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aqui - História da Medicina

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opulento envolto em <strong>da</strong>mascos e arminhos. Sau<strong>da</strong>de<br />

e na<strong>da</strong> mais” (10) .<br />

Anunciava esta notícia a morte do administrador<br />

do Conde <strong>da</strong> Graciosa. Para além de relatar a “fun<strong>da</strong><br />

dor que trespassa o peito dos tios e do pai do finado”<br />

e a dor “dos corações magoados dos povos dos<br />

concelhos de I<strong>da</strong>nha-a-Nova e de Penamacor”, o<br />

autor <strong>da</strong> notícia, amigo do finado, enaltece os<br />

socorros prestados pele médico de I<strong>da</strong>nha-a-Nova,<br />

que, embora “hábil”, não conseguiu impedir que “a<br />

alma se desprendesse do seu invólucro material”.<br />

Alguns aspectos, penso, deverão ser relevados<br />

nesta notícia. Narrando a morte de um servidor<br />

plebeu nobre opulento senhor de terras e de gentes<br />

dos concelhos de I<strong>da</strong>nha-a-Nova e Penamacor, o<br />

autor salienta de modo particular as quali<strong>da</strong>des de<br />

“talento” e de virtude do finado, acrescentando que<br />

elas reflectem uma nobreza de mais valia que a<br />

nobreza do sangue. A morte é assim encara<strong>da</strong> e<br />

descrita como a grande niveladora social, na medi<strong>da</strong><br />

em que o autor afirma arrastar ela ao abismo “tanto<br />

o pobre nas suas mesquinhas palhas como o<br />

opulento envolto em <strong>da</strong>mascos e arminhos”. Estas<br />

considerações traduzem, julgo, uma faceta dos novos<br />

valores sociais que os ventos <strong>da</strong> revolução liberal<br />

trouxeram a esta região.<br />

Uma outra notícia, também de 1864, anunciando<br />

a morte <strong>da</strong> Baronesa de Proença-a-Velha, é<br />

encima<strong>da</strong> por uma citação de Job (“Sicut Domino<br />

placuit, ita factum est: sit nomen Domini benedictum”-<br />

Como agra<strong>da</strong>r ao Senhor, assim seja feito e seja<br />

louvado o nome do Senhor”), e deste modo começa:<br />

“Que ente atingiu a meta <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> di-lo o dobre a<br />

finados!... Mas quem será esse ente? Alguém que<br />

Deus quis provar neste mundo experimentando-lhe<br />

a paciência no martírio? ou carregado de anos e de<br />

decepções foi no seio do Senhor achar alívio e paz?<br />

Não! o ente que se finou não sucumbiu ao peso dos<br />

anos nem dos desgostos( ...).” (11) .<br />

Carinhosa mãe no vigor dos anos era a Baronesa,<br />

arranca<strong>da</strong> aos filhos. Talvez por isso, nesta notícia,<br />

a Morte é chama<strong>da</strong> de “terrível parca que em sua<br />

robusta mão segura os ténues fios <strong>da</strong> existência”.<br />

Data<strong>da</strong> de 8 de Março de 1865 e publica<strong>da</strong> a 15 de<br />

Março desse mesmo ano, assim se inicia outra<br />

notícia:<br />

“No dia 6 de Março deixou de existir a mais lin<strong>da</strong> e<br />

mimosa flor, que vegetava fresca e louçã nos vastos<br />

campos <strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de! Um anjo que habitava sobre<br />

a terra, abriu suas cândi<strong>da</strong>s asas e qual cisne<br />

mavioso se elevou às alturas, seguindo seu voo para<br />

a mansão dos justos” (12) . Foi deste modo empolado,<br />

misto de barroquismo e poesia, que um professor<br />

de Segura iniciou a notícia <strong>da</strong> morte duma sua aluna<br />

de 8 anos. Apura<strong>da</strong> forma de demonstração <strong>da</strong> profun<strong>da</strong><br />

dor provoca<strong>da</strong> pela separação <strong>da</strong> morte, penso<br />

constituir esta notícia, pois essa separação é <strong>aqui</strong><br />

43<br />

compara<strong>da</strong> a um “acre fel no coração dos que<br />

amavam”. A uma submersão na “mais cruel e amarga<br />

dor” é assemelhado o estado dos pais e de<br />

quantos a conheciam, e isto apesar de na notícia<br />

também se afirmar ter sido a menina “arrebata<strong>da</strong> a<br />

um mundo de corrupção e crime. Ela foi gozar<br />

perante o trono do Altíssimo delícias inefáveis”.<br />

Vejamos ain<strong>da</strong> uma outra notícia:<br />

“Chamou-a Deus e ela fugiu-nos!... não para<br />

sempre porque além túmulo há uma vi<strong>da</strong> também.<br />

Quebrou-se o barro, e sua alma voou pura aos pés<br />

dc Eterno! A matéria voltou à matéria, o pó ao pó!<br />

mas a luz fo procurar outra luz(...).<br />

Fugiu-nos! ...perdemo-la... por algum tempo, só por<br />

algum tempo! (13) .<br />

Assim começa o relato <strong>da</strong> morte duma senhora <strong>da</strong><br />

nobreza rural do Fundão, escondendo-se o seu autor<br />

sob as iniciais J.G..<br />

De salientar nesta notícia, <strong>da</strong>ta<strong>da</strong> de Maio de 1865,<br />

que nem a acentua<strong>da</strong> esperança na vi<strong>da</strong> além-<br />

-túmulo, nem a convicção <strong>da</strong> brevi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> separação<br />

provoca<strong>da</strong> pela Morte tão manifestamente expressa<br />

(“... perdemo-la por algum tempo, só por algum<br />

tempo”) impedem o autor de revelar publicamente a<br />

sua dor: “Pungidos de mágoa e de sau<strong>da</strong>de,<br />

dobrando os joelhos e nos inclinando sobre as suas<br />

cinzas”. Foi deste modo sofrido que o autor<br />

descreveu o pedido de intercessão junto de Deus<br />

por parte <strong>da</strong> Senhora de quem a morte o separou.<br />

E mais uma outra notícia:<br />

“Que pode o homem para o homem que já não<br />

existe?<br />

Na<strong>da</strong> senão um frio epitáfio.<br />

A pedra guar<strong>da</strong> a memória por mais tempo que<br />

coração, e é por isso que se grava um nome sobre<br />

un sepulcro” (14) .<br />

Principia assim a notícia <strong>da</strong> morte duma menina<br />

de 14 anos <strong>da</strong> nobreza albicastrense, ocorri<strong>da</strong> <strong>aqui</strong><br />

em Castelo Branco nos começos de Novembro de<br />

1864. Escreveu-a de Lisboa um seu primo que a<br />

publica no “Jornal de Alpedrinha”:<br />

“Os bal<strong>da</strong>dos socorros <strong>da</strong> medicina” para a<br />

arrancar <strong>da</strong> Morte, o cui<strong>da</strong>do dos pais na educação<br />

<strong>da</strong> jovem como forma de lhe legarem um património<br />

condigno à sua condição social, o êxito nos estudos<br />

e a sua “marca<strong>da</strong> inclinação par a música”,<br />

prenunciadores duma vi<strong>da</strong> que se adivinhava feliz<br />

perpassam pungentemente por esta notícia. “A pedra<br />

guar<strong>da</strong> a memória por mais tempo que o coração”,<br />

escreveu o primo talvez conhecedor do papel do<br />

tempo desvanecedor <strong>da</strong> lembrança dos que partiram<br />

cedo, <strong>da</strong>queles para quem vi<strong>da</strong> mais não foi do que<br />

um punhado de efémeras esperanças. Geralmente<br />

“senti<strong>da</strong> e chora<strong>da</strong>”, afirma-se, foi a morte <strong>da</strong> jovem,<br />

e acrescenta-se: “Sirva ao menos isto de consolação<br />

à sua família”. Lágrimas, manifestações de dor como<br />

consolo <strong>da</strong> separação para os que ficam, reflectem

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