Leia um trecho do livro em PDF - Editora Objetiva
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O rito de passag<strong>em</strong><br />
encontravam o setor cultural vigilante e cada vez mais consciente da necessidade<br />
e da possibilidade de resistência. Havia, enfim, como s<strong>em</strong>pre, a situação<br />
social e política carregada de probl<strong>em</strong>as — o arrocho salarial, os sindicatos<br />
sob intervenção, <strong>um</strong>a insuportável inflação de 40% ao ano que Delfim Netto<br />
prometia reduzir para 25% —, mas o segun<strong>do</strong> governo militar anunciava que<br />
queria restabelecer o diálogo com a sociedade e com a classe política. Só por<br />
isso o ano de 68 já seria <strong>um</strong> avanço.<br />
Um personag<strong>em</strong> que viveu intensamente aqueles t<strong>em</strong>pos, o diretor de teatro<br />
Flávio Rangel, achava que houve entre 67 e 68 <strong>um</strong> mal percebi<strong>do</strong> clima de<br />
abertura, <strong>um</strong>a “primavera” — que l<strong>em</strong>brava <strong>um</strong>a outra, cont<strong>em</strong>porânea, a de<br />
Praga, e que, como esta, seria abortada, ainda que s<strong>em</strong> invasão de tanques. No<br />
depoimento que deu para este <strong>livro</strong>, <strong>em</strong> dez<strong>em</strong>bro de 1987, ele disse que só<br />
experimentaria clima s<strong>em</strong>elhante nos anos 80.<br />
Mas voltan<strong>do</strong> ao réveillon dessa frustrada abertura: encontrava-se ali <strong>um</strong>a parte<br />
considerável da inteligência brasileira que produzira, ou iria produzir, <strong>do</strong><br />
bom e <strong>do</strong> melhor. Com aqueles talentos, era possível organizar <strong>um</strong>a preciosa<br />
antologia. Com as vontades políticas ali presentes, poder-se-ia fazer a Revolução,<br />
isto é, a grande utopia daqueles t<strong>em</strong>pos. Isso, evident<strong>em</strong>ente, se o processo<br />
revolucionário dependesse apenas das condições subjetivas — e os anos<br />
seguintes iriam d<strong>em</strong>onstrar dramaticamente que não, que volição e revolução<br />
às vezes não passam de <strong>um</strong> trocadilho.<br />
Como o Brasil de então, o réveillon de Helô tinha tu<strong>do</strong> para dar certo, a<br />
começar pela <strong>do</strong>na da casa. A professora Heloisa Buarque de Hollanda, bonita,<br />
culta e de esquerda, era mito e ícone da intelectualidade carioca <strong>do</strong>s anos<br />
60. Com esses t<strong>em</strong>pos a “Bela Mestra” iria fazer a matéria-prima de sua tese de<br />
<strong>do</strong>utora<strong>do</strong> <strong>um</strong>a década depois. Misturan<strong>do</strong> duas viagens — a sua e a da História<br />
—, o seu trabalho ensinaria ao meio acadêmico que saber e competência<br />
não precisam ser chatos.<br />
A organização da festa, entregue a <strong>um</strong>a comissão, ou a <strong>um</strong> “coletivo”,<br />
como era de bom-tom dizer, parecia perfeita. Na verdade não foi: havia mais<br />
motivação <strong>do</strong> que competência, como aliás <strong>em</strong> tu<strong>do</strong> o que se organizava então.<br />
É b<strong>em</strong> verdade que os convites eram à prova de falsificação. Um <strong>do</strong>s<br />
organiza<strong>do</strong>res, o editor Sérgio Lacerda, na época o principal diretor da Da-<br />
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