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GRAVIDEZ<br />

E DOENÇAS<br />

RESPIRATÓRIAS<br />

TEMAS EM DESTAQUE<br />

Particularidades do tabagismo e<br />

seu tratamento na gestante<br />

Infecções respiratórias<br />

durante a gestação<br />

RELATO DE CASO<br />

Gestação em paciente<br />

com Fibrose Cística


DIRETORIA - BIÊNIO 2012 | 2013 SUMÁRIO<br />

Presidente: Mônica Corso Pereira<br />

Vice-Presidente: Oliver Augusto Nascimento<br />

Secretária Geral: Maria Raquel Soares<br />

1ª Secretário: Igor Bastos Polonio<br />

2º Secretário: Carlos Vianna Poyares Jardim<br />

Diretor de Finanças: Lara Maris Napolis<br />

Diretor de Assuntos Científicos: Elcio dos Santos Oliveira<br />

Vianna<br />

Diretor de Divulgação: Hugo Bok Yoo<br />

Diretora Informática: Roberta Pulcheri Ramos<br />

COMISSÕES<br />

Assuntos do Interior: Mauricio Sousa de Toledo Leme<br />

Defesa Profissional: Altair da Silva Costa Júnior<br />

Ensino: Federico Leon Arrabal Fernandes<br />

Promoções: Valéria Cristina Vigar Martins<br />

Assuntos da Grande São Paulo: Mônica Silveira Lapa<br />

DEPARTAMENTOS<br />

Cirurgia Torácica:<br />

Ricardo Mingarini Terra<br />

Roberto Gonçalves<br />

Daniele Cristina Cataneo<br />

Endoscopia Respiratória:<br />

Viviane Rossi Figueiredo<br />

Ascedio Rodrigues<br />

Péricles Barbato<br />

Pediatria:<br />

Marina Buarque de Almeida<br />

Adyleia Aparecida Dalbo Contrera Toro<br />

Beatriz Neuhaus Barbisan<br />

Fisioterapia Respiratória:<br />

Adriana Claudia Lunardi<br />

Luciana Dias Chiavegato<br />

Felipe Augusto Rodrigues Mendes<br />

Conselho Fiscal<br />

Efetivos:<br />

Ana Luisa Godoy Fernandes<br />

Carlos Alberto de Castro Pereira<br />

Irma de Godoy<br />

Suplentes:<br />

Jaquelina Sonoe Ota Arakaki<br />

José Antônio Baddini Martinez<br />

Ricardo Milinavicius<br />

Conselho Deliberativo<br />

Francisco Vargas Suso<br />

Jorge Nakatani<br />

José Eduardo Delfini Cançado<br />

Manuel Lopes dos Santos<br />

Miguel Bogossian<br />

Nelson Morrone<br />

Rafael Stelmach<br />

Ricardo Beyruti<br />

Roberto Stirvulov<br />

Sônia Maria Faresin<br />

Virgílio Alexandre Nunes de Aguiar<br />

PNEUMOLOGIA PAULISTA<br />

Órgão Informativo da Sociedade Paulista de<br />

Pneumologia e Tisiologia<br />

Editor Responsável:<br />

Oliver Augusto Nascimento<br />

Editoração Eletrônica:<br />

Miriam Miranda<br />

Impressão: Gráfica Riopedrense Tiragem: 1200 exemplares<br />

4<br />

6<br />

7<br />

30<br />

44<br />

55<br />

PALAVRA DA PRESIDENTE<br />

Consultas públicas – do que se trata?<br />

O papel dos especialistas e da sociedade<br />

de especialidade<br />

PALAVRA DO EDITOR<br />

Gravidez e Doenças Respiratórias<br />

TEMAS EM DESTAQUE<br />

Particularidades do tabagismo e seu<br />

tratamento na gestante<br />

TEV na gestante: prevenção, investigação e<br />

tratamento<br />

Infecções respiratórias durante a gestação<br />

É seguro realizar exames radiológicos durante<br />

a gestação ?<br />

RESUMINDO E RECORDANDO<br />

Asma na gestação: Quadro clínico e<br />

tratamento<br />

Distúrbios respiratórios do sono na gravidez<br />

Fisiologia respiratória durante a gestação<br />

Alterações do crescimento e desenvolvimento<br />

pulmonar fetal<br />

RELATO DE CASO<br />

Alterações do crescimento e desenvolvimento<br />

pulmonar fetal<br />

Gestação em paciente com Fibrose Cística<br />

Uso do sildenafil em gestação de paciente<br />

com Hipertensão Arterial Pulmonar<br />

secundária à cardiopatia congênita (Síndrome<br />

de Eisenmenger)<br />

Tuberculose e gestação<br />

ESTATÍSTICAS<br />

Testes de concordância estatística<br />

NOSSA CAPA<br />

Ilustração:<br />

Libero


PALAVRA DA PRESIDENTE<br />

Consultas públicas – do que se trata?<br />

O papel dos especialistas e da sociedade<br />

de especialidade<br />

Cada vez mais as decisões que<br />

dizem respeito à saúde pública<br />

tem se tornado realmente<br />

públicas, no sentido de ficarem de<br />

algum modo permeáveis às ações,<br />

opiniões, sugestões e contribuições<br />

da sociedade civil. Falo<br />

da prática das consultas públicas,<br />

evento novo para a maioria dos<br />

médicos, não apenas para os que<br />

militam somente na saúde<br />

suplementar (dita também<br />

privada, que inclui as medicinas<br />

de grupo, os convênios médicos,<br />

as cooperativas médicas e as<br />

consultas particulares), mas<br />

também para aqueles que<br />

trabalham na sáude pública, de<br />

variadas instâncias (municipal, estadual e federal) e<br />

complexidades (básica, níveis secundário e terciário).<br />

As consultas públicas são documentos criados pelo<br />

Ministério da Saúde (ou pelas Secretarias Estaduais de<br />

Saúde) que tratam de temas sobre saúde e que ficam<br />

disponíveis por um prazo determinado (em geral 20 a 30<br />

dias a partir de sua publicação em documentos oficiais,<br />

como o Diário Oficial da União ou o Diário Oficial do Estado)<br />

para receber con-tribuições tanto de setores especializados<br />

e técnicos (e é aí que nós entramos), quanto da sociedade<br />

e em geral (cidadãos, usuários dos sistemas de saúde,<br />

organizaçãoes não governamentais, enfim, quaisquer<br />

pessoas ou organizações).<br />

A proposta da consulta pública é que ela seja um<br />

instrumento útil para que a população em geral, a<br />

comunidade científica, os especialistas no assunto e as<br />

diversas partes interessadas se manifestem e participem<br />

na elaboração e no aprimoramento das políticas públicas.<br />

Em tese, com isso há a possiblidade de maior transparência<br />

nas ações governamentais, eventualmente permeadas e<br />

4 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


modificadas por sugestões de todas as partes interessadas.<br />

Tal instrumento vem sendo utilizado há alguns anos, e<br />

embora louvável, ainda é um instrumento imperfeito. Cabe<br />

a nós, especialistas, cidadãos e representantes nas<br />

sociedade de especialidade, aperfeiçoá-lo.<br />

Por exemplo, em 16 de maio de 2012 o Ministério da<br />

Saúde abriu consulta pública para modificações no<br />

Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas em DPOC, e era<br />

possível acessar o conteúdo do Protocolo através do<br />

link: www.saude.gov.br/consultapublica .<br />

Toda a comunidade médica que cuida da saúde<br />

respiratória se mobilizou para chamar a atenção sobre a<br />

importância da participação dos representantes da<br />

especialidade neste processo.<br />

A iniciativa de elaborar um protocolo abrangente de<br />

atendimento para a DPOC com o objetivo de melhorar o<br />

atendimento dos pacientes e reduzir o impacto negativo<br />

causado aos pacientes e seus familiares, bem como o custo<br />

familiar e geral causado pela doença sem dúvida foi<br />

louvável, pois evidenciou o reconhecimento da alta<br />

prevalência e gravidade da doença pulmonar obstrutiva<br />

crônica no mundo e no nosso país.<br />

A Sociedade Paulista de Pneumologia sentiu-se na<br />

obrigação de realizar uma manifestação formal, institucional<br />

sobre o assunto, e produziu um documento, o qual foi<br />

disponilizado para todos os associados, conforme<br />

mensagem enviada na ocasião.<br />

Como é do conhecimento de praticamente todos que<br />

cuidam na saúde respiratória no nosso estado, o estado de<br />

São Paulo tem um protocolo para tratamento dos<br />

portadores de DPOC desde 2007 (Resolução SS nº 278, de<br />

26 de julho de 2007). Este protocolo, de cuja gestão nos<br />

orgulhamos de ter participado, proporcionou aos pacientes<br />

atendidos pelo Sistema Único de Saúde – SUS, do Estado<br />

de São Paulo, acesso à medicação para tratamento da<br />

doença, resultando em grande benefício à saúde e qualidade<br />

de vida dos nossos pacientes.<br />

A experiência acumulada nestes cinco anos gabarita a<br />

todos nós pneumologistas paulistas a opinar e avalizar o<br />

protocolo federal.<br />

Embora tenhamos emitido uma opinião enquanto<br />

sociedade – na qual procuramos primar por avaliações<br />

baseadas em evidências científicas bem fundamentadas –<br />

a opinião individualmente manifesta por todos os<br />

especialistas da medicina torácica foi fundamental.<br />

Por um tempo demasiado longo nos acostumamos talvez<br />

a não nos manifestarmos, na expectativa que outros o façam<br />

por nós. Nada substitui, no entanto, em importância e<br />

representatividade, a manifestação individual e cidadã em<br />

consultas como estas. Temos o conhecimento, a<br />

fundamentação, a experiência e a legitimidade para tal.<br />

Nesta consulta pública houve quase 400 manifestações,<br />

incluindo médicos, associações, pacientes e quem mais<br />

quisesse. Esta é a primeira etapa do processo. A<br />

manutenção e a valorização destas ações dependem de<br />

todos nós, de fiscalização e cobrança tônicas por parte da<br />

especialidade, tanto das pessoas físicas quanto jurídicas<br />

(Sociedades de Especialidades).<br />

Quero, sobretudo, conclamar a todos nós a exercer<br />

nosso direito e dever cidadãos em ocasiões como a ocorrida,<br />

pois somos a reserva técnica e legítima na área da Medicina<br />

Respiratória, não somente no estado de São Paulo, mas<br />

também no país.<br />

Abraços<br />

Mônica Corso<br />

Presidente da SPPT (biênio 2012-2013)<br />

corso@mpcnet.com.br<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 5


PALAVRA DO EDITOR<br />

Gestação e<br />

doenças respiratórias<br />

A maioria das gestações é saudável e ocorre sem<br />

intercorrências. Porém, a presença de doença respiratória na<br />

mulher em idade fértil constitui um desafio importante<br />

durante o período pré-concepção, na gravidez e no pósparto,<br />

quer pela influência que pode ter no desenrolar da<br />

gravidez e no bem estar materno-fetal, quer pelo modo como<br />

a gravidez pode alterar o curso dessa mesma doença. É<br />

fundamental o controle da doença de base, o reconhecimento<br />

e prevenção da sua descompensação, ao mesmo tempo que<br />

se minimizam os efeitos secundários das terapêuticas<br />

utilizadas sobre a mãe e o feto. Esta abordagem é<br />

multiprofissional, incluindo muitas vezes o pneumologista,<br />

radiologista, obstetra, enfermeiro e fisioterapeuta.<br />

Em muitas circunstâncias, a gravidez afeta claramente o<br />

comportamento da doença e, em outros, a doença afeta<br />

fortemente os resultados da gravidez. Além do mais, expor as<br />

gestantes a riscos como tabagismo e radiações podem alterar<br />

o desenvolvimento fetal. Dano fetal associado à farmacoterapia<br />

das doenças respiratórias e preocupações de teratogenicidade<br />

e oncogenicidade complicam o quadro ainda mais.<br />

Portanto, nós profissionais da área respiratória devemos<br />

estar preparados para abordar e tratar gestantes, visto a alta<br />

prevalência das doenças respiratórias. Em acréscimo, com<br />

os avanços no tratamento, crianças com graves doenças<br />

hereditárias como a fibrose cística estão vivendo mais e<br />

chegam a idade reprodutiva.<br />

Portanto, o objetivo desta edição é alertar e preparar os<br />

profissionais da área respiratória com conhecimentos básicos<br />

que abordam desde o desenvolvimento pulmonar fetal até a<br />

prevenção e tratamento de doenças muito comuns em nosso<br />

meio e que podem ser negligenciados. Certamente, devem<br />

existir muitos outros assuntos relacionados a gestação que<br />

necessitam ser abordados. Contudo, este é o primeiro<br />

fascículo destinado exclusivamente a este tema e esperamos<br />

que sirva de inspiração a muitos colegas para a continuidade<br />

de seus estudos.<br />

Esperamos que todos aproveitem a leitura!!<br />

Oliver A. Nascimento<br />

Vice-presidente da SPPT e Editor do Pneumologia Paulista<br />

olivernascimento@yahoo.com.br<br />

Carlos Jardim<br />

Co-editor do Pneumologia Paulista<br />

jardim.carlos@uol.com.br<br />

6 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


TEMAS EM DESTAQUE<br />

Particularidades do tabagismo e seu<br />

tratamento na gestante<br />

AUTORES: Kênia Schultz 1 ; Angelo Xerez Cepêda Fonseca 1 ; Maria Vera Cruz de Oliveira Castellano 2<br />

1Residente de Pneumologia do Serviço de Doenças do Aparelho Respiratório (DAR) do Hospital<br />

dos Servidores Públicos Estaduais<br />

2Diretora do Serviço de Doenças do Aparelho Respiratório (DAR) do HSPE / Coordenadora do<br />

Ambulatório de Tabagismo (DAR) do HSPE<br />

Introdução<br />

Nos últimos 20 anos, a prevalência do tabagismo tem<br />

diminuído nos países desenvolvidos e aumentado nos países<br />

em desenvolvimento. Prevê-se que o total de mortes<br />

atribuíveis ao tabaco aumentará de 5,4 milhões em 2005 para<br />

6,4 milhões em 2015 e 8,3 milhões em 2030, com 80% dessas<br />

mortes adicionais ocorrendo em nações em<br />

desenvolvimento. 1 As taxas de prevalência de tabagismo<br />

ainda são maiores entre os homens, mas há uma tendência<br />

de aumento do tabagismo entre as mulheres jovens, apesar<br />

dos obstáculos culturais e religiosos. O baixo nível de<br />

escolaridade é um fator de risco para iniciação ao tabagismo<br />

entre as mulheres como relata Nisar após avaliação de uma<br />

amostra de mulheres de uma comunidade no Paquistão,<br />

sendo as analfabetas mais susceptíveis a iniciar o hábito<br />

de fumar, do que aquelas com mais de cinco anos de<br />

escolaridade. 2<br />

Nas mulheres ocorrem consequências do tabagismo<br />

específicas como osteoporose, infertilidade, câncer de colo<br />

de útero e problemas relacionados com a gravidez. Também<br />

doenças relacionadas ao tabagismo, comuns a ambos os<br />

sexos estão em ascensão entre as mulheres, como a doença<br />

pulmonar obstrutiva crônica, e o câncer de pulmão que já<br />

ultrapassou o câncer de mama como a principal causa de<br />

morte nos Estados Unidos (EUA). 3<br />

No Brasil as doenças cardiovasculares (infarto agudo do<br />

miocárdio e acidente vascular encefálico), as neoplasias<br />

(mama, pulmão e colo de útero) e as doenças respiratórias<br />

são as principais causas de morte na população feminina. 4,5<br />

Além do tabagismo ativo, a exposição ao fumo passivo é<br />

uma grande ameaça para a saúde das mulheres, fetos e<br />

crianças, com prevalência estimada de 37 a 70%, e maior<br />

exposição a mulheres em idade reprodutiva.<br />

Não existem dados sobre a prevalência do tabagismo entre<br />

as gestantes no Brasil. Nos EUA levantamento de 2004<br />

mostra uma prevalência do tabagismo de 18% entre as<br />

gestantes, sendo que entre 15-17 anos esta taxa sobe para<br />

26%, contra 20% entre não gestantes na mesma faixa etária. 6<br />

Na Inglaterra em 2005 17% das gestantes eram tabagistas. 7<br />

Consequências do tabagismo na gestação 8,9,10<br />

Na gestação, o metabolismo da nicotina é mais rápido e<br />

os níveis de nicotina no feto são 15% maiores que os<br />

maternos. Na gestante tabagista há uma maior expressão do<br />

receptor da ocitocina, o que se relaciona com a maior<br />

ocorrência de partos prematuros e abortos. A menor<br />

concentração de gonadotrofina coriônica presente nas<br />

gestantes que fumam também se asssocia à maior prevalência<br />

de abortos nesta população. A ação vasoconstritora da<br />

nicotina nos vasos uterinos e da placenta está associada à<br />

redução do fluxo sanguíneo, menor oferta de oxigênio e<br />

nutrientes para o feto, maior concentração de<br />

carboxihemoglobina que também concorre para menor<br />

concentração de oxigênio na placenta e feto, além de<br />

potencializar o risco de eventos trombóticos.<br />

O aumento da homocisteína presente na gestante<br />

tabagista pode causar retardo do crescimento intrauterino,<br />

placenta prévia, ruptura prematura de membranas, fetos<br />

PIG (pequeno pra a idade gestacional), sangramentos e<br />

gravidez ectópica.<br />

É descrita uma diminuição do colágeno tipo III que se<br />

relaciona com o descolamento prematuro de membranas. O<br />

aborto espontâneo tem sido relacionado ao tabagismo ativo<br />

e passivo da gestante. Em 2009, uma metanálise 11 foi<br />

publicada evidenciando um aumento significativo na<br />

probabilidade de aborto espontâneo em gravidez realizada<br />

por reprodução assistida no grupo de fumantes.<br />

Outras complicações da gestação como placenta prévia<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 7


são mais frequentes em gestantes tabagistas como<br />

documentou Castels 12 , apontando um risco relativo de 1,58.<br />

A gravidez ectópica estaria relacionada com o sinergismo<br />

do tabagismo com a doença inflamatória pélvica. Bouyer e<br />

colaboradores avaliaram os fatores de risco em 803 casos de<br />

gravidez ectópica ocorridos na França entre 1993 e 2000.<br />

Entre os principais fatores de risco encontraram o tabagismo<br />

(RR=3,9) e a doença pélvica infecciosa (RR=3,4). Foi descrita<br />

relação direta com a intensidade do tabagismo, sendo o risco<br />

relativo para as fumantes de 1 a 9 cigarros/dia 1,6 e para as<br />

que consumiam mais de 20 cigarros 3,9. 13<br />

A ação vasoconstritora da nicotina e o menor aporte de<br />

oxigênio e nutrientes para o feto podem resultar em retardo<br />

do crescimento fetal nas gestantes fumantes culminando com<br />

o nascimento de recém nascidos pequenos para a idade<br />

gestacional. Estudo realizado no município de Rio Grande<br />

(RS) em 2007 avaliou 2484 gestantes, com prevalência de<br />

tabagismo ativo de 23% e passivo de 29%. Os recém nascidos<br />

de mães fumantes tiveram, em média, redução de 223,4 gr<br />

(IC95%:156,7-290,0) no peso. 14<br />

Os danos celulares e moleculares causados pelo<br />

tabagismo materno podem afetar o desenvolvimento fetal,<br />

havendo relatos de maior frequência de hiperglobulia fetal,<br />

natimortos, maior mortalidade neonatal e perinatal,<br />

malformações congênitas, sendo a fissura labial e palatina a<br />

mais prevalente, síndrome da morte súbita do bebê, e baixo<br />

desenvolvimento físico e intelectual. 15<br />

Há evidência de que o tabagismo materno pode reduzir o<br />

suprimento de leite materno pela diminuição dos níveis de<br />

prolactina, sendo que Liu 16 demonstrou uma maior frequência<br />

de desmame precoce.<br />

Particularidades do tabagismo entre as<br />

gestantes<br />

Segundo DiClemente 8 as mulheres grávidas tabagistas<br />

podem ser divididas em três grupos: aquelas que param de<br />

fumar porque planejaram engravidar (grávidas desistentes),<br />

mulheres que param de fumar imediatamente após saberem<br />

sobre a gravidez (desistentes espontâneas), e mulheres que<br />

fumam durante a gestação. As grávidas desistentes são mais<br />

conscientes de que o tabagismo representa risco para a saúde<br />

fetal e tendem a permanecer como não fumantes, se<br />

motivadas. As desistentes espontâneas conseguem<br />

permanecer sem fumar na gravidez numa taxa em torno de<br />

80%, porém 70% delas recaem num intervalo de até seis meses<br />

após o parto. As tabagistas gestantes frequentemente advêm<br />

de classe socioeconômica menor, tem mais problemas<br />

emocionais e psicológicos, mais problemas familiares, maior<br />

dependência à nicotina, em geral se alimentam de forma<br />

inadequada, podem ser dependentes de outras drogas e fazem<br />

o pré natal de forma irregular.<br />

Em estudo realizado com 1264 gestantes foi observada<br />

uma prevalência de 21,1% de depressão, sendo o tabagismo<br />

um dos fatores de risco mais importante (RR=1,53). 17<br />

Fang 18 descreve que as mulheres que retornam ao<br />

tabagismo no pós parto tendem a ser mais jovens, fumantes<br />

de maior número de cigarros e param de fumar no terceiro<br />

trimestre da gestação; e que as razões para a recaída são a<br />

vulnerabilidade para fumar, a interrupção prévia não por si<br />

mas pelo filho, nostalgia pessoal do passado, utilização<br />

do cigarro para controle de emoções e stress e preocupação<br />

com o peso. 19 As mulheres com duas ou mais gestações<br />

apresentam maior tendência de manter o tabagismo<br />

inalterado, ou até mesmo aumentado durante a gestação e<br />

o aleitamento. 20<br />

Tratamento<br />

A gestação representa uma situação especial e nova na<br />

vida da mulher. Assim, pode ser um bom momento para a<br />

promoção da cessação do tabagismo, uma vez que os<br />

benefícios extrapolam a saúde da mulher e abrangem também<br />

a saúde do feto.<br />

O conhecimento sobre os riscos do tabagismo é um fator<br />

importante para a sua interrupção definitiva. As campanhas<br />

educativas sobre o tabagismo muitas vezes enfocam<br />

principalmente os riscos para os homens. As mulheres<br />

frequentemente não associam o tabagismo aos problemas<br />

que podem ocorrer na gestação. O estudo de Bhanji com<br />

250 mulheres em idade reprodutiva mostrou que enquanto<br />

um terço delas relacionavam o tabagismo com doença<br />

pulmonar, apenas 7% o relacionavam com menor peso do<br />

recém nascido e menos de 1% com aborto, parto prematuro<br />

e natimorto. 21<br />

A gestação e o puerpério são momentos importantes para<br />

a cessação do tabagismo, pois as mulheres se encontram<br />

motivadas por vários motivos: preocupação com a saúde<br />

do bebê, presença de emese gravídica, desejo de amamentar<br />

e pressão familiar e social. A consulta pré natal pode ser a<br />

forma mais eficiente de esclarecimento sobre os riscos do<br />

tabagismo, e para a promoção da cessação do tabagismo.<br />

Soma-se ainda o fato de que as gestantes podem durante a<br />

consulta expor dúvidas, medos e angústias decorrentes da<br />

gestação, que eventualmente causam ansiedade e<br />

depressão.<br />

A intervenção comportamental no pré natal é uma boa<br />

ferramenta na diminuição da prevalência do tabagismo entre<br />

as gestantes. O atendimento individual propicia uma relação<br />

de confiança entre a gestante e o médico. Também os maridos<br />

devem ser orientados uma vez que o cônjuge fumante é<br />

fator preditivo de insucesso para a cessação do tabagismo.<br />

O INCA sugere que o aconselhamento à gestante<br />

tabagista deve sempre incluir a caracterização da história<br />

tabagística, a avaliação do grau de motivação, a escolha da<br />

data para parar de fumar, e assistência para a manutenção<br />

da abstinência a longo prazo.<br />

No aconselhamento devem ser incluídas perguntas sobre<br />

8 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


a decisão da paciente em parar de fumar, as expectativas<br />

em permanecer livre do cigarro, conhecer o suporte familiar<br />

da paciente, avaliar o conhecimento sobre o impacto<br />

positivo de abandonar o tabagismo, e o potencial para<br />

recaída, alertando para os eventos que podem<br />

desencadeá-lo. Também deve ser desmistificada a crença<br />

de que fumar melhora as sensações desagradáveis da<br />

gravidez. Além da orientação sobre o treinamento de<br />

habilidades para lidar com a vontade de fumar, deve ser<br />

estimulada a prática de exercícios físicos e formas de<br />

relaxamento.<br />

Lumley 22 e colaboradores avaliaram 65 estudos e<br />

concluíram que as intervenções cognitivo-comportamentais<br />

e a entrevista motivacional reduziram a prevalência de<br />

tabagismo na gestação, o baixo peso ao nascer e o número<br />

de partos prematuros. O uso de incentivos no pré natal<br />

auxiliaram 24% das mulheres a pararem de fumar na gestação.<br />

Existem vários estudos que apontam o incentivo<br />

financeiro como fator importante para a cessação do<br />

tabagismo no acompanhamento pré natal. 23<br />

São preditores de recaída durante a gravidez a pouca<br />

credibilidade sobre os malefícios do tabaco ao feto, a crença<br />

da baixa capacidade de se manter sem fumar, multiparidade,<br />

falta de suporte social, stress, período curto de cessação<br />

antes da primeira visita pré natal, baixa escolaridade e gravidez<br />

precoce. Em um estudo prospectivo com 106 mulheres que<br />

haviam parado de fumar durante a gestação foi observado<br />

que na sexta semana pós parto 24% já haviam retomado o<br />

tabagismo de forma regular e ao término do sexto mês a taxa<br />

de racaída era 40%. 24<br />

A prevenção e o tratamento da recaída pós parto devem<br />

ser intensamente trabalhados, para que não seja<br />

comprometida a cessação definitiva do tabagismo.<br />

Terapia farmacológica<br />

A terapia farmacológica auxiliar tem uso muito restrito<br />

para a gestante devido à possibilidade de toxicidade fetal,<br />

sendo que o emprego destas drogas tem uma relação custobenefício<br />

incerta.<br />

Nos casos em que a gestante não for capaz de interromper<br />

o tabagismo apenas com o auxílio de intervenções não<br />

farmacológicas, deve-se considerar o uso da terapia de<br />

reposição de nicotina. 25<br />

Na gravidez as formulações de liberação intermitente<br />

(goma de mascar, pastilhas) devem ser preferidas por<br />

disponibilizarem ao feto uma dose total diária de nicotina<br />

menor do que as apresentações de liberação lenta (adesivo).<br />

Wisborg avaliou 250 gestantes sendo que 124 receberam<br />

adesivos com 15mg de nicotina por oito semanas e 10mg por<br />

três semanas. A taxa de abstinência foi 14% um ano após o<br />

parto, e a conclusão é de que o uso de adesivo de nicotina<br />

não aumentou as taxas de abstinência de forma significativa<br />

em comparação ao placebo, porém o peso dos recém<br />

nascidos foi 186 gramas maior no grupo tratado com<br />

reposição de nicotina. 26<br />

Em estudo randomizado Coleman e colaboradores<br />

avaliaram o efeito do adesivo de nicotina de 15 mg por oito<br />

semanas em 1050 gestantes. O desfecho primário era a<br />

abstinência no momento do parto validado pela monoximetria<br />

ou cotinina salivar. O grupo que recebeu a reposição de<br />

nicotina apresentou taxa de abstinência de 9,4% enquanto<br />

que no grupo que recebeu placebo a taxa foi de 7,6% / RR1,26<br />

– IC95%:0,82-1,96. Os efeitos colaterais foram semelhantes<br />

nos dois grupos corroborando com a segurança do uso da<br />

reposição de nicotina neste grupo de pacientes. 27<br />

É recomendado o uso de repositores de nicotina de liberação<br />

rápida para mães que amamentam já que a quantidade de nicotina<br />

excretada no leite materno é bem pequena, trazendo um risco<br />

menor ao bebê, frente ao grande benefício da proteção contra<br />

as consequências do tabagismo passivo.<br />

A bupropiona e a vareniclina estão contraindicadas na<br />

gestação por não haver segurança estabelecida para<br />

gestante. A bupropiona está relacionada com uma maior<br />

incidência de abortos.<br />

Conclusão<br />

O tabagismo na gestação é um fator prevenível de<br />

complicações materno-fetais. A gestação é um ótimo momento<br />

para a interrupção do tabagismo, pois a gestante muitas<br />

vezes se encontra em fase adequada de motivação. A<br />

intervenção comportamental deve ser sempre a primeira<br />

opção. O tratamento farmacológico para cessação do<br />

tabagismo na gestante é restrito devido a possibilidade de<br />

toxicidade fetal.<br />

O acompanhamento após o parto é obrigatório para<br />

prevenir recaídas e manter a abstinência alcançada na gestação.<br />

Devem ser implantadas políticas públicas de tratamento<br />

do tabagismo nas gestantes uma vez que o custo benefício<br />

em relação à saúde materno-fetal é significativo.<br />

Para prevenir-se os efeitos do tabagismo na gestação toda<br />

mulher em idade fértil, que esteja ou não considerando a<br />

hipótese de engravidar, deve ser aconselhada pelo seu<br />

ginecologista a parar de fumar antes da concepção.<br />

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Kênia Schultz<br />

keniaschultz@click21.com.br<br />

10 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


TEV na gestante: Prevenção,<br />

Investigação e Tratamento<br />

AUTORAS: Eloara Vieira Machado Ferreira 1 ; Danielle Silva Almeida 2 ; Jaquelina Sonoe Ota Arakaki 3<br />

1Médica do Grupo de Circulação Pulmonar e Função Pulmonar e Fisiologia Clínica do Exercício da<br />

Unifesp/Escola Paulista de Medicina (EPM)<br />

2Residente do Programa de Pneumologia da Unifesp/EPM<br />

3Médica Assistente da Disciplina de Pneumologia e Coordenadora do Grupo de Circulação Pulmonar<br />

da Unifesp/EPM<br />

A gestação é um importante fator de risco para o<br />

surgimento de tromboembolismo venoso (TEV), sendo 4-5<br />

vezes mais frequente quando comparado a mulheres nãográvidas,<br />

mas com risco absoluto baixo, em torno de 2:1000<br />

gestações. 1 A embolia pulmonar (EP) ainda é uma das<br />

principais causas de mortalidade materna, principalmente<br />

devido à falta de diagnóstico e tratamento corretos, seja por<br />

receio em se utilizar métodos diagnósticos que envolvam<br />

radiação ou pelo uso de anticoagulantes. Estima-se que nos<br />

EUA e na Europa, o risco de morte secundário à EP esteja<br />

entre 1,1 a 1,5 óbitos a cada 100.000 partos nos Estados<br />

Unidos e Europa. 2 Em mulheres em idade reprodutiva, mais<br />

da metade dos eventos trombóticos estão relacionados à<br />

gestação. Esta predisposição é resultante da soma dos<br />

componentes da tríade de Virchow: I) estado de<br />

hipercoagulabilidade (procoagulantes > anticoagulantes), de<br />

forma a proteger a mulher de hemorragia durante o parto e<br />

puerpério, II) estase venosa, por dilatação e compressão<br />

dos vasos com diminuição do retorno venoso e (III) injúria<br />

endotelial, por lesão dos vasos durante a evolução do parto<br />

e/ou da cesárea (lesão cirúrgica). Apesar da fase pós-parto<br />

acarretar em maior risco de TEV (ao redor de 60%), este<br />

persiste por todo o período gestacional, incluindo os dois<br />

primeiros trimestres. 3 Desta forma, o aconselhamento e<br />

avaliação de risco para TEV devem ocorrer antes da gestação<br />

propriamente dita. Apesar do reconhecimento da morbimortalidade<br />

materna envolvida num evento de TEV, faltam<br />

estudos controlados, principalmente em relação a um<br />

algoritmo diagnóstico, a ser instituído durante a gestação e<br />

puerpério.<br />

I. Fatores de Risco<br />

Os fatores de risco maternos para TEV podem estar<br />

relacionados com aqueles da população geral, por ex.,<br />

obesidade e tabagismo, assim como relacionados à própria<br />

gestação (tabela 1). Num levantamento realizado no Reino<br />

Unido, mais de 75% dos óbitos maternos por EP foram<br />

identificados fatores de risco. 4 O principal deles é a história<br />

de TEV prévio, principalmente quando a etiologia não foi<br />

identificada ou quando relacionado à utilização de<br />

hormônios. 4,5 A cesárea é um fator de risco independente no<br />

pós-parto e quando utilizado a tromboprofilaxia regularmente,<br />

o risco de EP diminuiu em 50% (0,45 vs 0,22 para 1000<br />

partos). 3,6 A presença de trombofilias é encontrada na mesma<br />

proporção em mulheres gestantes e não gestantes com TEV,<br />

não sendo uma condição que deva ser pesquisada em<br />

mulheres assintomáticas quando da decisão em engravidar<br />

ou utilizar reprodução assistida para este fim. As trombofilias<br />

mais comuns são o fator V de Leiden e a mutação do gene da<br />

protrombina, sendo que o primeiro, por ex., apesar de alto<br />

Idade > 35 anos Anemia<br />

Obesidade (IMC > 35 kg/m2 Tabela 1: Fatores de risco para TEV durante a gestação e no puerpério:<br />

) Anemia falciforme<br />

Ganho de peso > 21 kg Lúpus eritematoso sistêmico<br />

Imobilidade Transfusão sanguínea<br />

Tabagismo Doenças cardíacas<br />

Trombofilia Parto cesárea<br />

História pessoal ou familiar de TEV Pré-eclâmpsia<br />

Fertilização in vitro Hemorragia pós-parto<br />

Paridade > 1 Infecção puerperal<br />

Gestação múltipla<br />

Adaptado da referência<br />

Retardo do crescimento fetal<br />

8 .<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 11


Tabela 2: Estratégias sugeridas para profilaxia durante a gestação e no pós-parto em mulheres sem anticoagulação prolongada:<br />

Baixo risco:<br />

1.Qualquer trombofilia (exceto fator V Leiden<br />

e mutação da protrombina G20210A<br />

homozigotas) sem TEV prévio ou história<br />

familiar de TEV<br />

Risco intermediário:<br />

1.Episódio único de TEV provocado por fator<br />

de risco transitório, não relacionado à<br />

gestação ou uso de contraceptivo oral.2.<br />

Sem TEV anterior com trombofilia (exceto<br />

fator V Leiden e mutação da protrombina<br />

G20210A homozigotas) e história familiar<br />

positiva<br />

Risco alto:<br />

1.Fator V Leiden e mutação da protrombina<br />

G20210A homozigotas.2.Episódio único de<br />

TEV não provocado3. Episódio único de TEV<br />

provocado por uso contraceptivo oral ou<br />

relacionado à gestação ou pósparto.4.Episódio<br />

único de TEV associado à<br />

qualquer trombofilia.5.Vários eventos prévios<br />

de TEV sem uso de anticoagulação<br />

prolongada.<br />

Adaptado da referência 8 .<br />

risco relativo (aumenta em 8x) tem baixo risco absoluto para<br />

o surgimento de TEV na gestação (1,1%). 7 O risco absoluto<br />

de TEV aumentará nas gestantes portadoras de trombofilia<br />

quando tiverem história familiar positiva.<br />

Prevenção<br />

A ACCP publicou em 2012 novas orientações quanto à<br />

indicação ou não de tromboprofilaxia na gestação 8 ,<br />

entretanto, a maioria das recomendações foi baseada em<br />

estudos observacionais ou extrapolação de outras<br />

populações, demonstrando a necessidade de estudos<br />

controlados nesta população especial. Em linhas gerais, a<br />

prevenção com tromboprofilaxia deve ser instituída quando<br />

da presença de fatores de alto risco e/ou associados,<br />

devendo ser ponderado o risco-benefício para profilaxia no<br />

pós-parto ou durante a gestação (tabela 2). A escolha da<br />

droga deve ser baseada nos potenciais riscos de sangramento<br />

e anormalidades fetais assim como eficácia e adequação da<br />

posologia e via de aplicação para conforto da paciente, sendo<br />

as heparinas as droga de escolha por não atravessarem a<br />

placenta. As HBPM têm como vantagens menor risco de<br />

HIT assim como administração uma vez ao dia. Os<br />

antagonistas de vitamina K (AVK) atravessam a barreira<br />

placentária com risco de má-formação fetal no 1º trimestre e<br />

hemorragia fetal periparto no 3º trimestre. 9 Vide tabela 3 para<br />

Gestação<br />

Vigilância clínica<br />

Vigilância clínica<br />

Dose profilática ou<br />

intermediária de HBPM.<br />

Pós-parto<br />

Vigilância clínica<br />

1.Dose profilática ou intermediária<br />

de HBPM por 6 semanas. 2.Em<br />

mulheres sem deficiência da<br />

proteína C ou S, antagonistas da<br />

vitamina K podem ser usados de<br />

forma alternativa (para RNI 2,0-3,0).<br />

1.Dose profilática ou intermediária<br />

de HBPM por 6 semanas. 2.Em<br />

mulheres sem deficiência da<br />

proteína C ou S, antagonistas da<br />

vitamina K podem ser usados de<br />

forma alternativa (para RNI 2,0-3,0).<br />

doses de profilaxia e tratamento sugeridos para HBPM (via<br />

subcutânea) e heparina não-fracionada (HNF).<br />

Orientações da profilaxia farmacológica (baseada na<br />

ACCP 2012) 8 :<br />

1. HBPM ao invés de HNF;<br />

2. HBPM ao invés de AVK, em toda a gestação e parto;<br />

3. AVK poderão ser utilizados na profilaxia estendida após<br />

o parto;<br />

4. Utilização limitada do fondaparinux e inibidores diretos<br />

da trombina parenteral naquelas com alergia importante à<br />

heparina e que não possam receber danaparoides;<br />

5. Evitar o uso de inibidores orais diretos da trombina<br />

(dabigratan) e do fator anti Xa (rivaroxaban, apixaban).<br />

Principais indicações de profilaxia de TEV na gestação<br />

e puerpério (baseada na ACCP 2012) 8 :<br />

1. Em pacientes submetidas à cesárea sem outros fatores<br />

de risco, a profilaxia não está indicada, entretanto, naquelas<br />

com risco aumentado deve-se manter a profilaxia<br />

farmacológica (ou mecânica se contraindicação) após o parto,<br />

enquanto hospitalizada;<br />

2. Para pacientes com alto risco e que persistem após o<br />

parto, sugere-se manter a profilaxia estendida pós-alta por<br />

no mínimo 6 semanas após o parto;<br />

12 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


3. Nas gestantes com TEV prévio, estender a profilaxia<br />

por 6 semanas após o parto (HBPM ou AVK para RNI entre<br />

2,0-3,0). Se o risco de recorrência for baixo, manter a vigilância<br />

clínica e não instituir profilaxia farmacológica durante a<br />

gestação. Se risco moderado a alto, manter a profilaxia<br />

farmacológica durante toda a gestação com HBPM.<br />

4. Em relação às trombofilias, gestantes homozigotas para<br />

o fator V de Leiden ou da mutação do gene da protrombina<br />

sem antecedente de TEV mas com história familiar positiva<br />

para TEV, profilaxia farmacológica durante toda a gestação<br />

(com HBPM) e estendida por mais 6 semanas após o parto<br />

(HBPM ou AVK para RNI entre 2,0-3,0). Para outras<br />

trombofilias, vigilância clínica durante a gestação e profilaxia<br />

farmacológica estendida após o parto.<br />

5. Naquelas homozigotas para o fator V de Leiden ou da<br />

mutação do gene da protrombina sem antecedente de TEV e<br />

sem história familiar para TEV, vigilância clínica durante a<br />

gestação e profilaxia farmacológica estendida por 6 semanas<br />

após o parto. Para outras trombofilias, somente vigilância<br />

clínica.<br />

6. Em pacientes submetidas à reprodução assistida, não<br />

se recomenda o uso de tromboprofilaxia, entretanto, se<br />

desenvolverem a síndrome de hiperestimulação ovariana,<br />

manter por 3 meses após o resolução da síndrome;<br />

7. Pacientes com síndrome do anticorpo antifosfolípide<br />

(confirmação laboratorial e história clínica de 3 ou mais<br />

abortos) recomenda-se profilaxia durante a gestação com<br />

HNF ou HBPM combinada com baixa dose de aspirina (75-<br />

100 mg/dia).<br />

8. Pacientes com prótese cardíaca valvar mecânica, manter<br />

anticoagulação com duas doses diárias de HBPM ou HNF<br />

(ajustada pelo fator antiXa ou TTPa respectivamente) ou<br />

após a 13ª semana, trocar por antagonista da vitamina K até<br />

próximo do parto. Nestes casos, o tratamento deve ser<br />

individualizado de acordo com a vontade da paciente,<br />

pesando-se os riscos entre a trombose da valva ou<br />

anormalidades fetais.<br />

Investigação<br />

Devido ao risco aumentado de TEV durante toda a<br />

gestação e puerpério, um diagnóstico acurado é<br />

imprescindível para diminuir a morbimortalidade materna e<br />

para o planejamento da anticoagulação (para que não seja<br />

instituída de forma inadequada), do parto e da profilaxia em<br />

futuras gestações, assim como para o uso de contraceptivos.<br />

A. História médica e métodos laboratoriais:<br />

A suspeita clínica nem sempre é fácil, uma vez que os<br />

sintomas sugestivos de TEV podem estar presentes durante<br />

uma gestação normal: dispneia, taquicardia, dor torácica e<br />

edema de membros inferiores (MMII). Hipoxemia e colapso<br />

circulatório são menos frequentes. 10 Os escores preditivos,<br />

como o Escore de Wells, não foram validados na gestação,<br />

desta forma, o algoritmo utilizado para não-gestantes,<br />

acessando inicialmente a probabilidade pré-clínica para<br />

determinação do melhor método diagnóstico a ser iniciado,<br />

inexiste.<br />

A utilização do D-Dímero (DD) (produto da degradação<br />

da fibrina) é controversa durante a gestação. Na população<br />

geral é comumente dosado quando da probabilidade clínica<br />

baixa e intermediária, entretanto, durante a gestação seus<br />

níveis aumentam progressivamente (aumento relativo de 39%<br />

para cada trimestre quando comparado à pré-concepção) 11 ,<br />

não sendo possível a utilização dos mesmos níveis de corte<br />

da população geral. 12 No puerpério seus níveis diminuem,<br />

mas não se normalizam até o 1 o mês. Além disto, há relatos de<br />

casos de falsos-negativos durante a gestação, não sendo<br />

um método seguro para a exclusão de TEV em gestantes. 13<br />

Em virtude do exposto, não há um consenso sobre a utilização<br />

do DD na gestação. 14-17<br />

A gasometria arterial não é um exame com boa sensibilidade<br />

nem especificidade e alcalose respiratória pode ser<br />

encontrada em gestação sem complicações. 18<br />

B. Métodos de imagem:<br />

Apesar de se evitar exames invasivos, desconfortáveis e<br />

que necessitem de radiação durante a gravidez, as possíveis<br />

complicações desses exames são menos deletérias tanto para<br />

a mãe quanto para o feto que o não diagnóstico de TEV.<br />

1.Avaliação de Trombose Venosa Profunda (TVP):<br />

Ultra-som doppler (USG):<br />

A maioria das TVP ocorrem nos MMII e pelve, sendo que<br />

a localização é diferente quando comparado gestantes e não<br />

gestantes. Nas gestantes, 82% dos trombos são na perna<br />

esquerda sendo que 71% são proximais (femoral ou ilíaca),<br />

com risco aumentado de embolização nesta topografia. 19,20.<br />

Numa revisão sistemática recente foi demonstrado que 64%<br />

das TVP ocorrem nas veias ilíaca-femorais e 17% nas ilíacas<br />

isoladamente. 20<br />

Não há escores validados, mas num estudo onde foi<br />

solicitado avaliação empírica dos médicos sobre a suspeita<br />

ou não de TVP, quando houve a suspeita clínica, a<br />

positividade para TVP foi maior, tendo sido sugerido a<br />

utilização de três regras: (1) sintomas na perna esquerda, (2)<br />

diferença da circunferência das panturrilhas > 2 cm e (3)<br />

apresentação no 1 o trimestre da gestação. 21. Apesar de não<br />

ter sido diagnosticado TVP naquelas sem nenhum dos 3<br />

sintomas e aumento da chance com a presença de um (16,4%)<br />

ou dois e três dos sintomas (58,3%), este “escore” ainda<br />

precisa de validação.<br />

O método de escolha para detecção de TVP é a USG de<br />

MMII, mas que deve ser adaptado para gestantes, ou seja,<br />

avaliação de veias proximais deve ser sempre incluída devido<br />

à maioria das TVP acontecer neste sítio. É um exame rápido,<br />

não invasivo, com sensibilidade e especificidade de 95 e<br />

96%, respectivamente, para casos de trombo em veias<br />

proximais. 22 Se a suspeita clínica for alta e a USG for negativa,<br />

repetir o exame no 3 o e 7 o dias, ou prosseguir com outros<br />

métodos de imagem. Num estudo com 149 gestantes para<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 13


Peso<br />

Enoxaparina Dalteparina Tinzaparina (75 U/Kg/dia) Heparina não fracionada<br />

< 50 Kg<br />

20 mg/dia 2500 U/dia 3500 U/dia<br />

50 – 90 Kg<br />

40 mg/dia 5000 U/dia 4500 U/dia<br />

91 – 130 Kg<br />

60 mg/dia* 7500 U/dia* 7000 U/dia*<br />

130 – 170 Kg<br />

80 mg/dia* 10000 U/dia* 9000 U/dia*<br />

> 170 Kg<br />

0,6 mg/Kg/dia* 75 U/Kg/dia* 75 U/Kg/dia*<br />

Dose profilática alta<br />

(intermediária) 50-90 Kg<br />

40 mg 12/12h 5000 U 12/12h 4500 U 12/12h<br />

Dose ajustada<br />

5000-10.000 UI 12/12h<br />

ajustado para TTPa 2-3x<br />

basal<br />

Tratamento<br />

1 mg/Kg 12/12h 100 U/Kg 12/12h 175 U/Kg/dia<br />

80 UI/kg em bolus<br />

ou1,5 mg/Kg/dia ou 200 U/Kg/dia<br />

endovenoso seguido de<br />

18UI/kg/h para TTPa 2-3x<br />

o basal<br />

* pode ser dividido em duas doses. Adaptado da referência 8,15 Tabela 3: Regimes para profilaxia e tratamento sugeridos para heparina de baixo peso molecular (via subcutânea) e heparina<br />

não-fracionada:<br />

.<br />

avaliação da positividade do USG proximal no diagnóstico<br />

de TVP, foi demonstrado que o risco de falso-negativo em 3<br />

meses deste tipo de avaliação (na suspeita clínica e seriado<br />

se negativo nos dias 3 e 7, sem introdução de anticoagulação)<br />

foi de 0,7%. 23<br />

Na suspeita de EP associada, se a USG for positiva para<br />

TVP, não há necessidade da realização de outros métodos<br />

de imagem, visto que o tratamento (anticoagulação) será o<br />

mesmo. 16<br />

Outros métodos de imagem:<br />

A ressonância magnética venosa (venoRNM) pode ser<br />

usada em casos que não foi possível chegar ao diagnóstico<br />

através da USG, sem a necessidade da utilização de contraste,<br />

principalmente para avaliação de veias proximais. Tem boa<br />

sensibilidade (87-100%) e especificidade (95-100%) para<br />

detectar obstrução na veia cava, região pélvica e MMII<br />

(menor para região abaixo do que acima dos joelhos). Sua<br />

segurança na gestação ainda não foi comprovada, mas<br />

apesar de não haver evidências de efeitos adversos,<br />

recomenda-se evitar no 1 o trimestre. 15<br />

A venografia é o método considerado padrão áureo,<br />

entretanto, devido à radiação, será utilizado somente se alta<br />

suspeita de TVP sem confirmação por outros exames. Lembrar<br />

que é um método invasivo, incômodo e em alguns estudos,<br />

mesmo com radiologistas experientes, tem chance da técnica<br />

ser inadequada ao diagnóstico em quase 20% dos casos. 24<br />

Recomendações para o diagnóstico de TVP em gestantes<br />

(baseado na ACCP 2012) 24 :<br />

1. Na suspeita de TVP distal, avaliação inicial sempre com<br />

a USG proximal em relação aos outros métodos.<br />

2. Na suspeita de TVP com USG proximal inicial negativo,<br />

reavaliar com USG no 3 o e 7 o dias ou a dosagem de DD de alta<br />

sensibilidade na apresentação sem outros exames. Se USG<br />

negativo e DD negativo ou USG seriada negativa, não realizar<br />

outros exames. Todavia, se o DD for positivo, uma avaliação<br />

adicional com repetição de USG proximal deve ser realizada<br />

predominantemente em relação à venografia ou USG perna<br />

inteira.<br />

3. Se sugestivo de TVP isolada de ilíaca e sem evidência<br />

de TVP na USG proximal, outros testes deverão ser<br />

realizados, como USG Doppler de veia ilíaca, venografia ou<br />

venoRNM do que USG seriada.<br />

2. Avaliação de Embolia Pulmonar (EP):<br />

Ao se decidir sobre qual o melhor método a ser utilizado<br />

na gestação para o diagnóstico da EP, deve-se levar em<br />

consideração os riscos-benefícios em relação à exposição à<br />

radiação ionizante materna e fetal (tabela 4), o contraste a<br />

ser utilizado (tabela 5) e na probabilidade de se fazer o<br />

diagnóstico com o método escolhido, evitando exposições<br />

subsequentes. 16,25 É considerado uma exposição menor do<br />

que 50mGy como segura. 25 O risco potencial<br />

(matematicamente calculado e não por seguimento a longo<br />

prazo) seria de carcinogênese materna para câncer de mama<br />

e de pulmão e para o feto, de leucemia. 16 Em relação ao uso<br />

de substâncias endovenosas (contraste iodado ou<br />

gadolíneo), ambas atravessam a placenta e entram na<br />

circulação fetal e líquido amniótico (tabela 5). 25 Por fim, ainda<br />

não há respostas em relação ao qual o método de escolha a<br />

ser utilizado, com acurácia semelhante entre a<br />

angiotomografia de tórax (angioTC) e a cintilografia<br />

pulmonar. Um algoritmo diagnóstico (figura 1) foi proposto<br />

como sugestão, devendo ser individualizado e adaptado<br />

conforme a situação e compreensão materna dos riscosbenefícios<br />

de cada método a ser empregado.<br />

Radiograma de tórax (Rx tórax):<br />

É um exames inespecífico, com baixa dose de radiação<br />

materno-fetal (tabela 4), que poderia contribuir para a<br />

14 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Tabela 4: Doses de radiação materna e fetal associada aos testes diagnósticos para embolia pulmonar.<br />

Teste diagnóstico<br />

Dose total permitida<br />

Rx tórax (2 incidências)<br />

Cintilografia V/Q<br />

Angio TC tórax<br />

Angiografia digital<br />

Tabela 5: Considerações e recomendações para o uso de contraste iodado e baseado com gadolíneo<br />

durante a gestação e lactação.<br />

Contraste iodado<br />

Contraste com gadolíneo<br />

Considerações<br />

Gestação<br />

1. Dados em relação à dose 1. Poucos estudos avaliaram<br />

fetal são escarsos.<br />

a exposição fetal.<br />

2. Sem relatos de má<br />

2. Não há estudos de longo<br />

formações ou efeitos<br />

prazo para avaliação de riscos<br />

colaterais em recémnascidos.<br />

em humanos.<br />

3. Pode induzir hipotireodismo 3. O gadolíneo livre pode ser<br />

neonatal.<br />

potencialmente neurotóxico.<br />

Recomendações<br />

Considerações<br />

Dose fetal (mGy)<br />

< 50<br />

0,0005-0,01<br />

0,32-0,74<br />

0,01-0,66<br />

0,5<br />

1. Triagem neonatal para<br />

hipotireodismo na 1ª sem de<br />

vida.<br />

2. A indicação da utilização do<br />

contraste deve ser<br />

imprescindível para o<br />

diagnóstico.<br />

3. O consentimento informado<br />

sobre os riscos e benefícios<br />

deve ser obtido.<br />

Lactação<br />

1. A dose absorvida pelo<br />

lactente através do leite<br />

materno é 0,5% da dose<br />

materna.<br />

2. A amamentação após o<br />

contraste é segura.<br />

Recomendações 1. Mães “preocupadas” podem<br />

ser instruídas a desprezar o<br />

leite por 24h após o contraste.<br />

Adaptado da referência 25 .<br />

exclusão de diagnósticos alternativos, como pneumotórax.<br />

Entretanto, sua maior importância é em relação ao próximo<br />

método diagnóstico a ser escolhido para a investigação, ou<br />

seja, se normal, aumenta a chance de diagnóstico por<br />

cintilografia e, se alterado, pela angioTC. 16,26<br />

Dose de radiação (mGy)<br />

< 0,1<br />

0,1-10<br />

0,1-10<br />

0,1-10<br />

Dose materna (dose total efetiva<br />

para o corpo todo em mSv)<br />

1. É consenso de que o<br />

gadolíneo não deve ser usado<br />

na gestação a menos que os<br />

benefícios ultrapassem os<br />

riscos.<br />

1. Aproximadamente 0,01% é<br />

excretado pelo leite materno.<br />

2. A amamentação após o<br />

contraste é segura.<br />

0,1<br />

1-2,5<br />

4-18<br />

7-28<br />

Abreviaturas: Rx: radiograma; V/Q: ventilação e perfusão; TC: tomografia computadorizada. Adaptado da referência 16,25 .<br />

1. Mães “preocupadas” podem<br />

ser instruídas a desprezar o<br />

leite por 24h após o contraste.<br />

Cintilografia de ventilação-perfusão (V/Q)<br />

É um método diagnóstico que utiliza radioisótopos<br />

endovenoso e inalatório. Apesar da utilização da perfusão e<br />

da ventilação aumentarem a probabilidade de diagnóstico,<br />

um Rx tórax normal prescinde a fase de ventilação, diminuindo<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 15


Fig. 1: Algoritmo diagnóstico para suspeita de embolia pulmonar na gestação.<br />

Vide texto para maiores explicações. Abreviaturas: MMII: membros inferiores; USG: ultra-som doppler; Rx tórax: radiograma de tórax;<br />

angio TC: angiotomografia computadorizada de tórax; V/Q: cintilografia de ventilação-perfusão. Adaptado das referências 8 e 16 .<br />

à exposição materno-fetal com resultados normal ou de alta<br />

probabilidade em 94-96% dos casos com valor preditivo<br />

negativo de 100%. 16,26 A radiação materna, especialmente<br />

nos seios, é 40 vezes menor quando comparado à angioTC.<br />

A exposição fetal está dentro do aceitável (< 50mGy) (tabela<br />

4). Dose usuais de radioisótopos não expõem o feto a doses<br />

altas, entretanto, quando utilizado durante a amamentação,<br />

o leite deve ser desprezado nas próximas 12h. 16,17,25<br />

Angiotomografia computadorizada de tórax (angioTC)<br />

A angioTC tem boa sensibilidade e especificidade (83 e<br />

95%, respectivamente), mas com exposição materna e dos<br />

seios um pouco maior do que a cintilografia, mas com uma<br />

menor dose fetal. Para minimizar à exposição materno-fetal<br />

pode-se utilizar protocolos de baixa dosagem sem que isto<br />

prejudique a qualidade da imagem (tabela 4). 16,25 A vantagem<br />

da angioTC é a possibilidade de diagnósticos alternativos,<br />

como pneumonia e edema pulmonar e a menor chance de<br />

não-diagnóstico em relação à cintilografia. 16 Há estudos que<br />

comprovam que a cintilografia tem maior acurácia que a<br />

angioTC, com a ressalva de que os estudos foram<br />

retrospectivos e sem a técnica multi-detectora (MDTC). Um<br />

estudo retrospectivo utilizando esta técnica 27 (MDTC com 4<br />

canais) em 343 gestantes detectou TEV em 2,9% dos casos<br />

(9 pacientes), sendo que entre os resultados negativos, a<br />

técnica mostrou-se adequada (boa imagem obtida) em 79,1%<br />

e inadequada em 20% (a maioria no nível subsegmentar). No<br />

acompanhamento de 3 meses ou 6 semanas de pós-parto<br />

após a exclusão do diagnóstico de EP, nenhuma paciente<br />

apresentou eventos sintomáticos de TEV, demonstrando ser<br />

uma técnica segura para excluir EP em gestantes.<br />

Angioressonância magnética de tórax (angioRNM):<br />

Não há estudo de acurácia ou manejo de EP em gestantes<br />

utilizando a angioRNM. Na população geral, a técnica foi<br />

considerada inadequada para avaliação em 25% dos casos.<br />

Durante a gestação, o uso de contraste com gadolíneo tem<br />

contra-indicação relativa (tabela 5), visto que não se sabe<br />

ao certo os riscos impostos ao feto a longo prazo, uma vez<br />

que tem maior tempo de recirculação, além do risco em animais<br />

de teratogenicidade e neurotoxicidade. A utilização da<br />

angioRNM durante a gestação só deve ser feita em casos<br />

excepcionais. 16,25<br />

Tratamento para TEV<br />

O tratamento a ser instituído tanto para TVP quanto para<br />

EP será o mesmo assim como seguirá recomendação<br />

semelhante para pacientes não-gestantes. A ACCP 2012<br />

16 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


ecomenda o uso de HBPM em relação aos outros<br />

anticoagulantes uma vez que foi demonstrada eficácia e<br />

segurança nesta população. 28 Além disso, é uma classe com<br />

melhor biodisponibilidade, maior meia-vida, dose-resposta<br />

mais previsível e maior segurança materna em relação à<br />

osteoporose e à trombocitopenia. 8 Também é mais<br />

conveniente para ser utilizada em relação às HNF devido à<br />

possibilidade de ser aplicada uma vez ao dia e sem<br />

necessidade de monitoramento. A dose deverá ser ajustada<br />

para o peso, podendo ser aplicada uma ou duas vezes ao<br />

dia. 8,15,17 Ainda é controverso se após um período inicial de<br />

anticoagulação plena, se a dose poderia ser reduzida para<br />

uma dose intermediária ou 75% da dose plena. A manutenção<br />

do tratamento deverá ser por no mínimo 3 meses. 8<br />

A HNF ficará reservada para pacientes instáveis com TEP<br />

maciço, para pacientes em trabalho de parto ou aquelas com<br />

alto risco de sangramento (seu efeito poderá ser revertido<br />

com o uso de protramina e plasma fresco congelado), alergia<br />

à heparina ou insuficiência renal importante. A dose sugerida<br />

para HNF é de 80 UI/kg como dose de ataque e infusão<br />

continua de 18 UI/Kg/h com monitorização do TTPa, para<br />

manutenção de 2-3x o valor basal. 15 A trombólise só será<br />

considerada se houver risco de morte materna. 8<br />

Na proximidade do parto, o tratamento deverá ser utilizado<br />

de acordo com a decisão da equipe multidisciplinar (obstetra,<br />

hematologista, pnemologista e anestesiologista). Idealmente,<br />

o parto deverá ser programado, seja por indução ou por cesárea<br />

eletiva, mas não há contra-indicação se a opção for de parto<br />

espontâneo. 8,15,17 Para se evitar risco de sangramentos<br />

indesejados em partos planejados, no regime de duas vezes ao<br />

dia de HBPM ou HNF, a dose deverá ser suspensa 24h antes,<br />

se estiver recebendo uma dose de HBPM, a paciente receberá<br />

50% da dose no dia anterior ao parto. Naquelas pacientes que<br />

desejarem parto espontâneo, o bloqueio neuroaxial estará<br />

contra-indicado. Naquelas com alto risco de TEV ou de<br />

sangramento, o parto deverá ser planejado e sugere-se trocar a<br />

HBPM por HNF endovenosa, sendo suspensa 4-6h antes do<br />

parto ou do bloqueio epidural. A anticoagulação deverá ser<br />

reintroduzida após o parto, sendo 6-12 horas após parto vaginal<br />

e 12-24h se cesárea, se não houver sangramentos. 8,15,17<br />

1. Complicações maternas da terapia anticoagulante: 8<br />

As possíveis complicações maternas com a terapia<br />

anticoagulante na gestação são as mesmas vistas em<br />

pacientes não-gestantes.<br />

Heparina não-fracionada (HNF): Durante a gestação, a<br />

resposta do TTPA é amenizada devido ao aumento de fatores<br />

que se ligam à heparina, do fator VIII e do fibrinogênio. A<br />

taxa de sangramento pré-parto em gestantes atinge 1%<br />

(semelhante em não gestantes). Quando feito por via<br />

subcutânea, pode haver um efeito anticoagulante<br />

prolongado, devendo seu uso ser mais cauteloso antes do<br />

parto. A HIT não é incomum (em não-gestantes o risco é de<br />

3%). O uso prolongado (> 1 mês) parece ter relação com o<br />

aparecimento de osteoporose. Reações cutâneas adversas<br />

como hematomas, lesões urticariformes, vasculites e necrose<br />

de pele também podem acontecer.<br />

Heparina de baixo peso molecular (HBPM): A frequência<br />

de sangramento significante em gestante atinge 1,98%<br />

durante toda a gestação. A incidência de osteoporose e lesões<br />

cutâneas também é menor quando comparada a da HNF.<br />

2.Complicações fetais da terapia de anticoagulação: 8<br />

Antagonistas da vitamina K (AVK): são capazes de<br />

ultrapassar a placenta e podem acarretar em perda fetal,<br />

hemorragia e teratogenicidade, especialmente quando usados<br />

no primeiro trimestre da gestação.<br />

Heparinas: Tanto a HNF quanto e HBPM não atravessam<br />

a placenta e não têm o potencial de gerar sangramento ou<br />

teratogenicidade no feto, apesar de facilitar o sangramento<br />

na junção útero-placentária.<br />

Outros anticoagulantes: em relação aos pentas-sacarídeos,<br />

inibidores parenterais diretos da trombina, novos inibidores<br />

orais diretos da trombina e do fator anti Xa ainda não há<br />

evidências suficientes dos riscos fetais, devendo ser evitados<br />

na gestação. Há alguns casos reportados com o fondaparinux,<br />

mas utilizado no final da gestação, entretanto, a droga atravessa<br />

a placenta, não sendo possível afastar riscos para o feto.<br />

Conclusão<br />

O TEV é uma das principais causas de morbi-mortalidade,<br />

mas muitas vezes subdiagnosticado, principalmente durante<br />

a gestação. Não há contra-indicação (avaliando sempre o<br />

período gestacional) para o uso de métodos diagnósticos<br />

que usem radiação ou contraste ou a utilização de<br />

anticoagulantes, devendo sempre pesar os riscos-benefícios<br />

de forma minimizar riscos potenciais para o feto e a mãe. É<br />

de extrema importância que todas as condutas em relação à<br />

prevenção, diagnóstico e tratamento do TEV sejam<br />

esclarecidos e compartilhados com a mãe, de forma a se<br />

optar pela melhor decisão.<br />

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Eloara Vieira Machado Ferreira<br />

eloaravmf@yahoo.com.br<br />

18 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Infecções respiratórias durante<br />

a gestação<br />

AUTORES: Flávio Arbex 1 , Mauro Gomes 2<br />

1Pós-graduando da Programa de Pós-Graduação em Pneumologia( da Unifesp/Escola Paulista de<br />

Medicina (EPM)<br />

2Professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e medico do Ambulatório<br />

de DPOC da Disciplina de Pneumologia( da Unifesp/EPM<br />

Introdução<br />

A pneumonia é uma das principais causas de internação<br />

hospitalar no Brasil, com cerca de dois milhões de casos e<br />

um milhão de internações ao ano segundo o DATASUS. 1<br />

Apesar dos avanços na terapêutica antimicrobiana e em<br />

terapia intensiva, a pneumonia que ocorre durante a gestação<br />

ainda associa-se com significante morbidade e mortalidade<br />

maternofetal. 2 Na gestante, a pneumonia é a terceira causa<br />

mais frequente de morte por fatores não obstétricos e é a<br />

causa mais importante de infecção não obstétrica. 3,4 Estudos<br />

recentes mostram que a pneumonia em gestantes não é mais<br />

comum ou mais grave em relação à população geral, todavia,<br />

por afetar mãe e filho, pode levar a um aumento na<br />

probabilidade de partos e puerpérios complicados quando<br />

comparamos com grávidas nas quais a infecção não está<br />

presente. 4 Além disso, a pneumonia durante a gestação<br />

aumenta a probabilidade de parto prematuro, necessidade<br />

de tocólise, de baixo peso ao nascer e de mortalidade fetal. 2<br />

Antes de 1965, a incidência de pneumonia em grávidas<br />

era de 6,5-8,5/1000 partos, taxa esta que declinou para 0,44-<br />

0,78/1000 partos entre o final da década de 1970 e o início de<br />

1980. 5 Estudos recentes mostraram um novo aumento na<br />

incidência devido à possibilidade de mulheres com moléstias<br />

crônicas como, por exemplo,a AIDS, estarem aptas a<br />

engravidar, além do aumento do uso de drogas ilícitas durante<br />

a gravidez. 4 (Tabela 1)<br />

Tabela 1: Incidência de pneumonia em gestantes em várias séries<br />

Estudo<br />

Ano de publicação<br />

Cenário<br />

Benedetti et al<br />

1982 89.219 partos em um hospital universitário<br />

Madinger et al<br />

1989 32.179 em hospital comunitário<br />

Berkowitz e LaSalsa 1990 1120 registros de casos em hospital geral<br />

Munn et al<br />

1999 Estudo comparativo para identificar fatores<br />

de risco associados a Pneumonia na<br />

Gestação (59 casos VS 118 controles)<br />

Jin et al<br />

2003 Incidência de pneumonia na província de<br />

Alberta, Canadá<br />

Fonte: adaptado de Brito V, 2011 (4)<br />

Fisiologia<br />

A gravidez produz no organismo materno uma série de<br />

alterações mecânicas, fisiológicas e bioquímicas em diversos<br />

órgãos e sistemas, incluindo o respiratório.Essas alterações<br />

apresentam-se desde o início da gravidez, persistem até o<br />

puerpérioe devem ser conhecidaspara uma melhor avaliação das<br />

queixas cardiorrespiratórias e/ou doenças pulmonares na gestante.<br />

No início da gravidez há alterações nas vias aéreas<br />

superiores em consequência da elevação dos níveis de<br />

estrogênio, tais como edema, hiperemia, congestão,<br />

fragilidade capilarde mucosa e hipersecreção nasal,<br />

caracterizando uma rinite hormônio-dependente. Essas<br />

modificações afetam 30% das mulheres grávidas,<br />

independente de história prévia de atopia ou do relato em<br />

gestações anteriores, persistem durante todo o período<br />

gestacional e atingem o pico no terceiro trimestre.Obstrução<br />

nasal, espirros, epistaxe, mudança na tonalidade da voz e<br />

respiração bucal são queixas frequentes. Adicionalmente<br />

pode ocorrer diminuição do diâmetro da faringe segundo os<br />

critérios de Mallapanti. Usualmente esse quadro é refratário<br />

ao tratamento e desaparece 48h após o parto. 6,7<br />

Na gestação também ocorrem modificações na<br />

conformação torácicae abdominalda gestante, com<br />

consequente modificação na mecânica respiratória e<br />

diminuição da expansibilidade pulmonar, o que altera os<br />

volumes e capacidades pulmonares. 6,7,8,9<br />

Resultados<br />

0,4 por 1000<br />

0,78 por 1000<br />

2,72 por 1000<br />

0,78 – 2,7 por 1000<br />

1,47 por 1000<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 19


Tabela 2: Efeitos da gravidez na fisiologia respiratória<br />

Vias aéreas<br />

Tórax<br />

Abdômen<br />

Sistema Cardiovascular<br />

Fonte: Adaptado de Hanania, 2006 (10)<br />

Anatômicas<br />

Edema, fragilidade de mucosa, Rinite.<br />

Aumento do diâmetro e ângulo subcostal,<br />

elevação do diafragma.<br />

Uterino<br />

Complacência<br />

Aumento da massa do VE<br />

Volume sanguíneo<br />

Concomitantemente, a progesterona estimula o centro<br />

respiratório levando a hiperventilação e aumento do volume<br />

corrente (VC) e do volume-minuto (VM), sem alterações na<br />

frequência respiratória (f). Isso resulta em alcalose respiratória<br />

moderada, compensada pelo aumento da excreção renal de<br />

bicarbonato e queda dos valores séricos para cerca de 20<br />

mEq/L. O consumo de oxigênio aumenta 20-30% devido às<br />

maiores necessidades metabólicas.Como a alcalose altera a<br />

curva de dissociação da hemoglobina, a grávida com<br />

doenças pulmonares hipoxêmicas tem uma liberação de<br />

oxigênio diminuída nos tecidos. 6,8,9<br />

Essas alterações podem explicar o número de queixas<br />

subjetivas de dispneia durante a gestação. A dispneia tem<br />

sido relatada em cerca de 60%-70% das gestantes saudáveis,<br />

sendo mais intensa no terceiro trimestre, 9 o que dificulta ou<br />

retarda o diagnóstico de doenças cardiorrespiratórias<br />

subjacentes. (Tabela 2)<br />

Imunologia<br />

O maior fator predisponente para pneumonias graves em<br />

gestantes é o fator imunológico. A despeito de a imunidade<br />

humoral permanecer inalterada, há uma alteração na<br />

imunidade celular para permitir a sobrevivência do feto. Há<br />

decréscimo na resposta proliferativa dos linfócitos, na<br />

atividade das células natural killer e no número de células<br />

T4 helper. Há um bloqueio na secreção de citocinas e na<br />

resposta linfoproliferativa aos antígenos. Além disso, os<br />

linfócitos fetais podem inibir a resposta imunitária materna<br />

por supressão das células T e substâncias produzida pelo<br />

trofoblasto bloqueiam o reconhecimento materno dos<br />

antígenos fetais de histocompatibilidade maior (MHC). Essas<br />

alterações, mais intensas no segundo e terceiro trimestre<br />

podem, em tese explicam a suscetibilidade aumentada da<br />

gestante a pneumonias graves, pneumonias virais, fúngicas<br />

e à tuberculose. 3,4,10 (Tabela 3)<br />

A gestação também predispõe para a possibilidade de<br />

pneumonia por aspiração. Mendelson originariamente<br />

descreveu a síndrome avaliando a refluxo e a aspiração de<br />

material gástrico no trabalho de parto. A síndrome de<br />

Mendelson já foi causa de 2% de todas as mortes maternas.<br />

Funcionais<br />

Aumento do drive respiratório e hiperventilação<br />

VR<br />

CRF<br />

CV preservada<br />

Alcalose Respiratória<br />

Oxigenação normal<br />

Aumento do Debito Cardíaco<br />

Tabela 3: Alterações na gravidez que levam aumento da<br />

incidência e risco de complicações por pneumonia<br />

Alterações Imunológicas<br />

Proliferação de linfócitos<br />

Citotoxidade mediada por células<br />

Células T helper<br />

Resposta linfocítica<br />

Alterações Maternas<br />

Consumo de Oxigênio<br />

Elevação diafragma<br />

Aumento no risco de aspiração<br />

Hábitos e Doenças Associadas<br />

Tabagismo<br />

Anemia<br />

Asma<br />

Fibrose Cística<br />

Drogas ilícitas<br />

HIV<br />

Infecção Viral por Influenza<br />

Terapia e doenças imunossupressoras<br />

Durante o trabalho de parto<br />

Aumento do risco de pneumonia aspirativa<br />

Adaptado de Brito, 2011 (4)<br />

A grávida está predisposta a aspiração do material gástrico<br />

por meio de dois mecanismos: (1) elevação da pressão<br />

intragástrica devido ao aumento uterino; (2) relaxamento do<br />

esfíncter esofagiano consequente ao aumento da<br />

concentração sanguínea de progesterona e do esvaziamento<br />

gástrico lento que acompanha a gravidez. 4<br />

Pneumonia bacteriana<br />

Os fatores que aumentam o risco de pneumonias em<br />

grávidas incluem asma brônquica, uso de corticóides,<br />

anemia, necessidade de tocólise 1,4 - Tabela 3. Os patógenos<br />

mais comumente envolvidos costumam ser os mesmos da<br />

pneumonia comunitária em não gestantes:<br />

Streptococcuspneumoniae, Mycoplasma pneumoniae,<br />

Chlamydia pneumoniae, Haemophillus influenza e, menos<br />

20 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


frequentemente, Legionellapneumophilla e vírus (influenza<br />

e varicela), além da pneumonia por aspiração, especialmente<br />

no pós parto (1,4) - (Tabela 4).<br />

Tabela 4: Etiologia das pneumonias bacterianas na gravidez<br />

(ordem decrescente)<br />

Streptococcus pneumoniae<br />

Haemophilus influenzae<br />

Patógeno não identificado<br />

Patógenos Atípicos<br />

Legionellapneumophila<br />

Mycoplasma pneumoniae<br />

Chlamydophila pneumoniae<br />

Patógenos Virais<br />

Influenza A<br />

Varicela<br />

Staphylococcus aureus<br />

Pseudomonas aeruginosa (bronquiectasia, fibrose<br />

cística)<br />

Aspirativa<br />

Fúngica<br />

Pneumocystisjiroveci (HIV)<br />

Adaptado de Brito, 2011 (4)<br />

Diagnóstico<br />

Os sintomas característicos da pneumonia na gestante<br />

não diferem da pneumonia na população geral, tais<br />

comodispneia, febre, dor torácica e tosse. O que pode ocorrer<br />

comumente é um retardo no diagnóstico (10 a 20%) pela<br />

interpretação inadequada de sintomas respiratórios comuns<br />

na gestação normal. 6 O diagnóstico diferencial deve incluir<br />

pielonefrite, embolia pulmonar, edema agudo de pulmão,<br />

apendicite e cardiopatias, em particular a estenose mitral. 1<br />

O raio-X de tórax deve ser realizado com proteção<br />

abdominal e não há justificativa para não realizá-lo, uma vez<br />

que a dose de radiação é mínima e inócua para o feto. 1<br />

Tratamento<br />

Devido às poucas evidências sobre a segurança do uso<br />

durante a gestação, alguns antibióticos devem ser evitados<br />

tais como as quinolonas, claritromicina, tetraciclinas e o<br />

estolato de eritromicina. 1 Para estabelecer padrões de<br />

segurança para o uso de fármacos durante a gestação e<br />

fornecer aos médicos referências para a prescrição, o FDA<br />

(FoodandDrugAdministration) divide os fármacos em cinco<br />

categorias (Tabela 5). Para o tratamento ambulatorial da<br />

pneumonia comunitária na gestante podem ser<br />

empregados:<br />

1- Amoxicilina 500–1000mg via oral de 8 em 8 horas por 10<br />

a 14 dias, ou<br />

2- Eritromicina (estearato) 500mg via oral de 6 em 6 horas<br />

por 10 a 14 dias, ou<br />

3- Azitromicina 500mg ao dia por 7 a 10 dias<br />

Tabela 5: Antibióticos e suas categorias quanto a aprovação<br />

do FDA para segurança do uso na gestação.<br />

Antibiótico Passagem pela<br />

barreira placentária<br />

FDA<br />

Aciclovir B<br />

Amicacina + C/D<br />

Amoxacilina ++ B<br />

Amoxacilina/Ácido clavulânico ? B<br />

Ampicilina +++ B<br />

Ampicilina/Sulbactam ? B<br />

Anfotericina B B<br />

Azitromicina + B<br />

Aztreonam + B<br />

Caspofungina ++ C<br />

Cefadroxil +++ B<br />

Cefalexina +++ B<br />

Cefazolina +++ B<br />

Cefepima ++ B<br />

Cefotaxima + B<br />

Ceftazidima ++ B<br />

Ceftriaxona + B<br />

Cefuroxima ? B<br />

Cloranfenicol +++ C<br />

Ciprofloxacino +++ C<br />

Claritromicina ? C<br />

Clindamicina ++ B<br />

Cotrimazol +++ C<br />

Doxiciclina ++ D<br />

Gentamicina D<br />

Ertapenem ? B<br />

Eritromicina ? B<br />

Estreptomicina D<br />

Etambutol +++ B<br />

Etionamida ? C<br />

Fluconazol ++ C<br />

Fosfomicina ++ B<br />

Gentamicina ++ C<br />

Imipenem/Cilastina +++ C<br />

Isoniazida +++ B/C<br />

Levofloxacina +++ C<br />

Itraconazol C<br />

Linezolida ? C<br />

Meropenem ? B<br />

Metronidazol +++ B<br />

Moxifloxacina ? C<br />

Norfloxacina ? C<br />

Ofloxacina ? C<br />

Oseltamivir C<br />

Oxacilina + B<br />

Penicilina G/V B<br />

Piperacilina/Tazobactam ? B<br />

Pirazinamida ? C<br />

Polimixina B ?<br />

Rifampicina ++ C<br />

Sulfametaxazol/Trimetropim +++ C<br />

Teicoplamina ? C<br />

Vancomicina +++ C<br />

Voriconazol D<br />

Fonte: adaptado das referências (21)(22)(23)<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 21


Obervações<br />

• Categoria A: Estudos controlados conduzidos em<br />

mulheres não demonstraram risco para o feto no primeiro<br />

trimestre de gestação (também não há risco durante os<br />

trimestres subsequentes) e a possibilidade de dano ao feto<br />

parece remota<br />

•Categoria B: Estudos de reprodução animal não<br />

demonstraram riscos de malformações fetais. Não existem<br />

estudos controlados em gestantes ou em animais que<br />

demonstraram algum efeito adverso e não foram confirmados<br />

em estudos controlados conduzidos em humanos<br />

•Categoria C: Estudos conduzidos em animais têm<br />

demonstrado efeitos adversos nos fetos, como malformações<br />

ou embriotoxicidade ou não há estudos controlados em<br />

humanos<br />

• Categoria D: Existe forte evidência de risco fetal, porém<br />

os benefícios do uso na gestante podem superar o risco<br />

para o feto<br />

• Categoria X: Forte evidência de risco fetal. Estudos em<br />

animais e humanos têm demonstrado anormalidades fetais.<br />

O risco do uso desses fármacos durante a gestação supera<br />

qualquer possível benefício.2 0<br />

Pelo risco aumentado de edema agudo de pulmão e<br />

alterações de vitalidade fetal por hipóxia, a internação não<br />

deve ser postergada para gestantes com evidências, ainda<br />

que duvidosas, de comprometimento respiratório mais grave<br />

(1). Em gestantes internadas deve ser colhido escarro para<br />

bacterioscopia e cultura, hemocultura, hemograma<br />

egasometria arterial, além de se checar o status sorológico<br />

para o HIV. Não há indicação de antecipação do parto, o que<br />

pode agravar a condição clínica materna. 1 Para as gestantes<br />

que necessitem de internação hospitalar podem ser<br />

empregados:<br />

1- Amoxicilina-clavulanato 500mg EV de 8 em 8 horas, ou<br />

2- Ceftriaxone1g-12/12h, associado ou não a Azitromicina.<br />

Infecções virais respiratórias na gestante<br />

Varicela e influenza são os patógenos que mais comumente<br />

se associam a pneumonia virótica na gravidez, que pode se<br />

complicar com insuficiência respiratória aguda, infecção<br />

bacteriana secundária e síndrome dodesconforto respiratória<br />

no adulto (SDRA). Infecções pelo coronavírus foram<br />

recentemente descritas e também possuem alta letalidade. 2,3,4<br />

Influenza<br />

O vírus influenza pertence à família dos Ortomixovírus e é<br />

composto por RNA de hélice única. É subdividido em tipos<br />

A, B, C e classificado, ainda, com base em seus constituintes<br />

de superfície: HA (hemaglutinina) e NA (neuraminidase). Os<br />

tipos A e B causam maior morbidade e mortalidade do que o<br />

tipo C, sendo o tipo A, geralmente, mais associado às<br />

epidemias e pandemias. 11<br />

A gestante apresenta um alto risco de contrair a influenza.<br />

O risco aumenta com a idade, com doenças associadas e no<br />

terceiro trimestre. A influenza está historicamente associada<br />

a aumento importante de morbidade e mortalidade na<br />

gestação. Durante a pandemia de “gripe espanhola” (A/<br />

H1N1), em 1918, 1350 gestantes com a doença foram<br />

avaliadas, sendo que 43% apresentaram pneumonia como<br />

complicação e, destas, em 52% foi necessário interromper a<br />

gravidez. A mortalidade (23%) foi maior quando a infecção<br />

ocorreu no terceiro trimestre ou a paciente apresentava<br />

pneumonia. 12,13 Metade das gestantes que desenvolveram<br />

pneumonia morreu enquanto a taxa foi de 30% entre as não<br />

grávidas. 14 Durante a epidemia global de 1957 [A/Ásia<br />

(H2N2)], na cidade de Nova Iorque, as gestantes contribuíram<br />

com metade das mortes das mulheres em idade fértil. 13 Estudo<br />

realizado no Reino Unido avaliou 1659 gestantes e 11%<br />

apresentaram evidência sorológica de infecção por influenza<br />

durante a gestação. 14<br />

Na última epidemia pelo influenza A-H1N1, em 2009,<br />

segundo o CDC, metade dos pacientes que requerem<br />

internação apresentaram doenças associadas ou eram<br />

gestantes, com maior risco de morbidade e mortalidade em<br />

gestantes. O impacto no recém-nato é desconhecido, mas a<br />

experiência prévia sugere maior risco de doença grave. Há<br />

também maior chance de abortamento espontâneo e parto<br />

pré-termo. No Brasil, dados do Ministério da Saúde<br />

destacaram que, entre as mulheres, houve o percentual de<br />

39,5% de gestantes, dentre os casos de Síndrome Respiratória<br />

Aguda Grave, que evoluíram para óbito.<br />

O quadro clínico da influenza na grávida não difere da<br />

não grávida e a pneumonia é a complicação mais comum nas<br />

gestantes. 3 O período de incubação é de 1 a 4 dias e os<br />

sintomas incluem tosse, febre, indisposição, rinite, mialgias,<br />

cefaleia e tosse seca.Os sinais incluem taquipneia, rubor<br />

facial, adenopatia cervical. As hospitalizações por influenza<br />

aumentam cerca de cinco vezes nas grávidas no terceiro<br />

trimestre, em comparação com as mulheres não grávidas. 12,13,14<br />

Clinicamente, é difícil distinguir a pneumonia bacteriana<br />

daquela por influenza. 14 Comumente ocorre um agravamento<br />

do quadro clínico com queda na saturação de oxigênio. Os<br />

exames radiológicos demonstram um processo intersticial<br />

difuso, embora não seja rara a ocorrência de<br />

consolidações(Figura 1). Podem ocorrer infecções bacterianas<br />

secundárias como otite, sinusite, pneumonia e, nessa situação,<br />

é necessária a introdução de antibióticos apropriados. 3 Doenças<br />

associadas como asma, diabetes, doenças cardiovasculares,<br />

tabagismo e obesidade aumentam o risco de pneumonia e/<br />

ou hospitalização em gestantes com influenza. 14<br />

O tratamento inclui repouso e cuidados de suporte. A<br />

febre pode ser controlada com acetaminofeno. 13 Existem dois<br />

grupos de drogas antivirais com efetividade nessa doença:<br />

• análogos do aminoadamantano (amantadina e<br />

rimantadina):não têm atividade contra o vírus B e apresenta<br />

resistência crescente para o vírus A. Em anos recentes, sua<br />

utilização não temsido mais recomendada nos Estados<br />

Unidos 14 ;<br />

• inibidores da neuraminidase viral (zanamivir e<br />

22 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Fig. 1:Pneumonia em infecção pelo influenza A-H1N1 e mulher grávida. Condensação com broncogramas aéreos na língula, demonstrando<br />

que as lesões predominam no lobo superior esquerdo<br />

oseltamivir): tem atividade contra os vírus A e B. 13 O oseltamivir<br />

via oral é utilizado para tratamento e quimioprofilaxia. O início<br />

do tratamento deve serem 48h após os primeiros sintomas e a<br />

dose recomendada é de 75 mg duas vezes ao dia, por cinco<br />

dias. Para quimioprofilaxia, a dose recomendada é de 75mg 1x<br />

ao dia durante 10 dias. O zanamivir é utilizado por via inalatória<br />

e apresenta broncoespasmo em asmáticos como efeito<br />

colateral importante. 12,13<br />

Varicela Zoster<br />

Apesar de a varicela ser considerada uma enfermidade<br />

que afeta principalmente as crianças, 5 a 10% ocorrem após<br />

a idade de 15 anos e afeta as grávidas na proporção de 5-7<br />

em cada 10000 gestações. Dez a vinte por cento das mulheres<br />

com infecção primária por varicela podem desenvolver uma<br />

pneumonia fulminante. 13 Antes da introdução da terapêutica<br />

antiviral, a mortalidade materna em casos de pneumonia por<br />

varicela era maior que 40%, mas, ainda hoje, apesar da<br />

terapêutica a mortalidade aindaé preocupante (14%). 13,14<br />

São considerados fatores de risco para pneumonia por<br />

varicela o tabagismo, gestação tardia e a presença de mais<br />

de 100 lesões cutâneas. Os sinais e sintomas respiratórios<br />

surgem de 2 a 5 dias após o rash cutâneo e a febre e incluem<br />

dispneia, taquipneia, tosse, hemoptóicos e dor torácica. O<br />

RX de tórax pode mostrar um processo intersticial difuso<br />

com o padrão reticulonodular. A ventilação mecânica pode<br />

ser necessária em 50% das pacientes. 13,14 Apesar de alguns<br />

estudos sugerirem que a pneumonia por varicela aumenta a<br />

possibilidade de parto prematuro, ainda há controvérsias. 13<br />

O manejo da exposição materna à varicela depende do<br />

estado imunológico da gestante. Infecção e vacinação prévia<br />

comprovada ou IgG sérica contra varicela conferem<br />

imunidade e não há risco pela exposição. No entanto, se a<br />

gestante não apresentar imunidade, imunoglobulina humana<br />

antivaricela zoster dever ser administrada em até 96 horas<br />

com o intuito de atenuar ou prevenir a infecção materna. A<br />

vacina é contraindicada. Gestante com varicela primária deve<br />

fazer uso de aciclovir (800 mg) na tentativa de prevenir<br />

complicações como a pneumonia, sendo mais efetivo se<br />

administrado em até 24 após o inicio do rash. Se a gestante<br />

apresentar sintomas respiratórios, é aconselhável a utilização<br />

de aciclovir parenteral (5-10 mg/kg cada 8h durante 7-10<br />

dias). Há maior eficácia se administrado nas primeiras 72h<br />

após o inicio da doença ou 24h após o inicio do rash. 13,14,15<br />

Coronavirus<br />

Síndrome respiratória aguda grave causada pelo<br />

coronavirus é uma nova enfermidade virótica descrita em<br />

2002. O vírus causa uma pneumonia atípica que evolui<br />

rapidamente para falência respiratória. Segundo a<br />

Organização Mundial de Saúde no período compreendido<br />

entre novembro de 2002 e julho de 2003 afetou 8.098<br />

indivíduos e provocou 774 mortes em 26 países a nível<br />

mundial. 16 A transmissão se faz através de gotículas<br />

respiratórias ou contato pessoal próximo. O vírus se mantém<br />

ativo por 1 a 2 dias na urina ou nas fezes. Os sintomas são os<br />

mesmos para a grávida e a não grávida e inclui febre,<br />

tremores, calafrios, indisposição e mialgias. O RX de tórax<br />

mostra, frequentemente, infiltrado intersticial difuso. Exames<br />

laboratoriais mostram diminuição na saturação de oxigênio,<br />

linfopenia e trombocitopenia, elevação das<br />

aminotransferases (2 a 6 seis vezes acima dos valores de<br />

referência) e da CPK (acima de 3000 UI/l). Três testes (ELISA,<br />

PCR e IFI) têm sido utilizados para o diagnóstico etiológico,<br />

porém nenhum deles ainda se mostrou útil para a detecção<br />

precoce de casos. 3,13<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 23


As complicações mais frequentes são: insuficiência<br />

respiratória necessitando de ventilação mecânica, infecção<br />

bacteriana secundária e coagulação intravascular<br />

disseminada, aborto espontâneo no primeiro trimestre, parto<br />

prematuro e recém-nato de baixo peso. Não foi relatada<br />

transmissão vertical. O tratamento inclui antibióticos de largo<br />

espectro para infecções bacterianas secundárias, altas doses<br />

de corticosteróides e, possivelmente, ribavirina. A ribavirina<br />

tem efeitos tetarogênicos em animais e o uso na gestação<br />

ainda não está bem estabelecido. 4<br />

Pneumonia na gestante imunodeprimida<br />

Mais de 80% de todos os casos de infecção por HIV<br />

atinge mulheres em idade fértil. A gravidez pode,<br />

teoricamente, acelerar a progressão da infecção por HIV e<br />

infecções respiratórias na gestação pode aumentar o risco<br />

de mortalidade materna e fetal. 4 Além disso, a transmissão<br />

vertical para o recém-nato é ainda uma preocupação.A<br />

infecção respiratória bacteriana é a complicação mais comum<br />

na infecção por HIV.<br />

Pneumocystis jirovecy (PCP)<br />

Contagem de CD4


fúngicas é anfotericina B seguida de fluconazol no pósparto.<br />

2,4<br />

Vacinação na gestante<br />

A vacinação contra influenza deve ser recomendada para<br />

todas as gestantes e mulheres que planejam engravidar nas<br />

estações de maior prevalência de gripe. Mulheres que estejam<br />

amamentando devem também ser vacinadas. 18<br />

Com relação a vacinação contra o influenza A-H1N1,<br />

segundo o CDC, toda a população mundial a partir de 6 meses<br />

de idade deve ser vacinada assim que a vacina estiver<br />

disponível em seu país. Crianças que não completaram 6 meses<br />

e são muito jovens para serem vacinadas devem ter seus<br />

cuidadores vacinados para evitar a transmissão da doença.<br />

Além disso, a vacinação da mãe durante a gestação protege<br />

tanto ela quanto o bebê, até que ele complete seismeses 19 .<br />

Com relação à vacinação antipneumocóccica, aquela que<br />

contém os polissacarídeos capsulares dos 23 sorotipos de<br />

S. pneumoniae foi licenciada desde 1983 para uso em<br />

populações de alto risco. A imunização materna é uma<br />

estratégia com o potencial de oferecer proteção passiva ao<br />

recém-nascido durante os mais vulneráveis primeiros meses<br />

de vida, antes de imunização ativa do recém-nascido. No<br />

entanto, esta vacina é pouco imunogênica em crianças<br />

menores de dois anos de idade e, para esta população, são<br />

indicadas as vacinas conjugadas pneumocócicas,<br />

imunogênicas em lactentes jovens. A vacinação, associada<br />

ao aleitamento materno, pode ser uma abordagem útil para<br />

prevenir a infecção pneumocócica em crianças jovens.<br />

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Flávio Ferlin Arbex<br />

ffarbex@hotmail.com<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 25


É seguro realizar exames radiológicos<br />

durante a gestação ?<br />

AUTORES: Alexandre Marchini Silva 1 , Anarégia Ferreira 2 , Gustavo S. P. Meirelles 3<br />

1 Médico Radiologista do Grupo Fleury e da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo<br />

2 Residente de Pneumologia da Unifesp/Escola Paulista de Medicina (EPM)<br />

3 Médico Radiologista da Unifesp/EPM e do Grupo Fleury<br />

Introdução<br />

O emprego dos métodos de diagnóstico por imagem<br />

apresentou grande aumento nos últimos anos, com<br />

importância crescente na elaboração das mais variadas<br />

condutas terapêuticas, inclusive em pacientes gestantes.<br />

Contudo, a exposição a alguns exames diagnósticos durante<br />

a gravidez é habitualmente uma preocupação para médicos<br />

e pacientes, com informações confusas e contraditórias,<br />

resultando em ansiedade, cancelamento inadequado de<br />

procedimentos e contraindicação da utilização de meios de<br />

contraste, mesmo em casos de indicações formais.<br />

Em casos de necessidade do emprego de métodos que<br />

utilizem radiação ionizante, como estudos radiográficos,<br />

exames de tomografia computadorizada (TC) e cintilografia,<br />

bem como em ocasiões onde a ressonância magnética (RM)<br />

está indicada, é de grande importância ponderar os riscos e<br />

benefícios de tais exames. Atualmente, o que se sabe é que<br />

as doses de radiação decorrentes da exposição à maior parte<br />

dos exames é bem inferior aos limites de dose considerados<br />

seguros para o feto, dando suporte à tese que os riscos<br />

fetais são mínimos quando exames radiológicos são<br />

realizados com técnica adequada e com indicações corretas.<br />

O objetivo desta revisão é demonstrar os riscos e<br />

benefícios para o feto dos exames radiológicos mais<br />

usualmente realizados, bem como dos meios de contraste<br />

empregados em tais exames.<br />

Riscos fetais relacionados à radiação ionizante<br />

Embora o conceito de exposição à radiação esteja muito<br />

relacionado a exames radiológicos, é importante lembrar que<br />

todos os seres humanos estão expostos a uma radiação<br />

ambiental, com dose da ordem de 1,1 a 2,5 mGy por ano,<br />

proveniente da exposição aos raios cósmicos. Alguns exames<br />

radiológicos, quando realizados com técnica adequada, têm<br />

doses semelhantes ou até inferiores à exposição ambiental anual.<br />

Na paciente gestante, o cuidado deve ser maior, pois o<br />

feto está em formação e mais sujeito a eventuais efeitos<br />

deletérios da exposição à radiação. O risco fetal relacionado<br />

à exposição à radiação ionizante está ligado a 2 efeitos:<br />

estocástico e determinístico.<br />

O efeito estocástico da radiação ionizante tem origem a<br />

partir de possíveis danos celulares que possam levar a<br />

carcinogênese. Não tem limiar de dose, mas o risco de efeitos<br />

deletérios decorrentes do efeito estocástico aumenta com a<br />

dose de radiação. A estimativa atual de desenvolver câncer<br />

na infância é de aproximadamente 1:500 na população geral;<br />

doses de radiação fetal de até 1 mGy (dose inferior à recebida<br />

pelo feto, por exemplo, em uma tomografia computadorizada<br />

do tórax materno) são consideradas aceitáveis, estando<br />

ligadas a um risco incremental de carcinogênese inferior a 1<br />

em 10.000. A maioria dos exames radiológicos de estruturas<br />

anatômicas abaixo dos joelhos (por exemplo, tomografia da<br />

perna) e acima do diafragma (por exemplo, tomografia<br />

computadorizada do tórax) entra nessa categoria. A exposição<br />

estimada de radiação é baixa quando o feto está fora do<br />

campo de visão, como nas tomografias do crânio, pescoço,<br />

tórax, coluna cervical e de extremidades. Nestes casos,<br />

apenas a radiação espalhada atinge o feto. O risco de<br />

carcinogênese aumenta por um fator de dois em exames com<br />

maiores doses de radiação, como no exame de tomografia<br />

computadorizada pélvica, onde ocorre irradiação direta do<br />

feto; mesmo assim, o risco de câncer infantil ainda é<br />

considerado baixo (menos de 1 em 250). A Tabela 1 demonstra<br />

a dose de radiação estimada para o concepto nos exames<br />

radiológicos tradicionais.<br />

O efeito determinístico da radiação ionizante resulta do<br />

dano a um número de células, apresentando um limiar de<br />

dose a partir da qual o dano ocorre. Este efeito inclui o risco<br />

de malformações fetais, retardo do crescimento, retardo<br />

mental e morte. O estágio mais vulnerável à teratogênese se<br />

encontra entre a 2 a e 20 a semanas de gestação,<br />

particularmente no período entre a 8 a e 15 a semanas. As doses<br />

pré-natais de radiação da maioria dos exames radiológicos<br />

não determinam um risco aumentado de morte pré-natal,<br />

malformações e retardo mental frente à incidência natural<br />

dessas entidades. As recomendações de 2007 do<br />

‘’International Commitee on Radiological Protection’’<br />

concluem que nenhum efeito determinístico de significância<br />

prática ocorre abaixo da dose de 100 mGy. Por exemplo,<br />

mesmo para uma gestante submetida a um protocolo amplo<br />

26 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Tabela 1. Doses de radiação fetal associadas com exames de<br />

diagnóstico por imagem<br />

Exame<br />

Radiografia<br />

Dose Fetal (mGy)<br />

Radiografia coluna cervical (AP e lateral)


procedimento mais recente, ainda com poucos estudos,<br />

deve-se injetar gadolínio apenas quando o mesmo for<br />

essencial para o diagnóstico, na ausência de outros exames<br />

alternativos ou na impossibilidade de se postergar o exame<br />

para o período pós-natal.<br />

Amamentação<br />

Com relação à amamentação, é seguro que a mãe continue<br />

amamentando normalmente o concepto após realização de<br />

exames radiológicos, sem ou com injeção de contraste iodado<br />

ou gadolínio. Caso a mãe se sinta mais segura, pode-se<br />

orientar a suspensão temporária da amamentação por 24 horas<br />

após a administração de meios de contrastes, embora<br />

diretrizes recentes não recomendem a interrupção da<br />

amamentação nestes casos.<br />

Utilização de exames diagnósticos com<br />

radiação ionizante em Pneumologia<br />

Em Pneumologia, uma das afecções que mais demanda<br />

atenção em gestantes é o tromboembolismo pulmonar (TEP)<br />

que continua a ser uma das grandes causas de mortalidade<br />

materna. A gravidez aumenta em cinco vezes o risco de<br />

tromboembolismo venoso (TEV), que ocorre em 0,5 a 3<br />

ocasiões para cada 1000 gestações (vide artigo específico<br />

nesta edição). A ultrassonografia (USG) com doppler de<br />

membros inferiores é um método não invasivo e seguro na<br />

gravidez, podendo ser o primeiro exame de diagnóstico por<br />

imagem realizado na suspeita de trombose venosa profunda.<br />

A TC de tórax possui algumas vantagens em relação à<br />

cintilografia pulmonar, ao demonstrar diretamente o trombo,<br />

permitir exclusão de diagnósticos alternativos e, de modo<br />

geral, estar mais disponível em situações de urgência. A<br />

redução da quilovoltagem e da miliamperagem empregadas<br />

na TC, além da redução da área de cobertura do exame,<br />

reduzem a dose de radiação para níveis muito baixos, sem<br />

perda da qualidade do exame.<br />

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2010;195:214–20.<br />

Gustavo Meirelles<br />

gmeirelles@gmail.com<br />

Centros de Referência em<br />

HAP no Estado de São Paulo<br />

SÃO PAULO CAPITAL<br />

FMUSP - InCOr - Pneumologia do Hospital das Clínicas(*)<br />

Responsável: Prof. Dr. Rogério Souza e Dr. Carlos<br />

Jardim<br />

Endereço: Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar 44<br />

Horário Atendimento: 4º e 6º feira a partir das 8h<br />

Tel: 11 3069-5034<br />

e-mail: rogerio.souza@incor.usp.br<br />

Hospital Servidor Público Estadual de São Paulo<br />

Dr. Responsável: Dr. Carlos Alberto de Castro Pereira<br />

Endereço: Rua Pedro de Toledo, 1800<br />

Horário Atendimento: 2ª feira a partir das 8h<br />

Tel: 11 5088-8648<br />

Instituto Dante Pazzanese (*)<br />

Endereço: Avenida Dr. Dante Pazzanese, 500 - Vila<br />

Mariana<br />

Tel: 11 5085-6413 ou 5085-6412<br />

UNIFESP - Hospital São Paulo - Pneumologia (*)<br />

Responsável: Dra. Jaquelina Sonoe Ota<br />

Endereço: Rua José de Magalhães, Vila Clementino<br />

Horário Atendimento: 5° feira a partir das 13h<br />

Tel: 11 5549-1830<br />

e-mail: jaqueota@uol.com.br<br />

UNIFESP – Hospital São Paulo - Cardiologia (*)<br />

Responsável: Dra. Célia Maria Camelo Silva<br />

Endereço: Rua dos Otonis, 897<br />

Horário Atendimento: 2ª feira a partir das 8h<br />

Tel: 11 5549-9064<br />

Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São<br />

Paulo - Cardiologia (*)<br />

Endereço: Rua Cesário Motta Júnior, 112 - Vila Buarque<br />

Tel: 11 2176-7000<br />

CAMPINAS<br />

UNICAMP - Hospital das Clínica - Pneumologia (*)<br />

Responsável: Dra. Monica Corso Pereira e Prof.Dra.<br />

Ilma Aparecida Paschoal<br />

Endereço: Rua Zeferino Vaz S/N Prédio HC-UNICAMP<br />

Horário Atendimento: 4º feira a partir das 13h30<br />

Tel: 19 3521-7776 e 3521-7907<br />

Hospital Municipal Dr. Mário Gatti<br />

Endereço: Av. Prefeito Faria Lima, 340 - Pq. Itália<br />

Tel: 19 3772-5700<br />

BOTUCATU<br />

UNESP - Hospital das Clínicas de Botucatu (*)<br />

Responsável: Prof. Dr. Hugo Hyung Bok Yoo<br />

Endereço: Distrito Rubião Jr.<br />

Horário Atendimento: 4º feira a partir das 8h<br />

Tel: 14 3882-2969<br />

RIBEIRÃO PRETO<br />

FMUSP Ribeirão Preto - Hospital das Clínicas de<br />

Ribeirão Preto (*)<br />

Responsável: Dr. Adriana Ignácio de Pádua<br />

Endereço: Av. Bandeirantes 3900 - Monte Alegre<br />

Horário Atendimento: 3º feira a partir das 13h (Triagem)<br />

Tel: 16 3602-2631<br />

São José do Rio Preto<br />

Hospital de Base (*)<br />

Endereço: Av. Brig. Faria Lima, 5544 - Vila São Pedro<br />

Tel: 17 3201-5000<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 29


RESUMINDO E RECORDANDO<br />

Asma na gestação: quadro clínico<br />

e tratamento<br />

AUTORAS: Regina Maria de Carvalho Pinto 1 ; Maria Cecília Nieves Teixeira Maiorano 2 ;<br />

Priscila Cilene León Bueno de Camargo 3<br />

1Médica Assistente da Disciplina de Pneumologia, Instituto do Coração (InCor)/Faculdade de<br />

Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP)<br />

2Médica Preceptora da Disciplina de Pneumologia, InCor/FMUSP<br />

3Médica Residente de Pneumologia, InCor/FMUSP<br />

Introdução<br />

A presença de asma durante a gestação pode trazer<br />

complicações no binômio mãe-feto, sendo correlacionada<br />

principalmente com baixo peso ao nascer, necessidade de<br />

partos cesarianos, pré eclampsia e parto prematuro, além de<br />

1, 2<br />

malformações e aumento de mortalidade perinatal.<br />

Entretanto, os dados dos estudos geralmente são<br />

discrepantes3-7 mas aponta que tais complicações estão<br />

relacionadas principalmente à asma não controlada e<br />

exacerbações. 8-14 A principal medicação usada atualmente<br />

para o controle da doença é o corticóide inalatório (CI),<br />

medicação que em doses habituais não ocasiona risco para<br />

o desenvolvimento fetal, apresentando segurança para ser<br />

utilizada durante a gestação. 15-17<br />

Epidemiologia<br />

A asma afeta entre 3 a 12% das gestantes ao redor do<br />

mundo, sendo que a prevalência de asma entre gestantes<br />

vem aumentando nos últimos anos 18 . Essa prevalência é<br />

variável devido às diferentes definições de asma utilizadas<br />

nos estudos 4 . As exacerbações podem acontecer em<br />

qualquer momento da gestação, mas existe uma maior<br />

tendência da ocorrência ao final do segundo trimestre.<br />

Durante a gravidez aproximadamente 20% das gestantes<br />

asmáticas têm uma exacerbação que necessita intervenção<br />

medicamentosa, com aproximadamente 6% das mulheres<br />

sendo admitidas no hospital. 19<br />

Como é possível perceber, trata-se de condição<br />

prevalente que representa um importante problema em termos<br />

de saúde pública.<br />

Quadro clínico e efeitos da doença sobre a<br />

mãe e o feto<br />

O quadro clínico da asma na gestação é semelhante ao<br />

observado em mulheres fora do período gravídico-puerperal,<br />

mas apresenta algumas peculiaridades. O curso da asma é<br />

variável sendo que um terço das mulheres poderá apresentar<br />

melhora dos sintomas, um terço irá piorar e um terço<br />

permanecerá sem alterações. Não se sabe se isso ocorre por<br />

mudanças na gravidade da asma, pior controle ou<br />

exacerbações ao acaso. 4<br />

O curso da doença, na maioria das vezes, é semelhante<br />

nas gestações sucessivas20 , por outro lado, a evolução da<br />

asma irá depender de fatores que vão desde a aderência ao<br />

tratamento, presença de exacerbações e gravidade da<br />

doença, além de aspectos associados a características<br />

materno-fetais como mudanças hormonais, sexo do feto e<br />

18, 20, 21<br />

função imunológica da mãe.<br />

Os mecanismos que levam a mudança de apresentação<br />

dos sintomas da asma durante a gestação não são bem<br />

compreendidos (Figura 1). O aumento do cortisol livre<br />

durante a gestação e o efeito relaxante da progesterona sobre<br />

a musculatura lisa podem levar a melhora dos sintomas. Por<br />

outro lado, alterações com redução da responsividade do<br />

receptor beta-2 agonista e aumento na inflamação das vias<br />

aéreas devido a progesterona circulante podem, de maneira<br />

inversa, levar a um pior controle da doença. A exposição a<br />

antígenos fetais ou alteração na função imune também pode<br />

ocasionar uma piora do quadro clínico durante a gestação. 4<br />

Alguns estudos realizados em mulheres não gestantes<br />

mostraram que as asmáticas têm concentrações anormais de<br />

estrógeno e progesterona quando comparadas a não<br />

asmáticas. 22 Anormalidades individuais poderiam explicar a<br />

variação do comportamento da asma nas gestantes. 4<br />

Os principais efeitos da asma nos desfechos da gestação<br />

são baixo peso, prematuridade, pré-eclampsia e partos<br />

cesarianos (Figura 2). Tais complicações estão relacionadas<br />

principalmente à asma não controlada e exacerbações. 8-14<br />

Apesar da falta de estudos para esclarecer os mecanismos<br />

que relacionam esses efeitos deletérios na gestação, acreditase<br />

que a hipóxia, a inflamação, medicamentos, tabagismo<br />

30 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


materno e alterações na função placentária possam estar<br />

relacionados. A hipóxia pode contribuir com baixo peso, préeclâmpsia,<br />

abortamento e placenta prévia em gestantes<br />

asmáticas. A hipoxemia pode estar presente em pacientes<br />

com exacerbações graves e existem evidencias de que<br />

pequenas reduções na pressão parcial de oxigênio arterial<br />

materno podem ser responsáveis por efeitos extremamente<br />

deletérios ao feto. 4<br />

<br />

Baixo peso<br />

Asma e Gestação<br />

Asma e Gestação<br />

<br />

Mecanismos possíveis:<br />

Inflamação materna<br />

Corticóide<br />

Hipóxia materna<br />

Exacerbações da asma<br />

Alteração da função placentária<br />

Tabagismo materno<br />

Sexo do feto<br />

<br />

<br />

Mecanismos possíveis:<br />

Hormônios maternos (cortisol,<br />

estradiol, progesterona)<br />

Responsividade dos receptores Beta-2<br />

adrenérgicos<br />

Sexo do feto<br />

Alteração da função imune<br />

<br />

Piora<br />

<br />

Sem mudança Melhora<br />

Fig. 1: Mudanças na asma durante a gestação<br />

<br />

Prematuridade Pré-eclâmpsia Cesariana<br />

Fig.2: Efeitos da asma nos desfechos da gestação.<br />

Alguns aspectos da fisiologia placentária em gestantes<br />

asmáticas podem ser responsáveis por afetar o crescimento<br />

fetal, incluindo o fluxo sanguíneo placentário e a atividade<br />

enzimática da 11β-hidroxiesteróide desidrogenase tipo 2 (11<br />

β-HSD2), a qual protege o feto do excesso de<br />

glicocorticóides maternos. O fluxo placentário pode estar<br />

reduzido em gestantes com asma moderada a grave, podendo<br />

levar a redução de suprimento de nutrientes para o feto.<br />

Outra alteração encontrada foi a redução da enzima 11β –<br />

HSD2 na placenta de asmáticas que não faziam uso de CI. A<br />

própria atividade inflamatória da doença pode se relacionar<br />

com o crescimento fetal prejudicado e pode ser minimizada<br />

com o tratamento com CI. 4<br />

<br />

<br />

O receio das gestantes com possíveis efeitos colaterais<br />

causados pelos CI no feto reduz a adesão ao tratamento da<br />

asma, com consequente perda de controle da doença. 18<br />

Outros fatores relacionados ao não controle são as infecções<br />

virais e a gravidade da doença previamente à gestação<br />

precipitando a ocorrência de exacerbações. 19 Estudos<br />

realizados previamente ao advento dos CI mostraram índices<br />

maiores de crises em gestantes asmáticas, além de maior<br />

incidência de baixo peso ao nascer, pré-eclampsia e parto<br />

prematuro, comparados a grupos de gestantes sem asma 23,24 .<br />

Outros estudos realizados em gestantes asmáticas, após a<br />

introdução de CI, demonstraram que exacerbações e sintomas<br />

durante a gestação estavam relacionados a baixo peso ao<br />

nascer e que essas mulheres tinham uma tendência a apresentar<br />

maior incidência de pré-eclampsia e parto prematuro. 8,14 Tais<br />

estudos, no entanto, apresentam diversos fatores<br />

confundidores como a falta de sistematização da classificação<br />

da asma, a não uniformização do tratamento instituído e a<br />

inclusão de gestantes tabagistas, adolescentes e de diferentes<br />

graus de instrução. O risco de parto prematuro pode estar<br />

relacionado ao uso de corticóide sistêmico ou pela própria<br />

exacerbação da asma. Outros desfechos relatados em gestantes<br />

admitidas em hospital por exacerbações são a maior incidência<br />

de pré-eclâmpsia, diabetes gestacional, rotura prematura de<br />

membranas, parto prematuro e aumento da mortalidade<br />

perinatal 19 . Portanto, os dados referentes às repercussões da<br />

asma no recém-nascido ainda são controversos 3-7 , mas as<br />

evidencias sugerem que as complicações relacionadas à asma<br />

durante a gestação estão em grande parte associadas à falta<br />

de controle e presença de exacerbações. 8-14<br />

As mudanças hormonais que ocorrem na mulher neste<br />

período, bem como idade gestacional e o sexo do feto, podem<br />

alterar o controle da doença. 15, 25 Gestantes em uso de CI<br />

apresentaram necessidade de aumento da dose quando o<br />

feto era do sexo feminino. 25 Nesse mesmo estudo, mulheres<br />

que não usaram CI e apresentavam feto do sexo feminino<br />

tinham níveis de monócitos circulantes aumentados e pior<br />

controle da doença. Recentemente, a comparação da<br />

dosagem de cortisol, estriol, osteocalcina e hormônio<br />

liberador de corticotrofina em mulheres gestantes sem asma,<br />

com asma moderada e asma grave, considerando ainda o<br />

uso ou não de CI, evidenciou que durante o primeiro trimestre<br />

as gestantes asmáticas com fetos do sexo feminino<br />

apresentavam inibição dos níveis de cortisol, associado a<br />

maior dose de CI, o que não foi observado nos demais<br />

trimestres ou em gestantes asmáticas com fetos masculinos,<br />

sugerindo que o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal materno<br />

fique mais sensível aos efeitos de glicocorticóides naquele<br />

grupo. 15 Apesar dos CI afetarem vias maternas dependentes<br />

de glicocorticóides, não se observou interferência na atividade<br />

adrenal e no crescimento e desenvolvimento fetal com o uso<br />

da medicação. 15 O aumento da expressão de proteínas de<br />

barreira dos glicocorticóides na placenta poderia explicar a<br />

alteração do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal materno pelo<br />

CI, sem interferência na função adrenal do feto. 19<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 31


Tratamento e manejo da asma durante a<br />

gestação<br />

O manejo da asma durante a gestação é semelhante ao<br />

recomendado fora do período gestacional 26-28 , incluindo a<br />

necessidade de evitar fatores desencadeantes, realização de<br />

avaliações espirométricas regulares, orientação da medicação<br />

e de planos de ação terapêuticos, além do controle das<br />

exacerbações, visando o bem estar da mãe e do feto. O sucesso<br />

depende da correta avaliação da gravidade, identificação e<br />

conduta adequada e precoce das exacerbações, procurando<br />

um tratamento individualizado, de acordo com as diretrizes de<br />

manejo da asma. 26-28 É importante integrar os cuidados com a<br />

asma, aos obstétricos, principalmente nos casos de asma não<br />

controlada ou grave/de difícil controle.<br />

Apenas metade das mulheres asmáticas que fazem uso<br />

de medicação preventiva para asma, continua a utilizá-la<br />

durante a gravidez 29 , ressaltando os aspectos importantes<br />

relacionados à necessidade de orientação adequada quanto<br />

à relevância do tratamento e da sua continuidade durante o<br />

período gestacional. Diversos estudos, compilados em uma<br />

meta-análise 1 , confirmam que um melhor controle da asma<br />

durante a gravidez reduz os riscos de efeitos deletérios tanto<br />

para a mãe quando para o feto.<br />

Existem evidências de segurança na utilização da maioria<br />

das classes de drogas empregadas para o controle da asma<br />

durante a gestação, cabendo ressaltar que a escolha dos<br />

medicamentos deve levar em consideração os benefícios do<br />

seu uso em relação aos potenciais riscos, tanto para a mãe<br />

quanto para o feto. O Food and Drug Administration (FDA),<br />

classifica os medicamentos utilizados no manejo da asma durante<br />

a gestação em categorias: A, B, C, D e X, de acordo com a<br />

segurança, baseando-se em estudos realizados em animais e<br />

seres humanos, sendo que a maioria dos medicamentos<br />

empregados no tratamento da asma é da classe B ou C. 26<br />

Os CI são seguros durante a gestação. 15-17,30-32 Não foi<br />

encontrada nenhuma alteração em relação ao crescimento<br />

fetal com o uso de beclometasona e budesonida, sendo esta<br />

última o corticosteróide inalatório que apresenta mais dados<br />

quanto a sua segurança e eficácia na gestação. 26 A<br />

beclometasona, embora com menos dados disponíveis,<br />

também apresenta baixo risco para o feto 33 , podendo ser<br />

utilizada com segurança na falta de disponibilidade da<br />

budesonida. Faltam estudos de relevância em relação a<br />

possíveis efeitos adversos dos novos CI, entretanto, estes<br />

são classificados na categoria C pelo FDA, na qual os estudos<br />

ainda são insuficientes e o risco não pode ser excluído,<br />

todavia, os benefícios podem justificar os riscos potenciais.<br />

Em relação à segurança dos corticosteróides orais (CO)<br />

os dados são menos claros. Entretanto, o seu uso para<br />

controle da asma grave e de exacerbações 34 , já está bem<br />

estabelecido. A sua prescrição deve ser realizada sempre<br />

que indicado, pois estas situações são condições de risco<br />

tanto para a mãe quanto para o feto e os benefícios superam<br />

os riscos. São descritos alguns efeitos colaterais com os<br />

CO, como lábio leporino e fenda palatina, quando utilizados<br />

no primeiro trimestre da gestação, além de baixo peso e<br />

aumento da incidência de parto prematuro. 35-37<br />

Apesar de diversos estudos mostrando segurança do<br />

tratamento da asma na gestação, tanto as gestantes quanto<br />

os médicos têm receio do uso das medicações nesse período,<br />

o que se deve ao conceito amplamente difundido de que<br />

muitas medicações têm efeitos teratogênicos quando<br />

utilizadas gestantes. Comparando-se gestantes e não<br />

gestantes que procuravam um serviço de emergência por<br />

exacerbação da asma constatou-se que as gestantes recebem<br />

corticóide sistêmico com uma frequência muito menor do<br />

que as não gestantes, apesar de sintomas e valores de pico<br />

de fluxo semelhante. 34 Nota-se, portanto que apesar de<br />

evidência bem estabelecida quanto à necessidade de manejo<br />

adequado para prevenção dos efeitos deletérios da asma<br />

não controlada sobre a mãe e o feto, o tratamento correto<br />

não é instituído plenamente na prática clínica. 4<br />

Dados sugerem a associação do uso de altas doses de CI<br />

no primeiro trimestre da gestação com malformação fetal 38 , no<br />

entanto, o não controle da asma, a ocorrência de exacerbações<br />

e visitas a sala de emergência levam a pior desfecho<br />

gestacional. Alguns estudos também associam uma maior taxa<br />

de desfechos negativos ao uso de CO e teofilina, porém<br />

acredita-se que tais alterações não se devam à medicação em<br />

si, mas à própria doença, de controle mais difícil, com<br />

necessidade de uso de tais medicações. As repercussões<br />

negativas sobre o feto seriam decorrentes do efeito da asma,<br />

principalmente nos episódios de exacerbação grave, algumas<br />

vezes podendo cursar com hipóxia, o que representa risco<br />

importante para o feto 4 . Deste modo, o aconselhamento<br />

materno sobre os riscos do tratamento e seu abandono, e a<br />

terapêutica farmacológica visando o controle da asma devem<br />

ser estimulados durante o período pré-natal.<br />

A segurança do uso de beta2 agonista de curta ação, o<br />

salbutamol, por via inalatória, durante a gestação, já foi<br />

demonstrada. 39 Porém, existem poucos dados avaliando a<br />

utilização dos beta2 agonistas de longa duração (formoterol<br />

e salmeterol). Tanto a ação farmacológica, quanto a<br />

toxicidade dos beta-agonistas de longa duração são<br />

semelhantes aos de curta ação e de acordo com a<br />

classificação do FDA para o grau de risco dos medicamentos<br />

utilizados no tratamento da asma, tanto o salbutamol, quanto<br />

o salmeterol e formoterol encontram-se na categoria C. 26<br />

As metilxantinas, embora seguras na gestação, não são o<br />

tratamento de escolha. 27 São escassas as informações em<br />

relação aos agentes anticolinérgicos e embora não sejam<br />

considerados de escolha para o tratamento da asma, o<br />

ipratrópio é classificado na categoria B do FDA. Antagonistas<br />

de leucotrienos são classificados na categoria B e em virtude<br />

de dados limitados em humanos, não é tratamento de primeira<br />

linha. O uso de anticorpo anti-Imunoglobulina E, o<br />

omalizumabe, não apresenta dados suficientes até o momento<br />

que justifique a sua indicação em gestantes.<br />

Gestantes com asma de maior gravidade e as com doença<br />

não controlada devem ter avaliações mensais, tanto com o<br />

32 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


obstetra quanto com o pneumologista, com o objetivo de<br />

acompanhamento constante quanto ao crescimento do feto,<br />

sinais de pré-eclâmpsia e verificação em relação à aderência<br />

ao tratamento, eficácia da medicação prescrita e controle da<br />

asma. No ambulatório de asma do Hospital das Clínicas da<br />

FMUSP, o acompanhamento das gestantes asmáticas é<br />

realizado quinzenalmente ou em consultas mensais,<br />

dependendo da evolução das pacientes.<br />

A recomendação atual, baseada em revisões recentes, é<br />

de que gestantes devem ser tratadas da mesma maneira que<br />

mulheres não gestantes, inclusive durante as exacerbações.<br />

A educação em asma e a relação médico-paciente são<br />

fundamentais em termos de um melhor conhecimento da<br />

doença e segurança da gestante, contribuindo com aumento<br />

da aderência e, portanto, melhor controle e redução de<br />

desfechos negativos.<br />

Conclusões<br />

Apesar de dados conflitantes de diversos estudos sabese<br />

que o curso da asma pode ser alterado pela gestação e<br />

que a doença se relaciona com efeitos indesejados durante<br />

esse período. A asma que requer hospitalização e a não tratada<br />

com CI, estão associadas com pior desfecho gestacional.<br />

O controle adequado da asma reduz o número de<br />

exacerbações e admissões hospitalares, reduzindo a necessidade<br />

do uso de CO. O tratamento correto com CI irá reduzir as taxas<br />

de parto prematuro, mortalidade perinatal e baixo peso ao<br />

nascer a níveis comparados aos de gestantes não asmáticas.<br />

O manejo da asma durante a gestação deve ser<br />

individualizado, e uma análise minuciosa do risco-benefício<br />

deve ser constantemente realizada. Ressalta-se a importância<br />

do seguimento conjunto da gestante pelo pneumologista e<br />

pelo obstetra e o conceito mais importante que deve ser<br />

passado para a paciente é que o controle inadequado da<br />

doença e as exacerbações são muito mais prejudiciais para o<br />

feto do que qualquer forma de tratamento instituído.<br />

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of print].<br />

Regina Maria de Carvalho Pinto<br />

pneumoreal@uol.com.br<br />

Centros de Referência em<br />

DPOC no Estado de São Paulo<br />

SÃO PAULO CAPITAL<br />

Hospital das Clínicas de São Paulo/USP<br />

Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 155 - 5º andar - Bloco<br />

4ª - (Prédio Amarelo)<br />

Santa Casa de São Paulo<br />

Rua Martins Fontes, 208<br />

Tel.: 11 2141-6200<br />

Hospital São Paulo/UNIFESP<br />

Rua Pedro de Toledo, 659<br />

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Hospital Heliópolis<br />

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Hospital Mandaqui<br />

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Tel.: 11 6281-500<br />

NGA 62 Maria Zélia<br />

Rua Jequitinhonha, 360 - Catumbi<br />

Tel.: 11 6291-3025<br />

NGA 63 - Várzea do Carmo<br />

Rua Leopoldo Miguez, 327 - Cambuci<br />

Tel.: 11 3385-7073<br />

CSI Pinheiros<br />

Rua Ferreira de Araújo, 789<br />

Tel.: 11 8588-0079<br />

CS Pirajussara<br />

Av. Ibirama, 1214 - Taboão da Serra<br />

Tel.: 11 4139-9506<br />

Instituto Clemente Ferreira<br />

Rua da Consolação, 717<br />

Tel.: 11 3219-0750<br />

CSI Ibirapuera<br />

Rua Phellipe Vitry, 280<br />

Tel.: 11 5515-1693<br />

Hospital Mário Covas<br />

Av. Príncipe de Galles, 821 - Sala de Função Pulmonar<br />

Anexo II<br />

Tel.: 4993-5469/6829-5011<br />

Santo André<br />

34 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Distúrbios respiratórios do sono na<br />

gravidez<br />

AUTORES: Adriana Hora de M. Fontes 1 , Eduardo Menezes Lopes 2 , Sonia Maria G. P. Togeiro 3<br />

1 Médica Especializanda em Pneumologia da Unifesp/Escola Paulista de Medicina (EPM)<br />

2 Médico pneumologista e Especializando em medicina do sono AFIP<br />

3 Doutora em pneumologia e Pesquisadora do Instituto do Sono- São Paulo<br />

Introdução<br />

Grávidas relatam, frequentemente, mudanças no padrão e<br />

duração do sono. A Insônia, a síndrome das pernas inquietas<br />

e os distúrbios respiratórios do sono (DRS) são prevalentes<br />

nesta população e ocorrem, principalmente, no último<br />

trimestre da gestação. O conceito de DRS refere-se ao<br />

conjunto de alterações que vão desde o ronco isoladamente<br />

e ou limitações do fluxo aéreo às manifestações mais graves,<br />

como apneia-hipopneia obstrutiva do sono. Essas desordens<br />

respiratórias são caracterizadas por episódios repetidos de<br />

obstrução parcial ou completa das vias aéreas superiores<br />

durante o sono, resultando em alteração na ventilação<br />

normal, hipoxemia intermitente e fragmentação do sono. 1-4<br />

A prevalência dos DRS na gravidez não é bem estabelecida<br />

na literatura, entretanto estudos sugerem a presença de<br />

ronco isoladamente em 14-45% das grávidas comparadas a<br />

15 % nas mulheres não grávidas. No entanto, faltam estudos<br />

com polissonografia para avaliar sua real frequência durante<br />

a gestação. 4<br />

O espectro clínico da doença varia de leve a grave, incluindo<br />

sintomas como: ronco habitual, fadiga, sonolência diurna,<br />

engasgos noturnos e pausas respiratórias. Entretanto, essas<br />

5, 6,7<br />

manifestações são ainda menos específicas nas grávidas.<br />

O diagnóstico e tratamento dos DRS na gestante são de<br />

fundamental importância, dada a sua associação às<br />

complicações obstétricas, principalmente desordens<br />

hipertensivas da gestação, além de diabetes gestacional e<br />

alterações no crescimento e vitalidade do feto. 1,4,5<br />

Fisiopatologia<br />

Nas gestantes, as evidências sugerem que o ronco, a<br />

apneia e a fragmentação do sono predispõem às<br />

complicações obstétricas. 2,8<br />

Alterações fisiológicas da gravidez que podem predispor<br />

a distúrbios respiratórios do sono incluem: ganho<br />

progressivo de peso, elevação do diafragma, alteração da<br />

mucosa nasofaringeana (por ação da rinite vasomotora e<br />

dos estrógenos levando a hiperemia e edema de mucosa).<br />

Tais condições podem reduzir significativamente a via aérea<br />

das gestantes, que associadas à redução da CRF podem<br />

aumentar a colapsibilidade desta, sobrepondo os efeitos<br />

protetores do aumento da ventilação mediado pela<br />

progesterona, da preferência pelo decúbito lateral<br />

(especialmente na fase mais tardia da gestação) e da própria<br />

4, 7, 9,10<br />

arquitetura do sono (redução do sono REM).<br />

As apneias e hipopneias cursam com hipóxia e hipercapnia<br />

intermitentes bem como a fragmentação do sono que, por sua<br />

vez, ativam os mecanismos envolvidos na gênese da hipertensão<br />

arterial, das alterações metabólicas e do desenvolvimento fetal.<br />

Aumento da atividade simpática, estresse oxidativo, inflamação,<br />

e ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal com consequente<br />

hipercortisolismo são os mecanismos envolvidos na cadeia<br />

3, 7, 8,11<br />

de complicações referidas. (Figura 1).<br />

Outro aspecto a ser discutido é que boa parte das<br />

gestantes apresentam roncos e episódios de limitação ao<br />

fluxo aéreo, mas sem a presença de apneias ou hipóxia.<br />

Sugere-se, nestas circunstâncias, que o aumento do esforço<br />

respiratório levando ao aumento da pressão negativa<br />

intratorácica e fragmentação do sono com consequente<br />

ativação simpática estariam envolvidos nos desfechos<br />

3, 7-10<br />

obstétricos desfavoráveis.<br />

Complicações Obstétricas<br />

Os DRS podem estar associados com complicações na<br />

gravidez como: desordens hipertensivas, diabetes<br />

gestacional, restrição de crescimento intrauterino, trabalho<br />

de parto prematuro e escores mais baixos de Apgar. 2,12,13<br />

As desordens hipertensivas estão entre as complicações<br />

médicas mais comuns na gravidez e são uma importante causa<br />

de morbimortalidade materna e perinatal no mundo. Com<br />

prevalência em torno de 6-8% nas grávidas estão divididas<br />

em três categorias: hipertensão crônica, hipertensão<br />

gestacional e pré-eclâmpsia. Esta última é a apresentação<br />

clínica mais grave e é definida como o aparecimento de<br />

hipertensão e proteinúria após 20 semanas de gestação em<br />

previamente normotensas ou piora da hipertensão e<br />

surgimento de nova proteinúria em hipertensas prévias.<br />

Associação entre as desordens hipertensivas gestacionais<br />

e os distúrbios respiratórios do sono foi descrita em diversos<br />

estudos. 5-8 A disfunção endotelial foi identificada como<br />

anormalidade chave na patogênese da hipertensão arterial e<br />

possivelmente, está presente nas gestantes com DRS,<br />

especialmente nas com apneia do sono mais grave. 2,3,12-16<br />

Diabetes gestacional e hiperglicemia isolada também<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 35


G<br />

R<br />

A<br />

V<br />

I<br />

D<br />

E<br />

Z<br />

<br />

DRS<br />

<br />

<br />

Fragmentação<br />

do sono<br />

Hipóxia/<br />

Hipercapnia<br />

intermitentes<br />

} }<br />

Stress<br />

oxidativo<br />

Atividade<br />

simpática<br />

Inflamação<br />

36 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012<br />

HHA<br />

Adipocinas<br />

Complicações<br />

Hipertensivas<br />

e de<br />

Desenvolvimento<br />

fetal<br />

Fig. 1. Mecanismos relacionados aos distúrbios respiratórios do sono sobre os desfechos maternos e fetais.<br />

Adaptado do Bilgay Izci-Balserak and Grace W. Pien. Sleep-disordered breathing and pregnancy: potential mechanisms and evidence for<br />

maternal and fetal morbidity Curr Opin Pulm Med 16:574–582.<br />

DRS: Distúrbios respiratórios do sono.<br />

HHA: hipotálamo-hipófise-adrenal.<br />

estão associadas com risco aumentado para complicações<br />

materno-fetais, como pré-eclâmpsia e retardo de<br />

crescimento fetal. Com prevalência em torno de 1-8% nas<br />

grávidas, os estudos sugerem associação com os<br />

distúrbios respiratórios do sono. É provável que a<br />

inflamação e o aumento da atividade simpática sejam os<br />

mecanismos envolvidos na intolerância a glicose e<br />

resistência à insulina a semelhança da hipertensão<br />

2, 4, 7, 17<br />

arterial.<br />

Diagnóstico<br />

Não existem consensos específicos para a triagem de DRS<br />

na gestação. Devido ao risco de complicações materno-fetais,<br />

o diagnóstico deve sempre ser feito o mais precoce possível.<br />

Alguns autores sugerem que grávidas com sonolência<br />

excessiva diurna, ronco intenso e testemunho de paradas<br />

na respiração durante o sono devem ser avaliadas para DRS. 5<br />

A avaliação da queixa de sonolência na gestante requer<br />

atenção dos especialistas. Este sintoma, muitas vezes é<br />

considerado “normal” na gestação, associado ao fato de<br />

que nem sempre é evidenciada mesmo quando objetivamente<br />

avaliada (p. ex: Escala de Sonolência de Epworth). Os<br />

sintomas mais frequentemente descritos são “cansaço” e<br />

“fadiga”. O uso de questionários para rastreamento de<br />

doenças respiratórias no sono também apresentam um valor<br />

preditivo baixo na gestante. Um estudo encontrou<br />

sensibilidade de 35% e especificidade de 63% quando aplicou<br />

o questionário de Berlim neste grupo de pacientes.<br />

Mulheres com hipertensão arterial sistêmica prévia à<br />

gravidez ou mesmo relacionada à gestação, pré-eclampsia,<br />

diabetes gestacional ou história de restrição de crescimento<br />

intrauterino de forma não explicada, devem ser avaliadas<br />

com atenção para distúrbios respiratórios do sono, especialmente<br />

se há fatores predisponentes como obesidade. 19<br />

O diagnóstico deve ser realizado por meio do exame de<br />

polissonografia de noite inteira. O estudo polissonográfico<br />

geralmente é realizado sem dificuldades e está validado na<br />

gestante, devendo ser realizado na sua forma usual. 20<br />

Dentro do espectro dos eventos respiratórios anormais<br />

na polissonografia além das apneias e hipopneias, podem<br />

ocorrer episódios isolados de limitação ao fluxo aéreo,<br />

2, 18<br />

caracterizada pelo achatamento da curva de fluxo, que<br />

decorrem do aumento da resistência das vias aéreas<br />

superiores. Nestes casos há limitação ao fluxo aéreo frente<br />

ao aumento do esforço respiratório que termina com despertar<br />

6, 21<br />

do sono. (Figura 2)<br />

Tratamento<br />

Gestantes com síndrome da apnéia do sono (SAOS)<br />

devem seguir medidas conservadoras como: ganho ponderal<br />

adequado, assumir a posição lateral para dormir, elevar a<br />

cabeceira da cama e evitar o uso de medicações com efeito<br />

sedativo ou mesmo álcool. 3-5<br />

O tratamento específico para a SAOS é similar ao aplicado<br />

em pacientes não gestantes. Destaca-se a importância de se<br />

corrigir a hipoxemia noturna (implicação na saúde materno-<br />

fetal).<br />

1,3,14, 20<br />

O CPAP nasal é o tratamento padrão para as gestantes<br />

com SAOS severa (IAH > 30 eventos/hora). Quadros leves<br />

ou moderados quando acompanhados de sintomas ou<br />

dessaturações recorrentes (SpO2 < 90%), também devem<br />

ser tratados com CPAP. Estudos confirmam a segurança,<br />

eficácia e tolerabilidade do uso do CPAP durante a gestação<br />

e nenhum efeito adverso foi diretamente atribuído a este<br />

tratamento. 5, 14, 20 (Figura 3)<br />

Na presença de eventos de limitação de fluxo aéreo e sem<br />

a presença de apneia e hipopneias, o CPAP com pressão fixa<br />

ou auto- ajustável torna-se uma alternativa atrativa.<br />

5,14, 22<br />

Desfechos favoráveis do uso do CPAP em grávidas<br />

como a redução da pressão arterial e melhora na vitalidade<br />

fetal foram demonstrados em vários estudos. No entanto,<br />

ainda que o CPAP possa ser útil em reduzir as<br />

complicações na gravidez, a presença da obesidade e préeclampsia<br />

em gestações anteriores foram associadas a<br />

complicações como pré-eclampsia, aborto e prematuridade<br />

e, portanto o tratamento individualizado deve sempre ser<br />

considerado. 14, 20, 22<br />

O uso de aparelhos intraorais é geralmente impraticável<br />

durante a gestação. Para a perfeita adaptação do dispositivo<br />

são necessárias múltiplas sessões com intervalos de<br />

algumas semanas, tornando-os inviáveis nesta condição.<br />

No entanto, pode ser uma alternativa às gestantes que não


Fig. 2. Traçado polissonográfico de 30 segundos com presença de achatamento da curva de fluxo (canal de fluxo).<br />

Circundado de vermelho: limitação fluxo aéreo com esforço respiratório. Circundado de azul: despertar<br />

Sintomas sugestivos ou fatores de risco para DRS na gestação.<br />

Não<br />

Sem necessidade de investigação adicional.<br />

Observar durante a evolução da gestação a<br />

ocorrência dos sintomas.<br />

Sem evidência de SAOS (IAH <<br />

5 eventos/hora) e sem<br />

dessaturação da SpO2


Seguimento Pós-parto<br />

A SAOS geralmente melhora após o parto devido à rápida<br />

redução do edema da nasofaringe e pela perda do excesso<br />

de peso. 24 Melhora significativa no IAH, nas dessaturações<br />

e no índice de despertares, geralmente são observados após<br />

3 a 6 meses pós-parto. 24<br />

Sugere-se que o manejo clinico no pós-parto em mulheres<br />

que apresentaram SAOS durante a gestação sejam de acordo<br />

com as recomendações a seguir: 5<br />

• SAOS severa: terapia deve ser continuada até o retorno<br />

do peso a 10-15% do peso basal. Nova polissonografia de<br />

controle deve ser realizada;<br />

• SAOS leve-moderada: o CPAP pode ser descontinuado<br />

no pós-parto. Entretanto requer atenção aos sintomas e<br />

sinais sugestivos de SAOS. Caso exista dúvida diagnóstica,<br />

deve-se repetir a polissonografia.<br />

• Todas as mulheres com SAOS relacionadas à gestação<br />

devem ser monitorizadas nas gravidezes subsequentes.<br />

Conclusões<br />

A gestação predispõe aos DRS pelo ganho de peso, edema<br />

de estruturas nasofaríngeas, aumento da pressão intraabdominal<br />

com subsequente elevação do diafragma e<br />

alterações hormonais. Existem fortes evidências que a<br />

presença de DRS durante a gravidez aumenta o risco de<br />

complicações hipertensivas e desfechos desfavoráveis tanto<br />

maternos quanto fetais. Mulheres com sintomas de DRS,<br />

hipertensão gestacional ou pré-eclâmpsia devem ser<br />

submetidas à avaliação diagnóstica de SAOS. O uso do CPAP<br />

nasal é o tratamento de escolha nos casos graves, ou mesmo<br />

dos casos leves a moderados, pois é eficaz em controlar o<br />

DRS e reduzir os desfechos desfavoráveis maternos e fetais.<br />

O término do tratamento no pós-parto esta ligado ao retorno<br />

ponderal próximo do basal pré-gestacional.<br />

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Sonia Maria G. P. Togeiro<br />

sonia.togeiro@sono.org.br<br />

38 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Fisiologia respiratória durante<br />

a gestação<br />

AUTOR: João Marcos Salge 1<br />

1 Médico Assistente da Disciplina de Pneumologia, Instituto do Coração (InCor)/Faculdade de<br />

Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e médico do Grupo Fleury<br />

Introdução<br />

A gravidez é condição fisiológica temporária que faz parte<br />

do ciclo de vida da mulher. Durante este processo, o<br />

desempenho de diversos sistemas orgânicos é testado em<br />

condições de exigência acima do habitual. Mecanismos<br />

adaptativos e reserva funcional são necessários para que<br />

sejam atendidas as necessidades desta nova situação.<br />

Especificamente para o sistema respiratório, adaptações de<br />

conformação da caixa torácica e da musculatura respiratória,<br />

rearranjo dos compartimentos volumétricos pulmonares,<br />

ajustes da ventilação e das trocas gasosas no repouso e em<br />

resposta ao exercício ocorrem de maneira harmônica e<br />

integrada. Nesta revisão são apresentados os principais<br />

aspectos destas modificações adaptativas respiratórias.<br />

Caixa Torácica, Musculatura Respiratória e<br />

Volumes Pulmonares:<br />

Durante o ciclo gravídico, ocorrem diversos ajustes<br />

hormonais que, associados aos efeitos mecânicos<br />

decorrentes do aumento do volume uterino e às modificações<br />

circulatórias, resultam em alterações relevantes da fisiologia<br />

respiratória. Adaptações fisiológicas são fundamentais para<br />

atender as necessidades metabólicas, que estão muito<br />

aumentadas durante este período. 1<br />

A caixa torácica sofre alterações significativas na sua<br />

conformação desde fases precoces da gestação. Observase<br />

aumento do ângulo subxifoídeo (praticamente dobra de<br />

60º para 110º) e da circunferência do tórax, preparando o<br />

compartimento torácico para adaptar-se ao aumento uterino<br />

que virá a seguir. Este efeito decorre de ação hormonal,<br />

sobretudo da relaxina produzida pelo corpo lúteo e placenta,<br />

que induz afrouxamento de ligamentos pélvicos e também<br />

torácicos. Tais ajustes permitem aumento nos diâmetros<br />

ântero-posterior e transverso do tórax e garantem que não<br />

ocorra impacto relevante sobre os volumes pulmonares,<br />

compensando a elevação de até cerca 4 cm na posição das<br />

2,3, 4,5<br />

cúpulas diafragmáticas observada ao final da gestação.<br />

Apesar das alterações posicionais do diafragma e de<br />

conformação da caixa torácica, habitualmente não se observa<br />

prejuízo no desempenho da musculatura respiratória, estando<br />

preservadas as pressões ins e expiratórias máximas, assim<br />

como a pressão trans-diafragmática. O aumento da aposição<br />

diafragmática sobre a caixa torácica, decorrente de seu<br />

deslocamento cranial, reflete em aumento da incursão máxima<br />

deste músculo observada na gestação. 6,7<br />

Os volumes pulmonares estáticos permanecem inalterados<br />

durante a gestação, exceto pela redução da capacidade<br />

residual funcional (CRF) e de seus componentes, o volume<br />

residual (VR) e o volume de reserva expiratório (VRE). Em<br />

decorrência da elevação diafragmática e da redução da<br />

elasticidade do gradeado costal, a tração exercida pelo<br />

componente tóraco-abdominal para baixo e para fora tornase<br />

reduzida, em oposição a uma tensão elástica do parênquima<br />

pulmonar preservada durante a gestação, fazendo com que<br />

o equilíbrio de forças elásticas, que caracteriza a CRF, ocorra<br />

em volume pulmonar ligeiramente menor que na mulher não<br />

grávida. A complacência pulmonar não é afetada pela<br />

gestação. 6-8,9 A capacidade pulmonar total (CPT)<br />

habitualmente não se altera, ou por vezes sofre redução<br />

mínima, enquanto que a capacidade inspiratória (CI) aumenta.<br />

A Figura 1 ilustra os efeitos da gestação no 3º trimestre<br />

sobre os volumes pulmonares estáticos.<br />

Fig. 1: Efeito da gestação sobre os volumes pulmonares estáticos<br />

.Abreviações - CPT: capacidade pulmonar total; CRF: capacidade<br />

residual funcional; CI: capacidade inspiratória; VRE: volume de<br />

reserva inspiratório; VR: volume residual.<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 39


Fluxos expiratórios e resistência das<br />

vias aéreas<br />

Durante a gestação, diversos fatores poderiam afetar o<br />

calibre das vias aéreas, com potencial influência sobre os<br />

fluxos expiratórios máximos e a resistência de vias aéreas.<br />

Edema da mucosa pela embebição gravídica,<br />

broncoconstricção pela redução das concentrações<br />

alveolares de dióxido de carbono (CO 2 ) e o efeito da redução<br />

de volume pulmonar (CRF) sobre as vias aéreas constituem<br />

exemplos de mecanismos que poderiam gerar redução de<br />

fluxos e aumento da resistência das vias aéreas. 9,10<br />

Entretanto, estas alterações teóricas não são confirmadas<br />

pelos diversos estudos que compararam variáveis<br />

espirométricas durante a gestação e após o parto. Não foram<br />

caracterizadas alterações relevantes na grávida quanto à<br />

capacidade vital forçada (CVF), volume expiratório forçado<br />

do 1º segundo (VEF 1 ) ou relação VEF 1 /CVF, o mesmo<br />

ocorrendo com os fluxos expiratórios e com a morfologia da<br />

alça fluxo-volume. Há alguma divergência na literatura quanto<br />

à caracterização de aumento, redução ou manutenção da<br />

CVF porém, mesmo nos estudos que mostraram aumento ou<br />

redução deste parâmetro, a modificação ocorreu em pequena<br />

magnitude e sem relevância clínica. 10,11,12,13,14,15<br />

Difusão<br />

Assim como em relação às vias aeras, diversas adaptações<br />

que ocorrem na gestação normal têm potencial influência<br />

sobre a difusão pulmonar, frequentemente medida na prática<br />

clínica pelo teste de difusão do monóxido de carbono (D L CO).<br />

O aumento da volemia capilar pulmonar e o consequente<br />

recrutamento capilar, associados ao aumento do débito<br />

cardíaco, constituem mecanismos potenciais para aumento<br />

da D L CO. Por outro lado, a redução da taxa de hemoglobina<br />

e os efeitos, ainda que leves em intensidade, de redução da<br />

CPT, tenderiam a promover sua redução. Estudo prospectivo<br />

avaliou o comportamento da difusão ao longo da gestação,<br />

por meio da realização de medidas seriadas mensais da D L CO<br />

desde o primeiro trimestre até o período pós-parto. 16 A D L CO<br />

no primeiro trimestre da gestação foi maior que nas mulheres<br />

não grávidas, ocorrendo pequena queda até 26ª semana, a<br />

partir de quando não se observou redução adicional. As<br />

modificações observadas ao longo da gestação não foram<br />

explicadas pelas variações das taxas de hemoglobina ou do<br />

volume alveolar. Não houve também correlação entre as<br />

variações da D L CO e os níveis séricos de estrogênio.<br />

Interessante particularidade ocorre na avaliação do efeito<br />

do decúbito sobre a D L CO em gestantes. Ao contrário do<br />

comportamento observado em mulheres não grávidas, as<br />

gestantes não apresentam aumento da D L CO na posição<br />

supina em comparação com a posição sentada. Este<br />

comportamento sugere efeito da gestação sobre o retorno<br />

venoso, provavelmente secundário à compressão da veia<br />

cava pelo útero gravídico. 17 De qualquer forma, as pequenas<br />

variações observadas em associação com a gravidez não<br />

mostraram impacto clínico nos diversos estudos disponíveis<br />

que abordaram este tópico. 16-18,19<br />

A relativa estabilidade das variáveis funcionais respiratórias<br />

que caracteriza o curso de uma gestação normal alerta para uma<br />

importante implicação prática: a identificação de alterações na<br />

função pulmonar de uma gestante deve ser valorizada e avaliada<br />

dentro do contexto clínico apropriado, considerando-se a real<br />

possibilidade de existência de doença pulmonar e evitando o<br />

equívoco de imputar as eventuais alterações funcionais às<br />

modificações gravídicas fisiológicas. Dados reais evolutivos<br />

dos parâmetros de função pulmonar de uma jovem saudável<br />

pré e durante as fases da gestação estão apresentados, a título<br />

de exemplo, na Tabela 1. Todos os parâmetros mantiveramse<br />

dentro das faixas previstas ao longo da gravidez.<br />

Ventilação, trocas gasosas e resposta ao<br />

exercício<br />

O padrão ventilatório sofre alterações adaptativas no<br />

decorrer da gestação. Marcado aumento na ventilação<br />

Tabela 1: Evolução de parâmetros de função pulmonar em mulher jovem saudável em condição basal e durante gestação<br />

normal (2º e 3º trimestres).<br />

Pré-Gestação 2º Trimestre 3º Trimestre VariaçãoPré x 3ºT<br />

CVF (L) 4,33 (114%) 4,38 4,38 + 0,05 L (1,5%)<br />

VEF (L) 1 3,39 (106%) 3,44 3,48 + 0,09 L (2,6%)<br />

VEF /CVF 1 0,78 (94%) 0,79 0,79<br />

FEF (L/s) 25-75% 2,93 (103%) 3,00 3,06<br />

CPT (L) 6,02 (111%) 5,75 5,75 - 0,27 L (-5,5%)<br />

VR (L) 1,62 (101%) 1,32 1,39 - 0,23 L (-14%)<br />

CI (L) 3,42 (132%) 3,36 3,44 + 0,02 L (0,5%)<br />

CRF (L) 2,60 (92%) 2,39 2,31 - 0,29 L (-11%)<br />

VRE (L) 0,98 (81%) 1,07 0,92 -0,06 L (-6%)<br />

D CO (mL/min.mmHg) L 26,1 (92%) 25,0 26,6<br />

Abreviações – CVF: Capacidade Vital Forçada; VEF : Volume expiratório forçado do 1º segundo; FEF : fluxo expiratório forçado<br />

1 25-75%<br />

médio, entre 25-75% da CVF; CPT: capacidade pulmonar total; CRF: capacidade residual funcional; CI: capacidade inspiratória; VRE:<br />

volume de reserva inspiratório; VR: volume residual; D CO: difusão medida pelo monóxido de carbono<br />

L<br />

Fonte dos Dados: Laboratório de Função Pulmonar – Serviço de Pneumologia do Incor / FMUSP 2012<br />

40 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


minuto (V E ) é observado, achado concordante nos diversos<br />

estudos da literatura. O aumento da V E ocorre precocemente<br />

na gestação, ao longo das primeiras 12 semanas, mantém-se<br />

neste patamar aumentado, sem incremento adicional<br />

relevante até o termo. A magnitude deste aumento é<br />

significativa, atingindo níveis em torno de 20% a 50% acima<br />

da ventilação em repouso em comparação com nãogestantes<br />

2,3,20,21 O padrão de aumento da V E também é<br />

bastante característico, ocorrendo essencialmente às custas<br />

de aumento do volume corrente (V T ) da ordem de 30 a 50%,<br />

equivalente a incremento de cerca de 200 mL. O aumento da<br />

frequência respiratória é bem mais modesto, entre 1 a 2<br />

inspirações por minuto, o que faz com que a duração do<br />

ciclo respiratório pouco se altere. O padrão ventilatório da<br />

gestante, que combina aumento do V T sem alteração<br />

relevante da frequência respiratória, gera como consequência<br />

o aumento dos fluxos ins e expiratórios, uma vez que passa<br />

a ser mobilizado maior volume de ar dentro de um mesmo<br />

intervalo de tempo. 20,21,22<br />

A gravidez está associada a um incremento do metabolismo<br />

basal, levando a aumento do consumo de oxigênio (VO 2 ) e<br />

da produção de dióxido de carbono (VCO 2 ). Entretanto, a<br />

hiper-ventilação da gestante não é apenas uma adaptação a<br />

este incremento de demanda ventilatória; mecanismos<br />

hormonais estão também envolvidos com a origem deste<br />

comportamento. A progesterona exerce reconhecido efeito<br />

estimulante sobre o centro de controle da respiração.<br />

Mulheres não-grávidas na fase lútea do ciclo menstrual e<br />

homens submetidos à administração de progesterona<br />

exógena apresentam respostas ventilatórias aumentadas. Os<br />

mecanismos moleculares relacionados a este efeito hormonal<br />

não são completamente esclarecidos, porém sabe-se que a<br />

ação do hormônio gera aumento da sensibilidade dos<br />

receptores de dióxido de carbono (CO 2 ) e estimulação dos<br />

centros neurais envolvidos com o controle da ventilação. O<br />

resultado é uma redução do ponto-alvo de ajuste CO 2 para<br />

níveis mais baixos. Estes efeitos ocorrem pela ação da<br />

progesterona isoladamente e são ainda potencializados pela<br />

associação com estrogênios. 23,24,25<br />

As modificações dos níveis de CO 2 no sangue arterial<br />

(paCO 2 ) observadas ao longo da gestação reforçam a tese<br />

de que a intensidade do incremento da ventilação na gestante<br />

excede a demanda metabólica. No primeiro trimestre observase<br />

redução da paCO 2 de 37 mmHg para ao redor de 27 mmHg,<br />

nível este que se mantém até o termo. Este comportamento<br />

caracteriza grau de ventilação alveolar desproporcionalmente<br />

maior que a necessidade ventilatória requerida para<br />

acomodar o aumento da VCO 2 . Em linha com este fenômeno,<br />

observa-se também uma elevação da pressão arterial de<br />

oxigênio (paO 2 ). A paO 2 aumenta de 95 para 105 mmHg já no<br />

primeiro trimestre e mantém-se elevada durante o restante<br />

da gravidez. 26,27 A alcalose respiratória gerada por esta adaptação<br />

do padrão ventilatório faz com que haja maior eliminação renal<br />

de bicarbonato, como mecanismo compensatório para ajuste<br />

do pH plasmático. Esta alcalose, mantida durante a gravidez,<br />

estimula a produção de 2,3 difosfo-glicerato (2,3-DPG), agente<br />

que interfere na curva de dissociação da hemoglobina,<br />

tornando-a mais apta a liberar o oxigênio na troca gasosa<br />

periférica. Estes efeitos constituem importantes mecanismos<br />

adaptativos que contribuem para a otimização da entrega de<br />

oxigênio para a circulação fetal. 26-28,29<br />

Dispnéia “Fisiológica” da Gestação<br />

A prática de exercício aeróbico em intensidade moderada<br />

é segura durante a gestação e parece exercer efeitos<br />

benéficos sobre o risco de adventos mórbidos como diabetes<br />

gestacional e pré-eclâmpsia. As respostas fisiológicas ao<br />

exercício apresentam características particulares na grávida.<br />

Estudos que avaliaram as respostas funcionais ao exercício<br />

incremental em gestantes saudáveis, comparando-as com<br />

as respostas observadas após o parto ou com grupo de<br />

mulheres não-grávidas. Não foram caracterizadas diferenças<br />

relevantes quanto ao VO 2 no pico do esforço, porém a V E<br />

atingiu níveis significativamente maiores para a mesma<br />

intensidade de carga de exercício nas gestantes (Figura 2a)<br />

6,1,10 Além do aumento da V E , há também aumento dos<br />

índices de dispnéia (escala de Borg) (Figura 2-b) e da<br />

intensidade do esforço muscular na respiração corrente<br />

durante o exercício (Figura 2-c); o esforço respiratório foi<br />

medido através da amplitude de variação da pressão<br />

esofágica, expressa como porcentagem da pressão<br />

inspiratória máxima (P ES /PImax %). Entretanto, ambas as<br />

variáveis não apresentaram diferenças quando corrigidas<br />

para a V E (Figura 2-d). Estes dados sugerem que o incremento<br />

da resposta ventilatória promove a necessidade de maior<br />

esforço inspiratório e que de fato não há caracterização de<br />

maior sensação de dispnéia na gestante, sobretudo quando<br />

corrigida para a intensidade da V E .<br />

O relato de sensação de dispnéia no curso de uma<br />

gestação normal é muito frequente, atingindo cerca de dois<br />

terços das gestantes, sintoma frequentemente chamado de<br />

dispnéia “fisiológica” da gestação. Interessante estudo<br />

comparou as respostas fisiológicas ao esforço em gestantes<br />

com e sem a queixa de dispnéia para atividades habituais,<br />

por meio da avaliação de um grupo de mulheres saudáveis<br />

no 3º trimestre da gestação e cerca de 4 a 5 meses após o<br />

parto. 30,31 No grupo sem dispnéia, a gestação não produziu<br />

diferença na escala de Borg em condições de mesma carga<br />

durante exercício incremental. Entretanto, a gestação<br />

proporcionou menor sensação de dispnéia quando corrigida<br />

pela ventilação minuto (Figura 3-a). Em contraste com este<br />

comportamento, no grupo com dispnéia a gestação foi fator<br />

associado ao aumento na escala de Borg em condições de<br />

iso-carga, mas não quando corrigida para a ventilação minuto,<br />

quando não diferiu do período tardio pós-parto (Figura 3-b).<br />

Estes dados sugerem que a dispnéia fisiológica da gestação<br />

consiste na percepção normal do estado de hiper-ventilação<br />

que acompanha a gravidez, ao passo que a gestante que<br />

não tem dispnéia apresenta uma redução da percepção que<br />

auxilia na tolerância do estado de hiper-ventilação próprio<br />

da gestação. Este estado de hiper-ventilação é mediado pelos<br />

ajustes hormonais promovidos sobre os centros de regulação<br />

da ventilação e tem importante papel adaptativo para<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 41


Fig. 2: Comparação da resposta ventilatória e da sensação de dispnéia em mulheres saudáveis no 3º trimestre da gestação e no período<br />

tardio pós-parto. Fonte: Referência (31)<br />

Fig. 3: Comparação da resposta ao exercício no 3º trimestre da gravidez e no período tardio pós-parto de mulheres com e sem queixa de<br />

dispnéia durante a gestação. Fonte: Referência (30)<br />

42 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


atendimento das necessidades metabólicas da mãe e do feto.<br />

A queixa de dispnéia da gestante frequentemente é leve e<br />

apresenta pouco impacto para as atividades habituais, porém<br />

em alguns casos demanda avaliação médica. O conhecimento<br />

de seus mecanismos e características clínicas é fundamental<br />

para permitir a diferenciação entre dispnéia fisiológica da<br />

gestação daquela decorrente de alguma doença subjacente.<br />

Conclusão<br />

Alterações relevantes estruturais e funcionais ocorrem<br />

no transcurso de uma gestação normal. Aumento dos<br />

diâmetros ântero-posterior e transverso do tórax ocorrem<br />

precocemente para compensar a elevação diafragmática que<br />

progressivamente ocorrerá em consequência do aumento<br />

do tamanho uterino. Pequenas reduções da CRF são<br />

observadas, decorrentes da redução do VR e VRE, porém a<br />

CPT mantém-se estável. Fluxos expiratórios e difusão também<br />

não sofrem alterações relevantes. Portanto, a função<br />

pulmonar é essencialmente preservada em gestação normal<br />

e a presença de teste de função pulmonar alterado em uma<br />

gestante deve suscitar investigação diagnóstica adicional<br />

de acordo com o contexto clínico.<br />

Adaptações ventilatórias ocorrem de maneira relevante<br />

em repouso e como resposta ao esforço. A combinação de<br />

efeitos hormonais reajusta o ponto-alvo da paCO2 para<br />

patamar inferior, gerando estado de hiperventilação<br />

característico da gestante. A preservação da percepção deste<br />

estado crônico de hiper-ventilação está associada com a<br />

gênese da chamada dispnéia “fisiológica” da gestação.<br />

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João Marcos Salge<br />

jmsalge@me.com<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 43


Alterações do crescimento e<br />

desenvolvimento pulmonar fetal<br />

AUTOR: Adyléia A Dalbo Contrera Toro<br />

1Medica Assistente do Departamento de Pediatria/ Pneumologia Pediátrica da Faculdade de Ciências<br />

Médicas /UNICAMP<br />

Introdução<br />

O desenvolvimento intrauterino do sistema respiratório é<br />

crucial para determinar a qualidade das trocas gasosas e a<br />

possibilidade de doenças durante a vida. Qualquer agressão<br />

nessa fase está relacionada com sintomas respiratórios na<br />

infância e na vida adulta em decorrência de alterações na<br />

formação dos alvéolos e dos brônquios. Fatores genéticos,<br />

ambientais, hormonais e nutricionais podem alterar o<br />

desenvolvimento pulmonar. Além disso, existem diferenças<br />

individuais em relação ao tamanho e calibre das vias aeríferas<br />

o que pode determinar um pior desfecho diante de um agravo.<br />

Eventos pós-natal como parto prematuro, infecções,<br />

ventilação mecânica também podem resultar em alterações<br />

persistentes na estrutura e função pulmonar. 1<br />

O desenvolvimento do pulmão compreende os estágios<br />

embrionário, pseudo glandular, canicular, sacular , alveolar,<br />

prossegue após o nascimento e termina quando para o<br />

crescimento do indivíduo. 2 Fig-1<br />

Fig-1. Fases do desenvolvimento das vias aéreas Modificado de Miller e Marty, 2010 6 .<br />

Desenvolvimento pulmonar durante a<br />

gestação<br />

a.Fase embrionária<br />

Na quarta semana de gestação a partir do tubo digestivo<br />

se diferencia um broto que origina a laringe e a traqueia.<br />

Essa se subdivide em dois ramos, os brônquios principais<br />

direitos e esquerdo. 2<br />

b.Fase Pseudo glandular<br />

A árvore traqueobrônquica se origina nas primeiras semanas<br />

de gestação. A via de condução está completa perto da 16ª<br />

semana de gestação durante a fase pseudo-glandular, quando<br />

ocorre o desenvolvimento das vias aéreas inferiores em 20<br />

ramificações. Os 8 primeiros são os brônquios com cartilagem<br />

em sua estrutura e os demais ramos de 9 a 20 gerações, são os<br />

bronquíolos. Os vasos linfáticos e a membrana pleural se<br />

desenvolvem nesse período. Durante esse período pode<br />

ocorrer anormalidades das conexões dos brônquios como o<br />

cisto brônquico e o enfisema lobar congênito.<br />

44 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


c.Fase Canicular<br />

Entre as 16ª e 24ª semana é a fase canicular em que as<br />

estruturas condutoras têm seu calibre aumentado. Ocorre<br />

diferenciação dos espaços aéreos e da vasculatura pulmonar,<br />

o que permite a troca gasosa. Isso explica o fato de<br />

prematuros com 24 semanas de gestação poder apresentar<br />

oxigenação do sangue embora não tenham completado a<br />

diferenciação da membrana alvéolo-capilar e dos septos<br />

interalveolares.<br />

d.Fase Sacular<br />

Na fase seguinte entre as 24 e 36 semanas, as vias aéreas<br />

pré-acinares crescem, os bronquíolos se desenvolvem e os<br />

ácinos são formados. O alvéolo pode ser reconhecido a partir<br />

da 30ª semana de gestação. 3<br />

e.Fase Alveolar<br />

Compreende o período de 37 semanas a 3 anos pós-termo.<br />

Com a evolução das estruturas alveolares ocorre um aumento<br />

da superfície das trocas gasosas.<br />

O crescimento das vias aéreas prossegue após o<br />

nascimento, tendo seu diâmetro dobrado e seu comprimento<br />

triplicado até a idade adulta. 4 Recém-nascidos com a mesma<br />

idade gestacional e peso apresentam diferenças no calibre e<br />

número de alvéolos ao nascimento. Essas diferenças também<br />

são encontrados nas meninas e meninos. 5<br />

Determinantes pré-natais do desenvolvimento<br />

das vias aéreas<br />

a.Fatores Mecânicos<br />

O desenvolvimento estrutural e funcional das vias aéreas<br />

inferiores durante a gestação é determinado também por fatores<br />

mecânicos 7 . A limitação do espaço torácico em geral em presença<br />

de hérnia diafragmática está associado ao um menor crescimento<br />

e desenvolvimento pulmonar. O volume do líquido amniótico<br />

também está associado com alterações, como a hipoplasia<br />

pulmonar encontrada em crianças com oligodrâmnio.<br />

A destruição seletiva da medula cervical ao nível do<br />

núcleo do frênico resulta em parada dos movimentos<br />

respiratórios fetais e alterações no desenvolvimento<br />

pulmonar. A redução ou parada dos movimentos respiratórios<br />

fetais pode ser responsável pelo crescimento anormal do<br />

pulmão visto em condições tais como a Doença de Werdig–<br />

Hoffman ou a distrofia miotônica. 8<br />

b.Fatores Genéticos<br />

As características genéticas individuais influenciadas<br />

pelo meio ambiente são determinantes para o crescimento<br />

estrutural e funcional das vias aéreas . Algumas doenças tais<br />

como doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), Asma e<br />

Fibrose Cística podem estar relacionadas com o<br />

desenvolvimento anormal do pulmão na vida intrauterina e<br />

nos primeiros anos de vida. 9 Diferentes características<br />

genéticas individuais que influenciam o crescimento<br />

pulmonar podem contribuir com a futura vulnerabilidade dos<br />

pulmões aos agravos do meio ambiente e suscetibilidade a<br />

futuras doenças. 9<br />

A epigenética, controle do fenótipo ao nível molecular,<br />

refere-se a todas as mudanças reversíveis e herdáveis no<br />

genoma funcional que não alteram a sequência de<br />

nucleotídeos do DNA. Nesse sentido ocorre a mudança de<br />

expressão espaço-temporal de genes durante a diferenciação<br />

de um tipo de célula através da influência do meio ambiente<br />

e esses são passados para os descendentes. 10<br />

As mudanças epigenéticas são fortemente influenciadas<br />

pelo ambiente. Qualquer alteração ambiental como poluição,<br />

tabagismo tipo de alimentação e infecção pode acarretar em<br />

mudanças epigenéticas. Sendo assim, a epigenética está<br />

intimamente relacionada com o aumento de variabilidade<br />

fenotípica dos indivíduos resultando em relevante<br />

importância para a evolução.<br />

A nicotina é o maior produto do cigarro e está associada<br />

com dano ao DNA. A exposição a fumaça do cigarro durante<br />

a vida uterina e no período pós-natal leva a sérias alterações<br />

estruturais do pulmão e resulta em mudanças epigenéticas<br />

que podem passar para as futuras gerações. 11<br />

c.Fatores Ambientais<br />

A exposição a poluentes do ambiente durante a vida<br />

intrauterina e no período pós-natal altera negativamente ao<br />

crescimento e a função pulmonar. 12,13,14 Associado a isso<br />

existem alterações como diminuição da alveolização,<br />

decréscimo da síntese e liberação de proteínas e de<br />

surfactante pelo epitélio alveolar que estão associados a<br />

prematuridade do recém nascido. 14 Assim parto prematuro e<br />

retardo do crescimento intrauterino, causas comuns de baixo<br />

peso ao nascimento irão influenciar o risco de doenças<br />

pulmonares em todos os estágios da vida pós-natal. 14,15<br />

Estudos prospectivos que investigaram a associação entre<br />

a exposição materna a poluentes ambientais e parto prematuro<br />

relataram significantes redução no tempo de gestação com<br />

aumento dos níveis de partículas totais em suspensão e<br />

dióxido de enxofre no ar. 16<br />

Além disso, as associações entre cigarro, tabagismo<br />

materno e mortalidade fetal, parto prematuro, retardo do<br />

crescimento intrauterino são amplamente documentados na<br />

literatura. 14, 17 18, 19,20 Acredita-se que esses efeitos são<br />

relacionados a toxidade do cigarro na época do<br />

desenvolvimento fetal por acarretar alterações morfológicas<br />

na placenta o que contribui para hipóxia crônica e nutrição<br />

deficiente do feto. 14 Outra alteração associada a exposição<br />

à fumaça do cigarro é a supressão imunológica que aumenta<br />

o risco de infecções respiratórias.<br />

Assim as agressões ambientais somadas às infecções<br />

crônicas e recorrentes durante a fase de crescimento pulmonar<br />

intenso e maturação do sistema imunológico podem interferir<br />

na formação adequada das estruturas respiratórias. 21<br />

d. Infecções durante o período pré-natal<br />

Durante a gravidez pode ocorrer infecção intrauterina<br />

como a corioamnionite. Alguns estudos mostraram que a<br />

infecção intrauterina está associada com trabalho de parto<br />

prematuro. 22 Entretanto a função placentária pode não ser<br />

afetada pela infecção havendo um crescimento fetal<br />

adequado e a gravidez chegar ao final. Mas a corioamnionite<br />

pode alterar o desenvolvimento de alguns órgãos na vida<br />

fetal entre eles o pulmão. Estudos em animais mostraram<br />

que a exposição fetal a agentes inflamatórios lipossacarídeos<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 45


ou endotoxinas pode alterar profundamente o<br />

desenvolvimento pulmonar. As alterações irão depender da<br />

época da exposição e do grau da inflamação. São<br />

questionados duas alterações relacionadas a corioamnionite.<br />

A primeira, o estímulo da produção de surfactante e a<br />

segunda o efeito adverso sobre o desenvolvimento<br />

alveolar. 20 Dessa forma a corioamnionite contribui para um<br />

amadurecimento pulmonar precoce com a produção do<br />

surfactante o que melhora a complacência pulmonar após o<br />

parto prematuro e contribui com a sobrevivência do recémnascido<br />

pré-termo, mas também afeta negativamente o<br />

desenvolvimento alveolar o que pode elevar o risco de displasia<br />

broncopulmonar. 23 Não se sabe se a alteração na arquitetura<br />

pulmonar causada por infecção no período pré-natal é<br />

permanente, visto que alguns estudos mostraram a recuperação<br />

estrutural e funcional do pulmão após o nascimento. 20 Todavia<br />

a exposição à endotoxinas no período condiciona duas<br />

respostas do sistema imune inato, a maturação e a tolerância. O<br />

pulmão do feto contém uma quantidade muito pequena de<br />

macrófagos intersticiais ou alveolares e os monócitos presentes<br />

são imaturos. A corioamnionite ativa a inflamação inicial<br />

promovendo a maturação dos macrófagos alveolares, mas uma<br />

segunda exposição à endotoxinas não amplia a resposta<br />

inflamatória pelo mecanismo de tolerância o que deve ser vital<br />

para sobrevivência do feto em um ambiente pró-imflamatório. 24<br />

Os efeitos da exposição a infecções sobre o sistema imunológico<br />

na fase prenatal estão começando a ser desvendadas na<br />

literatura e algumas respostas não estão totalmente claras. 22<br />

Considerações finais<br />

Fatores que afetam o desenvolvimento pulmonar durante<br />

a gestação e no pós-natal imediato precisam ser melhores<br />

reconhecidos, para que sejam evitados os desfechos<br />

negativos. Os maiores eventos associados negativamente a<br />

formação do pulmão são a insuficiência placentária, a<br />

exposição a fumaça do cigarro, o parto prematuro, as<br />

infecções e a poluição ambiental.<br />

O padrão de crescimento e de desenvolvimento das vias<br />

aéreas e do parênquima pulmonar está relacionado com<br />

doenças futuras tanto na faixa etária pediátrica como na vida<br />

adulta. Portanto um melhor reconhecimento das alterações<br />

estruturais e funcionais do sistema respiratório que ocorrem<br />

durante a fase de pré-natal acarretará em estratégias para<br />

reduzir o quadro atual de doenças pulmonares relacionadas<br />

ao desenvolvimento pulmonar.<br />

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Med. 2009 Feb;14(1):2-7<br />

Adyléia A. Dalbo Contrera Toro<br />

dalbotoro@terra.com.br<br />

46 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 47


48 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


RELATO DE CASO<br />

Gestação em paciente com<br />

Fibrose Cística<br />

AUTORES: Silvia Maria Romão Pontes 1 , Lidia Alice Gomes M.M. Torres 2 , Ieda Regina Lopes Del Ciampo 3 ,<br />

Marcelo Amaral Ruiz 4 , Albin Eugenio Augustin 5 , Valéria Laguna Salomão Ambrósio 6 ,<br />

Maria Inez Machado Fernandes 7<br />

1 Médica Pneumologista Assistente do Ambulatório Multidisciplinar de Fibrose Cística do Hospital<br />

das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HC/<br />

FMRP/USP)<br />

2 Chefe do Serviço de Pneumologia Pediátrica e Assistente do Ambulatório Multidisciplinar de<br />

Fibrose Cística - HC/FMRP/USP<br />

3 Médica Pediatra Gastroenterologista e Assistente do Ambulatório Multidisciplinar de Fibrose<br />

Cística - HC/FMRP/USP<br />

4 Médico Pediatra Endocrinologista Assistente do Ambulatório Multidisciplinar de Fibrose Cística<br />

- HC/FMRP/USP<br />

5 Médico Pediatra Pneumologista Assistente do Ambulatório Multidisciplinar de Fibrose Cística -<br />

HC/FMRP/USP<br />

6 Nutricionista Chefe da Clínica Materno-Infantil - HC<br />

7 Docente do Departamento de Pediatria e Chefe do Ambulatório Multidisciplinar de Fibrose Cística<br />

HC/FMRP/USP<br />

Introdução<br />

A Fibrose Cística (FC) é uma doença autossômica<br />

recessiva causada por mutações em um gene que codifica<br />

uma proteína denominada CFTR, cuja função é o transporte<br />

transmembrana de cloro. Sendo várias as mutações já<br />

conhecidas, os fenótipos são bastantes variáveis. 1<br />

É uma doença complexa que acomete vários órgãos,<br />

sendo a insuficiência pancreática exócrina, com consequente<br />

má-absorção e desnutrição, e a doença pulmonar crônica,<br />

caracterizada por bronquiectasias, colonização por agentes<br />

microbiológicos patogênicos e piora progressiva da função<br />

pulmonar, suas principais manifestações. 3<br />

Embora, há algumas décadas a sobrevida fosse muito<br />

reduzida, a associação do diagnóstico precoce a melhores<br />

abordagens terapêuticas permitiu que atualmente esta se<br />

elevasse para, em média, os 40 anos de idade e<br />

consequentemente, houve uma elevação na incidência de<br />

gestantes portadoras da doença. 2,3,4<br />

Registros da Fundação Norte-Americana de Fibrose<br />

Cística apontam para cerca de 140 gestações por ano desde<br />

1991, com um percentual de gravidez igual a 3-4% nas<br />

fibrocísticas acima de 17 anos. 4<br />

A gestação nas portadoras de Fibrose Cística deve ser<br />

considerada de alto risco, pois as modificações fisiológicas<br />

próprias da gestação podem comprometer seriamente o<br />

estado nutricional e o aparelho cardiorrespiratório da<br />

gestante, principalmente naquelas com menor função<br />

pulmonar. 5<br />

A evolução e o desfecho da gravidez nestas mulheres<br />

são variáveis, habitualmente com manejo complexo.<br />

Consideramos interessante relatar o caso de uma gestante<br />

portadora de Fibrose Cística, com grave comprometimento<br />

pulmonar, paciente de nosso Ambulatório Multidisciplinar<br />

de Fibrose Cística (AMFC) no Hospital das Clínicas de<br />

Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.<br />

Caso Clínico<br />

Paciente de 32 anos, portadora de FC, com diagnóstico<br />

aos 04 anos de idade, apresentava:<br />

• insuficiência pancreática exócrina, em terapia de<br />

reposição das enzimas pancreáticas;<br />

• diabetes relacionada a FC (DRFC), em uso de insulina<br />

regular;<br />

• doença pulmonar crônica sendo VEF 1 antes da gestação<br />

correspondente a 27% do previsto (0,83L), em uso de alfadornase<br />

duas vezes ao dia;<br />

• colonização crônica da via aérea por Stafilococcus<br />

aureus MSSA, Pseudomonas aeruginosas e Achromobacter<br />

xylosoxydans ssp denitrificians, em uso de colistina<br />

inalatória no momento da descoberta da gestação<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 49


Tabela 1 – Evolução laboratorial<br />

Basal Primeiro trimestre Terceiro trimestre Pós – parto<br />

Sódio (mmol/L) 138,6 137,3 131 142<br />

Potássio (mmol/L) 4,3 4,9 3,7 4,6<br />

Cálcio total (mg/dl) 9,4 - -<br />

Creatinina (mg/dl) 0,8 0,7 0,5 0,7<br />

Uréia 25 20 12 32<br />

Hb (g/dl) 12,2 10,9 10,0 10<br />

Ht (%) 38 34 33 33<br />

VCM (fl) 78 77 85 65<br />

HCM (pg) 24,9 31,7 26 26<br />

GB 12300 9500 9400 8400<br />

Plaquetas 366000 375000 326000 479000<br />

AST (U/l) 12 10 12 10<br />

ALT(U/l) 8 5,0 9 18<br />

FAL (U/l) 185 123 254 249<br />

GGT (U/l) 18 12 36 30<br />

BB TOTAL (mg/dl) - - 0,38 0,17<br />

TTPA (ratio) 1,24 1,27 1,14 -<br />

TP (INR) 1,0 1,0 0,9 -<br />

Glicemia (mg/dl) 122 92 124 169<br />

Ferro sérico (ug/dl) - 24 53 26<br />

UIBC (ug/dl) - 266 394 348<br />

Ferritina (ng/ml) - 19,8 47,6 57<br />

Colesterol total (mg/dl) 127 113 188 190<br />

LDL (mg/dl) 69 64 196 -<br />

HDL (mg/dl) 48 35 30 -<br />

Triglicérides (mg/dl) 51 71 118 162<br />

Albumina (g/dl) 4,1 3,15 3,2 3,3<br />

Proteína total (g/dl) 6,8 7,10 6,6 6,7<br />

Vitamina A (mg/l) - 0,38 0,16 0,52<br />

Hemoglobina glicosilada (%) - 8,3 6,0 -<br />

Devido à gravidade do comprometimento pulmonar e das<br />

frequentes exacerbações, apresentava necessidade de<br />

internações semestrais para realização de antibioticoterapia<br />

endovenosa (EV) e já era submetida a avaliações no serviço<br />

de transplante pulmonar do INCOR-SP.<br />

Não utilizava nenhum método contraceptivo. Compareceu<br />

à consulta de rotina com relato de atraso menstrual há 02<br />

meses e “teste de farmácia” positivo, sendo encaminhada<br />

para seguimento conjunto com o grupo de gestação de<br />

alto risco.<br />

A evolução dos exames laboratoriais encontram-se na<br />

tabela 1.<br />

Em consulta anterior à gestação, apresentava-se eutrófica<br />

do ponto de vista nutricional, com peso igual a 61,8<br />

quilogramas (Kg), altura igual a 1,64 m, correspondendo a<br />

um índice de massa corpórea (IMC) de 22,9 Kg/m 2 . Devido à<br />

hiperemese gravídica, chegou a pesar 60,6 Kg ao final do<br />

primeiro trimestre.<br />

Nesse mesmo período foi iniciada oxigenoterapia aos<br />

esforços, devido à presença de hipoxemia induzida por<br />

exercício detectada pelo teste de caminhada dos seis minutos.<br />

Houve, ainda, a necessidade de internação para uso de<br />

antibioticoterapia EV em razão de exacerbação infecciosa<br />

por volta da 12ª semana de gestação, quando apresentou<br />

piora da dispneia e do padrão do escarro, na vigência da<br />

colistina inalatória. Em razão do perfil de sensibilidade dos<br />

agentes colonizadores, optou-se pela utilização de<br />

meropenen e oxacilina, por 21 dias, nas doses habituais,<br />

após discussão em conjunto com a equipe de gestação de<br />

alto risco. Durante a internação, foi submetida a um<br />

ecocardiograma, que foi compatível com a normalidade.<br />

Recebeu alta com melhora clínica e ganho satisfatório de<br />

peso, sendo mantido o uso da oxigenoterapia aos esforços<br />

e à noite, além de tobramicina inalatória para manutenção do<br />

controle dos sintomas. Na alta, foi realizada prova de função<br />

pulmonar (PFP) com obtenção de VEF 1 correspondente a<br />

23% do previsto. A evolução da função pulmonar pode ser<br />

vista na tabela 2.<br />

Além das avaliações de rotina no AMFC e do pré-natal,<br />

fez-se correção das doses de sulfato ferroso, acido fólico,<br />

50 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Tabela 2 - Evolução da função pulmonar durante o período gestacional<br />

Maio/2011 (pré-gestacional) Dez/2011 (17 sem) * Fev/2012 (23 sem e 5 d) *<br />

CV 1,84 L 51,4% ** 1,53 L 42,9% ** <br />

CRF 2,32 L 82,2% ** 1,73 L 61,3% ** <br />

VR 2,16 L 153,2% ** 1,57 L 109,8% ** <br />

CPT 4,0 L 80,1% ** 3,10 L 62% ** <br />

VEF1 0,83 L 27,1% ** 0,72 L 23,6% ** 0,76 L 25% **<br />

CVF 1,84 L 51,4% ** 1,53 L 42,9% ** 1,67 L 46,9% **<br />

VEF1/CVF % 45 47 45<br />

FEF25-75 0,21 L 5,9% ** 0,28 L 8% ** 0,22 L 6,3 **<br />

* idade gestacional ** porcentagem do previsto paciente não conseguiu realizar medição de volumes<br />

suplementos nutricionais e vitaminas, e controle rigoroso<br />

do DRFC. Houve acompanhamento nutricional, com<br />

orientações dietéticas que seguiram as recomendações para<br />

gestante fibrocística. A dieta foi fracionada em 6 vezes ao<br />

dia e foram utilizados suplementos com alta densidade<br />

calórica.<br />

Devido ao alto risco materno em uma possível posterior<br />

gestação, foi acordada com a equipe da Ginecologia e<br />

Obstetrícia (GO), com consentimento da paciente, a realização<br />

de laqueadura tubária.<br />

Nas consultas clínicas realizadas mensalmente e durante<br />

o pré-natal, as queixas de cansaço e dispneia limitante eram<br />

cada vez mais frequentes, com aumento progressivo de<br />

intensidade.<br />

Por volta da 29ª. semana de gestação, compareceu ao<br />

hospital com quadro clínico de dispneia, frequência<br />

respiratória de 40 incursões por minuto, hipoxemia em<br />

repouso, sinais de esforço respiratório, sibilos difusos,<br />

associado a relato de hemoptise de pequeno volume nos<br />

dias que antecederam a procura pelo serviço médico,<br />

hemoptoicos e piora da característica do escarro. Nova<br />

internação para controle, com utilização do mesmo esquema<br />

de antibiótico EV (meropenen e oxacilina). Houve<br />

necessidade de nebulização com broncodilatador por toda a<br />

internação. Pelo quadro clínico pouco favorável, a equipe<br />

Gráfico 1 – Evolução ponderal<br />

da gestação de alto risco optou por realizar o primeiro ciclo<br />

de betametasona para indução de maturação pulmonar do<br />

feto. Após alguns dias de internação, houve melhora clínica.<br />

No entanto, a corticoterapia prejudicou o controle do<br />

diabetes, com necessidade de aumento das doses de insulina<br />

e início do uso de insulina de ação intermediária. A paciente<br />

apresentou hiponatremia assintomática, sendo feita<br />

reposição com solução de reidratação oral, por volta do 14 o .<br />

dia de internação, além de edema dos membros inferiores,<br />

atribuído ao período gestacional.<br />

Apesar do controle clínico da exacerbação infecciosa, a<br />

dispneia piorava diária e gradativamente. No 20º. dia da<br />

antibioticoterapia, apresentou piora intensa, com dificuldade<br />

para tomar banho, pentear os cabelos, mover-se no leito.<br />

Após extensa discussão e descarte de outras hipóteses,<br />

consideramos o quadro como consequência da fase<br />

gestacional avançada numa paciente com função pulmonar<br />

reduzida. Desta forma, em reunião multidisciplinar com as<br />

equipes da Pneumologia/Fibrose Cística, Ginecologia e<br />

Obstetrícia além de Pediatria/Neonatologia, optou-se pela<br />

interrupção da gestação. Nesse momento, a paciente pesava<br />

69,2 Kg, com ganho médio de 230 g por semana (gráfico 1).<br />

Todas as avaliações obstétricas mostravam feto sem<br />

anormalidades, com excelente perfil biofísico fetal, com peso<br />

estimado de 1700 g ao redor da 29ª. semana de gestação. Foi<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 51


ealizado o segundo ciclo de betametasona para maturação<br />

pulmonar fetal e posterior parto cesárea (PC) em 13/04/2012.<br />

A via de parto foi optada em razão da limitação da paciente<br />

para esforço físico e o procedimento transcorreu sem<br />

intercorrências para a mãe e para o RN. A modalidade<br />

anestésica escolhida foi a raquianestesia, e realizada<br />

laqueadura tubária.<br />

O concepto nasceu pré-termo, masculino, pesando 2555g<br />

e medindo 43 cm, com Apgar 8/9, adequado para idade<br />

gestacional. Em razão da prematuridade, foi encaminhado<br />

para a unidade de terapia intensiva. Apresentou desconforto<br />

respiratório transitório do recém-nascido, hipoglicemia e<br />

icterícia neonatal, que se resolveram gradativamente. Em<br />

razão da dificuldade de se estabelecer definitivamente a<br />

amamentação, e pelos cuidados exigidos na prematuridade,<br />

mãe e filho permaneceram internados por 15 dias. A paciente<br />

apresentou quadro gripal e evoluiu com sinusite aguda, sendo<br />

prescrito amoxacilina-clavulanato. Recebeu alta com<br />

medicações habituais.<br />

O teste de triagem neonatal foi normal, com IRT<br />

(imunotripsina reativa) igual a 13. Mãe e criança passam<br />

bem, com aleitamento materno complementado com fórmula<br />

apropriada e mãe utilizando medicações habituais.<br />

Discussão<br />

Apesar do desfecho favorável, a paciente apresentava<br />

uma função pulmonar basal muito limitante. De acordo com<br />

a experiência e o relato de outros centros, a função pulmonar<br />

basal é um dos determinantes do prognóstico da gestação,<br />

da evolução da mãe e do feto. 4,5,6 A função pulmonar reduzida<br />

está associada à prematuridade, retardo do crescimento fetal,<br />

além de complicações maternas graves no peri-parto. O VEF 1<br />

entre 60% e 70% seria o recomendado para uma evolução<br />

favorável da gestação. Há recomendações de interrupção<br />

da gestação caso a mãe apresente um CVF abaixo de 50%,<br />

entretanto, as únicas condições nas quais não restam<br />

dúvidas sobre a indicação de interrupção são hipertensão<br />

pulmonar e cor pulmonale pré-existentes. 6,7,8 Uma função<br />

pulmonar reduzida está associada à hipoxemia induzida por<br />

esforço e noturna, situações que podem surgir na evolução<br />

da gestação e devem ser ativamente pesquisadas neste<br />

contexto, pois a hipoxemia pode comprometer seriamente a<br />

evolução da mãe e da criança.<br />

Outra situação esperada nesta população é o<br />

aparecimento ou a descompensação do Diabetes relacionado<br />

à Fibrose Cística. A paciente portadora de FC gestante tem<br />

alto risco de desenvolver essa doença em razão da<br />

incapacidade de secretar quantidade suficiente de insulina,<br />

para equilibrar o aumento da resistência insulínica nas fases<br />

mais avançadas da gestação. A presença do DRFC está<br />

relacionada à prematuridade e geralmente associada à<br />

deterioração da função pulmonar. O mau controle glicêmico<br />

no primeiro trimestre está associado a malformações. 4,9 Nossa<br />

paciente já apresentava DRFC antes da gestação e tinha um<br />

bom controle glicêmico em uso de insulina. Como esperado,<br />

necessitou de ajustes frequentes da insulinoterapia durante<br />

a gestação. Não houve restrição dietética conforme previsto<br />

no tratamento desse tipo de diabetes, em razão da máabsorção.<br />

10<br />

O estado nutricional eutrófico de nossa paciente<br />

colaborou para a boa evolução. Baixo IMC está associado à<br />

piora da função pulmonar e baixo peso do RN ao nascer.<br />

Nossa paciente apresentou um ganho de peso satisfatório e<br />

recebeu constantemente orientações para suplementação do<br />

aporte calórico, tanto pela dieta como através de<br />

suplementos nutricionais. A reposição de vitaminas foi<br />

avaliada e readequada com base em dosagens séricas.<br />

Recomenda-se que a reposição de vitamina A não ultrapasse<br />

10.000 UI/dia. A suplementação de vitamina D ainda não<br />

está totalmente estabelecida. A deficiência de ferro já é<br />

descrita em pacientes com FC. A gestação aumenta os riscos<br />

de depleção e desenvolvimento de anemia. Desta forma, é<br />

comum a avaliação e reposição de ferro, durante o pré-natal,<br />

em mulheres grávidas mesmo saudáveis. A recomendação<br />

não difere para as portadoras de Fibrose Cística. Nossa<br />

paciente apresentava anemia hipocrômica e microcítica, com<br />

alteração na ferrocinética, a qual normalizou após reposição<br />

habitual. A ingesta de proteínas, carboidratos e gorduras,<br />

com acréscimos da quantidade de calorias de acordo com<br />

cada fase gestacional foi controlada e ajustada pela equipe<br />

de nutrição. O ganho adequado de peso é de suma<br />

importância para um prognostico favorável. Desta forma,<br />

recomenda-se a nutrição enteral em casos nos quais a<br />

ingestão calórica não é atingida. Embora, muito raramente<br />

necessária, há relato de caso de utilização de nutrição<br />

parenteral em gestante portadora de FC. 4<br />

Uma das principais dificuldades é o manejo terapêutico<br />

medicamentoso. Foram seguidas as recomendações das<br />

diretrizes européias sobre gestação em portadoras de FC,<br />

além de consultarmos a equipe da gestação de alto risco. O<br />

manejo dos antibióticos fica comprometido principalmente<br />

durante o primeiro trimestre. Tanto a tobramicina quanto a<br />

colistina inalatórias são classificadas como provavelmente<br />

seguras, em razão da baixa absorção sistêmica. Durante as<br />

internações, embora a escolha da oxacilina não oferecesse<br />

problemas em razão da segurança das penicilinas, o uso do<br />

carbapenêmico baseou-se no benefício superando os riscos<br />

para a mãe. Vários outros medicamentos de uso rotineiro<br />

pela paciente portadora de FC devem ser avaliados e<br />

readequados. As enzimas pancreáticas não trazem risco.<br />

Apesar da ausência de estudos sobre a segurança da alfadornase<br />

na gestação, provavelmente é segura, e não deve<br />

ser descontinuada. 4,9<br />

A fisioterapia é um dos pilares no tratamento do portador<br />

de FC. Dessa forma não deve ser desencorajada e sim<br />

adaptada a cada fase gestacional, inclusive com associação<br />

52 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


de reforço da musculatura do assoalho pélvico. 4<br />

A amamentação não é contraindicada. Deve-se estar<br />

atento para uso de drogas que possam ser prejudiciais ao<br />

RN para que adaptações possam ser feitas. Uma grande<br />

preocupação nesse grupo de mulheres é o consumo<br />

energético que exige a amamentação exclusiva, além do risco<br />

de desidratação. Dessa forma, estratégias para<br />

suplementação nutricional e hidratação vigorosa devem ser<br />

revistas regularmente no período pós-natal. 4<br />

Felizmente, tivemos um desfecho favorável. No entanto,<br />

a gestação nesse grupo de mulheres sempre deve ser visto com<br />

cautela e, de certa forma, pouco encorajada. Trata-se de gestação<br />

de alto risco para a mãe, com serias implicações clínicas, além de<br />

sociais e emocionais. A gravidade da doença, bem como sua<br />

complexidade, além de uma sobrevida ainda reduzida apontam<br />

fortemente para a necessidade real de investirmos em orientações<br />

sobre contracepção nos ambulatórios de transição. Há, ainda, a<br />

possibilidade do nascimento de um novo paciente portador de<br />

Fibrose Cística, na dependência do material genético do parceiro.<br />

Apesar de haver possibilidade de investigação e<br />

aconselhamento genético nessas gestações, infelizmente o<br />

acesso é restrito e muito caro. Neste caso específico, não<br />

houve possibilidade de avaliação genética.<br />

O preparo da família para suporte da gestante e da criança<br />

é de extrema importância e o serviço de apoio psicológico<br />

deve estar preparado para lidar com uma gestante com graves<br />

intercorrências clínicas, maior possibilidade de depressão<br />

pós-parto e grande insegurança e incerteza sobre o desfecho<br />

da gravidez . Há ainda que se dizer sobre a possibilidade do<br />

abortamento espontâneo ou a necessidade de intervenção<br />

com interrupção terapêutica da gestação, em geral por<br />

indicação materna. 11<br />

Conclusão<br />

A gravidez em pacientes portadoras de fibrose cística vem<br />

se tornando comum, em geral em pacientes jovens, com graus<br />

variáveis de comprometimento nutricional e função pulmonar<br />

reduzida. Embora não haja contraindicação para gravidez, tratase<br />

sempre de uma situação de alto risco para a mãe e para o<br />

feto, com implicações clínicas, emocionais e sociais sérias,<br />

principalmente quando presente de forma não planejada.<br />

O manejo terapêutico, principalmente medicamentoso,<br />

exige uma série de adequações para minimizar os efeitos<br />

deletérios sobre a evolução da mãe e do concepto.<br />

A função pulmonar basal, o estado nutricional prévio e a<br />

presença ou não de DRFC estão intimamente relacionados ao<br />

desfecho mais ou menos favorável, na dependência do status<br />

dessas condições. Desta forma, baixa função pulmonar, IMC<br />

reduzido e mau controle glicêmico estão associados à<br />

prematuridade, malformações, baixo peso ao nascer, além de<br />

maior morbimortalidade materna.<br />

Nosso objetivo foi relatar o caso de uma gestação de alto<br />

risco em uma paciente fibrocística, portadora de DRFC, com<br />

função pulmonar muito reduzida e que, pôde, apesar do manejo<br />

complexo, ter um final muito satisfatório. A abordagem<br />

multiprofissional contribuiu muito para esse desfecho.<br />

Vale ressaltar, que em razão dos riscos apresentados, é de<br />

suma importância que os profissionais que atuam nos<br />

ambulatórios de transição e no atendimento de fibrocísticos<br />

adultos estejam aptos para abordar claramente questões<br />

como sexualidade, gravidez e contracepção e que estratégias<br />

de abordagem e intervenção sejam feitas para minimizar riscos<br />

ou evitar uma gravidez indesejável.<br />

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Silvia Maria Romão Pontes<br />

smrpontes@yahoo.com<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 53


Uso do sildenafil em gestação de<br />

paciente com Hipertensão Arterial<br />

Pulmonar secundária à cardiopatia<br />

congênita (Síndrome de Eisenmenger)<br />

AUTORAS: Paula Catarina Caruso¹; Maira Eliza Petrucci Zanovello¹; Ilma Aparecida Paschoal²;<br />

Mônica Corso Pereira 3<br />

1Residentes de Pneumologia da Disciplina de Pneumologia, Faculdade de Ciências Médicas,<br />

UNICAMP<br />

2Professora Associada da Disciplina de Pneumologia, Faculdade de Ciências Médicas, UNICAMP<br />

3Médica Assistente da Disciplina de Pneumologia, Faculdade de Ciências Médicas, UNICAMP<br />

Introdução<br />

Pacientes portadoras de cardiopatias congênitas tinham<br />

um prognóstico limitado até pouco tempo atrás. Com a<br />

melhora da sobrevida dos portadores destas graves<br />

afecções, devido ao diagnóstivo precoce e à melhora técnica<br />

e maior acesso às cirurgias corretivas, cada vez mais<br />

pacientes mulheres com cardiopatia congênita atingem a<br />

idade fértil e acabam por engravidar. 1<br />

A mortalidade materna de grávidas portadoras de<br />

hipertensão arterial pulmonar (HAP) de uma maneira geral é<br />

ainda muito elevada e varia conforme a etiologia. Em revisão<br />

de 2009, em 73 casos de parturientes com hipertensão<br />

pulmonar, a mortalidade variou de 17% na hipertensão<br />

pulmonar idiopática (HAPI), 28% na HAP com cardiopatia<br />

congênita e 33% na HAP de outras causas. 2<br />

A presença da anormalidade da estrutura e função<br />

cardiorrespiratória desde o nascimento das pacientes com<br />

cardiopatia congênita leva a um remodelamento vascular<br />

nos pequenos vasos devido ao hiperfluxo crônico. Esse<br />

remodelamento é responsável por elevar a resistência<br />

vascular pulmonar. Quando as pressões nas câmaras<br />

cardíacas direitas tornam-se maiores que nas esquerdas, o<br />

fluxo tende a se inverter.<br />

Assim se define a Síndrome de Eisenmenger (SE): shunt<br />

intra ou extracardíaco, que quando não reparado resulta em<br />

remodelamento da vasculatura pulmonar e HAP progressiva,<br />

com inversão do fluxo sanguíneo e cianose. 3<br />

A prevalência da SE não é conhecida. De acordo com<br />

dados históricos, cerca de 8% dos pacientes com<br />

cardiopatias congênitas e 11% dos pacientes com shunts<br />

direita para esquerda desenvolvem SE 4 . O prognóstico de<br />

pacientes com SE é melhor do que dos pacientes com formas<br />

idiopáticas de hipertensão pulmonar. 5<br />

Esse relato de caso tem como objetivo descrever o manejo<br />

difícil de uma gestante com a SE, desde o acompanhamento<br />

pré-natal até o parto. O manejo da gestação em portadoras<br />

de HAP é complexo, e devem ser considerados diversos<br />

aspectos como necessidade, indicações e limitações do<br />

tratamento clínico, potenciais complicações do parto, escolha<br />

do tipo de anestesia e da via do parto. Idealmente o<br />

acompanhamento de grávidas portadoras de HAP deve ser<br />

feito em centros com experiência no manejo desta situação.<br />

Relatamos um caso de gestação em paciente com HAP<br />

que evoluiu com desfecho favorável para a mãe e bebê, na<br />

qual foi utilizado um inibidor de fosfodiesterase.<br />

Relato de Caso<br />

Paciente gestante de 34 anos com cardiopatia congênita<br />

e SE, classe funcional II, sem acompanhamento regular e<br />

que iniciou o pré-natal com 25 semanas de gestação.<br />

Trazia exames anteriores: Ecocardiograma (2004) –<br />

ventrículo direito (VD) de 40 mm, átrio único morfologicamente<br />

esquerdo (isomerismo esquerdo), hipertensão arterial<br />

pulmonar importante (PSAP não estimada); quantificação de<br />

shunt direito-esquerdo (cintilografia) positivo para shunt<br />

pulmonar-sistêmico. Ecocardiograma realizado em 2010,<br />

durante a gestação apresentava isomerismo atrial esquerdo,<br />

defeito parcial do septo atrioventricular, agenesia de veia cava<br />

inferior e pressão sistólica de artéria pulmonar (PSAP) estimada<br />

em 41 mmHg.<br />

Na 25ª semana de gestação a paciente foi internada<br />

eletivamente, e assim permaneceu até o parto. Durante todo<br />

o período usou enoxaparina 40mg via subcutânea uma vez<br />

ao dia e sildenafil 20 mg três vezes ao dia. No período foram<br />

realizados três novos ecocardiogramas que apresentavam a<br />

mesma alteração anatômica, e os mesmos níveis pressóricos,<br />

54 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


ausência de derrame pericárdico e ventrículo direito não<br />

medido. A paciente foi submetida ao parto cesárea com 32<br />

semanas de gestação, sem intercorrências. Optou-se por<br />

mantê-la em observação em Unidade de Terapia Intensiva<br />

por uma semana. Permaneceu internada por mais 30 dias<br />

após o parto, sem instabilidade hemodinâmica ou piora da<br />

HAP. A saturação de oxigênio se manteve 85% em ar<br />

ambiente, e não obteve resposta ao oxigênio suplementar.<br />

A criança vive bem, sem relato de malformações<br />

congênitas ou alteração de seu desenvolvimento.<br />

Discussão<br />

A SE se define por shunt intra ou extracardíaco com<br />

remodelamento da vasculatura pulmonar e HAP progressiva,<br />

com inversão do fluxo e cianose. 3 Cursa com hipoxemia<br />

crônica, dispneia e fadiga, insuficiência ventricular direita e<br />

morte prematura.<br />

Algumas mudanças fisiológicas acontecem no organismo<br />

materno durante a gravidez. As que tem maior impacto no<br />

organismo da gestante com SE são: aumento do volume de<br />

sangue, do débito cardíaco e redução da resistência vascular<br />

pulmonar e sistêmica. A gestação também é uma situação<br />

trombogênica devido à ativação de fatores trombogênicos 1 .<br />

Com as alterações hemodinâmicas do organismo durante<br />

a gestação pode haver aumento da HAP pré-existente, do<br />

fluxo plasmático e da sobrecarga ventricular direita, com<br />

consequente piora dos sintomas.<br />

A vasodilatação periférica da gestação gera aumento do<br />

fluxo sanguíneo da direita para a esquerda, fato que piora a<br />

hipoxemia pré-existente. O nível crítico ocorre durante o parto<br />

ou trabalho de parto, pelo possível maior comprometimento<br />

hemodinâmico. Se houver acidose ou qualquer sangramento<br />

maior, pode haver aumento da resistência vascular pulmonar,<br />

e eventualmente evolução para um desfecho fatal, com morte<br />

súbita. Além disso, no terceiro trimestre de gravidez há maior<br />

risco de aspiração do conteúdo gástrico devido à diminuição<br />

do tônus do esfíncter inferior do esôfago e distorção da<br />

anatomia gástrica, o que também pode piorar a dispnéia. A<br />

diminuição da capacidade residual funcional e o aumento<br />

do consumo de oxigênio podem resultar num rápido<br />

desenvolvimento de hipoxemia durante períodos de<br />

hipoventilação dessas pacientes. A anestesia inadequada<br />

pode acarretar piora da hipertensão pulmonar. 6<br />

O momento de iniciar o tratamento em pacientes com SE é<br />

uma questão não definida, principalmente em doentes<br />

estáveis. Não existem estudos ou “guidelines” para essa<br />

situação. Geralmente indica-se tratamento nos pacientes com<br />

sintomas como intolerância ao exercício, aumento da cianose<br />

e descompensação cardíaca. 7<br />

As terapias avançadas para HAP como os análogos da<br />

prostaciclina, antagonistas do receptor de endotelina e<br />

inibidores da fosfodiesterase melhoraram a capacidade<br />

funcional nos pacientes com HAP idiopática. Ocorrem<br />

efeitos semelhantes com o uso destes vasodilatadores em<br />

gestantes com SE. Se possível, devem ser administrados<br />

desde o início da gestação antes que aconteçam<br />

descompensações cardiovasculares.<br />

A anticoagulação sistêmica em pacientes com SE também<br />

é controversa e ainda não existem dados suficientes de<br />

estudos controlados, randomizados. Pacientes com Síndrome<br />

de Eisenmenger sofrem de variadas anormalidades<br />

hemostáticas, sobretudo alterações bioquímicas<br />

procoagulantes. Eventos tromboembólicos podem ocorrer<br />

em cerca de 20% desses pacientes. Portanto a anticoagulação<br />

parece lógica para o tratamento e prevenção de trombose. 8<br />

Os riscos de complicações durante a gestação e o parto<br />

devem ser levadas em consideração antes de usar os<br />

anticoagulantes. Os antagonistas de vitamina K são contra<br />

indicados por serem teratogênicos. A anticoagulação em<br />

gestante com SE pode levar a um risco elevado de<br />

sangramentos com queda de hemoglobina e necessidade de<br />

transplante. O uso de heparina de baixo peso molecular tem<br />

sido indicado por especialistas. 1<br />

Em relação aos vasodilatadores pulmonares, as grávidas<br />

acabam sendo excluídas dos estudos, dificultando a análise<br />

nesse grupo.<br />

O óxido nítrico (NO) inalado tem sido a droga mais usada<br />

e relatada, e tem como vantagens a redução aguda da<br />

resistência vascular no território pulmonar sem<br />

comprometimento significativo no débito cardíaco. 9<br />

Quanto aos antagonistas de receptor de endotelina, como<br />

a bosentana, estudos em animais mostraram efeitos<br />

teratogênicos. 10 De regra, tanto a bosentana quanto a<br />

ambrisentana não devem ser utilizadas na gestação.<br />

Estudos em animais com inibidores de fosfodiesterase não<br />

evidenciaram efeitos teratogênicos. Existem relatos de uso com<br />

desfechos bons para as mães e os fetos. O sildenafil produz<br />

vasodilatação dos vasos do miométrio com efeito positivo no<br />

crescimento fetal e no tratamento da pré-eclampsia.<br />

Os bloqueadores de canal de cálcio são seguros e podem<br />

ser utilizados em gestantes com resposta positiva no teste<br />

de vasorreatividade. 11 De quebra, tem ação na prevenção de<br />

parto prematuro, porém é crucial observar a possibilidade<br />

de queda do débito cardíaco e a instabilidade hemodinâmica.<br />

A conduta de internar a paciente entre duas a quatro<br />

semanas antes da data do parto, para monitorizar a gestante,<br />

e eventualmente antecipar parece garantir benefício no<br />

desfecho clínico. Na maioria das vezes, nas fases de parto e<br />

puerpério ocorrem fenômenos de tromboembolismo,<br />

hemorragia e piora da insuficiência cardíaca direita. Devemos<br />

então manter a atenção supervisionada dessas pacientes na<br />

fase de puerpério. 12<br />

Conclusão<br />

A gravidez deve ser contra-indicada em pacientes com<br />

SE devido ao alto risco materno, pois a taxa de mortalidade<br />

ainda é bastante elevada. As pacientes devem ser<br />

aconselhadas a realizar anticoncepção eficaz. Caso ocorra a<br />

gravidez, deve ser abordado com a gestante e o pai a<br />

possibilidade da interrupção da mesma. Caso a opção seja<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 55


por manter a gravidez, o acompanhamento da gestante deve<br />

ser cuidadoso e feito por equipe multidisciplinar e com<br />

experiência no manejo desta situação.<br />

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Paula Catarina Caruso<br />

paulaccaruso@bol.com.br<br />

56 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Tuberculose e gestação<br />

AUTORES: Ada Maria Dourado 1 , Luciene Franza Degering 1 e Jorge Barros Afiune 2<br />

1 Pneumologistas do Instituto Clemente Ferreira, São Paulo<br />

2 Diretor do Instituto Clemente Ferreira, São Paulo<br />

Introdução<br />

A tuberculose é um problema de saúde pública mundial.<br />

Aproximadamente um terço da população mundial está<br />

infectada pelo bacilo da tuberculose.<br />

A exata incidência da tuberculose na gestação é<br />

desconhecida, mas supõe-se ser tão alta quanto na população<br />

geral. Acredita-se que tuberculose de uma maneira geral não<br />

interfira na evolução da gravidez exceto nos casos de<br />

tuberculose avançada e quando associada à coinfecção com o<br />

HIV. Nestes casos contribuindo para mortalidade materno fetal.<br />

Complicações obstétricas podem ocorrer como alta taxa<br />

de aborto espontâneo, menor ganho de peso na gestação,<br />

recém nascido pré-termo, de baixo peso, aumento da<br />

mortalidade neonatal.<br />

Os objetivos deste trabalho serão de relatar um caso<br />

clínico de uma gestante que apresentou tuberculose e discutir<br />

a abordagem terapêutica nesta situação.<br />

Descrição do caso clínico<br />

IDENTIFICAÇÃO: ACAS, 17 anos, feminina, branca,<br />

solteira, estudante (fundamental incompleto).<br />

QUEIXA E DURAÇÃO: Dores nas costas há 1 mês da<br />

data da consulta.<br />

HPMA: Paciente relatava que no inicio de novembro de<br />

2009, no 5º mês de gestação, passou a apresentar febre que<br />

ocorria no final da tarde, além de sudorese noturna. O quadro<br />

evoluiu com dor torácica e discreta dificuldade respiratória que<br />

a fizeram procurar o pronto socorro de seu município sendo<br />

internada. Último episódio febril há dois dias da consulta.<br />

ISDA: Sem queixas para os demais sistemas.<br />

AP e HÁBITOS: Gestante de 5 meses (pré natal irregular),<br />

negava tabagismo, etilismo ou uso de drogas ilícitas.<br />

EXAME FÍSICO: Regular estado geral, descorada +/4,<br />

hidratada, eupneica.<br />

Propedêutica pulmonar: frequência respiratória 16irpm,<br />

redução do frêmito tóraco-vocal e submacicez à percussão<br />

em 1/3 inferior de hemitórax esquerdo. Em acréscimo,<br />

apresentava redução do murmúrio vesicular na mesma região.<br />

Propedêutica cardiológica normal. Frequência cardíaca<br />

igual ao pulso, de 90 batimentos por minuto.<br />

Altura abdominal compatível com 5 meses de gestação,<br />

sem evidência de hepato ou esplenomegalia.<br />

Exames laboratoriais<br />

Radiografia de tórax – Opacidade pulmonar homogênea<br />

ocupando a metade inferior do hemitorax esquerdo (figura 1).<br />

Hemograma – Série Vermelha: Hb = 10,0; Ht = 30,0;<br />

Fig. 1: Radiograma de tórax em PA da gestante.<br />

Série Branca: Leucocitos = 6,96mil/mm³ (Neutrófilos 76,0%;<br />

Linfócitos 9,3%; Monócitos 14,2%; Eosinófilos 0,4%;<br />

Basófilos 0,1%).<br />

VHS - 132 mm/h.<br />

Glicemia de jejum – 78mg/dL.<br />

TGO – 17U/L; TGP – 13U/L.<br />

Feita hipótese diagnóstica de síndrome de derrame pleural<br />

e foi internada para investigação diagnóstica. Foi submetida<br />

a punção torácica para coleta de material para investigação.<br />

A punção transcorreu sem intercorrências, porém, sem<br />

referência ao aspecto do liquido ou seu volume. Não foi<br />

feita biópsia pleural.<br />

Bioquímica do líquido pleural:<br />

- Proteína = 4,4g/dL;<br />

- DHL = 259U/L;<br />

- Glicose = 38mg/dl.<br />

- ADA = 43,5U/L (valor de referência até 24,0UL de acordo<br />

com o KIT utilizado).<br />

- Citologia diferencial do liquido pleural:<br />

-Leucócitos = 417; polimorfonucleares = 2%;<br />

mononucleares = 98%;<br />

- Hemácias = 8480;<br />

Baciloscopia de escarro de 11/2009: duas amostras<br />

negativas.<br />

Sorologias para hepatites B e C – não reagentes.<br />

Sorologia para HIV – não reagente.<br />

Iniciado tratamento com antigo esquema 1 (Isoniazida 400<br />

mg/dia, Rifampicina 600mg/dia e Pirazinamida 2g/dia).<br />

Evoluiu bem no primeiro e segundo meses de tratamento.<br />

Apresentou prurido cutâneo discreto nesse período que ocorria<br />

somente próximo à tomada das medicações (não foi medicada).<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 57


Apresentou ganho de peso progressivo, sem emese.<br />

Radiografia de tórax do 3º mês de tratamento com derrame<br />

pleural ainda presente, porém, em menor volume. Introduzido<br />

esquema de manutenção com Isoniazida e Rifampicina.<br />

A paciente evoluiu bem do ponto de vista pulmonar e<br />

entrou em trabalho de parto em 22/01/2010, tendo parto via<br />

baixa sem intercorrências.<br />

RN feminino com 2960g e 43,5cm. Apgar= 8 e 9<br />

Na consulta do 5º mês de tratamento apresentava-se sem<br />

queixas e exame físico pulmonar normal.<br />

Sua última consulta no ambulatório foi a do 6º mês de<br />

tratamento e estava assintomática, exame físico normal e<br />

amamentando normalmente. Não retornou para consulta de<br />

alta e realização de radiografia de controle.<br />

Discussão<br />

Trata-se de paciente jovem, no 5º mês de gestação, com<br />

febre vespertina e sudorese noturna, a que se seguiu dor<br />

torácica e desconforto respiratório. O derrame pleural,<br />

diagnosticado pela radiografia de tórax foi puncionado e,<br />

embora com o diagnóstico inicial de pneumonia, as<br />

características de exsudato e a citologia, com pequeno<br />

número de leucócitos e predomínio de mononucleares fez<br />

suspeitar de tuberculose pleural. Embora biópsia não tenha<br />

sido realizada, o quadro clínico, as características celulares<br />

do líquido e a atividade da Adenosina Deaminase elevada,<br />

sugeriram o diagnóstico de Tuberculose Pleural e o<br />

tratamento foi iniciado. Com duas baciloscopias de escarro<br />

normais, era pequena a possibilidade de doença<br />

parenquimatosa bacilífera concomitante, o que reduz<br />

sobremaneira a possibilidade de transmissão para o recém<br />

nascido. A paciente apresentou boa evolução, com<br />

propedêutica pulmonar normal no último mês de tratamento.<br />

O parto aconteceu no 4º mês de tratamento da doença, sem<br />

intercorrência para o concepto. Como o caso é de 2009, a<br />

paciente foi tratada com esquema tríplice e não como o<br />

esquema atual de quatro drogas.<br />

A seguir, uma revisão dos aspectos fundamentais da<br />

Tuberculose na gestação.<br />

Diagnóstico<br />

O diagnóstico da tuberculose na gestação segue os<br />

critérios clássicos, porém pode ser difícil devido a fatores<br />

confundidores. Os sintomas maternos são inespecíficos. A<br />

perda de peso associada com a doença pode ser mascarada<br />

temporariamente pelo ganho de peso normal da gestação.<br />

Há hesitação em realizar radiografias de tórax durante<br />

gestação levando a atraso no diagnóstico. Os Raios-X são<br />

potencialmente teratogênicos e só devem ser realizados se<br />

houver indicação precisa. Entretanto, uma radiografia<br />

torácica expõe o feto a radiação mínima, muitas vezes inferior<br />

ao estabelecido como nível de segurança (vide artigo<br />

específico neste fascículo). Existem evidências de que o uso<br />

de radiografias digitais reduziria a quantidade de radiação<br />

ionizante absorvida pelo paciente.<br />

Quanto ao teste tuberculínico, há controvérsias quanto a<br />

possível diminuição da sensibilidade na gestação, mas<br />

estudos recentes revelam não haver diferença entre grávidas<br />

e não grávidas. A baciloscopia e cultura de escarro não<br />

mostram diferença entre grávidas e não grávidas, bem como<br />

as características do líquido pleural, na Tuberculose da<br />

pleura, como no caso apresentado.<br />

Tuberculose congênita<br />

Tuberculose congênita é uma complicação extremamente<br />

rara, de difícil diagnóstico. A prevenção é realizada pelo<br />

tratamento precoce da mãe grávida para diminuir o risco de<br />

transmissão ao feto e recém-nato. A transmissão ocorre no<br />

período pré-natal, por via hematogênica, através do cordão<br />

umbelical, levando a infecção hepática ou pulmonar do recémnascido,<br />

ou durante o parto, por contato com o canal de parto<br />

infectado. Para que haja transmissão é preciso que a grávida<br />

apresente tuberculose disseminada, com micobacteremia. Em<br />

menos da metade dos casos de tuberculose congênita o<br />

diagnóstico materno era conhecido previamente. O<br />

diagnóstico pode ser realizado pela demonstração do complexo<br />

hepático primário/granuloma caseoso nas biópsias : hepática<br />

transcutânea ao nascimento, placenta ou trato genital<br />

maternal. São mais freqüentes as formas disseminadas. A<br />

mortalidade é de 50% sem tratamento. A possibilidade de<br />

transmissão pós-natal deve ser investigada.<br />

Tratamento da tuberculose durante a gestação<br />

O esquema com RHZE pode ser administrado nas doses<br />

habituais para gestantes e está recomendado o uso de<br />

piridoxina (50mg/dia) durante gestação pelo risco de<br />

toxicidade neurológica e convulsões (devido à isoniazida)<br />

no recém-nascido. Na gestação é comum a carência de<br />

piridoxina. O uso de fármacos antituberculose de primeira<br />

linha é considerado seguro para mãe e feto.<br />

A isoniazida é segura durante a gestação, até mesmo no<br />

primeiro trimestre.<br />

A rifampicina é segura na gravidez mas, no entanto, não deve<br />

ser administrada em doses aumentadas em esquemas intermitentes,<br />

devido ao risco de hipoprotrombinemia e sangramento. Há<br />

relatos de distúrbios hemorrágicos no recém nascido.<br />

O etambutol é droga segura na gestação.<br />

A estreptomicina é potencialmente teratogênica na<br />

gestação, causando malformações fetais, paralisia do oitavo<br />

par craniano e perda auditiva.<br />

O uso de etionamida, estreptomicina e quinolonas nas<br />

grávidas está contraindicado.<br />

Tuberculose multirresistente<br />

Mulheres grávidas com TBMR tem um prognóstico menos<br />

favorável. Requerem tratamento com drogas de segunda<br />

linha, incluindo cicloserina, ofloxacina, amicacina,<br />

kanamicina, capreomicina e etionamida. A segurança destas<br />

drogas não está estabelecida na gestação. Aborto terapêutico<br />

tem sido proposto ou adiamento do tratamento para o<br />

segundo trimestre da gestação, quando possível.<br />

Coinfecção Tuberculose/HIV<br />

A coinfecção tuberculose/HIV na gestação contribui<br />

58 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Tabela 1: Segurança dos fármacos antituberculose de primeira e segunda linha nas gestantes<br />

Medicamentos seguros Medicamentos que devem ser evitados<br />

Rifampicina Estreptomicina e outros aminoglicosídeos (potencialmente teratogênica, déficit<br />

auditivo, paralisia VIII par craniano)<br />

Isoniazida Polipeptídeos<br />

Pirazimamida Etionamida e outras tionamidas (comprovadamente teratogênicas)<br />

Etambutol Quinolonas (alterações do crescimento)<br />

Tabela 2: Segurança dos fármacos antituberculose de primeira e segunda<br />

linha durante o aleitamento materno<br />

Medicamentos seguros Medicamentos com uso criterioso<br />

Rifampicina Etionamida<br />

Isoniazida Ácido paraminossalisílico(PAS)<br />

Pirazinamida Ofloxacina<br />

Etambutol Capreomicina<br />

Estreptomicina Claritromicina<br />

Cicloserina/terizidona Clofazimina<br />

significativamente para a morbidade e mortalidade. Devemos<br />

considerar a interação medicamentos entre as drogas antiretrovirais<br />

e fármacos antituberculose. O espectro de drogas<br />

anti-retrovirais seguros na gestação é limitado.<br />

Prevenção da tuberculose do recém nascido<br />

Na ausência de tuberculose congênita, deve ser<br />

administrada ao recém nascido isoniazida 10mg/kg por 3<br />

meses e após esse período faz-se a prova tuberculínica. Se a<br />

criança for reatora , a quimioprofilaxia deve ser mantida até o<br />

sexto mês. No caso de não reação à prova tuberculínica,<br />

considera-se que a criança não foi infectada e administra-se<br />

BCG intradérmico.<br />

Amamentação<br />

Não há contraindicações à amamentação, desde que a<br />

mãe não seja portadora de mastite tuberculosa. Mas é<br />

recomendável que se faça uso de máscara cirúrgica ao<br />

amamentar e cuidar da criança. Os fármacos antituberculose<br />

são excretados no leite materno, mas em concentração bem<br />

menor que a do plasma materno. Isto não ocasiona toxicidade<br />

para o recém-nascido.<br />

Gestantes e lactantes devem utilizar os esquemas<br />

preconizados, mas devem receber especial atenção no<br />

monitoramento de efeitos adversos, descritos nas tabelas 1 e 2.<br />

Referências bibliográficas<br />

1. Brasil, Ministério da Saúde [Página na internet]- Manual de<br />

recomendações para o controle da tuberculose no Brasil –<br />

Brasília/DF 2011<br />

2. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. III Diretrizes para<br />

tuberculose de SBPT- J.Bras Pneumol – 2009; 35(10): 1018-48.<br />

3. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Diretrizes<br />

para tuberculose de SBPT – J. Pneumol –2004;30: supl 1.<br />

4. Escola Paulista de Medicina Unifesp. Guias de medicina<br />

ambulatorial e hospitalar. Pneumologia. Luiz Eduardo Nery,<br />

Ana Luiza Godoy Fernandes, João Aléssio Perfeito. Editores.<br />

São Paulo, 2006, Editora Manole<br />

5. Rosemberg J, Tarantino AB, Sobreiro MC. Tuberculose. In:<br />

Tarantino Doenças Pulmonares. 6ª ed. Rio de Janeiro: Ed.<br />

Guanabara-Koogan, 2008. p. 300-303<br />

6. Gomes M, Klautau GB. Tuberculose em situações especiais.<br />

In: Terra Filho M, Fernandes ALG, Stirbulov R, Editores.<br />

Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia. Atualização<br />

e Reciclagem. São Paulo: Editora Vivali, 2006, cap 53- p. 1-7.<br />

7. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. In:<br />

Pneumologia – Diagnóstico e tratamento- - capítulo 60- pág<br />

568-571- Mauro Zamboni, Carlos Alberto de Castro Pereira<br />

8. Baker MA, Harries AD. The impact of diabetes on<br />

tuberculosis. Treatment outcomes: a systematic review. BMC<br />

Medicine 2011, 9:81<br />

9. Jeon CY, Murray MB. Diabetes mellitus increases the risk<br />

of active tuberculosis : a systematic review of 13 observational<br />

studies.<br />

10. Plos Med 2008 July 5(7): e152<br />

11. Dooley KE, ChaissonRE. Tuberculosis and diabetes mellitus:<br />

convergence of two epidemics.<br />

12. Lancet Infect Dis 2009December; 9(12):737-746<br />

13. Stevenso CR, Forouhi NG. Diabetes and tuberculosis: the<br />

impact of the diabetes epidemic on tuberculosis incidence.<br />

14. BMC Public Health 2007; 7 :234<br />

15. Sia IG, Wieland ML. Current concepts in the management of<br />

tuberculosis.<br />

16. Mayo Clin Proc 2011 April;86(4):348-361<br />

17. Snier JR D, Layde PM, Jonson MW. Treatment of tuberculosis<br />

during pregnancy.<br />

18. Am Rev Respir Dis 1980;122(1):65-79<br />

19. Loto OM, Awowole I. Tuberculosis in pregnancy: a review.<br />

20. J Pregnancy 2012 nov. J Pregnancy. 2012;2012:379271. Epub<br />

2011 Nov 1<br />

21. Restrepo BI, Camerlin A J. Cross-sectional assessment<br />

reveals high diabetes prevalence among newly diagnosed<br />

tuberculosis cases.<br />

22. Bull World Health Organ. 2011 May 1 ; 89(5) : 352-359<br />

Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 59


ESTATÍSTICA<br />

Testes de concordância estatística<br />

AUTORES: Melaine Priscila Fidélix 1 , Sergio Alberto Rupp de Paiva 2 , Suzana Erico Tanni 3<br />

1Pós-graduanda em Fisiopatologia em Clínica Médica( da Faculdade de Medicina de Botucatu<br />

(FMB)/UNESP<br />

2Prof. Adjunto do Departamento de Clínica Médica( da FMB/UNESP<br />

3Médica da Disciplina de Pneumologia da FMB/UNESP<br />

Uma das experiências mais rotineiras na prática médica é a<br />

solicitação de testes com objetivo de rastrear pacientes para<br />

possíveis diagnósticos, confirmar a presença de doenças,<br />

acompanhar e estimar o prognóstico do paciente. Muitas vezes<br />

o método padrão é realizado por equipamento sofisticado e<br />

existe outro método mais simples que realiza a mesma<br />

determinação. Para que este método possa ser substituído há<br />

necessidade de estudos clínicos com qualidade. 1 A análise<br />

estatística se tornou ferramenta importantíssima na<br />

comparação da metodologia aplicada nos estudos e para uso<br />

adequado dos resultados obtidos para a população. 2 Assim,<br />

este texto descreverá os testes de concordância para variáveis<br />

quantitativas e qualitativas para melhor interpretação dos<br />

resultados de estudos.<br />

Descrevendo primariamente sobre os testes de<br />

concordância de variáveis quantitativas, estes podem ser<br />

realizados de várias formas e com diferentes aplicações.<br />

Quando o objetivo do estudo é apenas quantificar a força da<br />

associação entre dois testes, como exemplo, entre duas<br />

técnicas de avaliação de composição corporal, podemos fazer<br />

o coeficiente de correlação 3 que vai avaliar a relação da<br />

variação entre as duas variáveis. Espera-se que as duas séries<br />

de medidas apresentem valores muito próximos um do outro,<br />

para que na plotagem destes valores corresponda a<br />

sobreposição perfeita com a criação de uma “linha” com<br />

angulação de 45°. Esta relação pode ser representada por um<br />

diagrama de dispersão que está exemplificado abaixo.<br />

Porém, interpretar a correlação usando somente o diagrama<br />

Conforme X aumenta,<br />

y tende a aumentar<br />

Fig. 1: <strong>Modelo</strong> do método de correlação linear positiva<br />

de dispersão pode ser subjetivo. Para avaliação mais precisa<br />

da correlação linear entre as variáveis, o que inclui a força e o<br />

tipo, calculamos o coeficiente de correlação, representado por<br />

r. A amplitude do coeficiente de correlação é -1 para 1. Se há<br />

correlação linear positiva forte, o valor de r deverá estar próximo<br />

de 1; no mesmo sentido, o inverso é semelhante, se a correlação<br />

linear for negativa forte, o valor de r está próximo de -1. Os<br />

valores próximos de zero representam correlação fraca ou<br />

ausência de relação linear. 4 A correlação entre duas variáveis<br />

com distribuição normal pode ser avaliada pela correlação de<br />

Pearson. Não é adequado usar a correlação de Pearson<br />

isoladamente para avaliar a concordância, pois o valor de r em<br />

si, não mostra o quanto as medidas se distanciam da angulação<br />

ao eixo de 45°. Um exemplo é o de um método fornecer o resultado<br />

que é o dobro do outro método. O valor de r seria alto, mas a<br />

angulação é menor de 45°. Pode-se concluir que os métodos<br />

não seriam concordantes. Além disso, é necessário ter a<br />

premissa que as medidas obtidas tenham distribuição normal.<br />

Pode-se usar o teste de regressão linear para verificar<br />

melhor a linearidade e a angulação. O teste de regressão linear<br />

pode avaliar o grau de relacionamento entre duas variáveis<br />

quantitativas, descreve a variação média da variável<br />

dependente em função da variação média da variável<br />

independente da população em estudo. Esta interpretação<br />

matemática pode ser explicada pela equação : E[Y/X=x]=β0 +<br />

β1x e também pela representação gráfica na Figura 2.<br />

Para verificar se existe boa concordância entre os métodos<br />

pela regressão linear temos que verificar ou testar se β0 é igual<br />

a zero e β1é igual a 45º.<br />

Outro teste utilizado é o de comparação de médias. O teste<br />

utilizado é o de medidas pareadas ou de medidas repetidas.<br />

Assim, o teste t pareado pode ser utilizado para avaliar<br />

concordância de variáveis quantitativas, pois por meio deste<br />

teste podemos comparar a variação entre os dados coletados<br />

na mesma população. Se houver mais do que duas medidas<br />

repetidas, a análise de variância (ANOVA) de medidas repetidas<br />

deve ser utilizada. A inadequação do uso destas técnicas<br />

ocorre quando houver grande dispersão dos valores (desvio<br />

padrão) que limita sua utilização e pode influenciar na<br />

conclusão de existência concordância entre os métodos<br />

quando na verdade não existem. 5<br />

Além dos procedimentos descritos acima, Bland e Altman<br />

em 1983 propuseram método gráfico para verificar a análise de<br />

60 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Fig. 2: <strong>Modelo</strong> do método de regressão linear<br />

concordância entre dois métodos. 4 Neste gráfico é plotado o<br />

viés (diferença média entre os métodos) e intervalo de<br />

confiança de 95%. 4,6 Na Figura 3, está um exemplo do gráfico<br />

de Bland e Altman. É importante observarmos três aspectos:<br />

1) A linha tracejada do meio representa a média das diferenças<br />

entre as medidas pelos dois métodos, quando houver perfeita<br />

concordância, a diferença será zero. Na figura esta linha<br />

corresponde que o método T é quatro unidades maior do que<br />

o método A. A primeira verificação que deve ser realizada é se<br />

4 unidades tem importância clínica. 2) São plotados, também,<br />

as variações das diferenças par a par. Estas diferenças são<br />

representadas pelos pontos no gráfico. Ao se observar os<br />

pontos pode-se verificar a dispersão ampla dos valores, e ao<br />

avaliar os pontos em relação ao eixo do x, ter uma ideia do<br />

valor médio da variável estudada. 3) As linhas tracejadas<br />

superior e inferior representam os limites de concordância.<br />

Estas linhas são calculadas a partir do valor médio da diferença<br />

entre as duas técnicas e ± 2 desvio padrão. A grandeza do<br />

intervalo de concordância vai ser avaliada em relação ao valor<br />

das médias da variável estudada (eixo x). Neste caso, o valor<br />

entre os limites de concordância é de 50 unidades. A pergunta<br />

que cabe ao pesquisador é se a variação observada (50) é<br />

aceitável para uma média de 60 unidades. Aceita-se em biologia<br />

variações de até 10% da média. Assim, pela análise do gráfico<br />

Fig. 3: <strong>Modelo</strong> do método de Bland-Altman 4<br />

de Bland-Altman podemos concluir que na média o método T<br />

é semelhante ao A. Entretanto, a variação individual impede<br />

4, 6<br />

que façamos a substituição de um método pelo outro.<br />

Por outro lado, os testes de concordância podem ser<br />

usados para avaliar variáveis qualitativas. Exemplo deste uso<br />

é o de comparação de respostas de dois avaliadores sobre<br />

imagem ou de questionário. 7 Para descrever a intensidade da<br />

concordância pode ser utilizado a medida Kappa (k). A medida<br />

k é baseada no número de respostas concordantes, ou seja,<br />

no número de casos cujo resultado é o mesmo entre os<br />

avaliadores. O Teste de Kappa é uma medida de concordância<br />

intra e interobservador e mede o grau de concordância, além<br />

do que seria esperado tão somente pelo acaso. Esta medida<br />

de concordância tem como valor máximo igual a 1, que<br />

representa total concordância ou, ainda, pode assumir valores<br />

próximos e até abaixo de 0, o que indica nenhuma concordância.<br />

Um valor negativo sugere discordância, porém seu valor não<br />

tem interpretação como intensidade de discordância. 7,8<br />

O teste estatistico fornece o coeficiente Kappa e<br />

posteriormente para realizar a interpretação da intensidade de<br />

concordância deve-se usar a seguinte tabela8,9 :<br />

Adaptação de; Landis JR, Koch , 19779 Valores obtidos<br />

de Kappa<br />

Interpretação<br />


Centros de Referência em<br />

Fibrose Cística no Estado<br />

de São Paulo<br />

SÃO PAULO CAPITAL<br />

CR – Hospital das Clínicas<br />

Dra.Fabíola Villac Adde<br />

Av. Dr. Eneas de Carvalho Aguiar, 647 –1ºandar<br />

Fone :(0xx11) 2661-8538<br />

Hospital São Paulo – EPM<br />

Dra.Sônia Mayumi Chiba<br />

R: José de Magalhães 340<br />

( Ambulatório Fibrose Cística)<br />

Fone:(0xx11) 5576-4145<br />

Santa Casa de Misericórdia de São Paulo<br />

Dra. Neiva Damaceno<br />

Ambulatório de Fibrose Cística<br />

Prédio Conde de Lara<br />

Fone: (0xx11) 3224-0122 r:5534<br />

INTERIOR<br />

Campinas<br />

Hospital de Clínicas – UNICAMP<br />

Dr. José Dirceu Ribeiro<br />

Dr. Antônio Fernando Ribeiro<br />

Departamento de Pediatria<br />

Fone: (0xx19) 3521-7646<br />

Ribeirão Preto<br />

Hospital das Clínicas<br />

Dra. Maria Inês Machado Fernandes<br />

Dra. Lídia Alice G.M. Torres<br />

Av. Bandeirantes, s/n – Campus Universitário<br />

Fone: (0xx16) 3633-0136 - Botucatu<br />

Faculdade de Medicina de Botucatu/UNESP<br />

Dra. Giesela Fleischer Ferrari<br />

Distrito de Rubião Júnior s/n – Botucatu – SP<br />

Cep: 18618-970<br />

Fone: (0xx14) 3811-6000<br />

São José do Rio Preto<br />

Hospital de Base<br />

Dra. Katia Izabel Oliveira<br />

Av. Brigadeiro Faria Lima,5416<br />

PRÓXIMA EDIÇÃO<br />

Oncologia Torácica<br />

62 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012


Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012 63


64 Pneumologia Paulista Vol. 26, N o. 1/2012

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