Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
dia, eu ficava ainda mais cara e fuça <strong>do</strong> meu faleci<strong>do</strong> e odia<strong>do</strong> pai.<br />
Não fiz rodeio. Fui logo ao ponto morto. Disse-lhe que precisava saber o que havia ocorri<strong>do</strong><br />
com um rapaz de nome Sepp. Sepp Mertens... desencarna<strong>do</strong> há um ano.<br />
“Humm, Sepp... Sepp.... Sim, claro, o jovem Sepp... filho de Michael, o pesca<strong>do</strong>r vesgo.<br />
Sim, sim... o idiota morreu afoga<strong>do</strong> em Gobsun no inverno passa<strong>do</strong>. É isso mesmo... bêba<strong>do</strong>...<br />
afoga<strong>do</strong>... glub...hic... glub!”, disse Nolla, deflagran<strong>do</strong> um sorriso sarcástico de estranhos dentes<br />
<strong>do</strong>ura<strong>do</strong>s, gastos, piratas.<br />
À minha direita, um velho cheiran<strong>do</strong> a malte entrou na dança, rin<strong>do</strong> e imitan<strong>do</strong> a si mesmo –<br />
bêba<strong>do</strong> – como se estivesse se afogan<strong>do</strong>... feliz da vida!<br />
“Vai ver aquele moleque esquisito nunca tinha bebi<strong>do</strong> na vida. E quan<strong>do</strong> tomou o primeiro<br />
porre... glub... hic... gluuubbb...Mo-Rre-U!”, disse Cheira Malte, quase cain<strong>do</strong> <strong>do</strong> banquinho de<br />
madeira de três pernas não muito seguras de si.<br />
“Eu concor<strong>do</strong>”, disse Nolla, limpan<strong>do</strong> as mãos oleosas na camiseta que gritava por um banho<br />
em soda cáustica. “Acho que o garoto esquisito levou um fora da namorada, pois não conseguiu<br />
enfiar o pintinho numa bela buçanha; daí desatou a beber, a chorar, a beber mais e... pimba.. glub...<br />
hic... gluuubbb. Simples assim!”, confirmou o velho <strong>do</strong>no da velha bodega, agarran<strong>do</strong> meu ombro<br />
esquer<strong>do</strong> com sua mão suada, cheiran<strong>do</strong> a restos de um peixe qualquer.<br />
“Obriga<strong>do</strong>, velho Nolla”, eu disse, sem convencer. “Sua teoria me deixou... impressiona<strong>do</strong>”,<br />
complementei, com meia sinceridade.<br />
“Ah, é verdade”, ele disse, rin<strong>do</strong> a plenos pulmões. “Per<strong>do</strong>e o velho marinheiro. Eu sempre<br />
me esqueço que você não gosta da coisa rachada... ah, ah, ah!”<br />
Ignorei a brincadeira. Por trás da piada eu via o temor <strong>do</strong> homem solitário, desespera<strong>do</strong>, na<br />
expectativa que eu revelasse aos parcos clientes as nossas brincadeiras atrás <strong>do</strong> balcão nas<br />
madrugadas etílicas de verão. Perdi a conta de quantas vezes Nolla tinha me comi<strong>do</strong>, me chupa<strong>do</strong>,<br />
me meianovea<strong>do</strong>.<br />
Sacanagens por trás da bebida. Do balcão de bebidas. Suprin<strong>do</strong> nossas carências na eterna<br />
expectativa de um amor impossível. Nolla sem sua japonesa 1978. Eu... sem meu príncipe libertino<br />
1996.<br />
Nós <strong>do</strong>is apenas afogávamos a carência <strong>do</strong> corpo, de vez em quan<strong>do</strong>; jamais a tristeza da<br />
alma pelos amores perdi<strong>do</strong>s por causa da nossa burrice compartilhada.<br />
Conversamos mais um pouco sobre detalhes da família Mertens. Paguei minha cerveja com<br />
duas velhas notas úmidas de um lov. em casa, coloquei a enorme caixa que continha minhas<br />
artísticas garrafas rigorosamente bem embaladas num suporte improvisa<strong>do</strong> atrás da bicicleta, e lá<br />
9