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Odin TeaTreT e POrTO alegre

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PRIMEIRO<br />

SEMESTRE<br />

2012<br />

CADERNO DE TEATRO<br />

CADERNO DE TEATRO<br />

PRIMEIRO<br />

SEMESTRE<br />

2012<br />

40<br />

9 Grupos selecionados que participaram da residência: Teatro Sarcáustico (RS); Cooperativa Alegretense de Teatro (RS); Usina do<br />

Trabalho do Ator (RS), Santa Estação Companhia de Teatro (RS); Grupo Ritornelo (RS); Circo Girassol (RS); Companhia Bananeira<br />

(RJ); Teatro Diadokai (MG); Tao Filmes (DF); Teatro del Arca (Uruguai). Não estiveram presentes todos os integrantes de cada<br />

grupo, mas apenas alguns artistas para representá-los, já que o número de participantes era limitado.<br />

10 A programação completa compreendeu:<br />

Teatro de Câmara Júlio Piva: a residência artística A Cumplicidade Artística entre o Ator e o Diretor (3 dias), conduzida por<br />

Barba e alguns de seus atores, incluindo uma oficina de Dança dos Orixás com Augusto Omolú; as demonstrações de trabalho<br />

O Irmão Morto e O Eco do Silêncio, com Julia Varley, e Branca como o Jasmin, com Iben Nagel Rasmussen; Teatro SESC Centro:<br />

os espetáculos coletivos As Grandes Cidades sob a Lua e Ode ao Progresso; a palestra de Eugenio Barba 50 anos de trabalho: a<br />

luta contra a natureza do teatro; a demonstração de trabalho Antropologia Teatral; o encontro público dedicado à finalização<br />

da residência artística, do qual participaram todos os membros do <strong>Odin</strong> Teatret; lançamento e venda de vários livros de Barba e<br />

das atrizes do <strong>Odin</strong>; Casa do Teatro: sessões dos vídeos A Conquista da Diferença, Nas Duas Margens do Rio, O Teatro encontra<br />

o Ritual, Em Princípio era a Ideia; Teatro do Museu: o encontro A Ponte dos Ventos com Iben Nagel Rasmussen, Elena Floris<br />

e Tatiana Cardoso; a palestra A Organização e a Cultura do <strong>Odin</strong> Teatret com Base em Experiências desde 2004, com a tour<br />

manager do grupo Anne Savage. Espaço Circo Teatro Girassol: oficina de perna de pau com o ator Donald Kitt.<br />

41<br />

ODIN TEATRET NORDISK TEATERLABORATORIUM<br />

O <strong>Odin</strong> Teatret foi fundado em 1964 em Oslo, na<br />

Noruega. Em 1966, transferiu-se para Holstebro,<br />

na Dinamarca, e se transformou em Nordisk Teaterlaboratorium.<br />

Atualmente, os 25 membros que<br />

compõem o staff artístico e administrativo do <strong>Odin</strong><br />

são provenientes de 10 países e três continentes.<br />

Desde a sua origem, o <strong>Odin</strong> Teatret se concentrou<br />

no treinamento dos atores, em sua capacidade<br />

de estabelecer novas relações com os espectadores<br />

e nas diferentes dramaturgias que compõem um<br />

espetáculo. O autodidatismo dos atores do <strong>Odin</strong>,<br />

com a consequente elaboração de um treinamento<br />

individual e o ensino aos membros mais jovens<br />

do grupo, determinou o constante interesse pela<br />

aprendizagem e pela transmissão dos conhecimentos<br />

técnicos.<br />

Os 48 anos do <strong>Odin</strong> Teatret como laboratório<br />

favoreceram o crescimento de um ambiente profissional<br />

e de estudo, caracterizado por diversas atividades<br />

interdisciplinares e colaborações internacionais.<br />

Hoje, as principais atividades do Laboratório<br />

incluem: espetáculos, demonstrações de trabalho e<br />

workshops para atores e diretores; “trocas” feitas<br />

em diversos contextos, na Dinamarca e no exterior;<br />

A programação é farta e bastante articulada.<br />

Mas o que acontece exatamente naqueles dias?<br />

Uma residência artística para atores e diretores [9] ,<br />

espetáculos, demonstrações de trabalho, palestras,<br />

sessões de vídeo, lançamento e venda de<br />

livros, oficinas, etc [10] . Há longas listas de espera<br />

para assistir aos espetáculos, filas para ver as demonstrações<br />

de trabalho, alguns livros do <strong>Odin</strong><br />

esgotam-se já no primeiro dia, e uma multidão de<br />

jovens luta por um ingresso para ouvir Eugenio<br />

Barba e seus atores durante as palestras e os encontros.<br />

Chegam pessoas não só de várias cidades<br />

do Rio Grande do Sul, mas também de outros<br />

estados do Brasil, inclusive do Uruguai.<br />

Após cada palestra ou demonstração de trabalho,<br />

incansavelmente, Barba e seus atores permanecem<br />

nos teatros para responder a todas as<br />

perguntas dos espectadores, abrindo espaço para<br />

o diálogo e a troca de experiências, em coerência<br />

com a tradição do <strong>Odin</strong>. Reflete-se sobre: o artesanato<br />

do ator, suas técnicas e seu treinamento;<br />

organização de encontros internacionais de grupos<br />

de teatro; hospitalidade para companhias e grupos<br />

de teatro e dança; <strong>Odin</strong> Week Festival anual; publicação<br />

de revistas e livros (<strong>Odin</strong> Teatret Forlag e<br />

Icarus Publishing Enterprise); produção de filmes e<br />

vídeos didáticos; pesquisas no campo da Antropologia<br />

Teatral durante as sessões da ISTA (International<br />

School of Theatre Anthropology), que desde 1979<br />

se tornou uma aldeia teatral onde atores e dançarinos<br />

de diversas culturas encontram estudiosos para<br />

investigar, confrontar e aprimorar os fundamentos<br />

técnicos de sua presença cênica; Universidade do<br />

Teatro Eurasiano; espetáculos do Theatrum Mundi;<br />

colaboração com o CTLS (Centre for Theatre Laboratory<br />

Studies) da Universidade de Arhus, que regularmente<br />

organiza a The Midsummer Dream School;<br />

Festuge (Semana de Festa) de Holstebro; Festival<br />

trienal Transit, dedicado às mulheres que trabalham<br />

no teatro; OTA (<strong>Odin</strong> Teatret Archives), arquivos<br />

vivos da memória do <strong>Odin</strong>; WIN, Prática para Navegantes<br />

Interculturais; espetáculos para crianças;<br />

exposições; concertos; mesas-redondas; ações culturais<br />

e projetos especiais para a comunidade de<br />

Holstebro e de seu entorno, etc.<br />

os vários níveis de dramaturgia que compõem um<br />

espetáculo; a cumplicidade entre ator e diretor; os<br />

desafios do ofício do ator nos dias atuais; a sobrevivência<br />

dos grupos de teatro no Brasil e no<br />

mundo; a perseverança do <strong>Odin</strong> através do teatro<br />

e a transmissão da experiência.<br />

Neste festival, estão presentes Irion Nolasco,<br />

Jane Schöninger, Gilberto Icle, Alexandre Vargas,<br />

Tatiana Cardoso, Jezebel de Carli, entre tantos outros.<br />

Nada mais justo do que dar-lhes novamente<br />

voz para que nos falem de mais este contato com<br />

o grupo dinamarquês em Porto Alegre. Nesses<br />

novos depoimentos, eles nos contam sobre o impacto<br />

que a presença integral do <strong>Odin</strong> causa nos<br />

espectadores que seguem suas atividades neste 7º<br />

Palco Giratório, sobretudo em relação ao ano de<br />

2010. Ainda que os vários textos tenham – inevitavelmente<br />

– algumas informações ou impressões<br />

repetidas, decidi deixá-los aqui na íntegra, pelas<br />

reflexões que podem despertar, inclusive a partir<br />

dessas repetições.<br />

O <strong>Odin</strong> Teatret criou 74 espetáculos que viajaram<br />

por 63 países em contextos sociais diferentes.<br />

Durante essas experiências, desenvolveu-se uma<br />

cultura específica do <strong>Odin</strong>, baseada na diversidade<br />

e na prática da “troca”: os atores do grupo se<br />

apresentam à comunidade que os recebe com o seu<br />

trabalho artístico e, em troca, ela responde com<br />

cantos, músicas e danças que pertencem a sua própria<br />

tradição. A “troca” é uma espécie de permuta,<br />

ou escambo, de manifestações culturais, e não só<br />

oferece uma compreensão das formas expressivas<br />

alheias como também dá início a uma interação<br />

social que desafia preconceitos, dificuldades linguísticas<br />

e divergências de pensamento, juízo e<br />

comportamento.<br />

Nenhum outro grupo de teatro no mundo, até<br />

os dias de hoje, desenvolveu um leque de atividades<br />

tão diversificado quanto o <strong>Odin</strong> Teatret, criando e<br />

transmitindo incansavelmente sua própria tradição<br />

entre Ocidente e Oriente, alcançando um raio de<br />

milhares de artistas, estudantes e estudiosos – de<br />

diferentes campos do saber – que encontram nele<br />

matéria de inspiração e referência para suas próprias<br />

buscas.<br />

Depois dos depoimentos de alguns dos amigos<br />

gaúchos mais antigos do <strong>Odin</strong>, seguem também<br />

os de dois amigos gaúchos mais novos: Lucas<br />

Sampaio e Álvaro Rosa Costa. Lucas é ator do<br />

Grupo Geográfico e professor do Teatro Escola de<br />

Porto Alegre (TEPA); além disso, também deu um<br />

grande suporte ao <strong>Odin</strong> Teatret neste Palco Giratório<br />

de 2012. Álvaro, que hoje integra a Cia. Incomode-te,<br />

participou da residência artística com o <strong>Odin</strong><br />

como ator convidado do Circo Girassol.<br />

Compõem este artigo mais dois importantes<br />

depoimentos: o de Priscila Duarte e o de Julia<br />

Varley. Priscila é uma atriz do Teatro Diadokai que<br />

conheceu o <strong>Odin</strong> em 1986, tendo dialogado com o<br />

grupo em diferentes países e em diversos contextos<br />

desde então. Aqui, através de seu depoimento<br />

sobre a residência de Porto Alegre, ela nos traz<br />

um olhar “cruelmente sincero” sobre o sentido de<br />

continuar fazendo teatro nos dias de hoje. Fecha o<br />

artigo o texto de Julia Varley já citado na Premissa.<br />

Alexandre Vargas<br />

Tem uma diferença entre 2010 e 2012 até<br />

pelo formato de trabalho. O que mais me<br />

chama atenção, como espectador disso tudo,<br />

é perceber uma aproximação que foi se dando<br />

gradualmente. Com isso, não estou mirando o<br />

meio cênico, pois os artistas, os atores, foram<br />

chegando aos poucos. Eles não vieram todos<br />

de uma vez só, foram se aproximando. Acho<br />

que o Eugenio também fala dessa questão da<br />

“comunidade”. É difícil chegar numa comunidade:<br />

tem lutas, tem territórios, tem espaços<br />

aí. Muitas vezes, é difícil para os grupos locais<br />

se defrontarem com certas coisas, sobretudo<br />

com certas coisas que o Eugenio fala, por<br />

exemplo: coerência, trabalho diário, a questão<br />

do ofício. Basta lembrar o que ele falou<br />

ontem, como ir contra as leis do teatro, lutar<br />

contra um teatro rentável, não só na questão<br />

financeira, mas na questão da ideologia.<br />

Sendo que às vezes você é obrigado a ter um<br />

trabalho dentro do sistema em que vivemos,<br />

onde você cede a isso. Hoje, acho que tem<br />

uma mistura de gerações também.<br />

Naquela plateia tem essa mistura: você vê<br />

um Irion, que inicia um movimento forte,<br />

que traz o Eugenio, vê alunos que o Irion<br />

formou, tendo como base muito desse trabalho,<br />

e aí tem a Tatiana Cardoso, o Gilberto<br />

Icle, o UTA. O UTA, Usina do Trabalho do Ator,<br />

é gerado tendo como base esse movimento<br />

do <strong>Odin</strong> e do Burnier. Aí você pega também<br />

grupos mais jovens que tem um preconceito<br />

em relação a esse trabalho. Pode ser até um<br />

preconceito juvenil, como dizer “não quero<br />

fazer isso, não me interessa”. São coisas<br />

que eu já ouvi, tem gente que acha que os<br />

espetáculos são sisudos demais. Mas aí se<br />

surpreendem quando percebem o humor<br />

dos espetáculos. Uma coisa que eu também<br />

achava legal desses dois espetáculos é o formalismo<br />

de um [As Grandes Cidades sob a<br />

Lua] e o não formalismo do outro [Ode ao<br />

Progresso]. Achava que isso podia dar um<br />

insight no público que podia ser bacana.<br />

Eu também me percebi em algumas perguntas<br />

que foram feitas, como: “E a questão<br />

do amor, como é que fica, com os atores, e<br />

tal?”. E na pergunta, estava a sombra de seu<br />

grupo, ou seja, a sombra de seus problemas.<br />

O André Carreira fala que o <strong>Odin</strong> seria uma<br />

experiência, uma nova célula de sociabilidade<br />

possível para a América Latina. Então, a<br />

América Latina se encanta com essa ideia e<br />

vai buscar isso. Eu acho que ainda tem esse<br />

referencial nos grupos. Quando perguntam,<br />

perguntam coisas que não são só “como o<br />

diretor faz”. E acho que o Eugenio é muito<br />

coerente quando diz “essa é a minha maneira<br />

de fazer, funciona para mim, pode não<br />

ser eficaz para você”. Ele não está dando receitas.<br />

Mas o que as pessoas querem saber,<br />

às vezes não pode ser respondido, pois não<br />

há respostas, tipo “como eu dirijo? como eu<br />

mantenho um ator?".<br />

Tatiana Cardoso<br />

Olha, foi muito interessante ver o <strong>Odin</strong> na<br />

minha cidade, depois de já passados 18 anos<br />

da minha relação com o grupo fora do Brasil,<br />

através do Ponte dos Ventos.<br />

Me senti honrada, feliz, orgulhosa de fazer<br />

parte de um trabalho tão profundo, tão revolucionário<br />

para a história do teatro como<br />

é o do <strong>Odin</strong>. Há 15 anos, a vinda de Eugenio<br />

tinha um ar de novidade, de curiosidade por<br />

parte dos jovens estudantes de teatro da época.<br />

E é surpreendente constatar que agora,<br />

em 2012, ainda tem! Eu não conhecia muitos<br />

daqueles jovens atores ou estudantes de teatro<br />

da plateia aqui de Porto Alegre, mas podia<br />

ver o impacto que causava naquela plateia,<br />

aquele grupo longevo, experiente e maduro.<br />

Antes, eles nos chocavam com sua precisão,<br />

com suas habilidades corpóreas, com suas<br />

imagens herméticas e cheias de profundidade,<br />

com seu trabalho vocal primoroso. Hoje,<br />

eles nos chocam pelos mesmos motivos, mas<br />

com um sabor a mais: jovens velhos homens<br />

e mulheres gigantes, profundos, monstruosamente<br />

humanos, inspirando profissionalismo,<br />

ética, coragem, disciplina e inquietude. Eles<br />

nos inspiram, diria até dolorosamente por ser<br />

tão difícil, que vale a pena manter-se unido.<br />

Quando se considera as diferenças e se coloca<br />

o teatro como um ideal, “manter-se unido”<br />

– mesmo parecendo impossível – porta um<br />

significado que vai além do próprio ofício, da<br />

própria arte. (...) Mas o que fica depois que<br />

eles partiram é, sobretudo, essa vontade de<br />

fazer igual, de apostar em parcerias fecundas,<br />

de olhar o teatro como algo que vai além de<br />

uma produção eventual ou comercial.<br />

Gilberto Icle<br />

Este encontro foi fundamental, pois as novas<br />

gerações não conhecem o trabalho do<br />

<strong>Odin</strong>, senão pela narrativa dos mais velhos<br />

e pelos livros. Ainda que os espetáculos que<br />

estiveram em POA não sejam os espetáculos<br />

exemplares do grupo, a presença do <strong>Odin</strong> ajuda<br />

a dar conhecimento sobre sua produção<br />

e mobiliza a discussão sobre a cena contemporânea,<br />

tão desestabilizada nas discussões

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