15.04.2013 Views

Novas Diretrizes em Tempo de Paz

Novas Diretrizes em Tempo de Paz

Novas Diretrizes em Tempo de Paz

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

SEGISMUNDO - No Brasil nós falamos português...<br />

CLAUSEWITZ - (TEMPO) Meu professor <strong>de</strong> latim dizia que o Português era uma<br />

língua falada por passarinhos... Tão doce, tão alegre...<br />

SEGISMUNDO - (TEMPO) O senhor nunca recebeu uma ord<strong>em</strong> <strong>em</strong> Português.<br />

Por isso teve essa idéia. Quando o meu padrinho me dá uma ord<strong>em</strong>, eu obe<strong>de</strong>ço.<br />

(TEMPO) O senhor t<strong>em</strong> suas l<strong>em</strong>branças. Eu tenho as minhas. Sabe qual foi o<br />

primeiro serviço que eu fiz para o meu padrinho? Desenterrei um <strong>de</strong>funto <strong>de</strong> um<br />

mês e <strong>de</strong>ixei na porta da viúva.<br />

CLAUSEWITZ - (ESTREMECE) Titus!<br />

SEGISMUNDO - O quê?!<br />

CLAUSEWITZ - Titus Andrônicus. Não conhece?<br />

SEGISMUNDO - Você e o seu Teatro outra vez...<br />

CLAUSEWITZ - Mas esse era o monólogo <strong>de</strong> Aarão! A passageira... A senhora<br />

ruiva... Ela me viu no papel <strong>de</strong> Aarão! Toda a noite eu sugeria que arrancass<strong>em</strong> a<br />

língua e cortass<strong>em</strong> as mãos <strong>de</strong> uma jov<strong>em</strong> profanada; eu falava <strong>de</strong> mortes,<br />

estupros, massacres... Atos cometidos nas sombras da noite...<br />

SEGISMUNDO - A viúva era uma estancieira que estava criando probl<strong>em</strong>as para<br />

o meu padrinho. Já tinham mandando matar o marido <strong>de</strong>la, mas a viúva<br />

continuava. Meu padrinho me disse para dar um susto na viúva. Isso aconteceu!<br />

Silêncio.<br />

CLAUSEWITZ - Eu estava no palco quando os al<strong>em</strong>ães cruzaram a fronteira do<br />

meu país. Como todas as noites. A companhia <strong>de</strong>cidiu n<strong>em</strong> interromper a sessão.<br />

Mas no dia seguinte o teatro estava fechado. Fiquei <strong>em</strong> casa. Foi a primeira vez<br />

<strong>em</strong> <strong>de</strong>z anos que eu passei uma noite fora do palco. Tanta coisa tinha acontecido<br />

na Polônia, tanta coisa tinha acontecido na Europa! E eu, no palco, esse t<strong>em</strong>po<br />

todo. Por isso eu acho que foi uma espécie <strong>de</strong> alívio quando não tive que fazer<br />

minha maquiag<strong>em</strong> naquela noite. Acho... acho cheguei mesmo a pensar que,<br />

afinal, tinha chegado a hora <strong>de</strong> viver a vida. (TEMPO) A vida... (TEMPO) Os dias<br />

foram passando e eu não saí para a rua. Via tudo da janela. Eu não sabia o que<br />

fazer no meio daquela confusão. Eu era um ator! Não sabia carregar um fuzil, não<br />

sabia curar uma ferida... O melhor era ficar <strong>em</strong> casa. Até o dia <strong>em</strong> que foram me<br />

buscar. Não tive medo, não. Achei outra vez que, <strong>de</strong> alguma maneira, eu estava<br />

vivendo. Vivendo enquanto eu presenciava todo o horror. Porque era a única<br />

coisa que eu podia fazer: estar presente. E guardar na m<strong>em</strong>ória. (TEMPO) Eu<br />

estava presente quando mataram professor Cracowiack. Eu estava presente<br />

quando encontraram o corpo do meu pai, que tinha se suicidado com um arame<br />

no pescoço. Eu estava presente quando meus amigos caíram metralhados na<br />

12

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!