Poesia - Academia Brasileira de Letras
Poesia - Academia Brasileira de Letras
Poesia - Academia Brasileira de Letras
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
e a consciência é uma palavra<br />
fora da raiz. Talvez venha dos<br />
mortos a moléstia. Não se aquietam<br />
na terra e se levantam, <strong>de</strong>sfilam<br />
com os vivos sua festa. Como pés<br />
não avançando o estribo.<br />
Se até as mãos são cegas, que fazer<br />
com esta <strong>de</strong>mocracia sem infância,<br />
entre o bico <strong>de</strong> fome e pânico,<br />
o esqueleto <strong>de</strong>splumando-se?<br />
Aon<strong>de</strong> foram a América da infância<br />
e os veleiros inflados junto ao peito?<br />
A luz não se fabula, nem fabrica<br />
como antes. É cada vez menor,<br />
ou <strong>de</strong>lirante. A luz truncada<br />
jamais volta e apenas corre adiante.<br />
Meu país ficou cego <strong>de</strong> memórias, cego<br />
no ventríloquo direito. E goteja sua história<br />
no bordão do vento. E os heróis são<br />
cúmplices. E nem sabem a distância<br />
entre a escuridão e a tar<strong>de</strong>. E talvez<br />
seja a infância o que nunca mais mu<strong>de</strong>.<br />
Meu país tem montanha <strong>de</strong> lobos<br />
e serpentes sobre os olhos.<br />
Meu país é uma enfermida<strong>de</strong><br />
estranha do tempo. Hamlet cego<br />
com a dinamarca <strong>de</strong> almas.<br />
E um cheiro <strong>de</strong> pólvora queimada.<br />
E tudo o que apaga, morre<br />
pela água. Ou serei profeta,<br />
alguma vez, na ciosa república?<br />
Poemas<br />
291