17.04.2013 Views

POEMAS IRÔNICOS, VENENOSOS E SARCÁSTICOS Álvares de ...

POEMAS IRÔNICOS, VENENOSOS E SARCÁSTICOS Álvares de ...

POEMAS IRÔNICOS, VENENOSOS E SARCÁSTICOS Álvares de ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Formosa pali<strong>de</strong>z cobria o rosto;<br />

Nessas órbitas — ocas, <strong>de</strong>negridas! —<br />

Como era puro seu olhar sombrio!<br />

Agora tudo é cinza. Resta apenas<br />

A caveira que a alma em si guardava,<br />

Como a concha no mar encerra a pérola,<br />

Como a caçoila a mirra incan<strong>de</strong>scente.<br />

Tu outr’ora talvez <strong>de</strong>sses-lhe um beijo,<br />

Por que repugnas levantá-lo agora?<br />

Olha-o comigo! Que espaçosa fronte!<br />

Quanta vida ali <strong>de</strong>ntro fermentava,<br />

Como a seiva nos ramos do arvoredo!<br />

E a se<strong>de</strong> em fogo das idéias vivas<br />

On<strong>de</strong> está? on<strong>de</strong> foi? Essa alma errante<br />

Que um dia no viver passou cantando,<br />

Como canta na treva um vagabundo,<br />

Per<strong>de</strong>u-se acaso no sombrio vento,<br />

Como noturna lâmpada apagou-se?<br />

E a centelha da vida, o eletrismo<br />

Que as fibras tremulantes agitava<br />

Morreu para animar futuras vidas?<br />

Sorris? eu sou um louco. As utopias,<br />

Os sonhos da ciência nada valem.<br />

A vida é um escárnio sem sentido,<br />

Comédia infame que ensangüenta o lodo.<br />

Há talvez um segredo que ela escon<strong>de</strong>;<br />

Mas esse a morte o sabe e o não revela.<br />

Os túmulos são mudos como o vácuo.<br />

Des<strong>de</strong> a primeira dor sobre um cadáver,<br />

Quando a primeira mãe entre soluços<br />

Do filho morto os membros apertava<br />

Ao ofegante seio, o peito humano<br />

Caiu tremendo interrogando o túmulo...<br />

E a terra sepulcral não respondia.<br />

Levanta-me do chão essa caveira!<br />

Vou cantar-te uma página da vida<br />

De uma alma que penou, e já <strong>de</strong>scansa.<br />

II<br />

— Por quem esperas trêmula a <strong>de</strong>soras,<br />

Mulher da noite, na <strong>de</strong>serta rua?<br />

A miséria venceu os teus orgulhos,<br />

E vens na treva contratar teu leito?<br />

55<br />

55

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!