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Download do Livro - Moa Sipriano

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Eu não ia permitir que uma cretinice daquelas deturpasse por completo minha mente ainda abalada<br />

por causa <strong>do</strong>s últimos acontecimentos.<br />

Apanhei minha garrafa como se apanha um filho que implora carinho através <strong>do</strong> seu choro<br />

fora de controle. Embalei minha única arte entre meus braços e procurei o conforto <strong>do</strong> meu sofá<br />

aconchegante.<br />

Estavam to<strong>do</strong>s lá: os cristais vermelho e azul, o crucifixo, a areia, as sementes, a moeda... até<br />

o adesivo com to<strong>do</strong>s os meus da<strong>do</strong>s profissionais permanecia intacto no fun<strong>do</strong> da garrafa.<br />

Eu comecei a chorar. Chorar e desaguar toda minha <strong>do</strong>r. Como um bebê a implorar um<br />

segun<strong>do</strong> de carinho, talvez eu precisasse saciar a minha fome de respostas lógicas, concretas.<br />

* * *<br />

Ele abriu a porta com muito cuida<strong>do</strong>. Pediu licença. Nem me espantei com sua presença<br />

imponente. Ele retirou o chapéu de abas largas. Algo Indiana Jones. Retirou também o pesa<strong>do</strong><br />

paletó cor de chumbo. Agacha<strong>do</strong>, depositou ambos por sobre o tapete da sala, sem lógica, sem<br />

cerimônia.<br />

De joelhos, ele sorriu para mim e buscou a minha mão fria e trêmula. Algo de reconfortante<br />

emanava de seus gestos comedi<strong>do</strong>s. Eu me senti seguro com sua presença.<br />

Eu chorava. Ele não aplacava meu choro. Mas permitia que eu colocasse toda minha emoção<br />

e angústia para fora.<br />

Ele retirou com extrema delicadeza a minha garrafa, o meu filho, a minha criação de minhas<br />

mãos chacoalhantes. Ele beijou em seguida as pontas <strong>do</strong>s meus de<strong>do</strong>s. Eu me senti abençoa<strong>do</strong>.<br />

“Vamos chamar Sepp”, ele disse. E eu não acreditava que isso era possível.<br />

Seria aquele gostosão um pai-de-santo picareta? Um mesa-branca-omo-dupla-ação?<br />

“Vocês precisam acertar algumas coisas. Cada um tem que seguir seu destino e cumprir com<br />

suas obrigações nessa e na outra vida!”, afirmou o Homem <strong>do</strong> Cemitério.<br />

Eu não compreendia mais nada, mas confiava cegamente naquele envia<strong>do</strong> de Deus.<br />

Ele só podia ser um Envia<strong>do</strong> de Deus... para aplacar to<strong>do</strong> meu sofrimento.<br />

O Homem <strong>do</strong> Cemitério levantou-se e dirigiu-se até a cozinha. Trouxe uma jarra de vidro<br />

transparente quase que toda cheia de água. Onde ele tinha acha<strong>do</strong> aquela jarra... eu não sabia.<br />

Trouxe também <strong>do</strong>is copos de vidro, vagabun<strong>do</strong>s, desses de embalagem de requeijão. Notei<br />

que tu<strong>do</strong> fora posto no meio da sala, diretamente no chão, entre nós <strong>do</strong>is.<br />

O Homem <strong>do</strong> Cemitério murmurou algumas palavras incompreensíveis para mim. Pegan<strong>do</strong><br />

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