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Luísa Lacerda Maciel - XI Encontro Nacional de História Oral

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Trabalho e sociabilida<strong>de</strong>: memória dos salões <strong>de</strong> baile da<br />

região da colônia <strong>de</strong> Pelotas (1950-1970)<br />

<strong>Luísa</strong> <strong>Lacerda</strong> <strong>Maciel</strong> 1<br />

“Entre uma situação e outra, o trabalho e a festa, a produção e<br />

a celebração, uma diferença simples e quase romântica estaria<br />

dizer que, pelo menos para o caso <strong>de</strong> trabalho rural, o trabalho<br />

gera os frutos da terra, e a festa camponesa celebra os seres –<br />

humanos, naturais ou sobre naturais – por meio das quais<br />

acredita-se ou sabe-se que os frutos são gerados”<br />

(Brandão, 2009, p. 39)<br />

Este artigo tem por objeto apresentar os espaços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> comunitários,<br />

mais especificamente os salões <strong>de</strong> baile, relacionados com o trabalho fabril na região <strong>de</strong><br />

colonização imigrante na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pelotas (RS). A partir <strong>de</strong> entrevistas, busca-se<br />

recompor o cenário em que se <strong>de</strong>ram essas festivida<strong>de</strong>s, bem como a i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong><br />

elementos constitutivos da memória social dos agentes sociais.<br />

Trabalhos recentes que abordam o tema patrimônio cultural e memória social<br />

irão voltar sua atenção para zona rural, caracterizando sua paisagem, arquitetura,<br />

costumes e tradições, por exemplo, como “patrimônio cultural rural” (Panis, 2008;<br />

Silva, 2009). Nesse contexto, a colônia <strong>de</strong> imigração da região <strong>de</strong> Pelotas (RS) vem<br />

sendo analisada em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas diversas manifestações culturais, como por exemplo<br />

o trabalho <strong>de</strong> Panis (2008), que ressalta a cultura italiana consi<strong>de</strong>rando “(...) a<br />

arquitetura e a paisagem rural, os costumes e tradições italianas que representam o<br />

1 Graduada em <strong>História</strong> pela Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Pelotas, Especialista em Educação pela mesma<br />

instituição. Mestranda do Programa <strong>de</strong> Pós Graduação em Memória Social e Patrimônio Cultural da<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Pelotas (UFPel), Bolsista CAPES. E-mail: luisamaciel@gmail.com


conjunto do arranjo espacial, como casas <strong>de</strong> pedra, moinhos, cantinas <strong>de</strong> vinho,<br />

ferramentas <strong>de</strong> trabalho, <strong>de</strong>ntre outros; e da reprodução social cotidiana como a<br />

religiosida<strong>de</strong>, técnicas <strong>de</strong> trabalho, a produção do vinho, práticas <strong>de</strong> lazer a festas<br />

religiosas, (...)” (s.p.)<br />

A vinda dos imigrantes para a região <strong>de</strong> Pelotas está inserida no processo <strong>de</strong><br />

substituição da mão-<strong>de</strong>-obra escrava no Brasil – a partir <strong>de</strong> 1850 – e a consequente<br />

queda na produção das charqueadas. O Governo Imperial, nesta época, realiza a busca<br />

<strong>de</strong> terras <strong>de</strong>volutas, que <strong>de</strong>veriam ser <strong>de</strong>marcadas e colonizadas. Segundo Peixoto<br />

(2003), na região da Serra dos Tapes, a colonização se <strong>de</strong>u através <strong>de</strong> dois processos<br />

diferentes: a imigração espontânea, que ocorreu ao longo <strong>de</strong> algumas décadas e a<br />

imigração organizada (pelo governo ou particulares). Charqueadores e estancieiros<br />

vislumbraram na imigração uma fonte <strong>de</strong> enriquecimento, sustentando um movimento<br />

<strong>de</strong> especulação fundiária, conforme afirma Grando (1990). Segundo o autor, esses<br />

charqueadores, “(...) apossavam-se das terras <strong>de</strong> mato contíguas as suas proprieda<strong>de</strong>s e<br />

transformavam-nas em colônias a serem vendidas aos imigrantes, retendo para si,<br />

todavia, as terras planas. O sistema <strong>de</strong> colonização privada juntou-se, assim, à<br />

colonização oficial.” (p. 18). A partir <strong>de</strong>sse processo <strong>de</strong> intensificação da colonização da<br />

zona sul do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul começa a surgir os estabelecimentos agrícolas <strong>de</strong> caráter<br />

familiar.<br />

Na colônia <strong>Maciel</strong>, por exemplo, a base econômica era a agricultura.<br />

Cultivavam o milho, a uva e árvores frutíferas, das quais iniciaram a produção <strong>de</strong><br />

compotas caseiras. (Peixoto, 2003). A dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> comunicação entre a cida<strong>de</strong> e a<br />

colônia (Peixoto, 2003) e entre as próprias colônias (Caruso, 2008), resultaram num<br />

esforço para viabilizar a sobrevivência das famílias, levando aoaparecimento <strong>de</strong> fábricas


<strong>de</strong> caráter artesanal. Com o passar dos anos, <strong>de</strong>senvolvem-se “(...) moinhos, vinícolas,<br />

pequenas fábricas <strong>de</strong> compotas, doces em pasta e embutidos atrelados às proprieda<strong>de</strong>s<br />

rurais e que conferiam um caráter diversificado às colônias.” (Caruso, 2008, p. 15).<br />

Com base nas entrevistas <strong>de</strong> <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> imigrantes italianos, Peixoto<br />

(2003) ressalta a existência, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o inicio da colonização, <strong>de</strong> uma inter-relação entre os<br />

espaços – as lavouras, os currais e as casas... A importância <strong>de</strong>ssa relação residia no fato<br />

<strong>de</strong> que era indispensável agilida<strong>de</strong> no trabalho, e a participação <strong>de</strong> todos os membros da<br />

família. Segundo ela, o primeiro mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> assentamento <strong>de</strong>sses colonos serviu <strong>de</strong> base<br />

para o mo<strong>de</strong>lo atual que caracteriza a proprieda<strong>de</strong> rural. As alterações neste espaço,<br />

provocadas com o tempo, <strong>de</strong>vido a melhores condições financeiras, ou <strong>de</strong> novos<br />

padrões culturais, não afetaram por completo as condições <strong>de</strong> trabalho e as relações<br />

pessoais (Peixoto, 2003).<br />

Santos (1986) afirma que o espaço é um testemunho. Segundo ele, o espaço,<br />

(...) testemunha um momento <strong>de</strong> um modo <strong>de</strong> produção pela memória do<br />

espaço construído, das coisas fixadas na paisagem criada. Assim o espaço é<br />

uma forma, forma durável, que não se <strong>de</strong>sfaz paralelamente à mudança <strong>de</strong><br />

processos; ao contrario, alguns processos se adaptam às formas preexistentes<br />

enquanto que outros criam novas formas para se inserir <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>las [...] Os<br />

modos <strong>de</strong> produção ce<strong>de</strong>m lugar a outros, os momentos <strong>de</strong> cada modo se<br />

suce<strong>de</strong>m enquanto os objetos sociais por eles criados continuam firmes, e<br />

muitas vezes ainda com uma função na produção. (p. 138)<br />

Bach (2009), afirma que gran<strong>de</strong> parte das indústrias <strong>de</strong> conservas <strong>de</strong> frutas na<br />

zona rural <strong>de</strong> Pelotas era composto por pequenas fábricas tipicamente artesanais,<br />

geralmente localizadas junto à residência do proprietário, guardando, muitas <strong>de</strong>las, as


características da casa da família. As instâncias do doméstico e do trabalho confundiam-<br />

se. Além disso, o autor afirma que a fábrica cumpria um papel social muito importante<br />

<strong>de</strong>ntro da comunida<strong>de</strong>, pois, <strong>de</strong> acordo com relatos orais obtidos para sua pesquisa,<br />

pô<strong>de</strong> constatar que várias serviam <strong>de</strong> local para comemorar festas <strong>de</strong> casamento <strong>de</strong><br />

familiares, bodas <strong>de</strong> prata, festas religiosas ou celebração <strong>de</strong> cultos dominicais.<br />

Portanto, segundo Bach, “o lazer do trabalhador colonial tinha na sociabilida<strong>de</strong> o ponto<br />

alto. Nos bailes, festas do colono, do pêssego, no futebol, enfim, em todos os eventos, a<br />

figura da rainha estava presente.” (p. 24).<br />

O mesmo autor ainda aponta as formas <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> que se verificavam na<br />

colônia, <strong>de</strong>stacando os bailes e os chás dançantes. Em relação aos bailes, afirma que os<br />

principais faziam parte <strong>de</strong> um calendário “oficial” – Baile <strong>de</strong> Natal, Baile <strong>de</strong> Ano Novo,<br />

Baile <strong>de</strong> Páscoa, Baile da escolha da rainha da colônia – um dos mais expressivos. Esses<br />

bailes tinham gran<strong>de</strong> repercussão nas redon<strong>de</strong>zas, já que vinham várias pessoas até <strong>de</strong><br />

outros municípios. Nesse caso, o autor i<strong>de</strong>ntifica que o mesmo meio <strong>de</strong> transporte<br />

utilizado para o trabalho (carroça, ao menos na década <strong>de</strong> 1950) também servia para o<br />

lazer. Esses eventos tinham gran<strong>de</strong> notorieda<strong>de</strong> na mídia também: há registros em<br />

jornais como o “Diário Popular”, e também na Rádio Cultura <strong>de</strong> Pelotas, em entrevista<br />

concedida ao autor.<br />

Percebe-se, portanto, a significativa importância que atribuídos à esses espaços<br />

<strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>, principalmente no que se refere ao período abarcado por esse trabalho.<br />

Deste modo, tem-se como foco central <strong>de</strong>sta investigação i<strong>de</strong>ntificar e analisar quais<br />

seriam esses espaços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>, e qual a relação que po<strong>de</strong> ser estabelecida entre<br />

estes e o espaço fabril, na Colônia <strong>de</strong> Pelotas, no período caracterizado como o início, o<br />

apogeu e o <strong>de</strong>clínio <strong>de</strong>ssas fábricas, ou seja, <strong>de</strong> 1950 a 1970 (Bach, 2009; Caruso,2008)


De acordo com Mota (2003),<br />

A sociabilida<strong>de</strong> é uma categoria que possibilita compreen<strong>de</strong>r a relação entre<br />

esferas da vida cotidiana e do trabalho, simultaneamente, tanto no que se<br />

refere às suas formas (re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> indicação, equipes <strong>de</strong> convivência no trabalho<br />

e na rua, por exemplo) quanto ao conteúdo (interesses, finalida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>sejos<br />

dos indivíduos). (p.56)<br />

Os salões <strong>de</strong> baile da colônia serão analisados, no período em que estas<br />

fábricas apresentaram, conforme mencionado, seu início, apogeu e <strong>de</strong>clínio (entre as<br />

décadas <strong>de</strong> 1950 e 1970), sob a perspectiva da sociabilida<strong>de</strong>, buscando nos discursos a<br />

dinâmica das festas, suas exclusões, negociações, as relações <strong>de</strong> intriga ou amorosas,<br />

enfim, compreen<strong>de</strong>ndo os salões como espaços que agregam diferentes sentidos. De<br />

acordo com Müller (2010), o estudo da sociabilida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> trazer informações sobre<br />

comportamentos culturais e sensibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong>terminado <strong>de</strong> indivíduos em<br />

um tempo e espaço <strong>de</strong>finidos. Conforme a autora,<br />

O estudo da sociabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>tém-se na análise das formas a partir das quais<br />

um grupo <strong>de</strong> indivíduos entra efetivamente em relação, consi<strong>de</strong>rando a<br />

dimensão afetiva – positiva ou negativa – como competente da interação<br />

social. (MÜLLER, 2010, p. 20)<br />

Para esse trabalho <strong>de</strong> investigação, inicialmente realizou-se uma pesquisa<br />

exploratória, buscando bibliografias relacionadas ao tema proposto. Nesse sentido,<br />

alguns textos foram procurados em sites acadêmicos <strong>de</strong> busca 2 . Nestes foram<br />

encontrados excelentes trabalhos que servirão <strong>de</strong> referência futura para o presente<br />

2 http://www.scielo.br, http://cj.uenp.edu.br, http://www.eeh2010.anpuh-rs.org.br, http://www.cfh.ufsc.br/,<br />

http://bdtd.ibict.br/, entre outros.


estudo. Além disso, na pesquisa na Biblioteca das Ciências Sociais (ICH | UFPel),<br />

também foram encontradas bibliografias <strong>de</strong> referência.<br />

À esta altura do trabalho foi realizada, ainda, uma análise prévia do acervo <strong>de</strong><br />

entrevistas do Museu Etnográfico da Colônia <strong>Maciel</strong>. Neste acervo, encontram-se<br />

entrevistas com antigos moradores da região <strong>de</strong>nominada “Colônia <strong>Maciel</strong>” que foram<br />

realizadas para a constituição do Museu, e que indicam possíveis entrevistados para este<br />

trabalho, bem como lugares <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> que também po<strong>de</strong>m ser relacionados à esse<br />

estudo. Dentre as entrevistas do acervo do Museu da Colônia <strong>Maciel</strong>, <strong>de</strong>staca-se a <strong>de</strong><br />

Delcira Maria Mayer Tessmer, filha <strong>de</strong> Joaquim Mayer, proprietário do Salão dos<br />

Mayer. A mesma relata, numa das entrevistas, algumas características dos bailes na sua<br />

época <strong>de</strong> juventu<strong>de</strong>:<br />

“[...]Antigamente a gente também fazia café... Fazia quando vinha gente aí,<br />

antigamente, café diverso. Com o forno ali fora, forno que se faz na rua o<br />

pão, essas coisas. Aí nós fazíamos uma fornada <strong>de</strong> cuca e <strong>de</strong> pão e aquilo nós<br />

comia tudo <strong>de</strong> noite no café. [...]” (Entrevista realizada em junho <strong>de</strong> 2005,<br />

acervo Museu Colônia <strong>Maciel</strong>)<br />

Como mencionado anteriormente, o recurso da entrevista (<strong>História</strong> <strong>Oral</strong>) está<br />

sendo utilizado nessa pesquisa, no intuito <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r melhor os espaços <strong>de</strong><br />

sociabilida<strong>de</strong> do cotidiano <strong>de</strong>ssas pessoas, com vínculo aos espaços fabris da colônia <strong>de</strong><br />

Pelotas. Durante as entrevistas é usado o recurso da fotografia como elemento evocador<br />

<strong>de</strong> memórias, bem como documentação <strong>de</strong>sses espaços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>.


Além disso, foi realizado um primeiro contato com autores locais, que<br />

trabalharam com temas relacionados à essa pesquisa, com o intuito <strong>de</strong> alcançar<br />

informações que possam auxiliar nesse trabalho.<br />

Os salões da Colônia<br />

Como já foi dito anteriormente, das formas <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> que se verificavam<br />

na colônia, <strong>de</strong>stacavam-se os bailes e os chás dançantes. Em relação aos bailes, Bach<br />

(2009) afirma que os principais faziam parte <strong>de</strong> um calendário “oficial” – Baile <strong>de</strong><br />

Natal, Baile <strong>de</strong> Ano Novo, Baile <strong>de</strong> Páscoa, Baile da escolha da rainha da colônia – um<br />

dos mais expressivos. Esses bailes tinham gran<strong>de</strong> repercussão nas redon<strong>de</strong>zas, já que<br />

vinham várias pessoas até <strong>de</strong> outros municípios. Nesse caso, o autor i<strong>de</strong>ntifica que o<br />

mesmo meio <strong>de</strong> transporte utilizado para o trabalho (carroça, ao menos na década <strong>de</strong><br />

1950) também servia para o lazer. Esses eventos tinham gran<strong>de</strong> notorieda<strong>de</strong> na mídia<br />

também: há registros em jornais como o “Diário Popular”, e também na Rádio Cultura<br />

<strong>de</strong> Pelotas, em entrevista concedida ao autor.<br />

Percebe-se, portanto, a significativa importância que atribuídos à esses espaços<br />

<strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>, principalmente no que se refere ao período abarcado por esse trabalho.<br />

Deste modo, tem-se como foco central <strong>de</strong>sta investigação i<strong>de</strong>ntificar e analisar quais<br />

seriam esses espaços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>, e qual a relação que po<strong>de</strong> ser estabelecida entre<br />

estes e o espaço fabril, na Colônia <strong>de</strong> Pelotas, no período caracterizado como o início, o<br />

apogeu e o <strong>de</strong>clínio <strong>de</strong>ssas fábricas, ou seja, <strong>de</strong> 1950 a 1970 (Bach, 2009; Caruso,<br />

2008).


Até o momento, realizou-se uma pesquisa exploratória com o objetivo <strong>de</strong><br />

i<strong>de</strong>ntificar os salões <strong>de</strong> baile. Muitos dos salões foram localizados através <strong>de</strong> indicações<br />

<strong>de</strong> moradores da região que, entre os quais, também frequentavam os salões <strong>de</strong> baile no<br />

referido período.<br />

Nesse primeiro momento <strong>de</strong> pesquisa, optou-se por localizar os salões que se<br />

encontram na região distrital do município <strong>de</strong> Pelotas, embora se saiba que o período<br />

aqui estudado compreen<strong>de</strong> o município <strong>de</strong> Pelotas antes das emancipações dos Distritos<br />

<strong>de</strong> Capão do Leão, Morro Redondo, Turuçu e Arroio do Padre.


Figura 1 - Mapa divisão distrital Pelotas (RS) | Fonte: Marcelo Panis, 2008<br />

Das indicações que obtivemos <strong>de</strong> diferentes moradores, bem como <strong>de</strong><br />

pesquisadores da região, elaboramos a seguinte tabela, <strong>de</strong> caráter preliminar, no intuito<br />

<strong>de</strong> situar os salões em suas respectivas localida<strong>de</strong>s:


RelaçãoSalões/Comunida<strong>de</strong>s:<br />

4º distrito: Triunfo<br />

5º distrito: Cascata<br />

- Ponte Cor<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> Farias<br />

- Cascata<br />

7º distrito: Quilombo<br />

Colônia Municipal<br />

Bachini<br />

8º distrito: Rincão da Cruz<br />

<strong>Maciel</strong><br />

Santa Eulália<br />

9º distrito: Monte Bonito<br />

- Monte Bonito<br />

- Natale<br />

- Brasil<br />

- Centenário<br />

- Salão AntérioKrause<br />

- Gruppelli<br />

- A. Khols<br />

- Bachini (Red Hotel)<br />

- LuizAldrighi<br />

- João Casarin<br />

- Vidal<br />

- Mayer<br />

- João Schaun<br />

- Aldrighi<br />

A opção <strong>de</strong> iniciar a pesquisa pela região da atual divisão distrital <strong>de</strong> pelotas se<br />

<strong>de</strong>u pelo fato <strong>de</strong> que já existe uma maior proximida<strong>de</strong> com a região distrital <strong>de</strong> Pelotas,<br />

não apenas física, como também pessoal, <strong>de</strong>vido ao trabalho, já mencionado, realizado<br />

junto ao MECOM. O ponto <strong>de</strong> partida para esta pesquisa, portanto, é região conhecida<br />

coma Colônia <strong>Maciel</strong> (8º distrito – Rincão da Cruz).


Figura 2 - João Casarin em frente ao prédio da antiga fábrica (década <strong>de</strong> 60) – Colônia <strong>Maciel</strong> (8º<br />

distrito – Rincão da Cruz) | Fonte: BACH (2009)<br />

A fábrica do senhor João Casarin teve início <strong>de</strong> suas ativida<strong>de</strong>s em 1961,<br />

comprando pêssegos <strong>de</strong> produtores da região, e chegou a ter cerca <strong>de</strong> 60 funcionários.<br />

No período em que a fábrica permanecia fechada, adaptava as instalações para a<br />

realização <strong>de</strong> bailes durante o ano (BACH, 2009).<br />

De acordo com Bach (2009, p. 90),<br />

O Ministério do Trabalho fazia visitas freqüentes, exigindo o cumprimento<br />

da lei, o que o obrigou a fazer o registro dos trabalhadores. Outro problema<br />

era a fiscalização da saú<strong>de</strong> que exigia altura, forro e azulejo nas pare<strong>de</strong>s.<br />

Disse que naquela época trabalhava-se mais ou menos um mês com a safra, o<br />

que dificultava um empreendimento daqueles, para ficar parado o resto do


ano. Isso foi <strong>de</strong>sgostando-o até que, quando as gran<strong>de</strong>s fábricas se instalaram,<br />

muita gente <strong>de</strong>sistiu da colônia.<br />

Atualmente, o prédio tem como sua principal funcionalida<strong>de</strong> ser salão <strong>de</strong><br />

festas. Ainda assim, é necessário ressaltar as diferenças entre os diferentes momentos <strong>de</strong><br />

realização <strong>de</strong> festas nesse mesmo espaço. Conforme mencionado, durante o período<br />

entre safras eram realizados alguns festejos no espaço da fábrica. Após o fechamento da<br />

mesma, no mesmo espaço passou-se a realizar bailes, on<strong>de</strong> era cobrada a entrada e<br />

vendida a bebida e comida, ou seja, bailes foram uma alternativa <strong>de</strong> comércio para a<br />

família. Atualmente, o salão é ocasionalmente emprestado para a realização <strong>de</strong> festejos,<br />

como casamentos ou festas <strong>de</strong> aniversário.<br />

Figura 3 – Vista prédio antiga fábrica e a casa (ao lado, na cor azul) <strong>de</strong> João Casarin – Colônia<br />

<strong>Maciel</strong> (8º distrito – Rincão da Cruz) | Fonte: http://www.panoramio.com/photo/15657561


No caminho que leva da Colônia <strong>Maciel</strong> à Colônia São Manoel, ainda no 8º<br />

distrito (Rincão da Cruz), encontramos o antigo Salão dos Mayer, que encontra-se<br />

inativo nos dias <strong>de</strong> hoje. Referências sobre esse salão são encontradas na bibliografia<br />

recente sobra a colônia <strong>Maciel</strong>. Peixoto (2003), ao analisar as entrevistas realizadas para<br />

a constituição do MECOM, ressalta para a importância dada aos salões <strong>de</strong> baile nos<br />

relatos. Num <strong>de</strong>sses o entrevistado menciona:<br />

Para dançar, havia salão <strong>de</strong> baile. A primeira vez que fui a um baile, eu tinha<br />

vinte anos. [...] Depois apareceu um ali na <strong>Maciel</strong>. Tinha todo tipo <strong>de</strong> música,<br />

italiana, alemã. Vinha tocar um conjunto <strong>de</strong> alemães do Morro Redondo.<br />

Havia o salão do Joaquim Mayer e o do João, todos <strong>de</strong> origem alemã. [...] O<br />

Gruppelli também tinha um salão. Com o tempo, foram aparecendo outros,<br />

como um aqui no Rincão da Caneleira. (Entrevista com Cesário Zanetti,<br />

realizada em 20/05/2000, fonte: PEIXOTO, 2003)<br />

Ainda sobre o mesmo salão, temos o relato da senhora DelciraTessmer, filha<br />

do proprietário do mesmo, em entrevistas concedida também para a constituição do<br />

MECOM, em junho <strong>de</strong> 2005. Em sua narrativa, senhora Delciralembra <strong>de</strong> como era a<br />

casa quando seus pais se casaram, e que aos poucos foram aumentando, para construir o<br />

salão. Além disso, ela afirma que realizavam um baile por mês, além das festas maiores<br />

como Natal, Páscoa, Ano-Novo, além <strong>de</strong> outras festivida<strong>de</strong>s em feriados durante o ano,<br />

e baile <strong>de</strong> carnaval. Em seu discurso evi<strong>de</strong>nciam-se também alguns conflitos, quando<br />

questionada acerca das etnias que frequentavam o salão.<br />

(...)antigamente não era assim. Não se misturava tanto os morenos como<br />

agora, né.... A gente não se misturava com os morenos. Quase não tinha<br />

morenos nos bailes. Agora sim <strong>de</strong>pois foi misturando. Depois sim, quando<br />

esse Darci Bonow alugou aí vinha <strong>de</strong> lá não sei dá on<strong>de</strong> vinha. Começaram a<br />

vir mais morenos. Lembro que meu pai queria colocar para fora. Não<br />

estavam acostumados, antigamente não vinha os morenos aqui, enós<br />

dizíamos [para o pai] que agora não, que era assim. Já estava com ida<strong>de</strong>


avançada, já estava ficando meio esquecido das coisas, <strong>de</strong> tudo [...]<br />

(DelciraTessmer, entrevistaconcedidadia 11/06/2005)<br />

Figura 4 - Salão dos Mayer (atual proprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> DelciraTessmer) – Colônia <strong>Maciel</strong> (8º distrito –<br />

Rincão da Cruz) | Fonte: Foto da autora, 2011<br />

Seguindo em direção à Colônia Municipal (4º distrito - Triunfo), po<strong>de</strong>mos<br />

encontrar o Salão Gruppelli, que encontra-se em ativida<strong>de</strong> até os dias atuais. No mesmo<br />

local estão em ativida<strong>de</strong>, hoje, o armazém, o restaurante e a casa da família Gruppelli.


Figura 5 - Fachada Restaurante e Armazém Gruppelli – Colônia Municipal (4º distrito - Triunfo) |<br />

Fonte: VIEIRA, 2009<br />

Ao analisar uma imagem da década <strong>de</strong> 1960, <strong>de</strong> vista da parte interna do salão<br />

Gruppelli, Vieira (2009) aponta que pouco ou nada <strong>de</strong>ste espaço lembra o restaurante<br />

atual, revelando a transformação no espaço.<br />

(...) além das pare<strong>de</strong>s e aberturas contidas nesse ângulo fotográfico, nada<br />

mais permaneceu no ambiente. O piso <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira claro foi trocado por<br />

ladrilho cerâmico, certamente, influenciado pela Cerâmica BellaGres; os<br />

retratos, que ninguém mais se lembra <strong>de</strong> quem eram, <strong>de</strong>sapareceram; e o<br />

banco virou peça do acervo do Museu Gruppelli. (VIEIRA, 2009, p. 221)


Figura 6 - Convite para baile no salão Gruppelli | Fonte: acervo pessoal Norma Gruppelli<br />

No caminho da estada principal, seguimos em direção à “colônia francesa”,<br />

próximo à localida<strong>de</strong> “Alto do caixão”, encontramos o antigo salão <strong>de</strong> Alfredo Kohls,<br />

pai <strong>de</strong> senhora Norma Gruppelli, atual proprietária do Restaurante Gruppelli. O salão<br />

ficava ao lado do armazém da família, o qual, segundo a senhora Norma, “(...) tinha <strong>de</strong><br />

tudo”. O salão, atualmente, encontra-se fechado. Em 1957 o salão já estava em<br />

ativida<strong>de</strong>, relembra senhora Norma: “(...) já trabalhávamos, tinha baile, porque meus 15<br />

anos foi ali, eu me lembro muito bem...” 3 . Nos bailes, eles tinham copa, serviam<br />

bebidas, e bolo em pedaços, cachorro-quente, no entanto, não tinha espaço para fazer<br />

café, como em outros bailes da região. Os bailes começavam cedo, lembra senhora<br />

Norma, cerca <strong>de</strong> nove horas da noite. O salão era frequentado pela vizinhança, na sua<br />

época. A <strong>de</strong>poente lembra também do quanto era trabalhoso a realização <strong>de</strong>sses bailes.<br />

A maioria dos que trabalhavam no salão eram da família, segundo ela, e tinham também<br />

uma empregada.<br />

3 Entrevista concedida por Dona Norma Gruppelli, em julho <strong>de</strong> 2011.


Figura 7 - Prédio antigo salão Alfredo Kohls - Colônia Municipal (7º distrito - Quilombo) |<br />

Fonte: Foto da autora, 2011<br />

Pelo mesmo caminho, mais adiante chega-se a localida<strong>de</strong> chamada Bachini (na<br />

região conhecida como “colônia francesa”, conforme mencionado anteriormente). Ali se<br />

encontra o antigo salão e hospedaria Bachini, que hoje também se encontra <strong>de</strong>sativado.<br />

O salão também foi se<strong>de</strong> da Socieda<strong>de</strong> Bailante União Camponesa, fundada em<br />

1902. Referências aos bailes da época a qual abrange esse trabalho são encontradas<br />

através da divulgação no jornal “Diário Popular”:<br />

“Comemora-se hoje o 55º aniversário da Socieda<strong>de</strong> união Camponesa – 7º<br />

dist.


Consi<strong>de</strong>rações finais<br />

Conforme antecipamos, a Socieda<strong>de</strong> B. União Camponesa, fundada em<br />

1902, comemora, hoje, seu 55º aniversário. Essa tradicional e conceituada<br />

entida<strong>de</strong>, que reúne em seu seio a socieda<strong>de</strong> do 7º distrito – Colônia Santo<br />

Antônio, bem assim <strong>de</strong> outros pontos do interior do Município, tem sua se<strong>de</strong><br />

na proprieda<strong>de</strong> do sr.Clau<strong>de</strong>miroBachini.<br />

Por motivo do transcurso <strong>de</strong>sta expressiva data, fará realizar a S.B.U.C., á<br />

noite <strong>de</strong> hoje, um gran<strong>de</strong> baile, para o qual estão convidados seus sócios e<br />

exmas. familiares.<br />

A festa, com certeza, constituirá mais um sucesso da União Camponesa,<br />

reafirmando, assim, o êxito sempre alcançado pelas realizações da veterana<br />

entida<strong>de</strong>.<br />

A atual diretoria da SBUC está assim constituída: srs. Lino E. Ribes,<br />

Armindo Laufer, Nestor E. Crochemore, Val<strong>de</strong>mar Ribes, Artur Jouglard e<br />

João R. Schiller.” (Diário Popular, Suplemento Colonial, 27/abril/1957, s/p)<br />

Nesse primeiro levantamento observou-se que a maioria dos salões se<br />

encontram inativos, po<strong>de</strong>ndo-se inferir que muitos <strong>de</strong>les se caracterizavam como<br />

espaços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> relacionados ao trabalho fabril da época na região colonial <strong>de</strong><br />

Pelotas. Outro indício importante é a proximida<strong>de</strong> das se<strong>de</strong>s dos salões com se<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

antigas fábricas, entre as quais, muitas se encontram inativas também.<br />

Com este trabalho preten<strong>de</strong>-se ampliar o <strong>de</strong>bate referente à memoria cultural<br />

<strong>de</strong>ssas comunida<strong>de</strong>s, não per<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> vista a diversida<strong>de</strong> que se apresenta nas<br />

manifestações culturais das mesmas.<br />

As memórias recuperadas por ex-trabalhadores, patrões, enfim, pessoas que<br />

viveram o cotidiano <strong>de</strong>ssa “paisagem industrial” (Bach, 2009) na colônia, também<br />

po<strong>de</strong>m revelar o outro lado do trabalho, que eram as relações pessoais fortemente


marcadas, bem como o lazer <strong>de</strong>sse trabalhador colonial, que entre outras ativida<strong>de</strong>s,<br />

acontecia nos bailes nos salões coloniais.<br />

Referências Bibliográficas:<br />

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pêssego em pelotas – 1950 à 1970. 2009. Dissertação (Mestrado em Memória Social e<br />

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Paulo: Edusp, 2002.<br />

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CEOM – Ano 22, n. 31, p. 103-119, 2010.

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