UM PROMETEU CARNAVALIZADO: IRONIA E ... - Unesp
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ANAIS DO X SEL – SEMINÁRIO DE ESTUDOS LITERÁRIOS: “Cultura e Representação”<br />
A partir disso, o Mito de Prometeu deixa de ser significado, discurso monológico, para<br />
estabelecer dialogia com o miniconto de Marina Colasanti. E, como já pudemos analisar ao longo<br />
deste estudo, essa dialogia está muito mais marcada pela interdiscursividade do que pela<br />
intertextualidade estritamente material.<br />
Assim sendo, a intertextualidade entre “O prazer enfim partilhado” e o Mito de<br />
Prometeu é mais implícita, pois concentra-se mais na apresentação, por parte da autora, de<br />
alusões, traços, que transportam o leitor/decodificador ao hipotexto. Diferentemente do tipo de<br />
paródia que tem o objetivo apenas de escarnecer, ridicularizar, fazer troça, a paródia de Marina<br />
Colasanti do Mito de Prometeu é laudatória, em tom de homenagem. Apesar de Prometeu ser o<br />
correlato da personagem do marido, no miniconto, e este sofrer duplamente, ou seja, ser<br />
coroado como um “escravo” trabalhador e sustentador de sua esposa, não percebemos, aí, uma<br />
degradação do hipotexto. Pois, de acordo com Linda Hutcheon,<br />
Por esta definição, a paródia é, pois, repetição, mas repetição que inclui diferença<br />
(Deleuze, 1968); é imitação com distância crítica, cuja ironia pode beneficiar e prejudicar ao<br />
mesmo tempo. Versões irônicas de “transcontextualização” e inversão são os seus<br />
principais operadores formais, e o âmbito de ethos pragmático vai do ridículo desdenhoso à<br />
homenagem reverencial. (HUTCHEON, 1989, p. 54)<br />
O hipertexto, outrossim, sacraliza e dessacraliza o hipotexto de que estamos tratando<br />
aqui. Sacraliza, pois, como aponta Hutcheon (1989), o reverencia, o toma como base para<br />
desconstruí-lo logo em seguida, tornando-o quase que irreconhecível aos olhos do leitor.<br />
Reforçando essa ideia, “A paródia não é a destruição do passado; na verdade, parodiar é<br />
sacralizar o passado e questioná-lo ao mesmo tempo. E, mais uma vez, esse é o paradoxo pós-<br />
moderno.” (HUTCHEON, 1991, p. 165)<br />
Podemos concluir, então, que o nonsense, o grotesco, a ironia, o carnaval e a<br />
interdiscursividade foram recursos de que se valeu Marina Colasanti para dar a volta no mito,<br />
“tapeá-lo”, torná-lo mais incisivo dentro de uma época que, muitos de nós, julgamos pós-<br />
moderna, em que o antigo e o novo, paradoxalmente, se encontram para reescrever, e não para<br />
redigir textos que sejam puramente originais, geniais – e isso é impossível, uma vez que todos<br />
os textos já foram escritos, mas a possibilidade de reordená-los é infinita. Daí o caráter<br />
renovador, mas, ao mesmo tempo, “preso” ao passado mítico da Antiguidade de “O prazer enfim<br />
partilhado”.<br />
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