá mais espaço e infra-estrutura para realização das<br />
réplicas exigidas para precisão estatística e a obtenção de<br />
resultados confiáveis. Por exemplo, os estudos de nutrição<br />
de peixes marinhos, são feitos, em sua maioria com formas<br />
© Eduardo Sanches<br />
Figura 1. Pesquisa em fazendas.<br />
jovens, e em curtos períodos de experimentação. Decorre<br />
que os maiores desafios da cadeia produtiva estão na nutrição<br />
de peixes de maior peso (acima de 500 gramas) até o<br />
peso comercial (muitas vezes acima de 3 kg). Desta forma,<br />
podemos ver a dificuldade em transpor este desafio para<br />
compor parcerias.<br />
Claro que este assunto é bem mais complexo que<br />
isto, mas dizer simplesmente que o pesquisador deve se<br />
aproximar e desenvolver seus trabalhos junto ao segmento<br />
produtivo, sem considerar as dificuldades inerentes<br />
do rigor no delineamento amostral que os periódicos<br />
74<br />
COLUNA<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
científicos exigem para publicação,<br />
me parece uma forma de apenas<br />
“falar o que os ouvidos gostam de<br />
ouvir”...<br />
© Eduardo Sanches<br />
Pensem em como é difícil<br />
um pesquisador entender a<br />
dinâmica de um empreendimento<br />
de aquicultura. Agora imaginem<br />
um empresário e os funcionários<br />
entenderem a forma de trabalhar<br />
do pesquisador. Tente alinhar as<br />
expectativas de ambos os lados. Vejam<br />
que expectativas não alinhadas<br />
geram frustações. E críticas de ambos<br />
os lados são comumente ouvidas<br />
em diferentes fóruns.Além disto, se<br />
por um lado os produtores esperam<br />
ansiosamente aplicar os resultados<br />
obtidos com a pesquisa, os pesquisadores<br />
são alijados pelas regras<br />
impostas pelos órgãos financiadores<br />
de suas pesquisas, que exigem cada<br />
vez mais volume de publicação em<br />
periódicos internacionais.<br />
Figura 2. Pesquisa em fazendas.<br />
Apesar das dificuldades,<br />
muitos pesquisadores no <strong>Brasil</strong> têm rompido esta barreira,<br />
trabalhando alinhados com as necessidades do setor produtivo,<br />
o que tem resultado em excelentes artigos publicados<br />
em periódicos de elevado impacto e desatando grandes<br />
“nós” que existiam para produção nos empreendimentos<br />
comerciais de aquicultura. Apesar de ainda estarem longe<br />
de ser maioria, estão mostrando que este caminho é possível.<br />
Neste sentido as universidades e seus programas de<br />
pós-graduação podem fazer toda a diferença na formação<br />
dos jovens cientistas em possibilitar a aproximação destes<br />
com o setor produtivo. Assim como também cabe aos produtores<br />
“abrirem as porteiras” tendo a compreensão de que<br />
parte de seu empreendimento não irá produzir no ritmo<br />
comercial, pois estará seguindo o ritmo da ciência. Neste<br />
sentido, o programa de financiamento Pesquisa Inovativa<br />
em Pequenas Empresas, da Fundação de Amparo a Pesquisa<br />
no Estado de São Paulo (FAPESP), tem possibilitado a<br />
aproximação entre pesquisador e empresa, com resultados<br />
animadores.<br />
Acredito que temos muito o que evoluir para realmente<br />
aproximar a academia do setor produtivo. O setor<br />
produtivo tem demandas que precisam ser atendidas pela<br />
ciência. E a ciência tem que ser realizada, também, dentro<br />
da realidade de produção de organismos aquáticos.<br />
Como pudemos abordar, temos muitos bons exemplos de<br />
trabalhos feitos em cooperação pesquisador & empreendimentos<br />
de aquicultura no <strong>Brasil</strong>, o que nos deixa a certeza<br />
de que, apesar do longo caminho ainda a ser trilhado, nossos<br />
resultados indicam que estamos no rumo certo. Neste<br />
sentido, a <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong> tem um importante papel em<br />
proporcionar a aproximação entre estes dois mundos. Vida<br />
longa para esta iniciativa. Até a próxima coluna.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
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Aquicultura<br />
Latino-americana<br />
FENACAM:<br />
mais que uma Feira!<br />
Dr. Rodolfo Luís Petersen<br />
Universidade Federal do Paraná<br />
(UFPR), Pontal, PR.<br />
rodolfopetersen@hotmail.com<br />
N<br />
ão existem dúvidas que a FENACAM é umas das principais<br />
feiras de negócios aquícolas da América Latina. As<br />
principais empresas do mundo inseridas no mercado<br />
brasileiro, ou querendo entrar, vêm apresentar seus produtos e<br />
serviços. Renomados conferencistas nacionais e internacionais<br />
financiados pelas empresas. A maioria das apresentações são<br />
comerciais, porém, longe de tirá-las o mérito. Do meu ponto<br />
de vista, a parte acadêmica de apresentações orais e de pôster<br />
não são muito relevantes. Como reunião científica, no <strong>Brasil</strong>,<br />
o AQUACIÊNCIA é o evento principal. Nos anos em que a<br />
FENACAM fez parte da agenda da Sociedade Mundial de Aquicultura<br />
(WAS), como a histórica edição da conferência anual em<br />
Salvador, ou nos capítulos Latino-americanos, a parte científica<br />
torna-se mais importante. A seção gastronômica lamentavelmente<br />
é praticamente inexistente. Eu retiraria como parte das<br />
programações do evento.<br />
Das 14 edições devo ter ido a 12. No início os protagonistas<br />
eram as fábricas de ração, hoje é a<br />
© <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong><br />
biotecnologia genômica e os manejos intensivos<br />
de berçários, juvenis e engorda.<br />
A primeira totalmente futurística e a segunda<br />
já sendo aplicada com resultados<br />
promissores, principalmente pelo fantasma<br />
da mancha branca para o povoamento<br />
final de uma larva mais robusta. Outro<br />
tema coadjuvante e apavorante foi o de<br />
doenças emergentes, principalmente o<br />
EMS- AHPND. Achei esquisito o pessoal<br />
não comentar nada nos corredores sobre<br />
a chegada do EMS- AHPND nas larviculturas<br />
equatorianas.<br />
qualquer um com um pouco de conhecimento na plateia. Fábio<br />
mandou um recado muito certo ao setor acadêmico: os pesquisadores<br />
precisam de FOCO. Não é possível que numa mesma<br />
universidade tenhamos pesquisadores trabalhando em 4 a 5<br />
espécies diferentes. Além disso, mandou outro recado contundente:<br />
temos que pesquisar os peixes realmente de destaque na<br />
aquicultura brasileira atual: tilápia e peixes redondos.<br />
Voltando ao camarão, palestra magistral do Dr. Daniel<br />
Lanza (UFRN), pontuando claramente as consequências de<br />
uma possível abertura do mercado para o camarão de fora com<br />
relação aos riscos de entrada de novos patógenos. Bela justificativa<br />
para ABCC defender a manutenção do fechamento das<br />
importações em Brasília! Ninguém reclamou da Fenacam2017<br />
ter sido ruim de negócios. Esperamos que o novo governo e o<br />
sindicato de restaurantes não tenham suficiente força para abrir<br />
o mercado, despencando o preço salvador na era WSV. Se isso<br />
acontecer, a FENACAM 2018 estará banhada de lágrimas.<br />
Outro dos fatores interessantes<br />
que vieram a enriquecer a FENACAM<br />
foi a incorporação de temas de piscicultura<br />
em suas edições. Isso foi herdado da<br />
época do IMNV onde o desespero por alternativas<br />
colocou a piscicultura na Feira.<br />
Destaque para a palestra de Fábio Sussel,<br />
nosso correspondente na TV, divulgando<br />
e defendendo a aquicultura em todo<br />
canto do País. A palestra de Fábio, como<br />
ele mesmo diz, não foi motivacional mas<br />
foi contundente e objetiva, motivando a<br />
Figura 1. Itamar Rocha, presidente da ABCC, encerrando as palestras do Simpósio de Carcinicultura na<br />
Fenacam 2017.<br />
76<br />
COLUNA<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Piscicultura Marinha<br />
<strong>Brasil</strong> x México<br />
E<br />
m novembro de 2017 tive a oportunidade de participar<br />
do Congresso Latino Americano de Aquicultura<br />
(LACQUA), realizado na cidade de Mazatlán, no<br />
México. Na ocasião, pude conversar com vários colegas Latino-americanos<br />
e visualizar o que vem sendo realizado a nível<br />
de piscicultura marinha. Foram poucas as apresentações sobre<br />
a temática, mas me impressionou o que vem sendo realizado<br />
no México. Várias espécies nativas desse país sendo estudadas<br />
e produzidas comercialmente. Exemplo esse que poderia<br />
servir de espelho ao <strong>Brasil</strong>, pois temos muito em comum com<br />
nossos amigos mexicanos. Ao que pude ver, as semelhanças<br />
são a nível climático, cultural, diversidade de espécies, níveis<br />
econômicos e burocráticos... E, no entanto, ao contrário do<br />
<strong>Brasil</strong>, a piscicultura marinha deu grandes passos no México.<br />
Na terceira edição desta revista, foi publicado um<br />
artigo onde se comenta que além da produção do atum azul<br />
do Pacífico (Thunnus orientalis), o México vem produzindo<br />
ainda a totoaba (Totoaba macdonaldi), a corvina (Scianoeps<br />
ocellatus) e o olhete (Seriola dorsalis). Pude acompanhar durante<br />
o LACQUA, que além dessas espécies ainda há o robalo<br />
(Centropomus undecimalis), o pargo (Lutjanus guttatus) e o<br />
© Artur Rombenso<br />
Figura 1. Fazenda de produção de atum Baja Aqua Farms, no México.<br />
Dr. Ricardo Vieira Rodrigues<br />
Estação Marinha de Aquicultura (EMA)<br />
Universidade Federal do Rio Grande (FURG)<br />
vr.ricardo@gmail.com<br />
olhete (S. rivoliana) sendo estudadas e/ou produzidas.<br />
Outra questão que me chamou muito a atenção é que<br />
as dificuldades são as mesmas que enfrentamos no <strong>Brasil</strong> para<br />
o desenvolvimento da piscicultura marinha. Uma grande diversidade<br />
de espécies sendo estudadas, a escala de produção<br />
ainda é pequena - o que acaba dificultando o desenvolvimento<br />
adequado e específico de uma dieta para cada espécie - e<br />
a escassez de mão de obra qualificada, principalmente para a<br />
produção de juvenis em larga escala. Observando essas dificuldades,<br />
chama a atenção a comparação com o <strong>Brasil</strong>, pois<br />
são exatamente as mesmas dificuldades enfrentadas aqui.<br />
Por outro lado, um aspecto importante impulsiona<br />
o desenvolvimento da piscicultura marinha no<br />
México: sua proximidade com os Estados Unidos e Canadá!<br />
Essa proximidade facilita a importação de equipamentos<br />
americanos para desenvolvimento dos laboratórios de produção<br />
de juvenis (por exemplo: equipamentos de sistemas de<br />
recirculação de água), facilitam a importação de ração comercial<br />
para peixes marinhos e de mão de obra especializada, e a<br />
proximidade com um mercado consumidor com grande poder<br />
de compra. Esses aspectos acabam encarecendo a produção,<br />
mas, por outro lado, proporcionam<br />
aos poucos o desenvolvimento<br />
da atividade e uma<br />
nova geração de renda ao país,<br />
que já é um grande produtor<br />
de camarão e tilápia.<br />
Falando em produção de<br />
camarão e tilápia, tive a oportunidade<br />
de visitar uma fazenda<br />
de produção de camarão<br />
que aos poucos está migrando<br />
para a produção em sistema<br />
de bioflocos. Outra iniciativa,<br />
junto a universidades locais,<br />
é a inclusão da tilápia em bioflocos<br />
como alternativa e diversificação<br />
da produção de<br />
camarão em fazendas comerciais,<br />
devido as doenças que<br />
vêm afetando a carcinicultura.<br />
E por que a tilápia vem sendo<br />
introduzida em sistema<br />
de bioflocos marinho? Justamente<br />
pela falta de juvenis de<br />
peixes marinhos e de espécies<br />
adaptadas a esse sistema de<br />
produção, ou seja, mais um<br />
nicho de estudo com espécies<br />
marinhas, as adaptadas a sistemas<br />
de bioflocos!<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
COLUNA<br />
77
Recirculating <strong>Aquaculture</strong> Systems<br />
UMA INTRODUÇÃO<br />
AS MOTOBOMBAS<br />
Dr. Marcelo Shei<br />
Altamar Equipamentos e Sistemas Aquáticos<br />
shei@altamar.com.br<br />
www.altamar.com.br<br />
I<br />
ndependente da espécie ou do sistema de produção,<br />
movimentar ou transportar a água é<br />
uma necessidade contínua na maioria dos sistemas<br />
de aquicultura mais atuais. Em um sistema de<br />
recirculação (RAS), o sistema de bombeamento é<br />
uma etapa fundamental, possibilitando que a água<br />
circule continuamente entre as diferentes etapas de<br />
tratamento e os tanques de cultivo. Nessa edição<br />
irei abordar alguns aspectos básicos que devem ser<br />
considerados na seleção, instalação e manutenção<br />
desse processo.<br />
Demanda e energia: como o processo de<br />
bombeamento de água opera de forma ininterrupta<br />
e requer uma quantidade substancial de energia, a<br />
seleção do equipamento e instalações adequadas<br />
são importantes para manter os custos operacionais<br />
mais baixos possíveis. A demanda de bombeamento<br />
é conhecida a partir da soma da elevação total<br />
necessária, da perda de carga da tubulação, das<br />
conexões e equipamentos que estiverem nessa linha<br />
e da vazão requerida no sistema. A partir dessas<br />
informações, podemos fazer a seleção do tipo e<br />
modelo de motobomba que atenda essas condições<br />
com o menor consumo elétrico possível.<br />
Instalação: quanto as motobombas centrífugas<br />
externas (instaladas fora da água), apesar<br />
de existirem modelos auto escorvantes, o ideal é<br />
que a água chegue até a motobomba por gravidade,<br />
conhecida como “sucção afogada”. Desse modo, a<br />
motobomba opera com maior eficiência, sem a necessidade<br />
de puxar a água que será bombeada. As<br />
bombas auto escorvantes são utilizadas em locais<br />
aonde não é possível utilizar um modelo submerso<br />
ou uma instalação afogada. Essas motobombas possuem<br />
um reservatório acoplado que fica permanentemente<br />
preenchido de água e garante a partida do<br />
sistema quando a motobomba está acima do nível<br />
de água.<br />
Prevenção de problemas: por esse ser um<br />
equipamento crítico em um RAS, o recomendado<br />
é que ele seja instalado com um outro reserva ou<br />
opere com dois ou mais equipamentos em paralelo.<br />
Essa estratégia visa garantir que mesmo com a falha<br />
de um equipamento, exista outro para que o sistema<br />
continue a funcionar, diminuindo as chances de<br />
falha. O uso de inversores de frequência permitem<br />
ajustar a velocidade dos motores, otimizando a<br />
relação entre pressão, vazão e consumo elétrico. A<br />
operação em velocidades mais baixas também diminui<br />
o desgaste do selo mecânico e do motor.<br />
© Altamar<br />
Figura 1. Motobombas plásticas, com motores blindados e de baixa rotação<br />
instaladas em paralelo.<br />
Manutenção: O ideal é que as motobombas<br />
sejam instaladas sempre com válvulas, e uniões,<br />
permitindo que o equipamento seja desconectado<br />
facilmente para a manutenção. Válvulas de retenção<br />
também podem ser usadas para evitar acidentes,<br />
principalmente em bombas instaladas em paralelo.<br />
Também é recomendado que a cada seis meses<br />
os equipamentos passem por uma revisão, principalmente<br />
nos rolamentos e selos mecânicos, isso<br />
aumentará a vida útil dos equipamentos e evitará<br />
surpresas desagradáveis.<br />
A Altamar possui experiência e suporte<br />
de diversos fabricantes para selecionar e fornecer<br />
soluções que podem ser utilizadas em sistemas de<br />
água doce ou marinha.<br />
78<br />
COLUNA<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
79
TECNOLOGIA DO<br />
PESCADO<br />
C<br />
onforme publicado na coluna da 8ª <strong>Edição</strong>, a<br />
evolução tecnológica na indústria do pescado<br />
está intimamente relacionada à globalização,<br />
competitividade, capacidade tecnológica da indústria e<br />
finalmente do conhecimento das tecnologias emergentes<br />
– das inovações tecnológicas.<br />
Nesse sentido, muitas indústrias internacionais<br />
estão se adaptando e seguindo esse caminho, principalmente<br />
na adoção de inovações em suas plantas de<br />
processamento. No <strong>Brasil</strong>, existia ainda um impasse,<br />
pois tais inovações tecnológicas ainda eram vistas pelo<br />
MAPA como preocupantes, principalmente por alimentar<br />
um problema muito discutido – a fraude econômica.<br />
Para melhorar ainda mais esse cenário, com<br />
uma visão global, buscando a maior competitividade,<br />
padronização, segurança e até mesmo vislumbrando<br />
possível implementação da rastreabilidade na indústria,<br />
o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento<br />
(MAPA) recentemente publicou a Instrução Normativa<br />
Nº 30, de 9 de agosto de 2017 – SDA/MAPA, que estabelece<br />
os procedimentos para submissão de proposta,<br />
avaliação, validação e implementação de inovações<br />
tecnológicas a serem empregadas em qualquer etapa<br />
da fabricação de produtos de origem animal<br />
em estabelecimentos com registro no Departamento de<br />
Inspeção de Produtos de Origem Animal – DIPOA/SDA.<br />
No Art. 2º, alínea III da IN 30/2017 temos a<br />
definição para “inovação tecnológica” como sendo o<br />
processo, equipamento, substância ou material, isolado<br />
ou em combinação, tecnologicamente novo ou significativamente<br />
aperfeiçoado, que proporcione a melhoria<br />
do processo de fabricação ou da qualidade do produto<br />
de origem animal.<br />
No Art. 3º estão apresentados os itens que o<br />
interessado em aprovar qualquer inovação tecnológica<br />
que possa ser implementada em sua empresa:<br />
I – Identificação e descrição da inovação tecnológica:<br />
denominação; objetivo; efeitos tecnológicos<br />
e sanitários benéficos, e possíveis efeitos adversos,<br />
Ministério da Agricultura, Pecuária e<br />
Abastecimento (MAPA) finalmente<br />
possibilita a entrada das inovações<br />
tecnológicas dentro das indústrias<br />
de produtos de origem animal.<br />
Prof. Dr. Alex Augusto Gonçalves<br />
Chefe do Laboratório de Tecnologia e Controle de Qualidade do<br />
Pescado - LAPESC<br />
Universidade Federal Rural do Semi Árido - UFERSA<br />
Mossoró, RN, <strong>Brasil</strong><br />
alaugo@gmail.com<br />
no processo e no produto; fatores que a caracterizam<br />
como uma inovação tecnológica; revisão bibliográfica<br />
atualizada, incluindo legislação internacional, com os<br />
fundamentos da inovação tecnológica e justificativas<br />
que amparam sua aplicação no processamento de produtos<br />
de origem animal;<br />
II – Avaliação de conformidade com a legislação<br />
nacional: aqui talvez tenhamos alguma dificuldade, pois<br />
a evolução tecnológica e as inovações tecnológicas estão<br />
bem a frente da atualização da legislação brasileira,<br />
porém, podemos nos basear na lei maior, o Codex Alimentarius;<br />
III – Descrição detalhada dos seguintes<br />
itens relacionados à aplicação da inovação tecnológica:<br />
equipamentos e utensílios de processamento; método<br />
utilizado; parâmetros operacionais e medidas de controle;<br />
parâmetros de inocuidade, identidade e qualidade<br />
do produto; metodologias e frequência de avaliação<br />
desses parâmetros;<br />
IV – Descrição das etapas de validação e implementação<br />
da inovação tecnológica: entende-se por<br />
validação o procedimento, executado e documentado,<br />
que tem como objetivo comprovar com dados técnico-científicos<br />
que a inovação tecnológica descrita<br />
no Termo de Não Objeção (documento emitido pelo<br />
DIPOA/DAS após avaliação final do requerimento, no<br />
qual informa que não há objeção à implementação da<br />
inovação tecnológica nas condições), quando aplicada<br />
pelo estabelecimento, reproduz de forma consistente os<br />
efeitos tecnológicos previstos e que não compromete a<br />
inocuidade, identidade e qualidade do produto de origem<br />
animal.<br />
Nos casos em que a inovação tecnológica não<br />
encontre respaldo na legislação vigente, o requerente<br />
deverá identificar essa situação no requerimento e esclarecer<br />
como a inovação tecnológica proposta assegurará<br />
a inocuidade, identidade e qualidade do produto.<br />
No Art. 4º está previsto a obrigatoriedade do<br />
requerente na realização de experimento (através de<br />
80<br />
COLUNA<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
um protocolo de experimento desenvolvido por profissional<br />
com comprovada formação e experiência na área<br />
do estudo, preferencialmente vinculado à instituição<br />
de pesquisa nacional ou internacional, o qual deverá,<br />
também, supervisionar a execução do experimento.<br />
Tal protocolo deverá conter a descrição detalhada do<br />
experimento pelo qual a inovação tecnológica proposta<br />
será testada e avaliada. Ao final do experimento<br />
o requerente deverá apresentar relatório ao DIPOA/<br />
SDA, contendo os resultados e a argumentação técnica<br />
necessária para respaldar a avaliação) para avaliação da<br />
inovação tecnológica nos casos em que sua aplicação<br />
não esteja amparada pela legislação vigente ou que possa<br />
resultar em: risco à inocuidade, identidade e qualidade<br />
do produto; prejuízo aos procedimentos de inspeção<br />
sanitária oficial; prejuízo ao bem-estar animal.<br />
No Art. 5º está previsto que toda bibliografia<br />
técnico-científica usada como suporte ao requerimento<br />
e ao protocolo de experimento deverá corresponder<br />
à área de conhecimento da inovação tecnológica a ser<br />
avaliada e, quando tratar-se de artigo científico, deve ter<br />
sido publicada em periódico indexado (revista científica<br />
com padrões definidos e minuciosos de revisão e publicação,<br />
de periodicidade regular, indexada em bases de<br />
dados nacionais ou internacionais e com amplo acesso e<br />
difusão).<br />
No Art. 6º está previsto que o requerente deverá<br />
obter o parecer, licença ou aprovação dos órgãos competentes<br />
quando a proposta de inovação tecnológica envolva<br />
o uso de novas substâncias, questões ambientais,<br />
de segurança do trabalho, ou outros casos fora da competência<br />
do DIPOA/SDA.<br />
No Art. 8º o resultado da avaliação da proposta<br />
será expresso por meio do Termo de Não Objeção ou<br />
do Termo de Rejeição emitido pelo Diretor do DIPOA/<br />
DAS, e o requerente terá o prazo de 60 dias para recorrer<br />
do Termo de Rejeição (Art. 9º).<br />
No Art. 10º está previsto que será rejeitada a<br />
proposta de inovação tecnológica na qual seja identificada<br />
a possibilidade ou intenção de mascarar fraude, adulteração<br />
ou falsificação de matéria prima ou produto.<br />
No Art. 11º a inovação tecnológica para a qual<br />
o DIPOA/DAS tenha emitido Termo de Não Objeção<br />
deverá passar por processo de validação em todos os<br />
estabelecimentos onde for utilizada, como pré-requisito<br />
para sua implementação. E na ocasião da implementação<br />
da inovação tecnológica será obrigatória a atualização<br />
dos programas de autocontrole do estabelecimento (Art.<br />
12º).<br />
No Art. 13º o estabelecimento que fizer uso de<br />
inovação tecnológica que tenha recebido o Termo de<br />
Não Objeção do DIPOA/DAS deverá manter os arquivos<br />
com os registros de validação e implementação da<br />
inovação tecnológica, os quais deverão estar acessíveis<br />
ao SIF para avaliação.<br />
No Art. 14º a não objeção a uma inovação tecnológica<br />
poderá ser suspensa cautelarmente pelo SIF ou<br />
pelo DIPOA/SDA para reavaliação, quando constatado o<br />
não atendimento à proposta avaliada pelo DIPOA/SDA.<br />
No Art. 15º a partir da divulgação da não objeção<br />
à uma inovação tecnológica pelo DIPOA/SDA,<br />
qualquer estabelecimento registrado neste Departamento<br />
poderá aplicá-la, desde que comunique essa intenção<br />
ao Serviço de Inspeção de Produtos de Origem Animal<br />
da Superintendência Federal de Agricultura na Unidade<br />
da Federação onde o estabelecimento está localizado, e<br />
ainda, que a inovação tecnológica deverá ser adaptada às<br />
características específicas de instalações e de produção<br />
do estabelecimento que deseja aplicá-la.<br />
Portanto, chegou a hora das indústrias buscarem<br />
o apoio técnico-científico dos pesquisadores<br />
das inúmeras universidades espalhadas pelo país, e<br />
construírem um projeto bem alinhado com a inovação<br />
tecnológica (novos aditivos, novos equipamentos, novas<br />
tecnologias, como o ozônio, dentre outras), dentro dos<br />
padrões exigidos na IN 30/2017, respaldado principalmente<br />
com os resultados de pesquisas já publicadas na<br />
bibliografia técnico-científica nacional e internacional.<br />
Consulte as referências bibliográficas em www.aquaculturebrasil.com/colunas<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
COLUNA<br />
81
DEFENDEU!<br />
Novidades em teses e dissertações<br />
Em algum lugar do <strong>Brasil</strong>, um acadêmico de pós-graduação<br />
contribui com novas informações para nossa aquicultura.<br />
Temos recebido em nossa redação uma série de trabalhos de conclusão de curso de graduação<br />
(TCC´s) que, em princípio, não se enquadrariam na Seção “Defendeu”, projetada para publicar<br />
somente dissertações e teses.<br />
Mas se os trabalhos têm qualidade, porque não publicar?<br />
A partir desta edição o “Defendeu”, aliás, mais uma seção da <strong>Revista</strong> <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong> que<br />
é feita por você, querido leitor, apresentará também TCC´s de excelência!<br />
No final ganhamos todos e ponto para a aquicultura brasileira!!!<br />
Vamos curtir um primeiro trabalho sobre a tambatinga?<br />
Acadêmico: Leonilton Rodrigues Barbosa da Silva<br />
Orientadora: Me. Rosália Furtado Cutrim Souza<br />
Coorientador: Engº de Pesca Luciano Falcão<br />
Instituição: Universidade Federal Rural da Amazônia - UFRA<br />
campus Belém<br />
Curso: Engenharia de Pesca<br />
Título: “Morfologia e distribuição das espinhas intramusculares<br />
do híbrido tambatinga (tambaqui Colossoma<br />
macropomum Cuvier, 1816 com pirapitinga Piaractus brachypomus<br />
Cuvier, 1817) cultivado em cativeiro<br />
Introdução:<br />
A tambatinga é um híbrido<br />
do cruzamento da fêmea do<br />
tambaqui Colossoma macropomum<br />
com o macho da pirapitinga<br />
Piaractus brachypomus e apresenta<br />
espinhas intramusculares<br />
que dificultam a degustação da<br />
carne. As espinhas intramusculares<br />
são pequenas espículas colagenosas<br />
localizadas no tecido<br />
muscular em ambos os lados do<br />
corpo com diferentes morfologias.<br />
Objetivo:<br />
Analisar a morfologia e distribuição<br />
das espinhas intramusculares<br />
do híbrido tambatinga<br />
(tambaqui com pirapitinga).<br />
Metodologia:<br />
Foram selecionadas<br />
42 tambatingas entre<br />
36,5 a 53 cm provenientes<br />
de uma piscicultura do Estado<br />
de Tocantins. Os indivíduos<br />
foram submetidos<br />
ao raio-x (Figura 2) para<br />
geração de imagens lateral<br />
do corpo e depois colocados<br />
em estufa a 200°C por<br />
20 minutos para extração Figura 1. Exemplar de tambatinga.<br />
das espinhas.<br />
As distâncias vertical<br />
e da primeira espinha para a vértebra mais próxima e o número<br />
da vértebra inicial e final foram registradas para cada lado do peixe<br />
(Figuras 3 e 4). As espinhas foram identificadas morfologicamente<br />
e registradas os comprimentos total, das hastes e de suas ramificações.<br />
© Globo Rural<br />
82<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
Ánalise e<br />
estatística:<br />
O teste de Kruskal-Wallis foi utilizado<br />
para verificar se as espinhas tinham as mesmas<br />
dimensões entre as formas iguais e se as<br />
distâncias verticais das espinhas foram iguais<br />
nos peixes. O teste t de Student foi usado para<br />
verificar se média das distâncias verticais das<br />
espinhas no peixe e da imagem do raio-x eram<br />
iguais com α= 0,05. O teste χ2 foi usado para<br />
verificar se a quantidade das formas em cada<br />
região do corpo foi igual estatisticamente com<br />
α= 0,05. O comprimento total do peixe e comprimento<br />
total da espinha foram correlacionados<br />
por equação linear do tipo Y=a+b*X, onde<br />
a existência de correlação foi avaliada pelo coeficiente<br />
de Pearson (r).<br />
Figura 2. Nomenclatura para as regiões de distribuição das espinhas intramusculares.Nota:<br />
Epineural: Espinhas localizadas na região superior (dorsal); Epipleural:<br />
Espinhas localizadas na região inferior (nadadeira anal).<br />
A<br />
B<br />
A<br />
B<br />
Figura 3. Ilustração da metodologia para registro das distâncias da região<br />
dorsal (epineural): A) Distância da primeira vértebra a primeira espinha intramuscular<br />
e B) Distância vertical entre duas espinhas. Nota: Dt: Distância; V01:<br />
Primeira vértebra.<br />
Figura 4. Ilustração da metodologia para biometria das espinhas intramusculares:<br />
A) Nomenclaturas dadas as hastes e ramificações e B)<br />
Nomenclatura dada para espinha não bifurcada.<br />
Principais resultados:<br />
Os resultados mostraram 7 formas de espinhas com predominância numérica das formas<br />
não bifurcada, bifurcada desigual e bifurcada igual;<br />
O comprimento total das espinhas variou entre 4,78 e 62,39 mm e as formas não bifurcada,<br />
bifurcada desigual e bifurcada igual diferiam significativamente (p0,05);<br />
As espinhas se distribuíram principalmente entre as vértebras 1 e 25 na região epineural e<br />
entre 11 e 25 na epipleural e o t de Student mostrou que as distâncias médias entre as espinhas<br />
no peixe e no raio-x foram semelhantes estatisticamente para ambas regiões;<br />
A quantidade média total de espinhas por peixe foi de 82, sendo em média 28 espinhas para<br />
cada lado da região epineural e 12 para epipleural. O χ2 mostrou que as quantidades das<br />
formas são iguais entre os lados esquerdo e direito na região epineural e epipleural;<br />
O coeficiente r mostrou uma relação positiva do crescimento da espinha com o crescimento<br />
do peixe, onde as formas não bifurcada, bifurcada desigual, bifurcada duplahaste e polifurcada<br />
simples apresentaram correlação do tipo moderada enquanto que bifurcada igual a correlação<br />
foi do tipo forte (r= 0,93).<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
83
Conclusões<br />
1. O comprimento médio das formas<br />
foi crescente a medida que as espinhas<br />
se tornavam mais complexas;<br />
2. Há simetria lateral na quantidade<br />
das formas e distribuição das espinhas;<br />
3. As espinhas intramusculares não<br />
têm um único padrão de distribuição<br />
morfológica;<br />
4. O crescimento da espinha acompanha<br />
o crescimento do peixe. Figura 5. Formas de espinhas intramusculares identificadas na tambatinga: 1 – Não bifurcada,<br />
2 – Bifurcada desigual, 3 – Bifurcada igual, 4 – Polifurcada simples, 5 - Bifurcada duplahaste, 5 –<br />
Polifurcada multihaste e 7 – Bifurcada multihaste.<br />
O trabalho final será publicado em<br />
um periódico internacional.<br />
Figura 6. Comparação entre as técnicas de investigação de espinhas intramusculares: A)<br />
Técnica de extração eficiente para identificar a distribuição morfológica e B) Técnica do<br />
raio-x ineficiente para identificação morfológica. Nota: Setas brancas destacam algumas<br />
espinhas intramusculares.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
84
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
85
ENTREVISTA<br />
© <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong><br />
86<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
GERALDO<br />
BERNARDINO<br />
O entrevistado da 9ª edição já percorreu uma longa jornada no setor aquícola brasileiro e<br />
recebeu, no ano de 2016, o título de cidadão do Amazonas, fruto de seus 15 anos de trabalho<br />
como Secretário Executivo Adjunto de Pesca e Aquicultura do Estado.<br />
AQUACULTURE BRASIL: Geraldo, você é natural<br />
da Paraíba e formou-se em Engenharia de Pesca pela<br />
Universidade Federal do Ceará (UFC), em 1976, tornando-se,<br />
mais tarde, mestre em Ecologia e Recursos<br />
Naturais pela UFSCar. Conte-nos um pouco sobre estes<br />
mais de 40 anos de carreira profissional.<br />
Bernardino: Comecei no Pantanal Mato-grossense,<br />
em 1977, trabalhando como pesquisador no Centro<br />
de Pesquisa do Pantanal Mato-grossense (Cepimam/<br />
Sudepe), na área de biologia pesqueira e dinâmica de<br />
populações. Fiquei um certo tempo nesta Instituição e<br />
depois comecei a trabalhar especificamente com o pacu<br />
(Piaractus mesopotamicus), indo para São Paulo, onde<br />
atuei desde técnico da parte de manejo, até chegar ao cargo<br />
de Diretor do CEPTA (Centro Nacional de Pesquisa<br />
de Peixes Tropicais). Além disso, já fui coordenador de<br />
ensino do Centro Regional Latino-americano de Aquicultura<br />
– CERLA/FAO/SUDEPE (1981-1984), presidi a<br />
Associação <strong>Brasil</strong>eira de Aquicultura – ABRAq (1992-<br />
1999) e tive a oportunidade de ser Coordenador Nacional<br />
de Aquicultura do Ministério da Agricultura – DPA/<br />
MAPA (1999 e 2001), logo depois que saí de São Paulo.<br />
Na sequência, em 2003, mudei-me para Manaus, onde<br />
prontamente fui nomeado como Secretário Executivo de<br />
Pesca e Aquicultura, cargo que ocupo até hoje. A Secretaria<br />
trabalha não somente na área de aquicultura, mas<br />
também em parcerias com os profissionais da ciência e<br />
tecnologia, auxiliando no desenvolvimento de projetos<br />
de pesquisa e extensão em geral.<br />
AQUACULTURE<br />
BRASIL: A aquicultura<br />
sempre esteve<br />
presente em sua vida.<br />
Numa entrevista para<br />
a AQUABIO no ano<br />
de 2012 você apontou<br />
que para a aquicultura<br />
brasileira crescer<br />
era necessário superar<br />
limitações e dificuldades<br />
gerais do setor,<br />
tais como: pouca integração<br />
e gerenciamento<br />
de cadeias de<br />
produção, escalas de<br />
Há muitos<br />
projetos de<br />
pesquisas que não<br />
chegam a<br />
conclusões que<br />
possam ser<br />
utilizadas<br />
pelo<br />
setor<br />
produtivo.<br />
produção inadequadas, carga fiscal elevada, entre<br />
outras. O que mudou de lá para cá? O que conseguimos<br />
superar e o que ainda nos limita?<br />
Bernardino: Nós tivemos uma melhora na aquicultura,<br />
principalmente nos cultivos em águas interiores, com a<br />
tilápia e as espécies nativas (peixes redondos). Entretanto,<br />
o setor ainda carece de uma equipe multidisciplinar<br />
que trabalhe dentro de ações específicas, possibilitando<br />
que seja dado um salto qualitativo e bem substanciado.<br />
Existem muitas novas tecnologias, porém, existe muito<br />
modismo em relação a isso, e muitos projetos de pesquisas<br />
que não chegam a conclusões que possam ser utilizadas<br />
pelo setor produtivo. E nós precisamos é disso!<br />
Por exemplo, recentemente estamos com um problema<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
87
ENTREVISTA<br />
seríssimo que é a sanidade. Entretanto,<br />
estamos discutindo isto de<br />
uma maneira muito superficial. Temos<br />
que convocar a academia, institutos<br />
de pesquisa, Embrapa, e dizer:<br />
“- É isso que precisamos!”. Sanidade<br />
é um problema seríssimo. Um exemplo<br />
é o que vem ocorrendo com o camarão<br />
marinho e também a tilápia,<br />
tem muito vírus e parasitos no ambiente<br />
que estão comprometendo as<br />
produções desses organismos e em<br />
uma questão de tempo pode acontecer<br />
o mesmo com as espécies nativas.<br />
Mas a piscicultura cresceu,<br />
tivemos saltos de qualidade em<br />
toda a cadeia produtiva, incluindo<br />
o mercado e a comercialização.<br />
Outro aspecto importante é na área<br />
de qualificação profissional, com<br />
cursos profissionalizantes, formação<br />
de recursos humanos, o que é fundamental<br />
para o desenvolvimento da<br />
aquicultura brasileira.<br />
AQUACULTURE BRASIL: Recentemente<br />
(2016) uma legislação<br />
que permitia o cultivo de peixes<br />
©ABCC<br />
não nativos nos rios do Estado do<br />
Amazonas foi publicada e logo depois<br />
acabou sendo revogada, sob<br />
apelo de instituições ambientais.<br />
Em sua opinião, valeria a pena arriscar<br />
a introdução de uma espécie<br />
não nativa nestes locais? Ou as<br />
espécies da aquicultura nacional<br />
tem potencial para alavancar a produção<br />
do Amazonas?<br />
Bernardino: A tilápia foi introduzida<br />
há muito tempo no <strong>Brasil</strong> e também<br />
no Amazonas. Porém não de<br />
forma oficial, mas desde a década de<br />
70 já existe tilápia no Amazonas. Mas<br />
pensando em uma introdução nos<br />
dias atuais, previamente devemos<br />
analisar algumas perguntas que são<br />
chaves antes de tomar tal decisão. A<br />
primeira é sobre a questão econômica:<br />
“Ela vai aumentar o mercado?”,<br />
“Vai gerar emprego e renda para as<br />
famílias da região onde se está introduzindo<br />
a espécie?” a segunda<br />
pergunta é uma questão estratégica:<br />
“O que ela pode causar no ambiente<br />
natural?”, “Quais as doenças que ela<br />
pode trazer àquele ambiente?” Estas<br />
questões são interessantes de serem<br />
discutidas. Precisamos ter pesquisas<br />
visando a estas respostas e não sair<br />
introduzindo a espécie de qualquer<br />
modo. Por mais que exista uma<br />
tecnologia de produção definida<br />
para a tilápia, será que esta tecnologia<br />
vai adaptar-se perfeitamente<br />
ao Amazonas, uma região com suas<br />
particularidades e peculiaridades?<br />
E hoje a tilápia está com problemas<br />
seríssimos de doenças, problemas<br />
com vírus, parasitas, etc. Antes de<br />
ser introduzida, temos que provocar<br />
uma discussão abrangente, com<br />
a participação dos órgãos de controle,<br />
para saber realmente o perigo<br />
das introduções. Outra espécie que<br />
está se introduzindo no <strong>Brasil</strong> é o<br />
panga. Assim, daqui há uns anos não<br />
teremos uma aquicultura comercial,<br />
com espécies selecionadas, mas sim,<br />
vamos acabar nos transformando em<br />
uma aquicultura de modismo. Devemos<br />
pensar antes, fazer trabalhos<br />
de observação, ter a certeza de que<br />
a espécie vai trazer emprego e renda<br />
para quem optar por cultivá-la, e<br />
depois se discutir a introdução, com<br />
os impactos sociais, econômicos e<br />
ambientais bem estudados. A bacia<br />
amazônica é o maior banco genético<br />
que temos, com a maior biodiversidade<br />
de águas interiores do mundo.<br />
Dessa forma, é interessante pensar<br />
estes vários aspectos antes de introduzir<br />
uma determinada espécie<br />
exótica.<br />
AQUACULTURE BRASIL: Os planos<br />
de manejo para a captura do<br />
pirarucu, que já esteve ameaçado<br />
de extinção, foram um sucesso no<br />
Amazonas, resultando em um aumento<br />
considerável da produção.<br />
Neste sentido, quais os esforços que<br />
estão sendo feitos para alavancar<br />
88<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
também o cultivo desta espécie?<br />
Bernardino: O plano de manejo<br />
de fato deu muito certo e hoje é<br />
um sucesso. Saímos de uma captura<br />
de mil indivíduos para sessenta<br />
e cinco mil indivíduos. Quanto ao<br />
cultivo, é um peixe de grande interesse.<br />
Entretanto, como qualquer<br />
peixe, para começarmos a cultivá-lo<br />
são necessários uma série de estudos<br />
visando dar sustentação técnica<br />
à produção. Já iniciamos estudos<br />
do cultivo desta espécie não só<br />
em tanque-rede, como também em<br />
viveiros e raceways. E os resultados<br />
são positivos, apontando para uma<br />
alta biomassa produzida, com dados<br />
zootécnicos excelentes. Mas quando<br />
se refere à questão nutricional,<br />
esta ainda é um problema. A ração<br />
para peixe carnívoro ainda é muito<br />
cara e a conversão alimentar é alta,<br />
em torno de 1,8 a 2,3:1. Portanto,<br />
cultivar o pirarucu ainda não é um<br />
grande negócio. Temos que estudar<br />
mais, buscar aprimorar as técnicas<br />
de manejo, estudar a capacidade de<br />
suporte para cada sistema de produção,<br />
identificar as rações para as<br />
diferentes fases de cultivo, e então,<br />
com base na tecnologia, poderemos<br />
propagar o cultivo da espécie, que<br />
tem muito potencial, uma vez que<br />
em um ano o pirarucu pode chegar<br />
a 10 quilos.<br />
AQUACULTURE BRASIL: O segredo para aumentar a produção nacional está em apostar nas diferentes espécies<br />
ou estaria na hora de focarmos mais em poucas espécies?<br />
Bernardino: Temos que organizar<br />
melhor a piscicultura. Começando a<br />
organizar politicamente. A piscicultura<br />
como qualquer outra atividade<br />
zootécnica tem que ter uma “casa”<br />
onde se pode reclamar os aspectos<br />
políticos da atividade, principalmente<br />
com relação a mercado<br />
e formação de recursos humanos e<br />
pesquisas. Nós temos que fortalecer<br />
e brigar para que a Secretaria Especial<br />
de Aquicultura e Pesca se encontre<br />
em um órgão que possa fortalecer<br />
isso. O segundo ponto é exatamente<br />
focar em cima de espécies com tecnologia<br />
padronizada e bem definida.<br />
Neste ponto não adianta vulgarizar.<br />
Os chineses trabalham com poucas<br />
espécies, cerca de quatro, os americanos<br />
trabalham com uma espécie de<br />
água doce, o catfish, o chileno com<br />
uma espécie, o salmão. Nós não podemos<br />
ser um zoológico de peixes,<br />
trabalhando com espécies que não<br />
vão nos levar a nada. Temos que<br />
trabalhar com as espécies através de<br />
grupo formado, gerando tecnologia<br />
de acordo com as condições de cada<br />
região, evitando exatamente copiar<br />
as cartilhas prontas que muitas vezes<br />
não dão certo no <strong>Brasil</strong>.<br />
Nós não<br />
podemos ser um<br />
zoológico de peixes,<br />
trabalhando com espécies<br />
que não vão<br />
nos levar a nada.<br />
AQUACULTURE BRASIL: Quais as tendências e desafios para a produção de peixes nativos?<br />
Bernardino: Temos que ter<br />
especificidade, trabalhar com poucas<br />
espécies. Eu acredito que o Piaractus<br />
mesopotamicus (pacu) e o Colossoma<br />
macropomum (tambaqui) são<br />
duas espécies que vão se desenvolver<br />
muito no <strong>Brasil</strong>. O segundo ponto é<br />
ter investimento pós captura, com<br />
produtos diferenciados e com valor<br />
agregado, e não vender somente o<br />
peixe inteiro. Dessa forma é possível<br />
ter mercado tanto para o peixe<br />
pequeno quanto para o grande, tendo<br />
como subprodutos os embutidos,<br />
triturados, defumados, etc, o que<br />
pode dar uma diferença. O terceiro<br />
aspecto é deter tecnologia para reprodução<br />
induzida, tendo assim disponibilidade<br />
de alevinos o ano todo,<br />
e consequentemente a tendência da<br />
produção é aumentar. E por fim,<br />
a ração. A ração representa hoje o<br />
maior custo de uma produção, devendo<br />
ser muito bem estudada para<br />
todas as fases. Feito isso, daremos<br />
um salto no cultivo das espécies<br />
nativas. A perspectiva do mercado<br />
tanto interno quanto externo é<br />
muito grande. Outros países já produzem<br />
as nossas espécies nativas. Se<br />
demorarmos muito a gerar tecnologia<br />
e alavancar a produção, esse mercado<br />
vai ser preenchido por outros<br />
países. Assim como já ocorre com<br />
nossos peixes ornamentais.<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
89
ENTREVISTA<br />
AQUACULTURE BRASIL: O cooperativismo foi um modelo que deu muito certo no estado do Paraná, hoje um<br />
dos maiores produtores de peixe do país. Caberia o modelo do cooperativismo na região Norte?<br />
AQUACULTURE BRASIL: Finalizando, como você vê o retorno da SEAP – Secretaria Especial de Aquicultura<br />
e Pesca?<br />
Bernardino: A princípio me preocupa<br />
muito. Principalmente pelo modo<br />
como ela está sendo reestruturada,<br />
levando em consideração o interesse<br />
de alguns políticos e não do setor<br />
aquícola e pesqueiro. E esse interesse<br />
político ligado a questões do seguro<br />
defeso, por exemplo, ao invés de objetivar<br />
fazer a política nacional da<br />
pesca, o desenvolvimento das áreas<br />
pesqueiras, o investimento em recursos<br />
humanos, discussões sobre<br />
os grandes problemas políticos e<br />
econômicos do setor, entre outros<br />
aspectos, é o que me preocupa. Ou<br />
nós temos uma SEAP que leve em<br />
consideração que o <strong>Brasil</strong> tem um<br />
dos maiores potenciais do mundo<br />
Bernardino: O cooperativismo<br />
dá certo em todo o canto. Porém<br />
existem cooperativas e cooperativas.<br />
Primeiramente temos que ter uma<br />
associação muito bem direcionada,<br />
com as regras “de jogo” muito bem<br />
definidas, para deixar de ser apenas<br />
uma forma de agregar pessoas,<br />
mas tendo sempre como foco a produção.<br />
Assim, quando você tem um<br />
grupo de pessoas, empresários e<br />
produtores, de forma organizada e<br />
bem definida, englobando a parte de<br />
insumos, sistema de produção e processamento,<br />
a cooperativa com certeza<br />
vai dar certo. Porque nesse sentido,<br />
ela tem um objetivo maior, que<br />
é diminuir os custos de produção e<br />
aumentar os lucros do pescado.<br />
para a piscicultura, porque tem uma<br />
grande disponibilidade de matéria<br />
prima, que é a água, mas que precisa<br />
ter políticas para poder ter ração,<br />
tecnologia e ter comércio, ou então<br />
vamos ficar nos programas de<br />
parques aquícolas que até então não<br />
levaram a nada.<br />
AQUACULTURE BRASIL: Uma mensagem, para finalizar...<br />
Bernardino: O setor pesqueiro e<br />
aquícola vem crescendo e tem um<br />
futuro interessante no <strong>Brasil</strong>. Não só<br />
através dos interesses a nível nacional,<br />
mas a nível internacional. Nós<br />
teremos ainda grandes empresas e<br />
grandes projetos internacionais no<br />
país. O importante é que o setor<br />
cresça com a certeza que vai contribuir<br />
ao desenvolvimento do país,<br />
gerando emprego e renda.<br />
90<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
NOVOS LIVROS<br />
Farmacologia aplicada à Aquicultura<br />
Editores: Bernardo Baldisserotto, Levy de Carvalho Gomes, Berta Maria Heinzmann e<br />
Mauro Alves da Cunha<br />
Editora: Editora UFSM<br />
Idioma: Português - 654 páginas<br />
Lançamento: 2017<br />
Este livro aborda a legislação existente para a utilização de fármacos de diferentes classes em<br />
cultivos aquícolas. Quais as doses ou concentrações, bem como o tempo de aplicação dos fármacos ou de<br />
outros produtos utilizados para tratar os animais contra bactérias, parasitas, fungos, vírus em aquicultura;<br />
como anestesiar animais aquáticos; quais produtos são úteis para melhorar o transporte de animais<br />
aquáticos; como utilizar prebióticos, probióticos, estimuladores do crescimento, antioxidantes e promotores<br />
da reprodução e inversão sexual em aquicultura. Este livro traz essas informações, que antes só eram<br />
possíveis de se obter através de uma busca em artigos publicados em revistas científicas especializadas.<br />
Success Factors for Fish Larval Production<br />
Editores: Luis Conceição e Amos Tandler<br />
Editora: Wiley Blackwell<br />
Idioma:Inglês – 512 páginas<br />
Lançamento:março de 2018<br />
O sucesso de uma produção aquícola depende fundamentalmente do sucesso da larvicultura.<br />
Neste contexto, o livro aborda os processos mais atuais na produção de larvas, e como os fatores<br />
externos (ambientais e nutricionais) e internos (moleculares, desenvolvimento, fisiologia, comportamento<br />
e fatores genéticos) interagem na definição do fenótipo e qualidade das larvas e juvenis de<br />
peixes. Tais informações tem as contribuições de um grupo de renomados pesquisadores e também<br />
especialistas de campo, o que o torna ainda mais completo.<br />
Piscicultura Continental com<br />
Enfoque Agroecológico<br />
Editores: Graciane Regina Pereira, Henrique da Silva Pires, Leonardo Schorcht Bracony,<br />
Porto Ferreira e Katiuscia Wilhelm Kangersk<br />
Editora:Publicação do IFSC<br />
Idioma:Português – 94 páginas<br />
Lançamento: julho de 2017<br />
A obra conta com 16 capítulos trazendo métodos de aquicultura mais agroecológica, contextualizada<br />
para a região Sul do país. Com uma abordagem das formas mais sustentáveis de cultivo<br />
de peixes de água doce, o trabalho torna-se interessante, uma vez que os consumidores têm buscado<br />
cada vez mais uma segurança alimentar e preocupam-se com a origem destes alimentos. Entre os<br />
temas dos capítulos estão assuntos como aquaponia, probióticos, selo de rastreabilidade, policultivo,<br />
patologia e parasitologia, e alguns estudos com espécies como jundiá (Rhamdia quelen), cascudo<br />
(Pterygoplichthys pardalis), carpas (Cyprinus carpio) e tilápia (Oreochromis niloticus).<br />
DIVULGUE AQUI O SEU LANÇAMENTO EDITORIAL!<br />
redacao@aquaculturebrasil.com<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
91
Eles fazem<br />
a diferença!<br />
N<br />
a seção “Eles fazem a diferença” escolhemos sempre<br />
uma personalidade da aquicultura para homenagear.<br />
Nesta edição, entretanto, ela é válida no plural. Sim,<br />
“Eles” fazem a diferença. Todos eles que, após a partida do<br />
querido biólogo e empresário Alexandre Wainberg, pioneiro<br />
no cultivo orgânico de camarão no <strong>Brasil</strong>, possibilitaram<br />
que a fazenda PRIMAR não fechasse suas portas.<br />
A fazenda PRIMAR se localiza em Tibau do Sul, a 70<br />
km da capital do Rio Grande do Norte, e nós da <strong>Aquaculture</strong><br />
<strong>Brasil</strong> fomos visitar. Quem nos recepcionou e contou um<br />
pouco desta história foi a Designer Gráfica (e mais aquicultora<br />
que você possa imaginar) Marcia Kafensztok, esposa do<br />
fundador da PRIMAR, Alexandre Wainberg (in memoriam).<br />
“Alexandre era formado em biologia marinha, com mestrado em bioecologia aquática e faleceu em 2015.<br />
Quando partiu deixou todo esse projeto da PRIMAR. Projeto que teve continuidade em função do apoio dos<br />
funcionários e várias outras pessoas, como amigos e o pessoal das universidades, que aceitaram dar seguimento<br />
mesmo sem tê-lo presente” comenta Marcia.<br />
Fundada em 1993, a fazenda iniciou suas atividades com o cultivo de camarão nativo em sistema extensivo,<br />
mas logo intensificou a produção com a introdução do Litopenaeus vannamei.<br />
“Chegamos a ter aeradores por toda a fazenda, produção intensiva, 48 funcionários e toneladas de ração que<br />
chegavam a todo momento. Contudo, Alexandre, que era quem administrava tudo, achou que iria esgotar a área e<br />
resolveu “puxar o freio de mão”, entrando em um processo de conversão para uma fazenda menos intensiva e mais<br />
sustentável”.<br />
Certificação orgânica – o pioneirismo<br />
que hoje tornou-se modelo no <strong>Brasil</strong><br />
Na época, A PRIMAR dava o passo inicial para<br />
tornar-se a primeira fazenda com selo de certificação<br />
na produção orgânica de camarão marinho. O processo<br />
teve início em 2001 e só foi concluído em 2003, quando<br />
finalmente recebeu a certificação pelo IBD - Instituto<br />
Biodinâmico.<br />
“Como éramos a primeira no <strong>Brasil</strong> a entrar com<br />
o pedido da certificação, eles não tinham outra fazenda<br />
para se basear. Sendo assim, Alexandre sentou com o<br />
pessoal do IBD e juntos formataram quais seriam as normas<br />
para a aquicultura orgânica, porque não existia. Eles<br />
trouxeram para a aquicultura alguns conceitos que eram<br />
adotados na agricultura, como por exemplo o consórcio<br />
de culturas, cultivo em baixo adensamento e sem uso de<br />
produtos químicos”.<br />
92<br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017
O cultivo de forma orgânica<br />
© <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong><br />
Sem uso de ração, o camarão alimenta-se da<br />
biota natural existente no fundo do viveiro, que é formada<br />
graças a água rica em nutrientes bombeada do<br />
estuário. Após a captação, em um período de 10 dias<br />
já se tem a formação do alimento natural. Os animais<br />
são estocados a partir de PL10 e cultivados em um<br />
sistema extensivo e de baixa densidade, com 4 camarões/m².<br />
“O ciclo de produção leva entre 55 e 60 dias,<br />
com sobrevivência em torno de 70 e 80% e conseguimos<br />
despescar um camarão com peso final entre<br />
10 e 12 gramas. Comercializamos o camarão fresco<br />
ou filezinho (sem casca) processado por mulheres<br />
da comunidade, que depois retorna e o embalamos<br />
para a venda”.<br />
Figura 2. Viveiros com cultivo integrado de camarões e<br />
ostras dispostas em travesseiros.<br />
© <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong><br />
Figura 1. Cantinho da Aroeira.<br />
O impasse da comercialização como<br />
orgânico<br />
“Infelizmente hoje o camarão não é vendido como<br />
orgânico, porque para permitir o uso do selo na embalagem<br />
para comercialização como orgânico, temos<br />
que processar em uma unidade de beneficiamento com<br />
o SIF. Na época, conseguimos uma unidade de processamento<br />
que possuía as exigências necessárias e assim<br />
elaboramos um trabalho de marketing, criamos uma<br />
embalagem, etc. Contudo, a unidade acabou fechando<br />
a planta de camarão logo depois. Perdemos todo o trabalho<br />
construído, uma vez que na época essa era a única<br />
da região passível a ser certificada pelo IBD. Hoje, 10<br />
anos depois, visitei duas unidades beneficiadoras que<br />
possuem os requisitos para serem certificadas. É um<br />
trabalho que estamos tentando retomar”.<br />
© <strong>Aquaculture</strong> <strong>Brasil</strong><br />
AQUACULTURE BRASIL - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2017<br />
93
Eles fazem<br />
a diferença!<br />
Ostras nativas e orgânicas - um exemplo de persistência<br />
Em 2005 a PRIMAR resolveu<br />
introduzir o cultivo de os-<br />
Figura 4. Exemplar de ostra nativa Crassostrea gasar.<br />
tras, que deveriam ser nativas, tendo<br />
em vista que após a certificação,<br />
nenhuma outra espécie exótica,<br />
além do camarão que já estava<br />
presente, poderia ser introduzida<br />
na fazenda.<br />
Após muitas tentativas<br />
com ostras da espécie<br />
Crassostrea gasar, capturadas<br />
no ambiente natural e algumas<br />
provenientes do Laboratório de<br />
Moluscos Marinhos – LMM da<br />
UFSC, Alexandre percebeu que<br />
para manter uma regularidade na<br />
disponibilidade de sementes, teria<br />
que ter seu próprio laboratório.<br />
Assim, quase dez anos<br />
depois, em 2014 o laboratório foi<br />
montado e começou a operar. Mas<br />
nada foi fácil...<br />
“A primeira leva de sementes<br />
foi produzida com sucesso<br />
somente em 2015. Foram<br />
43 larviculturas sem êxito.<br />
Alexandre já estava desistindo,<br />
ficou longe do laboratório por 20 dias, mas depois voltou e na 44° tentativa fez um milhão e duzentas mil sementes.”<br />
Três meses depois, veio a falecer, mas deixou todo o protocolo utilizado documentado em detalhes.<br />
Figura 3. Futuras instalações da estação de Ciência Alexandre Wainberg.<br />
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O “tripé” que ajudou o laboratório a manter-se em atividade<br />
“Depois do ocorrido tivemos a força de pessoas essenciais que mantiveram<br />
o laboratório funcionando. Porque por mais que eu tivesse vontade de<br />
abrir, estava sem capital e além disso não entendia do funcionamento de um<br />
laboratório”.<br />
“A primeira pessoa com quem fui falar, Ana Carolina da Aquatec, logo<br />
se mostrou disposta a ajudar e deu suporte para que o laboratório funcionasse<br />
por 6 meses. Depois apareceu o Sebrae Nacional, o qual já tinha um projeto de<br />
ostreicultura para o Nordeste que estava baseado na produção do nosso laboratório.<br />
Eles queriam saber se iriamos reabrir. Comentei que apoio financeiro<br />
nós já tínhamos, precisávamos de um técnico e gostaria que fosse o “Pancho”<br />
(Prof. Dr. Francisco Jose Lagreze Squella, da UFPR), porque foi ele quem estruturou<br />
o laboratório junto com o Alexandre. O Sebrae então solicitou junto a<br />
UFPR, instituição na qual o Pancho é vinculado, o deslocamento de um técnico<br />
para o programa AquiNordeste, e a UFPR então o liberou para vir algumas vezes orientar o pessoal”.<br />
Depois do<br />
ocorrido tivemos<br />
a força de pessoas<br />
essenciais que<br />
mantiveram o<br />
laboratório<br />
funcionando.<br />
“Assim, a Aquatec, o Sebrae e a UFPR foram os responsáveis pela reabertura do laboratório, e em<br />
nossa primeira tentativa, conseguimos produzir 600 mil sementes”.<br />
Instituto Alexandre Alter Wainberg<br />
Mais de 30 trabalhos de graduação, mestrado e doutorado já foram realizados dentro da Fazenda PRIMAR.<br />
“Quando Alexandre faleceu o pessoal da Universidade ficava nos perguntando “E agora? Como vai ficar?”<br />
Porque poucas fazendas davam essa abertura para pesquisa e estágios”.<br />
O sonho de Alexandre era que a PRIMAR se tornasse um instituto, polo de referência para estudos em aquicultura.<br />
“Estou formalizando os contratos com as Universidades, aceitando estágio obrigatório, já temos estrutura de<br />
alojamento para poder receber os estudantes e coloquei a meta de 10 anos para que isso se torne um instituto, como<br />
queria ele”.<br />
“Nosso objetivo é realmente abrir para o pessoal entrar e fazer pesquisas. Estamos em um processo de<br />
construção coletiva de conhecimento. Porque eu acredito que quanto mais a gente se abre, mais a gente recebe”.<br />
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Crassostrea<br />
gigas<br />
Com sua ocorrência natural no litoral do Japão, a C. gigas é a espécie de ostra mais cultivada no mundo<br />
e também no <strong>Brasil</strong>, sobretudo no estado de Santa Catarina. Sua rusticidade e rápido crescimento é o que<br />
fazem dela a preferida para a criação.<br />
No <strong>Brasil</strong> os primeiros exemplares chegaram em 1974, importados da Inglaterra pelo Instituto de<br />
Pesquisas Marinhas de Cabo Frio (RJ). Contudo foi em Santa Catarina que de fato a atividade se estabeleceu,<br />
graças a iniciativa do Laboratório de Moluscos Marinhos (LMM) da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina),<br />
do órgão de extensão estadual (ACARPESC, atualmente EPAGRI) e do IBAMA, aliados, logicamente, ao<br />
clima favorável da região. Estas instituições realizaram diversas pesquisas a partir da década de 70, visando<br />
de fato tornar a ostreicultura uma atividade economicamente viável e uma fonte de renda às comunidades de<br />
pescadores artesanais do litoral catarinense.<br />
Biologia reprodutiva<br />
É uma espécie estuarina, que<br />
em ambiente natural prefere viver em<br />
áreas mais protegidas, como baías e estuários.<br />
São ovolíparas, ou seja, liberam<br />
os óvulos e espermatozoides na água<br />
para fertilização e desenvolvimento externos,<br />
não havendo dimorfismo sexual.<br />
São hermafroditas protândricas.<br />
Ostra do Pacífico ou<br />
ostra japonesa<br />
Alimentação<br />
A ostra do Pacífico é um<br />
organismo filtrador, cuja alimentação<br />
é constituída de fitoplâncton (sendo<br />
as microalgas o alimento principal) e<br />
matéria orgânica particulada e dissolvida,<br />
naturalmente presentes na coluna<br />
d´água. Desta forma, o local preferido<br />
para a implantação das estruturas de<br />
cultivo situa-se em regiões costeiras,<br />
onde há maior influência de rios e assim<br />
um maior predomínio de nutrientes<br />
que auxiliam na produtividade<br />
primária.<br />
Figura 1. Fazenda marinha de ostras em Santa Catarina.<br />
Obtenção de sementes<br />
No <strong>Brasil</strong> não há o estabelecimento natural da população<br />
de C. gigas, assim a obtenção de sementes é feita exclusivamente<br />
em laboratório. Em Santa Catarina o único laboratório que produz<br />
e comercializa as sementes é o LMM, da UFSC.<br />
96<br />
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Temperatura ideal e<br />
triploidia<br />
Apresenta faixa ideal de temperatura entre<br />
15 a 19°C (Walne, 1979). Contudo, para evitar o alto<br />
índice de mortalidade ao final da primavera e início do<br />
verão em virtude do gradativo aumento da temperatura<br />
da água que desencadeia o processo de maturação<br />
sexual, e consequentemente provoca um alto estresse,<br />
emagrecimento do animal e esgotamento energético,<br />
foi adotado em alguns países, como Chile, o cultivo<br />
com ostras triploides. As ostras triploides possuem<br />
baixa capacidade reprodutiva, assim, a energia é armazenada<br />
e empregada para seu crescimento.<br />
Sistema de cultivo<br />
No <strong>Brasil</strong> predomina o cultivo flutuante, tipo<br />
espinhel ou longline, cujas lanternas onde as ostras são<br />
acondicionadas estão presas ao cabo principal, que é suspenso<br />
por flutuadores. Nas regiões norte e nordeste, as ostras<br />
(no caso, espécies nativas) são produzidas em travesseiros.<br />
Principais parasitos que<br />
comprometem a produção<br />
No <strong>Brasil</strong> não são registrados surtos de<br />
mortalidades em decorrência de parasitos, contudo,<br />
é relatado principalmente a presença do poliqueta<br />
causador da Polidariose (Polydora websteri),<br />
e do fungo causador da doença chamada “mal do<br />
pé”. Ambos causam alteração na parte interna da<br />
concha e consequentemente diminuem o valor de<br />
comercialização do produto.<br />
Tamanho comercial<br />
No litoral de Santa Catarina as ostras são<br />
comercializadas de acordo com seu tamanho:<br />
• Baby: 7 cm, atingidos com 7 a 8 meses de cultivo;<br />
• Médias: 9 cm, atingidos com 9 a 10 meses de cultivo;<br />
• Master: 11 cm, atingidos com 11 a 12 meses de<br />
cultivo.<br />
Preço de mercado<br />
A dúzia direto do produtor é comercializada<br />
entre R$ 7,00 e R$ 9,00. Mas em restaurantes pode chegar<br />
a R$ 70,00.<br />
Volume nacional produzido<br />
Os dados estatísticos fornecidos pelo IBGE,<br />
agrupam as ostras com os demais grupos de moluscos<br />
bivalves. Contudo, segundo a EPAGRI, o Estado<br />
de Santa Catarina, obteve uma produção em 2016 de<br />
2.821 toneladas de C. gigas.<br />
ENTRAVES E DESAFIOS<br />
O consumo é culturalmente na forma fresca,<br />
ou seja in natura, o que causa uma diminuição<br />
do seu tempo de prateleira, que é de<br />
apenas 4 dias. Consequentemente, isso limita o<br />
produto de entrar em um dos mais importantes<br />
canais de comércio de alimentos, o varejista;<br />
Demora na licitação de novas áreas em<br />
parques que já estão demarcados, no caso<br />
de SC;<br />
Falta de políticas de crédito.<br />
CARACTERÍSTICAS POSITIVAS<br />
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É uma espécie rústica, tolerante a variações de salinidade;<br />
Pacote tecnológico já bem desenvolvido;<br />
Valor de mercado superior ao mexilhão;<br />
Atividade que possibilita à inclusão social.<br />
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DESPESCOU!<br />
Projeto Azul – Itapuã do Oeste (RO).<br />
A despesca apresentada nesta edição é do híbrido pintado real e foi realizada na região Norte do país,<br />
em Itapuã do Oeste (RO). O cultivo tem parceria com a Biofish Projetos, sendo 22 ha em sistema trifásico<br />
de produção (sistema desenvolvido pela Biofish para cultivo de peixes nativos). Essa foi a primeira, de quatro<br />
despescas de pintado que ainda acontecerão nos próximos meses.<br />
Área (m 2 ) 17.000<br />
Data de povoamento<br />
Número de alevinos 8.400<br />
Densidade inicial (peixes/m 2 ) 0,49<br />
Peso inicial (g) 8<br />
04/abr/17<br />
Biomassa inicial (kg) 67,2<br />
Data de despesca 26/dez/17<br />
Dias de cultivo 262<br />
Peso final (g) 1.500<br />
Biomassa final (kg) 12.000<br />
Produtividade (ton/ha) 7.058<br />
Sobrevivência (%) 95<br />
Total de ração (kg)<br />
Conversão alimentar<br />
98<br />
15.600<br />
1,29:1<br />
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