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PRIMEIRO<br />
SEMESTRE<br />
2012<br />
CADERNO DE TEATRO<br />
CADERNO DE TEATRO<br />
PRIMEIRO<br />
SEMESTRE<br />
2012<br />
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4 Barba, Eugenio. A Canoa de Papel: Tratado de Antropologia Teatral. Publicado pela primeira vez em 1994 pela Ed. Hucitec, de São<br />
Paulo, com tradução de Patricia Braga Alves. O livro foi reeditado em 2009, com a mesma tradução, pelo Teatro Caleidoscópio-<br />
Editora Dulcina, de Brasília.<br />
5 Barba, Eugenio e Savarese, Nicola, A Arte Secreta do Ator: um Dicionário de Antropologia Teatral, publicado em 1995, pela<br />
Editora Hucitec, São Paulo, com Tradução dos integrantes do LUME Teatro. Uma nova edição sairá em dezembro de 2012, pela<br />
Editora É Realizações, São Paulo, com tradução de Patricia Furtado de Mendonça.<br />
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volvidos na disciplina “Ética e Estética”,<br />
projeto, sobretudo porque o espectador<br />
era só teórico. Depois dos encontros de<br />
na do Trabalho do Ator (UTA). Também<br />
impressionou bastante. E também me<br />
que haja um distanciamento ou uma falta de<br />
em que, além de material bibliográfico,<br />
gaúcho não conhecia os espetáculos do<br />
1994 e 1995, a tradição do <strong>Odin</strong> ficou<br />
cito o trabalho de Tatiana Cardoso, de<br />
estimulava na minha preparação. Então,<br />
comunicação entre o grupo dinamarquês e os<br />
os alunos tinham acesso a vídeos de de-<br />
<strong>Odin</strong>, e considerávamos que, além da<br />
bem mais conhecida aqui. As pessoas já<br />
Jezebel de Carli e a pesquisa sobre o ator<br />
eu passava a ter uma referência que eu<br />
artistas e estudiosos da capital do Rio Grande<br />
monstrações técnicas de atores do <strong>Odin</strong><br />
oportunidade de poder fruir de sua ino-<br />
usavam termos do <strong>Odin</strong>, falavam em sats,<br />
de Irion Nolasco. Cito também a tese de<br />
não tinha. (...)<br />
do Sul. Isso pode ser constatado pelas inúmeras<br />
e espetáculos. O curso também tinha um<br />
vadora estética, também o espetáculo, as<br />
coisas assim.<br />
Inês Marocco sobre a espetacularidade<br />
Na época, já existia muito fortemente a<br />
viagens de gente de teatro local para outros<br />
intercâmbio intenso com o LUME e promovia<br />
oficinas e espetáculos. Portanto, já<br />
havia uma certa familiaridade com esse<br />
conhecimento e tradição.<br />
Quanto ao impacto produzido pelos espetáculos<br />
de Sanjukta, foi algo inimagi-<br />
demonstrações técnicas, a oficina e as<br />
conferências trariam um aporte importante<br />
aos profissionais de teatro, como<br />
também para a pedagogia teatral. Essa<br />
parceria nos levou a organizar e concretizar<br />
outros importantes projetos, que, de<br />
Em relação ao impacto causado pela presença<br />
e pelas atividades de Barba e Julia Varley, assim<br />
como em relação à influência dos estudos da<br />
Antropologia Teatral sobre grupos gaúchos, Nair<br />
D’Agostini afirma:<br />
da cultura gaúcha. (...)<br />
No curso de Artes Cênicas da UFSM, foram<br />
geradas inúmeras pesquisas práticas<br />
e teóricas a partir dos princípios da<br />
Antropologia Teatral. Hoje, acredito ser<br />
difícil ignorar, quer nas investigações<br />
antropologia aqui em Porto Alegre através<br />
dos discursos e das práticas. Duas<br />
pessoas fundamentais, Irion Nolasco e<br />
Maria Lúcia Raymundo, faziam um trabalho<br />
sensacional e nos passavam bastante<br />
coisa do trabalho da Antropologia Tea-<br />
estados ou países. Além disso, a busca de contato<br />
com a tradição do <strong>Odin</strong> também é facilitada pela<br />
publicação dos livros de Barba em português,<br />
pois eles se tornam referência fundamental para<br />
inúmeras teses nacionais de graduação e pósgraduação<br />
em Dança e em Artes Cênicas.<br />
nável, sobretudo no Caixa Preta, Teatro<br />
certa forma, estavam interligados e fo-<br />
teóricas quer nas práticas, os princípios<br />
tral. Mas, por outro lado, chegava uma<br />
Em 1995, é publicado o livro A Arte Secreta<br />
do Centro de Artes e Letras da UFSM. Ali,<br />
ram frutos do contato com a Antropolo-<br />
É bastante difícil ter uma ideia precisa<br />
da Antropologia Teatral revelados por<br />
disciplina, quase que uma onda de dis-<br />
do Ator: um Dicionário de Antropologia Teatral<br />
alunos e professores puderam vivenciar,<br />
gia Teatral, como o curso "Poética e Gra-<br />
sobre uma experiência estética, já que<br />
Barba. Seu aporte teórico e artístico já se<br />
ciplina extremamente grande que você<br />
, de Barba e Savarese. Este livro, junto de A Ca-<br />
além da magia da dança Odissi, a eficá-<br />
mática do Mimo Corpóreo", ministrado<br />
é muito subjetiva. Mas pelo que pude<br />
constitui uma tradição das mais signifi-<br />
tinha que ter com o trabalho, que era<br />
noa de Papel e Além das Ilhas Flutuantes, vai<br />
cia expressiva de seus princípios para a<br />
por Thomas Leabhart, do Pomona College<br />
perceber, foi despertado interesse pela<br />
cativas de nossos tempos e tornou-se um<br />
muito dura. E isso gerava trabalhos mui-<br />
nutrindo o estudo de vários artistas e estudan-<br />
arte do ator. Um espectador não ligado às<br />
University of Califórnia – USA, realizado<br />
Antropologia Teatral nos profissionais de<br />
referencial de suma importância para as<br />
to frios, mecânicos. Então tinha aquele<br />
tes de Porto Alegre, muitos dos quais alunos de<br />
artes cênicas fez o seguinte comentário:<br />
na UFSM e na UFRGS, ainda em 1995.<br />
teatro mais inquietos e sempre ávidos de<br />
investigações teóricas, práticas, artísticas<br />
viés de um trabalho que era demandado<br />
Irion, Maria Lúcia e Nair D’Agostini, e também<br />
“Saíam raios luminosos de seus pés, tão<br />
intensa era a energia que ela emanava”.<br />
1995: Eugenio Barba e Julia Varley<br />
chegam a Porto Alegre<br />
As sementes lançadas no seminário Teatro em<br />
Fim de Milênio começam a criar raízes. É preciso<br />
adubar a terra. Irion, Maria Lúcia e Nair reúnem<br />
forças mais uma vez e conseguem organizar<br />
outro encontro: em 1995, Eugenio Barba e Julia<br />
Varley chegam pela primeira vez a Porto Alegre.<br />
Sobre este projeto, nos conta Nair D’Agostini:<br />
Irion e Maria Lúcia tinham sido professores<br />
do Curso de Artes Cênicas da UFSM,<br />
Foram apenas três dias de evento em Porto<br />
Alegre: 6, 7 e 8 de dezembro. Mas a programação<br />
foi intensa e, mais uma vez, lotou todos os espaços<br />
que acolheram as atividades do <strong>Odin</strong> Teatret: Casa<br />
de Cultura Mario Quintana, Teatro Carlos Carvalho<br />
e Salão de Atos, onde Julia Varley apresentou seu<br />
espetáculo solo O Castelo de Holstebro e suas demonstrações<br />
de trabalho O Irmão Morto e O Eco do<br />
Silêncio. Eugenio Barba conduziu uma palestra e,<br />
junto de Julia Varley, um seminário para estudantes<br />
e artistas. Lembra Irion Nolasco:<br />
A palestra de Barba aqui, em 1995, despertou<br />
uma tremenda curiosidade da-<br />
novos conhecimentos e aquisições técnicas<br />
e artísticas. Muitos grupos iniciaram<br />
uma investigação prática, no sentido de<br />
se aproximarem dessa tendência estética.<br />
Quanto aos meus alunos, foi uma experiência<br />
forte em que os mais afoitos e imbuídos<br />
de força de vontade foram levados<br />
a organizar e realizar treinos intensos<br />
e sistemáticos sobre o corpo e, também,<br />
pesquisas de ações e aprimoramento de<br />
partituras de ações que os tornassem eficazes<br />
na pré-expressividade exigida por<br />
essa forma de linguagem expressiva. Na<br />
minha avaliação, houve, nessa nova tendência<br />
estética (se assim podemos nos<br />
e pedagógicas atuais.<br />
É em 1995, durante estes encontros, que<br />
Alexandre Vargas – ator, diretor, fundador do<br />
Falos & Stercus e organizador do Festival de<br />
Teatro de Rua de Porto Alegre – também entra<br />
em contato direto com o <strong>Odin</strong>, grupo do qual<br />
ouve falar pela primeira vez em 1992, quando<br />
Luis Otávio Burnier e Carlos Simioni fazem uma<br />
turnê em Porto Alegre. Curioso e interessado<br />
pelo que lhe contam, Alexandre vai buscar mais<br />
informações sobre a cultura do <strong>Odin</strong> nos livros de<br />
Barba, no Além das Ilhas Flutuantes e no Canoa<br />
de Papel [4] . Mas o impacto de estar frente a frente<br />
com Barba é ainda maior. Ele lembra:<br />
dessa forma, e quando você via o resultado<br />
artístico era de uma frieza que, e eu<br />
intuía que... mas não pode ser isso, não<br />
deve ser isso. O grande impacto que fica<br />
é o desmoronamento de quem já trabalhava<br />
com isso, tem o contato com o Eugenio<br />
e percebe que não era aquilo que<br />
ele vinha fazendo. E quando você ouve o<br />
Eugenio dizer: “Não é nada disso”... Isso<br />
foi importante demais.<br />
Tatiana Cardoso também nos fala sobre este<br />
encontro de 1995:<br />
Recordo que, para mim e meus colegas<br />
de outros professores que, apesar de não terem<br />
tido um contato mais estreito com o <strong>Odin</strong>, são<br />
igualmente influenciados pelo pensamento e<br />
pela cultura de Barba e seu grupo.<br />
Entre 7 e 18 de agosto de 1995, a convite<br />
da EITALC (Escuela Internacional de Teatro de<br />
América Latina y el Caribe), Gilberto Icle permanece<br />
na sede do <strong>Odin</strong>, em Holstebro, e participa<br />
do encontro Trabalhando e Convivendo<br />
com o <strong>Odin</strong> Teatret. Ali, ele tem a possibilidade<br />
de assistir a uma série de espetáculos, demonstrações<br />
e vídeos do grupo. Com relação aos<br />
reflexos da cultura do <strong>Odin</strong> e da Antropologia<br />
Teatral [5] sobre seu grupo, a Usina do Trabalho<br />
do Ator (UTA), e sobre sua visão relativa ao fa-<br />
e o projeto Teatro em Fim de Milênio<br />
queles que falavam sem conhecer. Eles<br />
referir), produções artísticas inovadoras<br />
da área, na época, era um acontecimen-<br />
zer teatral, Icle afirma:<br />
foi uma continuidade da parceria entre<br />
encheram o plenário da universidade,<br />
e com qualidade técnica, mas também<br />
Eu gostava demais da postura do Barba,<br />
to poder estar ouvindo os ensinamentos<br />
UFSM e UFRGS para a vinda do Potlach,<br />
o “Plenarinho”. Veio gente que nunca<br />
muitas produções que não alcançaram<br />
de alguém que tem um espaço no teatro.<br />
de Barba. E lembro especialmente a de-<br />
São tantos reflexos que eu não saberia<br />
da Itália, para Porto Alegre e Santa Maria,<br />
imaginei que viria. Estavam todos lá,<br />
o nível artístico e técnico desejável, pró-<br />
Ele chegava aqui falando, e tinha uma<br />
dicação do Irion para que a organização<br />
enumerá-los. A UTA trabalhava, nos pri-<br />
com espetáculos, parada de rua, oficinas,<br />
impactados. O seminário foi histórico.<br />
prio da imaturidade artística e da falta de<br />
postura de defender este espaço. Não es-<br />
ocorresse de forma impecável, sempre a<br />
meiros anos, a partir de boa parte dos<br />
apresentações técnicas e conferência.<br />
Era aberto para todos os que quisessem<br />
aprimoramento técnico.<br />
tava pedindo licença. E isso contrastava<br />
contento de Eugenio e Julia.<br />
exercícios do <strong>Odin</strong>, seja aprendidos dos<br />
Dessa forma, Teatro em Fim de Milênio<br />
foi uma produção, coordenação e organização<br />
conjunta, sendo que o sucesso<br />
e o resultado desse evento, assim como<br />
dos precedentes, nos levou a dar continuidade<br />
e unir forças para esse novo<br />
participar. Havia não só alunos e gente<br />
de teatro, mas, inclusive, professores<br />
de Letras. E a abertura foi tal que até<br />
as pessoas que falavam mal estavam lá<br />
também. Isso foi muito legal. Devia haver<br />
umas 200 pessoas no seminário, já que<br />
(...)<br />
Sei de grupos que tiveram uma forte<br />
influência e se orientaram em suas<br />
experimentações teatrais a partir dos<br />
princípios da Antropologia Teatral. Posso<br />
citar, em Porto Alegre, o grupo Usi-<br />
com o comportamento de pedir licença<br />
no meio teatral que eu estava acostumado.<br />
É uma convicção na postura, no dizer,<br />
e ao mesmo tempo um cara muito bem<br />
preparado para falar de seu argumento,<br />
na construção de seu discurso. Isso me<br />
Entre 1995 e 2010: amadurecendo<br />
o aprendizado<br />
Um hiato de 15 anos vem a separar fisicamente<br />
o <strong>Odin</strong> de Porto Alegre, já que, depois de 1995, só<br />
voltarão à cidade em 2010. Mas isso não significa<br />
próprios atores, seja legados via LUME.<br />
A organização e a forma de trabalho,<br />
tanto no treinamento diário quanto nas<br />
montagens, eram bastante inspiradas<br />
nos procedimentos tomados do grupo.<br />
Só muitos anos depois que conseguimos