ricardo-rugai-a-formac3a7c3a3o-do-anarquismo-uruguaio
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
atuação <strong>do</strong>s espanhóis, que desconheciam o ambiente. Quan<strong>do</strong> embarcou <strong>do</strong> Uruguai para Europa<br />
Durruti fez uso de um <strong>do</strong>cumento falso, em nome de um militante anarquista <strong>uruguaio</strong>, e durante um<br />
bom tempo ele viveu como Roberto Cotelo, militante funda<strong>do</strong>r da FAU alguns anos depois. 106<br />
Tempos depois de sua estada no Uruguai, Durruti chegou a enviar três “muchachos” de seu<br />
grupo para o Uruguai, recomenda<strong>do</strong>s a Rosicgna. 107 Entre eles estava Pedro Boada Rivas, famoso<br />
expropria<strong>do</strong>r que acabou se radican<strong>do</strong> no Uruguai e que mais tarde também seria um <strong>do</strong>s funda<strong>do</strong>res da<br />
FAU. O inverso também ocorreu. Silvio Astolfi, expropria<strong>do</strong>r argentino, também foi, via Montevidéu,<br />
para a Espanha recomenda<strong>do</strong> a Durruti. Algum tempo depois, já na Espanha, Durruti enviou uma carta<br />
na qual solicitou a presença de Roscigna na Espanha, pois conhecia suas qualidades de organiza<strong>do</strong>r. O<br />
anarquista argentino recusou o convite por se julgar mais útil no Rio da Prata. 108<br />
Estes anarquistas que atuaram na região <strong>do</strong> Rio da Prata permaneceram por bom tempo em<br />
Montevidéu onde realizaram várias ações, estiveram presos, fugiram e libertaram companheiros<br />
<strong>uruguaio</strong>s presos em Punta Carretas. 109 Protagonizaram episódios que ganharam fama na época e<br />
causaram inúmeras discussões tanto na sociedade uruguaia, quanto no meio libertário. Roscigna talvez<br />
tenha si<strong>do</strong> o principal destes expropria<strong>do</strong>res e a sua prisão passou a ser questão de honra para a polícia<br />
uruguaia. Depois de muito tempo de procura e de já ter sofri<strong>do</strong> a desmoralização pública, a polícia<br />
uruguaia conseguiu prendê-lo acompanha<strong>do</strong> de outros não menos “famosos” anarquistas<br />
expropria<strong>do</strong>res. A detenção de Roscigna foi anunciada com toques de sirene por os diários <strong>uruguaio</strong>s.<br />
A polícia oriental não saben<strong>do</strong> o que fazer para demonstrar sua façanha expôs os quatro: Roscigna, o<br />
capitão Paz, Mabicini e Moretti no pátio da chefatura para que a imprensa e o público constatassem o<br />
feito. 110 A polêmica entre os anarquistas de La Protesta e os expropria<strong>do</strong>res atingiu limites trágicos em<br />
1929. Num artigo apócrifo edita<strong>do</strong> em La Protesta, o jornal acusou o expropria<strong>do</strong>r anarquista Severino<br />
Di Giovanni de ser um agente fascista infiltra<strong>do</strong> no movimento anarquista e operário. Di Giovanni<br />
fizera de sua vida uma luta pela libertação de anarquistas e era um <strong>do</strong>s organiza<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Comitê Anti-<br />
Fascista Italiano em Buenos Aires, ten<strong>do</strong> sofri<strong>do</strong> inúmeras perseguições durante sua vida por esta<br />
militância. Este artigo provocou a ira <strong>do</strong> expropria<strong>do</strong>r que foi tomar satisfações diretamente com<br />
Emilio Lopez Arango, responsável pelo jornal, imaginan<strong>do</strong> ser ele o autor <strong>do</strong> artigo. Chegaram às vias<br />
de fato e Di Giovanni acabou matan<strong>do</strong> Lopez Arango. 111 Na verdade o autor <strong>do</strong> artigo que acusava Di<br />
Giovanni, fora Diego Abad Santillán. Anos depois Satillán fez correr uma outra versão, afirman<strong>do</strong> que<br />
Di Giovanni era um agente comunista a man<strong>do</strong> <strong>do</strong> italiano Togliatti. To<strong>do</strong>s estes fatos Santillán admitiu<br />
em suas memórias. 112 O mesmo tipo de postura Santillán manteve em seu regresso à Espanha e estas<br />
questões atravessaram toda a história da FAI e da CNT, quan<strong>do</strong> Durruti e Santillán divergiram<br />
constantemente. 113<br />
106 MECHOSO, Juan Carlos. Acción Directa Anarquista: una historia de FAU. Montevidéu: Recortes. p. 39.<br />
107 BAYER, op. cit., p. 71-72.<br />
108 Ibidem, p. 97.<br />
109 Ibidem, p. 74.<br />
110 Ibidem, p. 83.<br />
111 RAGO, Margareth. Entre a história e a liberdade: Luce Fabrri e o <strong>anarquismo</strong> contemporâneo. São Paulo, Edunesp,<br />
2000. p. 132. RAMA; CAPPELLETTI, op. cit., P. XXXVIII.<br />
112 SANTILLÁN, Diego Abad. Memorias (1897-1936). Barcelona: Planeta, 1977. p. 212.<br />
113 O episódio mais representattivo, e o mais importante, destas divergências aconteceu em meio à Revolução Espanhola.<br />
Diante da falta de armamentos para combater os fascistas e da negativa <strong>do</strong> governo republicano em ceder armas para o<br />
combate, Durruti organizou um assalto ao Banco Central da Espanha, objetivan<strong>do</strong> levar o ouro lá guarda<strong>do</strong> (maior reserva<br />
em ouro <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> na época). O plano era evidentemente secreto, o ouro seria transporta<strong>do</strong> de trem até a fronteira com a<br />
França e troca<strong>do</strong> por armas com contrabandistas. Santillán avaliou que tal ação deveria ser discutida pela FAI e pela CNT<br />
antes de ser levada a cabo. Obviamente, diante de um debate mais aberto e <strong>do</strong> vazamento de informações, o plano foi<br />
frustra<strong>do</strong>. Santillán também reconheceria este erro posteriormente, muito tarde infelizmente. Ver outros epiódios Cf. PAZ,<br />
Abel. O Povo em Armas: Buenaventura Durruti e o <strong>anarquismo</strong> espanhol. Lisboa: Assírio e Alvim, 1976. p. 61-72; 89, 94-<br />
97.<br />
38