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Especial Abril 2009.indd - Secretaria de Estado de Cultura de Minas ...

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8<br />

Setembro/2009<br />

Literatura Brasileira na Espanha<br />

As esponjosas, <strong>de</strong> pé <strong>de</strong> árvore plantado pelo folhetinesco filho da velha, fugido jovem<br />

Deus sabe aon<strong>de</strong>, sem mais notícias, segundo a mesma – fumando <strong>de</strong>moradamente – nos<br />

informou. Mulher que jamais vira povoado nem cida<strong>de</strong>, o comum, nem juiz <strong>de</strong> paz nem<br />

parteira, mas temente a Deus e aos homens. Respeitosa. Muito respeitável. Mãe <strong>de</strong> filha<br />

fina, <strong>de</strong>licada e sertaneiramente vistosa. Abacaxi, piña tropical, com – digo eu – frescos<br />

sucos sob a coroada aspereza. A que nos preparou aquele plumoso frango. A culinária: cozinheira.<br />

Relambida <strong>de</strong>lícia, com ervas temperada, com farinha crua no lugar <strong>de</strong> pão e aquela<br />

água turva; turva não: escura. Água suspensa. Que não nos <strong>de</strong>ixaram pagar: o japonês, com<br />

seu sombreiro madrilenho até a orelha, breve casquete.<br />

Essa é minha verda<strong>de</strong>ira experiência <strong>de</strong> tradutor pois que, <strong>de</strong>pois da<br />

conversação, sentados no chão, encostados na pare<strong>de</strong> (e eles queriam,<br />

não mais, ver-me abancado), conversação sobre Curvelo e suas finas<br />

folhas; e <strong>de</strong>pois da pesca <strong>de</strong> meia hora, com o neto mais velho, na vereda<br />

Essa é minha verda<strong>de</strong>ira<br />

– um dos vários cursos <strong>de</strong> água chamados Ribeirão das Ânimas: o <strong>de</strong><br />

Riobaldo? – que só <strong>de</strong>u peixes <strong>de</strong> escasso nutrir; <strong>de</strong>pois daquilo tudo, foi<br />

experiência <strong>de</strong> tradutor pois que, a experiência da venda.<br />

Com aquele coronel, dono <strong>de</strong> casa e gados, mas ven<strong>de</strong>dor sem precon-<br />

<strong>de</strong>pois da conversação, sentados ceito. O que nos quis contratar <strong>de</strong> mestre e mestra – para seus filhos e os<br />

filhos <strong>de</strong> seus agregados, e para as pessoas velhas. Gente eloquente. De<br />

no chão, encostados na pare<strong>de</strong>, não parvo falar. Antes bem, enredados claros enquanto se admiravam <strong>de</strong><br />

ver-me picar o tabaco e saber liá-lo em palha <strong>de</strong> milho. Tabaco <strong>de</strong> rolo,<br />

conversação sobre Curvelo e suas <strong>de</strong> feia comparação.<br />

E o médico Castro, chegado em seu jeep, que me mostrou o docu-<br />

finas folhas; e <strong>de</strong>pois da pesca <strong>de</strong> mento para acreditar parentescos, pois apareceu e se foi convencido <strong>de</strong><br />

que meu sobrenome era a tradução espanhola do seu, ou vice-versa.<br />

meia hora, com o neto mais velho, E o caçador <strong>de</strong> ofício, <strong>de</strong> cotias e patos, e <strong>de</strong> antas (se acompanhado),<br />

mordido em um pé por serpente braba, e que sabia escrever seu nome.<br />

na vereda que só <strong>de</strong>u peixes <strong>de</strong><br />

Sidurino? Marcelino? Beduín? Homem gente, magro como cão corredor,<br />

<strong>de</strong> pé no chão e duros cascos, en<strong>de</strong>moniado <strong>de</strong> falador, raso crente.<br />

escasso nutrir, <strong>de</strong>pois daquilo tudo, Convidou-me a cão e escopeta. Não quisemos disparar sobre o ninho<br />

do pássaro forneiro (joão-<strong>de</strong>-barro aí dito) por não matar o urubu, única<br />

foi a experiência da venda.<br />

peça. Matar a morte? Nunca se vira. Não quis, não.<br />

E por fim, e sempre, nossas cachaças, <strong>de</strong>vagar bebidas e sempre <strong>de</strong>vidas,<br />

que não me as quiseram cobrar; nem a com ervas em garrafa <strong>de</strong><br />

cerveja guardada.<br />

Essa foi minha experiência <strong>de</strong> tradutor. Aquelas línguas: os dizeres. Eles organizaram<br />

minha gramática. Seis, ou oito?, horas <strong>de</strong> ouvir e ouvir. De repetir. De dizer – para amor<br />

e contento – no floreado, o que eles expressavam temporões. Não sonhei, nem. Nem não<br />

carecia. De Riobaldo contei e alguns queriam haver <strong>de</strong>le ouvido. Boas memórias: imaginosas.<br />

Mas sim <strong>de</strong> Juanito Bem-Bem, real pessoal, e <strong>de</strong> Lampião, muito mais do norte. Os<br />

jaguncismos.<br />

E chegou, já na madrugadora noite tropical, aquela reposição. Formosura das curvas: a ÁNGEL CRESPO (Ciudad Rodrigo, 1926 – Barcelona, 1995)<br />

luz farol – apressada – invadia, não mais, uns metros quadrados <strong>de</strong> sertão, <strong>de</strong>snudava-os Poeta, ensaísta, tradutor e professor. Foi responsável pela tradução<br />

<strong>de</strong> escuridões. Era leitosa, neblinosa. Nas retas, os faróis o eram em seco: iluminavam a <strong>de</strong> inúmeras obras para o castelhano. Do português, traduziu obras <strong>de</strong><br />

Fernando Pessoa, Eugénio <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Guimarães Rosa, João Cabral<br />

ida; mas quando o serpenteio da estrada os obrigava a projetar-se entre os clãs <strong>de</strong> árvores, <strong>de</strong> Melo Neto, além <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte dos poetas brasileiros, reunidos na<br />

eu pensava nas curvas traçadas pela narração do chefe <strong>de</strong> fronteiras, Dr. Guimarães Rosa, primeira antologia sobre a poesia brasileira publicada na Espanha.<br />

iluminador <strong>de</strong> sertões, <strong>de</strong> muito sertão.

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