Charles Baudelaire – As Flores do Mal
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Repuxos no jardim choran<strong>do</strong> entre alabastros,<br />
Beijos como canções desde a manhã à tarde,<br />
Tu<strong>do</strong> o que de infantil o Idílio ainda guarde.<br />
O Alvoroço lá fora em tempestade cresça<br />
Mas eu nunca erguerei da carteira a cabeça;<br />
Mergulha<strong>do</strong> serei nesta sensualidade<br />
Do mês de abril chamar só com minha vontade,<br />
De um sol to<strong>do</strong> extrair de minha alma, que espera<br />
Mudar meu peito ardente em tépida atmosfera.<br />
O SOL<br />
Pois ao longo da viela em que, pelas mansardas,<br />
Persianas fazem véu às luxúrias bastardas,<br />
Quan<strong>do</strong> o sol reverbera, imponente e inimigo,<br />
Sobre a cidade e o campo e sobre o teto e o trigo,<br />
Eu ponho-me a treinar em minha estranha esgrima,<br />
Farejan<strong>do</strong> por tu<strong>do</strong> os acasos da rima,<br />
Numa frase a tombar como diante de obstáculos,<br />
Ou topan<strong>do</strong> algum verso há muito em nossos cálculos.<br />
Este pai nutritivo, a odiar sempre o que enferme,<br />
Pelos campos desperta a rosa como o verme;<br />
Faz as mágoas voar de que as almas são cheias,<br />
Enchen<strong>do</strong> o pensamento ao encher as colméias.<br />
Ele é quem dá o alento aos que vêm de muletas,<br />
Dan<strong>do</strong>-lhes um frescor de jóias ou violetas,<br />
Para ordenar depois que amadureça a messe<br />
No coração eterno, o que sempre floresce!<br />
E quan<strong>do</strong> vai à rua, à maneira de um poeta,<br />
Ele sabe aureolar a coisa mais abjeta.<br />
Sozinho e sem rumor, como um rei se introduz<br />
Nos hospitais da mágoa e nas mansões da luz!<br />
A UMA MENDIGA RUIVA<br />
Ruiva e branca a aparecer,<br />
Cuja roupa deixar ver<br />
Por seus rasgões a pobreza<br />
Como a beleza,<br />
A mim, poeta sofre<strong>do</strong>r,<br />
Teu corpo de um mal sem cura<br />
To<strong>do</strong> manchas de rubor,<br />
Só tem <strong>do</strong>çura.