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prosa - Academia Brasileira de Letras

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Sílvio Castro<br />

Machado <strong>de</strong> Assis é essencialmente uma personalida<strong>de</strong> urbana. Daí, talvez,<br />

aquela injusta <strong>de</strong>núncia <strong>de</strong> uma sua indiferença pela paisagem em geral. 6 Sendo<br />

uma individualida<strong>de</strong> presa à cida<strong>de</strong>, ele participa com a dimensão urbana nas<br />

suas máximas conseqüências.<br />

A cida<strong>de</strong> é a realida<strong>de</strong> vivida como o centro das modificações culturais e da<br />

tomada <strong>de</strong> consciência das mesmas. Nela e a partir <strong>de</strong>la o homem modifica o<br />

sistema <strong>de</strong> comportamentos tradicionais, po<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong>ssa maneira assumir dimensões<br />

morais e culturais renovadoras ou mesmo revolucionárias. No final<br />

da gran<strong>de</strong> equação se revela a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> urbana que modifica a tradição <strong>de</strong>rivada<br />

da cultura rural, longamente predominante, e ten<strong>de</strong> a conduzir o indivíduo<br />

à tomada <strong>de</strong> consciência <strong>de</strong> si e das suas relações com a alterida<strong>de</strong>.<br />

Sendo o lugar das modificações, a cida<strong>de</strong> é igualmente uma se<strong>de</strong> primordial<br />

para a tomada <strong>de</strong> consciência do valor da liberda<strong>de</strong>.<br />

O Rio <strong>de</strong> Janeiro é a só cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis. Trata-se <strong>de</strong> uma dimensão<br />

não puramente sentimental, cultural, mas igualmente biográfica. 7<br />

Nela e somente nela o criador <strong>de</strong> Capitu vive e elabora a própria história<br />

pessoal, <strong>de</strong>la construindo igualmente uma mundivisão quase ilimitada. Ele<br />

vive intensamente o ritmo <strong>de</strong> sua cida<strong>de</strong>. Conhece-a em todas as suas partes e<br />

<strong>de</strong>talhes. Participa dos processos e tempos <strong>de</strong> suas mudanças numa a<strong>de</strong>são serena.<br />

A metrópole brasileira, que nas décadas <strong>de</strong> 50 e 60 – isto è, na juventu<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Machado – já tinha uma população que superava os 400.000 habitantes e<br />

se avizinhava a tocar o meio milhão -, essa gran<strong>de</strong> metrópole e o seu caos não<br />

lhe provocavam particular tensão. Dela – por toda a sua existência – ele vivia e<br />

6 Em relação à questão da presença <strong>de</strong> natureza e paisagem na literatura brasileira, cf. o estimulante<br />

estudo <strong>de</strong> José Roberto Teixeira Leite, “A tópica «natureza» na literatura brasileira entre<br />

neoclassicismo, arcadismo e romantismo”, in AA.VV., História da literatura brasileira (criação e direção<br />

<strong>de</strong> S. Castro), 3 vols. Ed. Alfa, Lisboa, 1999-2000; cap. 12, vol. II, pp. 369-387 (cf. Bibliografia).<br />

7 Machado <strong>de</strong> Assis praticamente jamais se afastou fisicamente do Rio. Por isso, um dos dados mais<br />

curiosos <strong>de</strong> sua biografia é a força com que são remarcadas pelos seus biógrafos as viagens<br />

machadianas dignas <strong>de</strong>sse nome, aquelas feitas à não-distante Nova Friburgo. Mas isso não o impedia<br />

<strong>de</strong> fazer viajar distante, para outros pontos do Brasil e mesmo para a Europa, muitos <strong>de</strong> seus<br />

personagens.<br />

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