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Crescimento intrauterino - Febrasgo

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Revista Medicina<br />

Materno-Fetal<br />

Ano I • nº 2/2010 ISSn 2177-1588<br />

<strong>Crescimento</strong> <strong>intrauterino</strong><br />

Diagnóstico e condução<br />

<strong>Crescimento</strong> <strong>intrauterino</strong><br />

Sequelas a longo prazo<br />

Protocolo<br />

Conduta diante de feto pequeno para a<br />

idade gestacional<br />

Dissertação de mestrado<br />

Correlação entre os diversos valores<br />

da relação umbílico-cerebral e estado<br />

gasométrico fetal


2 Revista Neurociência de A a Z • Ano I • Nº 1/2010


Revista Medicina<br />

Materno-Fetal<br />

Ano I • nº 2/2010 ISSn 2177-1588<br />

Segue o segundo número da Revista Medicina Materno-Fetal. Considerando<br />

que a segunda causa de mortalidade neonatal é decorrente da restrição<br />

de crescimento fetal (RCF) e que os médicos que lidam com a medicina<br />

materno-fetal necessitam estar atualizados nas medidas que visam o diagnóstico<br />

para conduzirem cada caso da melhor maneira possível, evitando, assim, medidas<br />

intempestivas, abordaremos nesta edição o tema restrição de crescimento fetal.<br />

A definição do termo pequeno para idade gestacional (PIG) confunde-se com<br />

a restrição de crescimento fetal. Assim, há uma dificuldade em se diferenciar fetos<br />

com RCF e fetos PIG saudáveis. Alguns autores adotam a Dopplervelocimetria<br />

como método para diferenciar estas duas formas de fetos pequenos e assim determinar<br />

sua conduta. O diagnóstico e a conduta são revisados pelo grupo do<br />

Professor Antônio Carlos Vieira Cabral.<br />

No segundo artigo de Revisão, o Professor Mário Dias Corrêa aborda as sequelas<br />

a curto e longo prazo associadas à RCF. Ênfase especial para as doenças na vida<br />

adulta, tais como obesidade, hipertensão e diabetes não-insulino-dependente.<br />

Estas condições parecem ser programadas na vida intrauterina e sua prevenção<br />

deve ser iniciada ainda na gestação e prosseguir durante a infância com práticas<br />

saudáveis de vida. A prevenção do CIUR grave melhora a qualidade de vida desde<br />

o período neonatal até a vida adulta.<br />

Finalmente, a Comissão de Medicina Fetal da FEBRASGO apresenta um protocolo<br />

simples que ajuda a diferenciar e conduzir os fetos pequenos para a idade<br />

gestacional.<br />

Esperamos que vocês gostem deste número da Revista Medicina Materno-Fetal!<br />

Prof. Dr. Eduardo Borges da Fonseca<br />

Professor Adjunto da UFPB.<br />

Presidente da Comissão de Medicina Fetal FEBRASGO.<br />

4<br />

<strong>Crescimento</strong><br />

<strong>intrauterino</strong> restrito:<br />

diagnóstico e<br />

condução<br />

Carolina Amorim de Barros,<br />

Joana Sara Fonseca Dumont,<br />

Mário Dias Corrêa Júnior,<br />

Antônio Carlos Vieira Cabral<br />

10<br />

<strong>Crescimento</strong><br />

<strong>intrauterino</strong> restrito:<br />

sequelas a longo prazo<br />

Joana Sara Fonseca Dumont,<br />

Carolina Amorim de Barros,<br />

Mário Dias Corrêa Júnior,<br />

Mário Dias Corrêa<br />

14<br />

Protocolo de conduta<br />

diante de feto<br />

pequeno para a idade<br />

gestacional<br />

Rafael Frederico Bruns,<br />

Eduardo Fonseca<br />

15<br />

Correlação entre os<br />

diversos valores da<br />

relação umbílicocerebral<br />

e estado<br />

gasométrico fetal<br />

Dissertação de mestrado<br />

de Cláudia Lourdes Soares<br />

Laranjeira<br />

Medicina Materno-Fetal é uma publicação patrocinada pela Farmoquímica S/A, produzida pela Office Editora e Publicidade - Diretor Responsável: Nelson dos Santos Jr. - Diretora Executiva: Waléria Barnabá - Diretor de Arte: Roberto E. A. Issa - Publicidade:<br />

Adriana Pimentel Cruz e Rodolfo B. Faustino - Jornalista Responsável: Cynthia de Oliveira Araujo (MTb 23.684) - Redação: Flávia Lo Bello, Luciana Rodriguez e Vivian Ortiz - Gerente de Produção Gráfica: Roberto Barnabá - Departamento Jurídico: Martha Maria<br />

de Carvalho Lossurdo (OAB/SP 154.283). Toda correspondência deverá ser enviada para a Office Editora e Publicidade Ltda - R. Gal. Eloy Alfaro, 239 - Chácara Inglesa - CEP 04139-060 - São Paulo - SP - Brasil - Tel.: (11) 5594-1770 • 5594-5455 -<br />

e-mail: officed@uol.com.br. Todos os artigos publicados têm seus direitos resguardados pela editora. É proibida a reprodução total ou parcial dos artigos sem a autorização dos autores e da editora. Esta publicação é fornecida como um serviço da Farmoquímica<br />

aos médicos. Os pontos de vista aqui expressos refletem a experiência e as opiniões dos autores. Antes de prescrever qualquer medicamento eventualmente citado nesta publicação, deve ser consultada a bula emitida pelo fabricante. (11310B)


<strong>Crescimento</strong> <strong>intrauterino</strong> restrito:<br />

diagnóstico e condução<br />

4 Rev Med Mat Fetal 2010;1(2)4-9.<br />

Carolina Amorim de Barros * , Joana Sara Fonseca Dumont * ,<br />

Mário Dias Corrêa Júnior ** , Antônio Carlos Vieira Cabral ***<br />

*Residente de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital das Clínicas da UFMG.<br />

**Professor Adjunto do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da UFMG.<br />

***Professor Titular do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da UFMG.<br />

RESUMO<br />

O crescimento <strong>intrauterino</strong> restrito (CIUR)<br />

ocorre quando o feto não atinge o tamanho<br />

determinado pelo seu potencial genético, sendo<br />

clinicamente identificado quando o peso fetal é<br />

igual ou abaixo do percentil 10 para a idade gestacional.<br />

Após a prematuridade, o CIUR é a causa<br />

mais importante de morbidade e mortalidade<br />

fetal e neonatal, sendo a insuficiência placentária<br />

sua principal causa. Até o momento não há<br />

tratamento eficaz, sendo que o grande desafio é<br />

decidir pelo momento ideal do parto, tendo na<br />

avaliação da vitalidade fetal a principal peça no<br />

combate à prematuridade.<br />

ABSTRACT<br />

The intrauterine growth restriction (IUGR)<br />

occurs when the fetus does not reach the size<br />

determined by their genetic potential, and clinically<br />

identified when fetal weight is equal to<br />

or below the 10th percentile for gestational age.<br />

After prematurity, IUGR is the most important<br />

cause of morbidity and fetal and neonatal mortality,<br />

being the main cause placental insufficiency.<br />

So far there is no effective treatment, and the<br />

main challenge is to decide the optimum time<br />

of delivery, and the evaluation of fetal wellbeing<br />

is the best approach in the fight against<br />

prematurity.<br />

INTRODUÇÃO<br />

O crescimento <strong>intrauterino</strong> restrito (CIUR)<br />

ocorre quando o feto não atinge o tamanho<br />

determinado pelo seu potencial genético. Este é<br />

um problema clínico associado ao aumento da<br />

morbidade e mortalidade perinatal e atinge em<br />

torno de 7-15% das gestações. (1)<br />

Há uma dificuldade em se diferenciar fetos<br />

com CIUR e fetos pequenos para a idade gestacional<br />

(PIG) saudáveis. Os fetos PIG são aqueles<br />

com peso menor que o percentil 10 para aquela<br />

idade gestacional ou menor que dois desvios padrão.<br />

Há autores que definem CIUR com o mesmo<br />

conceito, porém considerando os percentis 5<br />

ou 3 para o diagnóstico e assim tornando-o mais<br />

sensível. Outros autores preconizam que além<br />

de incluir o peso fetal no diagnóstico, também<br />

consideram a necessidade de haver alterações<br />

no fluxo sanguíneo umbilical. Não há ainda um<br />

conceito internacionalmente aceito como definição<br />

clínica de CIUR. (2-4)


CLASSIFICAÇÃO<br />

Os fetos com CIUR podem ser classificados<br />

de maneiras diversas. Identificam-se três tipos,<br />

com alterações orgânicas diferentes e evolução<br />

distinta, tanto intraútero como pós-natal. Essa<br />

diferenciação decorre não apenas do fator causal,<br />

mas também da idade gestacional em que<br />

acontece a agressão e dos órgãos acometidos.<br />

Esses três tipos são denominados simétrico,<br />

assimétrico e misto. (5)<br />

Tipo I – Simétrico<br />

Responsável por cerca de 20% dos casos de<br />

CIUR. A agressão ocorreu precocemente, na fase<br />

de hiperplasia celular. De evolução crônica e<br />

usualmente relacionado a infecções maternas<br />

(TORCH), alterações cromossômicas ou malformações<br />

congênitas.<br />

Importante notar que os fetos constitucionalmente<br />

pequenos também apresentam um padrão<br />

de crescimento simétrico, o que pode dificultar<br />

o diagnóstico diferencial. Os recém-nascidos<br />

desse grupo geralmente não apresentam hipóxia<br />

neonatal.<br />

Tipo II – Assimétrico<br />

A agressão ocorre na fase de hipertrofia<br />

celular. A diminuição da oferta de nutrientes<br />

nessa fase leva à redistribuição dos fluxos<br />

sanguíneos para privilegiar órgãos (cérebro,<br />

coração e suprarrenais). Consequentemente, a<br />

cabeça continua crescendo de maneira adequada,<br />

enquanto o fígado (principal responsável<br />

pelo tamanho da circunferência abdominal do<br />

feto) passa a crescer aquém do esperado, devido<br />

ao maior consumo de glicogênio, o que leva à<br />

desproporção entre o crescimento da cabeça e<br />

do abdome fetal.<br />

Este tipo representa 75% dos casos de CIUR e<br />

a insuficiência placentária é a principal responsável.<br />

Os recém-nascidos são mais suscetíveis a<br />

hipóxia e hipoglicemia.<br />

Revista Medicina<br />

Materno-Fetal<br />

Tipo III – Intermediário ou misto<br />

Alguns autores reconhecem a presença de<br />

um terceiro tipo de CIUR, com características<br />

comuns aos tipos I e II. O CIUR misto ocorre<br />

por agressão na fase de hiperplasia e hipertrofia<br />

celular e responde por cerca de 5 a 10% dos<br />

casos. O diagnóstico clínico deste tipo é difícil<br />

e os fetos acabam sendo enquadrados como<br />

tipo I ou II.<br />

FATORES ETIOLÓGICOS<br />

O crescimento <strong>intrauterino</strong> é determinado<br />

pelo potencial genético e modulado pelo meio<br />

nutricional e endócrino ao qual o feto está submetido.<br />

O transporte e o metabolismo placentários<br />

são os principais responsáveis pela nutrição<br />

e oxigenação do feto. A placenta é, portanto,<br />

uma interface entre as condições maternas e as<br />

necessidades fetais. Dentre as causas que podem<br />

interferir neste padrão de crescimento temos: as<br />

causas maternas (tabagismo, peso materno<br />

pré-gestacional baixo, ganho insuficiente de<br />

peso durante a gestação, cirurgia bariátrica, uso<br />

de drogas teratogênicas, doenças hipertensivas,<br />

diabetes, lúpus eritematoso sistêmico, doenças<br />

renais crônicas, síndrome dos anticorpos antifosfolípides,<br />

cardiopatias cianóticas, doenças<br />

intersticiais pulmonares, hemoglobinopatias e<br />

anemias), causas fetais (genéticas: síndrome de<br />

Down, síndrome de Edwards, síndrome de Patau,<br />

síndrome de Turner (45XO), triploidias; ou<br />

mesmo os mosaicismos placentários, doenças<br />

gênicas como a síndrome de Cornelia de Lange,<br />

entre outras; infecções: toxoplasmose, rubéola,<br />

citomegalovírus, herpes, sífilis e a malária em<br />

locais endêmicos); as causas placentárias<br />

(artéria umbilical única, placenta circunvalada e<br />

corioangioma de placenta).<br />

Dentre as causas gerais citamos o pequeno<br />

intervalo entre as gestações, extremos de idade<br />

materna, nível socioeconômico mais baixo, história<br />

de CIUR em gestação anterior, técnicas de reprodu-<br />

Barros CA, et al, <strong>Crescimento</strong> <strong>intrauterino</strong> restrito: Diagnóstico e condução<br />

5


ção assistida e gestações múltiplas (3% dos casos<br />

de CIUR). Neste grupo é importante usar tabelas<br />

adequadas de percentil para não superestimar o<br />

número de fetos com crescimento restrito.<br />

6 Rev Med Mat Fetal 2010;1(2)4-9.<br />

DIAGNÓSTICO<br />

Diante da suspeita clínica de CIUR, a investigação<br />

diagnóstica deve ser iniciada. Primeiramente,<br />

deve-se ter certeza da idade gestacional<br />

para que haja uma avaliação correta do diagnóstico<br />

e acompanhamento fetal.<br />

O diagnóstico ultrassonográfico é suspeitado<br />

quando se encontra feto com peso estimado abaixo<br />

do percentil 10 para aquela idade gestacional.<br />

O ideal seria que houvesse curvas de percentis<br />

padronizadas distintamente para cada população,<br />

mas infelizmente não dispomos ainda de uma<br />

tabela própria para a população brasileira. (1,2)<br />

Além do peso fetal estimado, outros parâmetros<br />

são importantes. A circunferência abdominal<br />

(CA) é muito sensível, principalmente nos casos<br />

de CIUR assimétrico, sendo o primeiro a se alterar<br />

com a falta de nutrientes. As relações de CC<br />

(circunferência craniana)/CA e CF (comprimento<br />

do fêmur)/CA também auxiliam na avaliação<br />

da classificação e diagnóstico. A diminuição do<br />

volume de líquido amniótico também sugere<br />

sofrimento fetal crônico e é útil para diferenciar<br />

fetos PIG constitucionais de fetos que apresentam<br />

CIUR. O oligoidrâmnio geralmente sucede<br />

as alterações nas medidas da biometria fetal.<br />

A Dopplervelocimetria das artérias uterinas,<br />

que, nos casos de CIUR, podem apresentar índices<br />

de resistência aumentados e persistência de<br />

incisuras diastólicas após 24 semanas e a avaliação<br />

da artéria umbilical auxiliam indiretamente<br />

no diagnóstico de insuficiência placentária. Assim,<br />

estas alterações auxiliam na diferenciação<br />

entre os fetos com CIUR e os fetos PIG. Pode,<br />

no entanto, haver disfunção placentária e hipoxemia<br />

fetal sem que haja as alterações descritas<br />

ao Doppler. (4,10)<br />

ACOMPANHAMENTO PRÉ-NATAL<br />

A placenta, ao perder a capacidade de nutrir o<br />

feto, também perde a capacidade de oxigená-lo.<br />

Estas funções são realizadas no mesmo local placentário,<br />

o vilo terciário. Portanto, todos os fetos<br />

que apresentam deficiência nutricional (CIUR)<br />

estão potencialmente em estado de hipóxia.<br />

O acompanhamento pré-natal dos fetos com<br />

CIUR deve ser cuidadoso. O objetivo principal<br />

é avaliar o melhor momento da interrupção da<br />

gestação¸ determinando-se o tênue limite entre os<br />

riscos da prematuridade e os riscos de se manter<br />

uma gestação em que o feto está em estado não<br />

tranquilizador.<br />

A avaliação do bem-estar fetal deve ser realizada<br />

por vários métodos propedêuticos em<br />

combinação de múltiplos testes em diferentes<br />

parâmetros. Somente assim é possível minimizar<br />

as falhas no acompanhamento por métodos<br />

únicos e parâmetros isolados.<br />

Na cardiotocografia (CTG), a avaliação<br />

da linha de base, variabilidade, acelerações e<br />

desacelerações são importantes para avaliar o<br />

controle central e autônomo da atividade cardíaca.<br />

A CTG normal é indicativa de que não há<br />

hipoxemia fetal; no entanto, a hiporreatividade<br />

é um sinal inespecífico. A CTG computadorizada<br />

permite avaliação precoce da hipóxia miocárdica<br />

através da micro-oscilação (< 2 micro-oscilações/<br />

segundo) e, mais recentemente, pela análise do<br />

ECG fetal obtido por transdutores externos. Nesta<br />

metodologia torna-se possível avaliar o segmento<br />

ST e principalmente a onda T elevada como<br />

indicativa de hipóxia miocárdica. (4,11)<br />

A determinação do índice de líquido amniótico<br />

pode ser útil, já que a disfunção placentária e<br />

hipoxemia fetal podem causar redistribuição do<br />

fluxo renal, levando à oligúria fetal e oligoidrâmnio.<br />

Não há, no entanto, uma correlação direta<br />

com o prognóstico fetal ou acidose metabólica.<br />

Outros parâmetros do perfil biofísico fetal,<br />

como a movimentação e o tônus fetal, também


diminuem ou desaparecem com a acidemia fetal.<br />

Estes parâmetros devem ser avaliados dentro do<br />

contexto clínico. (11)<br />

A Dopplervelocimetria fetal tem grande valia<br />

para o acompanhamento do feto com CIUR,<br />

principalmente a avaliação da artéria umbilical,<br />

da artéria cerebral média e do ducto venoso. (4,10,11)<br />

Baschat & Harman observaram que o atraso<br />

no crescimento antecede a centralização. As<br />

desacelerações tardias na CTG seguem a centralização<br />

e, geralmente, são coincidentes com<br />

o surgimento de pulsações na veia umbilical.<br />

Essas alterações vão ocorrer em 80% dos fetos<br />

com CIUR grave, de início precoce. A progressão<br />

desde o surgimento da centralização até o aparecimento<br />

de pulsações na veia umbilical ocorre<br />

num prazo de 2 a 3 semanas. Alguns fetos, no<br />

entanto, podem mostrar fluxos anormais por<br />

várias semanas. (12)<br />

Hershkovitz et al. observaram que o surgimento<br />

de diástole zero ou reversa na artéria umbilical<br />

não é comum em fetos com CIUR de início após<br />

a 32ª semana, e que nesses casos devemos nos<br />

basear apenas na centralização e no PBF anormal<br />

para determinar a conduta. (13)<br />

TRATAMENTO<br />

Inúmeros tratamentos foram propostos para o<br />

crescimento <strong>intrauterino</strong> restrito. Incluídos nesta<br />

lista estão o repouso no leito, a hiperoxigenação<br />

materna, a suplementação dietética, a descompressão<br />

abdominal, a expansão de volume, a<br />

terapia hormonal e o uso de bloqueadores de<br />

canal de cálcio e de beta-miméticos. Nenhum<br />

desses tratamentos mostrou-se eficaz. (14,15)<br />

INTERRUPÇÃO DA GESTAÇÃO<br />

Como não há tratamento intraútero para a<br />

hipóxia fetal, a única intervenção real é a realização<br />

do parto prematuro, apesar de suas consequências.<br />

(16) O desafio é balancear os riscos fetais<br />

Revista Medicina<br />

Materno-Fetal<br />

frente a hipóxia com os riscos neonatais frente<br />

a prematuridade.<br />

Acima de 34 semanas de gravidez, a interrupção<br />

da gestação está indicada se houver qualquer<br />

alteração nos exames de vitalidade. Essa medida<br />

diminui o risco de decesso fetal com resultados<br />

neonatais excelentes. (10,14) É possível tentar o<br />

parto vaginal, desde que as condições fetais e<br />

maternas sejam favoráveis para a indução. No<br />

entanto, é necessária a monitoração fetal contínua.<br />

(17) A gestação dos fetos com CIUR não deve<br />

ultrapassar o termo. (18)<br />

Entre 30 e 33 semanas, o Doppler da artéria<br />

umbilical (AU) é o principal marcador do risco<br />

fetal. Com a melhoria dos cuidados neonatais, a<br />

interrupção precoce da gravidez se diástole zero<br />

na AU ou oligoidrâmnio grave, após corticoterapia,<br />

pode ser aventada. (4) Em casos onde o risco<br />

de morte fetal é iminente (diástole reversa na<br />

artéria umbilical ou Doppler venoso alterado),<br />

devemos interromper a gravidez sem realizar a<br />

corticoterapia. A interrupção nessa faixa de idade<br />

deve ser realizada por cesariana.<br />

Abaixo de 30 semanas, a decisão de realizar<br />

o parto é difícil e deve ser embasada em todas<br />

as informações disponíveis sobre a condição<br />

do feto. Muitas vezes a prematuridade poderá<br />

trazer mais malefício do que a própria doença.<br />

É necessário chegar ao limite do feto. São descritas<br />

várias alterações decorrentes da descompensação<br />

fetal, que são: fluxo reverso no ducto<br />

venoso, fluxo pulsátil na veia umbilical, diástole<br />

reversa na artéria umbilical e desacelerações<br />

da cardiotocografia. (14) Diante de qualquer uma<br />

dessas alterações, está indicada a interrupção da<br />

gestação por cesariana, preferencialmente após<br />

corticoterapia.<br />

PREVENÇÃO<br />

As estratégias de prevenção podem ser classificadas<br />

em primária e secundária. A prevenção<br />

primária é feita na população geral através da<br />

Barros CA, et al, <strong>Crescimento</strong> <strong>intrauterino</strong> restrito: Diagnóstico e condução<br />

7


promoção à saúde e proteção contra fatores de<br />

risco, a fim de evitar que a doença se estabeleça.<br />

A prevenção secundária se dá após o diagnóstico<br />

da doença ou condição, objetivando minimizar<br />

os danos. (15)<br />

Prevenção primária<br />

A medida de prevenção primária comprovadamente<br />

eficaz na redução do CIUR é cessar o<br />

tabagismo (RR 0,81, IC 0,70-94). (19) No entanto,<br />

medidas simples devem ser encorajadas. O aconselhamento<br />

pré-concepcional é importante para<br />

toda mulher planejar a gravidez, adotar um estilo<br />

de vida saudável, otimizar a saúde e o controle<br />

do peso. O índice de massa corporal (IMC)<br />

pré-concepcional e o ganho de peso durante a<br />

gestação têm efeito independente no crescimento<br />

fetal. (15) Deve-se respeitar um intervalo entre as<br />

gestações de pelo menos 18 meses (20) e realizar<br />

suplementação dietética naquelas pacientes com<br />

deficiências nutricionais. (7)<br />

A ultrassonografia de 1º trimestre é essencial<br />

na datação correta da gestação, diminuindo os<br />

falsos diagnósticos de PIG em função de erro<br />

de data. (21)<br />

Em áreas endêmicas para malária, o uso rotineiro<br />

de drogas antimaláricas reduz o risco de<br />

CIUR (RR 0,57, 95% IC 0,54-0,92). (15)<br />

Estudos que avaliaram o uso de ácido acetilsalicílico<br />

(AAS) profilático para recorrência de<br />

CIUR, repouso no leito, redução de exercícios<br />

físicos e suplementação nutricional rotineira não<br />

mostraram evidência de benefícios. (21,22)<br />

Prevenção secundária<br />

Comorbidades maternas como hipertensão<br />

e diabetes são fatores de risco para desenvolvimento<br />

de feto com CIUR. (15) O controle clínico<br />

dessas condições é uma importante medida<br />

no acompanhamento pré-natal. No entanto, o<br />

tratamento da hipertensão leve não diminuiu a<br />

incidência de CIUR nessas pacientes e o uso de<br />

beta-bloqueadores aumentou o risco de CIUR. (23)<br />

8 Rev Med Mat Fetal 2010;1(2)4-9.<br />

Gestantes com história de pré-eclâmpsia anterior,<br />

hipertensas, portadoras de trombofilias e<br />

de doenças vasculares podem receber AAS para<br />

prevenir a ocorrência de CIUR. Os resultados são<br />

melhores quando o AAS é iniciado antes de 20<br />

semanas. (22) Pacientes portadoras de trombofilias,<br />

com história de complicações obstétricas em<br />

gestações anteriores, devem receber também<br />

heparina, com melhora dos resultados perinatais.<br />

Todavia, o uso do AAS nas gestantes com<br />

alteração de Dopplervelocimetria das artérias<br />

uterinas realizado entre 22 e 24 semanas não<br />

diminuiu a incidência de CIUR. (24)<br />

CONCLUSÃO<br />

O CIUR é uma importante causa de morbimortalidade<br />

fetal e neonatal, sendo a insuficiência<br />

placentária sua principal causa. Não há<br />

ainda um conceito internacionalmente aceito<br />

para definição clínica de CIUR e não dispomos<br />

de curvas de percentis padronizadas para a<br />

população brasileira. Nenhum tratamento se<br />

mostrou eficaz e o grande desafio é decidir pelo<br />

momento ideal do parto, pois a prematuridade<br />

pode ser mais prejudicial do que a restrição do<br />

crescimento. É necessária uma vigilância abrangente,<br />

podendo-se utilizar vários métodos para<br />

avaliação do bem-estar fetal. A prevenção tem<br />

um papel limitado no CIUR. Mais estudos são<br />

necessários para melhorar a acurácia dos exames<br />

da avaliação das condições fetais.<br />

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Barros CA, et al, <strong>Crescimento</strong> <strong>intrauterino</strong> restrito: Diagnóstico e condução<br />

9


<strong>Crescimento</strong> <strong>intrauterino</strong> restrito:<br />

sequelas a longo prazo<br />

10 Rev Med Mat Fetal 2010;1(2)10-13.<br />

Joana Sara Fonseca Dumont * , Carolina Amorim de Barros * ,<br />

Mário Dias Corrêa Júnior ** , Mário Dias Corrêa ***<br />

* Residente de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital das Clínicas da UFMG.<br />

** Professor Adjunto do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da UFMG.<br />

*** Professor Titular do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais.<br />

RESUMO<br />

O baixo peso ao nascimento, especialmente<br />

naqueles que tiveram restrição de crescimento<br />

<strong>intrauterino</strong>, é um fator de risco para diversas<br />

doenças na vida adulta. As doenças mais<br />

prevalentes são a obesidade, a hipertensão<br />

e o diabetes não-insulino-dependente. Algumas<br />

das condições programadas na vida<br />

intrauterina são passíveis de alteração na vida<br />

pós-natal, porém o tratamento mais eficaz<br />

destas condições é a prevenção, que deve<br />

ser iniciada ainda na gestação e prosseguir<br />

durante a infância, com práticas saudáveis de<br />

vida. A prevenção do CIUR grave melhora a<br />

qualidade de vida desde o período neonatal<br />

até a vida adulta.<br />

ABSTRACT<br />

The low birth weight, especially those who<br />

had restricted intrauterine growth, is a risk factor<br />

for several diseases in adulthood. The most<br />

prevalent diseases are obesity, hipertension<br />

and non-insulin-dependent diabetes. Some<br />

of the conditions programmed in intrauterine<br />

life are likely to change in postnatal life. Ho-<br />

wever, the most effective treatment of these<br />

conditions is prevention, which must still be<br />

initiated during pregnancy but be continued at<br />

the childhood continue by practicing healthy<br />

living, but should. The prevention of severe<br />

IUGR improves the quality of life since the<br />

neonatal period until adulthood.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Evidências de que o crescimento e o desenvolvimento<br />

fetal têm relação com a suscetibilidade<br />

e o desenvolvimento de doenças no<br />

adulto só foram adquiridas recentemente. O<br />

número de doenças que podem ser determinadas<br />

na vida intrauterina cresce constantemente<br />

e inclui: coronariopatias, hipertensão,<br />

acidente vascular cerebral, diabetes tipo 2,<br />

insuficiência renal crônica, doença pulmonar<br />

obstrutiva crônica, osteoporose, esquizofrenia,<br />

depressão, câncer de mama e síndrome dos<br />

ovários policísticos. (1)<br />

OBSERVAÇÕES EPIDEMIOLÓGICAS<br />

As primeiras observações epidemiológicas<br />

que sugerem potenciais consequências da


estrição de crescimento a longo prazo surgiram<br />

com a análise dos registros de nascimento<br />

de homens e mulheres na meia-idade.<br />

Os estudos da Noruega e do Reino Unido<br />

demonstravam que o padrão de óbitos neonatais<br />

por baixo peso ao nascer (BPN) tinha<br />

correspondência com a variação geográfica<br />

das taxas de doenças coronarianas. Outros<br />

estudos repetiram essas observações e revelaram<br />

uma correlação entre o baixo peso ou<br />

índice ponderal (peso/comprimento) e a incidência<br />

de hipertensão arterial, diabetes tipo<br />

2 e osteoporose na vida adulta. (2) Estas observações<br />

motivaram muita discussão. Uma das<br />

críticas foi a de que a relação entre peso ao<br />

nascer e doença no adulto poderia ser explicada<br />

pela continuidade dos eventos adversos<br />

que causaram a restrição de crescimento na<br />

vida adulta. Fatores de confusão, tais como<br />

baixo nível socioeconômico e tabagismo poderiam<br />

simplesmente perpetuar e, portanto,<br />

representar as observações estatísticas. No<br />

entanto, já existe uma ampla base de dados<br />

que evidencia a correlação do BPN e doença<br />

crônica, mesmo após a correção das variáveis<br />

de confusão relevantes, incluindo o consumo<br />

de álcool, os níveis de exercícios físicos e<br />

as condições socioeconômicas. Crianças de<br />

baixo peso ao nascer, independentemente<br />

da sua origem social, têm um risco aumentado<br />

de apresentar doença cardiovascular e<br />

diabetes tipo 2 em relação aos seus pares<br />

de maior peso. Embora os fatores relativos<br />

ao peso adulto e estilo de vida possam ser<br />

fatores de confusão adicional, a associação<br />

do baixo peso ao nascimento com doenças<br />

crônicas parece persistir após a sua exclusão.<br />

Um dos primeiros estudos que compararam<br />

a mortalidade e o peso ao nascer foi realizado<br />

em 1989, com a análise de 16.000 pessoas<br />

nascidas em Hertfordshire, Reino Unido, entre<br />

1911 e 1930. Foi possível observar que a mortalidade<br />

por doença coronariana foi o dobro<br />

Revista Medicina<br />

Materno-Fetal<br />

naqueles que nasceram com peso < 2.500 g<br />

comparados aos que nasceram com > 4.000 g.<br />

Além disso, houve uma correlação inversa<br />

entre peso ao nascimento e pressão arterial<br />

no adulto. (3)<br />

Um estudo de coorte com cerca de 15.000<br />

nascimentos em Uppsala, na Suécia, avaliou<br />

a idade gestacional e o peso ao nascer. Esse<br />

estudo evidenciou que o risco de doenças<br />

crônicas na vida adulta não era devido ao<br />

tamanho e peso do nascimento, e sim ao<br />

padrão de crescimento fetal, sugerindo que<br />

a restrição do crescimento fetal (principalmente<br />

o tipo assimétrico) era definidora<br />

para o risco de hipertensão e diabetes tipo<br />

2. (2) Assim como o estudo realizado em<br />

Sheffield mostrou que entre os nascidos<br />

com o mesmo peso, aqueles que nasceram<br />

a termo tinham maior chance de doença do<br />

que aqueles nascidos com baixo peso pela<br />

prematuridade. (4)<br />

Outra coorte avaliou peso ao nascimento<br />

e risco de morte e internação por doença<br />

coronariana, além da hipertensão, em 13.517<br />

homens nascidos em Helsinque, Finlândia. A<br />

maior correlação foi observada em homens<br />

que tinham um baixo índice ponderal ao<br />

nascimento, mas que estavam acima do peso<br />

aos 11 anos de idade. Esse grupo apresentou<br />

um risco de morte por doença cardiovascular<br />

cinco vezes maior comparado aos nascidos<br />

com alto índice ponderal e que estavam<br />

com peso adequado na infância. Esse estudo<br />

evidenciou que os efeitos da restrição de<br />

crescimento podem se tornar mais relevantes<br />

quando colocados no contexto do crescimento<br />

durante a infância e no índice de massa<br />

corporal do adulto. Lactentes e crianças que<br />

apresentaram maior taxa de crescimento,<br />

e que posteriormente se tornaram adultos<br />

obesos, apresentam um maior risco de hipertensão,<br />

doenças cardiovasculares e diabetes<br />

tipo 2. (5)<br />

Dumont JSF, et al, <strong>Crescimento</strong> <strong>intrauterino</strong> restrito: Sequelas a longo prazo<br />

11


12 Rev Med Mat Fetal 2010;1(2)10-13.<br />

PROGRAMAÇÃO DO FETO – A HIPÓTESE<br />

DE BARKER<br />

Na vida fetal, os tecidos e órgãos do<br />

corpo passam por um período crítico de<br />

desenvolvimento, que coincide com o período<br />

de rápida divisão celular. A primeira<br />

adaptação fetal frente a falta de nutrientes<br />

e hipóxia é a diminuição da taxa de divisão<br />

celular, que ocorre tanto pelo efeito direto da<br />

desnutrição celular quanto pela alteração dos<br />

fatores de crescimento e hormônios. Mesmo<br />

curtos períodos de desnutrição podem reduzir<br />

permanentemente o número de células em determinados<br />

órgãos. Este é um dos mecanismos<br />

pelos quais a desnutrição pode alterar ou “programar”<br />

permanentemente o corpo. Outros<br />

mecanismos incluem a mudança na distribuição<br />

de tipos de células, no feedback hormonal,<br />

na atividade metabólica e na estrutura do<br />

órgão. Baixo peso ao nascer e desproporção<br />

no perímetro cefálico, comprimento e peso<br />

são marcadores de falta de nutrientes em determinadas<br />

fases da gestação. Essas alterações,<br />

que refletem adaptações fetais para sustentar<br />

o seu desenvolvimento, podem permanentemente<br />

“programar” a estrutura do corpo e sua<br />

função e assim determinar uma doença na<br />

fase adulta. (6)<br />

HIPERTENSÃO<br />

O CIUR está relacionado à maior chance de<br />

se desenvolver hipertensão arterial na idade<br />

adulta. As teorias que explicam este efeito<br />

estão descritas a seguir.<br />

Há uma hipótese postulada por Folkow<br />

na cardiologia para explicar por que alguns<br />

pacientes com hipertensão secundária permaneciam<br />

hipertensos mesmo após a retirada<br />

da causa-base. Segundo ele, o organismo de<br />

alguns pacientes, adaptado a uma pressão<br />

arterial (PA) mais elevada, seria incapaz de<br />

retornar aos níveis tensionais normais. No feto,<br />

o estímulo iniciado intrautero pela restrição<br />

do crescimento e redistribuição dos fluxos<br />

privilegiando órgãos nobres seria amplificado<br />

ao longo da vida. (7)<br />

O CIUR pode levar à diminuição dos números<br />

e tamanho dos néfrons desenvolvidos<br />

no feto. Estudos demonstram que crianças<br />

com número reduzido de néfrons tendem<br />

a ter mudanças na função renal pós-natal e<br />

consequentemente uma diminuição do ritmo<br />

de filtração glomerular, acúmulo de líquidos<br />

e hipertensão na vida adulta. (8,9)<br />

A complacência vascular em crianças que tiveram<br />

uma restrição de crescimento intrautero<br />

também parece ser menor, o que leva à menor<br />

capacidade de vasodilatação como mecanismo<br />

compensatório. Esta alteração permanece até<br />

a idade adulta. (8)<br />

DIABETES MELLITUS TIPO 2<br />

A incidência do diabetes tipo 2 (DM2)<br />

tem aumentado mundialmente. As causas da<br />

doença são genéticas e ambientais. Sabe-se<br />

hoje que o aumento de resistência à insulina<br />

e o DM2 é mais prevalente entre as pessoas<br />

que sofreram restrição de crescimento intrautero,<br />

indicando que desde então inicia-se<br />

uma disfunção na regulação da homeostase<br />

da glicose.<br />

A deficiência da secreção de insulina nos<br />

fetos com CIUR parece ser uma das principais<br />

causas da intolerância à glicose e do<br />

DM2 na vida adulta. Esta deficiência pode<br />

ser causada por vários mecanismos que se<br />

relacionam ao tipo, tempo e duração da má<br />

nutrição fetal. Em consequência, ocorre disfunção<br />

no desenvolvimento pancreático em<br />

diferentes estágios. (10)<br />

A necessidade de insulina parece ser<br />

aumentada nesses fetos, já que há um aumento<br />

na gliconeogênese hepática e uma


consequente hiperglicemia, com resistência<br />

à ação insulínica. Há também alteração nos<br />

processos intracelulares do metabolismo da<br />

glicose. (8)<br />

CRESCIMENTO FETAL E CÂNCER<br />

Há evidências epidemiológicas de que<br />

tanto o crescimento <strong>intrauterino</strong> restrito<br />

quanto a macrossomia podem estar associados<br />

a um risco aumentado de câncer. Além<br />

disso, a obesidade e o diabetes tipo 2 que<br />

estão relacionados com a diminuição do crescimento<br />

fetal são eles próprios associados<br />

a um risco aumentado. Ainda não há uma<br />

explicação sobre os mecanismos exatos. Uma<br />

hipótese seriam as mudanças permanentes<br />

na expressão do fator de crescimento e sensibilidade.<br />

(1)<br />

CONCLUSÃO<br />

O baixo peso ao nascimento, especialmente<br />

naqueles que tiveram restrição de crescimento<br />

<strong>intrauterino</strong>, é um fator de risco para diversas<br />

doenças na vida adulta. As doenças mais prevalentes<br />

são a obesidade, a hipertensão e o<br />

diabetes não-insulino-dependente.<br />

Algumas das condições programadas na<br />

vida intrauterina são passíveis de alteração<br />

na vida pós-natal, porém o tratamento mais<br />

eficaz destas condições é a prevenção, que<br />

deve ser iniciada ainda na gestação. A prevenção<br />

do CIUR grave melhora a qualidade<br />

de vida desde o período neonatal até a vida<br />

adulta.<br />

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Materno-Fetal<br />

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Dumont JSF, et al, <strong>Crescimento</strong> <strong>intrauterino</strong> restrito: Sequelas a longo prazo<br />

13


Protocolo de conduta diante de feto<br />

pequeno para a idade gestacional<br />

14 Rev Med Mat Fetal 2010;1(2)14.<br />

Rafael Frederico Bruns 1 , Eduardo Fonseca 2<br />

1 Universidade Federal do Paraná; 2 Universidade Federal da Paraíba.<br />

DOPPLERVELOCIMETRIA:<br />

CRITÉRIOS PARA RESOLUÇÃO<br />

Quando o Doppler de artéria umbilical mantém-se<br />

normal, o diagnóstico mais provável é de<br />

um pequeno constitucional, podendo a gestante<br />

ser seguida em ambulatório. A interrupção da gestação<br />

pode ser programada a partir da 37ª semana.<br />

A partir da 34ª semana, diante do achado<br />

de Doppler de artéria umbilical anormal, a gravidez<br />

pode ser interrompida<br />

em caso de maturidade fetal<br />

comprovada.<br />

Abaixo da 34ª semana,<br />

na presença de alteração da<br />

artéria umbilical (inclusive diástole<br />

zero), realizar Doppler da<br />

artéria cerebral média e do ducto<br />

venoso. Sugere-se a seguinte<br />

conduta: Índice de pulsatilidade<br />

para veias (IPV) situar-se entre<br />

1,0 e 1,5, realizar um ciclo de<br />

corticóide (entre a 26ª e a 34ª<br />

semana) e interrompe-se a gravidez<br />

após 48h.<br />

Constatado oligoidrâmnio<br />

grave ou diástole reversa pelo<br />

Doppler de artéria umbilical,<br />

preconizamos a interrupção da<br />

gestação a partir da viabilidade<br />

fetal, independente da maturidade<br />

fetal.<br />

Thilaganathan B. Problem-based obstetric<br />

ultrasound. Abingdon: Informa. Healthcare;<br />

2007.<br />

Protocolos Assistenciais da Clínica Obstétrica<br />

da FMUSP.


Revista Medicina<br />

Materno-Fetal<br />

Correlação entre os diversos valores da relação<br />

umbílico-cerebral e estado gasométrico fetal<br />

Dissertação de mestrado de Cláudia Lourdes Soares Laranjeira<br />

Orientador: Antonio Carlos Vieira Cabral<br />

INTRODUÇÃO<br />

A busca por métodos propedêuticos que possam<br />

identificar adequadamente os fetos em sofrimento<br />

crônico tem sido exaustiva. A análise gasométrica do<br />

sangue de cordão tem sido considerada o “padrão<br />

ouro” no diagnóstico do sofrimento fetal crônico.<br />

No entanto, esse é um método invasivo, com taxas<br />

de complicações elevadas que dificultam o acompanhamento<br />

destes conceptos. Entender e analisar os<br />

mecanismos adaptativos do feto ao insulto hipóxico é<br />

muito importante na prática clínica. O momento para<br />

o nascimento desses fetos em sofrimento crônico é<br />

uma decisão difícil, visto que a prematuridade é um<br />

importante fator de morbiletalidade perinatal. O ideal<br />

seria encontrar o exato momento em que as respostas<br />

não mais protegem o feto, levando a lesões irreversíveis<br />

que comprometem o concepto. Este trabalho visa<br />

avaliar o feto em sofrimento crônico e a redistribuição<br />

de fluxo sanguíneo como adaptação à hipóxia.<br />

OBJETIVO<br />

Verificar se existe correlação entre o grau de<br />

centralização de fluxo fetal (expressado pela relação<br />

umbílico-cerebral) e o estado gasométrico do feto<br />

(pH, pO 2 , pCO 2 , BE), tentando encontrar uma estratificação<br />

de gravidade no índice umbílico-cerebral<br />

frente aos parâmetros gasométricos do concepto.<br />

PACIENTES E MÉTODOS<br />

Foram avaliadas 115 pacientes com gestação única<br />

que apresentassem algum fator de risco para sofrimento<br />

Faculdade de Medicina, UFMG.<br />

fetal crônico. As pacientes foram divididas em quatro<br />

grupos, conforme o valor da relação umbílico-cerebral<br />

(índice de pulsatilidade artéria umbilical/índice de pulsatilidade<br />

artéria cerebral média) menor que 1 (grupo 1),<br />

entre 1 e 1,4 (grupo 2), maior ou igual a 1,4 (grupo 3) e<br />

aquelas com diástole zero ou fluxo reverso na artéria umbilical<br />

(grupo 4). Cada um dos grupos foi isoladamente<br />

caracterizado de acordo com os parâmetros gasométricos<br />

do sangue de veia umbilical, considerando-se os valores<br />

médios de pO 2 , pCO 2 , pH e BE (base excess). Os grupos<br />

foram então comparados entre si. A análise estatística foi<br />

realizada utilizando-se o teste de Kruskal-Wallis. Todos<br />

os resultados foram considerados significativos a um<br />

nível de significância de 5% (p < 0,05).<br />

RESULTADOS<br />

Os grupos 3 e 4 com relação umbílico-cerebral<br />

maior que 1,4 e diástole zero ou fluxo reverso apresentaram<br />

valores médios de pH de 7,21 e 7,15, pO 2 de<br />

16,9 e 13,8 e pCO 2 de 50,1 e 59,0, respectivamente, e<br />

foram significativamente diferentes dos grupos 1 e 2<br />

com relação umbílico-cerebral menor que 1,0 e entre<br />

1,0 e 1,4. O valor de BE não apresentou diferença<br />

significante entre os grupos.<br />

CONCLUSÕES<br />

Existe correlação entre relação umbílico-cerebral<br />

maior ou igual a 1,4 e queda dos valores de pH e<br />

pO 2 e elevação dos valores de pCO 2 venosos. Os fetos<br />

centralizados com fluxo diastólico umbilical ausente<br />

ou reverso apresentam maiores alterações nos índices<br />

gasométricos.<br />

Laranjeira CLS, Correlação entre os diversos valores da relação umbílico-cerebral e estado gasométrico fetal<br />

15


16 Rev Med Mat Fetal 2010;1(2)4-9.<br />

503239 - Agosto/2010

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