a multiplicidade de linguagens poéticas no interior da
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geralmente um poema <strong>de</strong> estrofes simétricas, com intuito <strong>de</strong> exaltação ou discussão<br />
<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>de</strong>senvolvi<strong>da</strong> especialmente pelo poeta lati<strong>no</strong> Horácio.<br />
O exemplo <strong>de</strong>sta relação entre a aceitação <strong>da</strong> morte e a celebração dos prazeres <strong>da</strong><br />
existência encontra-se na mais célebre o<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ricardo Reis (sem título):<br />
Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio.<br />
Sossega<strong>da</strong>mente fitemos o seu curso e apren<strong>da</strong>mos<br />
Que a vi<strong>da</strong> passa, e não estamos <strong>de</strong> mãos enlaça<strong>da</strong>s.<br />
(Enlacemos as mãos.).<br />
Depois pensemos, crianças adultas, que a vi<strong>da</strong><br />
Passa e não fica, na<strong>da</strong> <strong>de</strong>ixa e nunca regressa,<br />
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,<br />
Mais longe que os <strong>de</strong>uses.<br />
Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-<strong>no</strong>s.<br />
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.<br />
Mais vale saber passar silenciosamente<br />
E sem <strong>de</strong>sassossegos gran<strong>de</strong>s.<br />
Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,<br />
Nem invejas que dão movimento <strong>de</strong>mais aos olhos, (...)<br />
Pagãos i<strong>no</strong>centes <strong>da</strong> <strong>de</strong>cadência.<br />
Ao me<strong>no</strong>s, se for sombra antes, lembrar-te-ás <strong>de</strong> mim <strong>de</strong>pois<br />
Sem que a minha lembrança te ar<strong>da</strong> ou te fira ou te mova,<br />
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem <strong>no</strong>s beijamos<br />
Nem fomos mais do que crianças.<br />
E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,<br />
Eu na<strong>da</strong> terei que sofrer ao lembrar-me <strong>de</strong> ti.<br />
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim - à beira-rio,<br />
Pagã triste e com flores <strong>no</strong> regaço. (REIS, 1997, p.55)<br />
Nesse poema, observa-se a leveza <strong>da</strong>s imagens afetivas que o poeta elaborou,<br />
construindo uma proposta suavemente melancólica <strong>de</strong> relação amorosa. É claro<br />
também o conceito Epicurista: <strong>de</strong>vem-se evitar os “amores, os ódios, as paixões que<br />
levantam a voz”, em busca <strong>de</strong> uma tranqüili<strong>da</strong><strong>de</strong> amorosa. De qualquer modo: “Quer<br />
gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio” e “Mais vale saber passar<br />
silenciosamente/ E sem <strong>de</strong>sassossegos gran<strong>de</strong>s”. O fluir <strong>de</strong> um rio é uma imagem<br />
freqüente na poesia clássica, indicando <strong>no</strong>rmalmente o correr do tempo.<br />
Viver <strong>de</strong> forma sábia o presente (“colhamos flores... /...e que o seu perfume suavize<br />
o momento”) e evitar a paixão excessiva é uma forma que o poeta encontra <strong>de</strong> fugir<br />
<strong>da</strong> dor provoca<strong>da</strong> por uma sau<strong>da</strong><strong>de</strong> violenta: “E se antes do que eu levares o óbolo<br />
ao barqueiro sombrio, / Eu na<strong>da</strong> terei que sofrer ao lembrar-me <strong>de</strong> ti/ Ser-me-as<br />
suave à memória lembrando-te assim – à beira do rio”.<br />
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