grupo bom jesus de alcoólicos anônimos - existe uma solução
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Bebi o primeiro copo <strong>de</strong> vinho aos sete anos. Aos oito, a primeira cerveja. Festejava os Natais,<br />
logo pela manhă, com cálices <strong>de</strong> aguar<strong>de</strong>nte doce. Nas longas tar<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Verăo bebia capilé às<br />
escondidas. Pai, afasta <strong>de</strong> mim esse cálice. N<strong>uma</strong> manhă <strong>de</strong> Setembro, ainda o sol năo tinha<br />
nascido, abalo da minha terra rumo ao <strong>de</strong>sconhecido. Vou pela estrada sem fim, converso e<br />
<strong>de</strong>sconverso, procuro dar um sentido ao năo sentido. Na linha do horizonte um petiz corre atrás<br />
das bolas <strong>de</strong> sabăo. O vento ondula as searas. Pássaros esvoaçam em volta dos ninhos. Uma<br />
nuvem <strong>de</strong> gafanhotos tapou o sol. O tempo escureceu. De que matéria săo os sonhos? Sempre<br />
tive a tendência mórbida para interrogaçőes abstractas e fui apanhado nas teias do álcool. Perdi a<br />
bússola interior.<br />
Caminho estrada fora e năo sei como, nem don<strong>de</strong>, oiço foguetes e música no ar. Paro e pergunto<br />
a um pastor que <strong>de</strong>scia pela encosta do monte: Há festa na al<strong>de</strong>ia?<br />
(Devido a <strong>uma</strong> falha estrutural do meu pensamento, sempre associei as alegrias e as tristezas ao<br />
consumo exagerado do álcool).<br />
Em vez <strong>de</strong> ir ao circo, dar <strong>uma</strong> volta pela montanha mágica ou comprar bilhete para assistir ao<br />
poço da morte, fui direito à taberna. Puxo um cigarro. Um quadro surrealista pendurado na pare<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sperta-me a atençăo. Lá fora, a multidăo bate palmas.<br />
Perdi a bússola interior.<br />
A quem? Porquê? Peço <strong>uma</strong> bebida. Estou bem disposto. Bebo e saboreio o momento. Uma onda<br />
<strong>de</strong> euforia toma conta <strong>de</strong> mim. I<strong>de</strong>ias coloridas bailam no ar. Consulto as horas. Deus năo se<br />
explica: admira-se. A Fé năo se <strong>de</strong>monstra: interioriza-se.<br />
Pago a conta e saio. De repente, o vazio, a insegurança, o medo <strong>de</strong> viver. Passo da euforia à<br />
angústia. A feira, as barracas da feira, os a<strong>de</strong>reços, as luzes da feira, as pessoas, tudo me é<br />
indiferente. Ao virar a esquina, dou <strong>de</strong> caras com o absurdo. "Como vim aqui parar?... Mais valia<br />
năo ter nascido!"<br />
Completamente <strong>de</strong>sorientado (falta-me a bússola), entro <strong>de</strong> novo na taberna. Bebo copos <strong>de</strong><br />
vinho, sem conta. Tenho vómitos e vomito. Discuto comigo. Digo mal do bem e bem do mal: - Olha<br />
quem chega... a excelsa melancolia!<br />
- Năo brinques. Querias ver-te livre <strong>de</strong> mim?<br />
- Perdăo. Mil vezes perdăo.<br />
- Vamos, ó Zé-ninguém!<br />
Saímos. A feira está <strong>de</strong>serta. Chove torrencialmente. Tropeço n<strong>uma</strong> pedra e caio na lama. A lua<br />
escon<strong>de</strong>u-se. As estrelas apagaram-se, <strong>uma</strong> a <strong>uma</strong>. Adormeci, sonhei que estava no mar alto.<br />
Lanço um SOS.<br />
Maio <strong>de</strong> 2007. Bato à porta dos Alcoólicos Anónimos.<br />
Uma gran<strong>de</strong> caminhada começa com o primeiro passo.<br />
Bem-Haja.<br />
Lino G. - Área 09