Seis décadas de teleteatro do teatro “ao vivo” ao experimental ...

era enorme, muitas vezes os espetáculos seriam exibidos até mesmo sem patrocínio, como foi o
caso do Grande Teatro Tupi no Rio de Janeiro, sob direção de Sérgio Britto 12 . O programa ficou
nove anos no ar, apresentando uma telepeça a cada segunda-feira, com elenco fixo composto por
Fernanda Montenegro, Nathália Timberg, Zilka Salaberry, Ítalo Rossi, Aldo de Maio, Fernando
Torres e o próprio Britto além de artistas convidados que faziam sucesso nos teatros. A mobilidade
dos artistas entre os setores culturais como o teatro, o rádio e a televisão, no Rio de Janeiro,
facilitavam as manobras para os produtores de TV, pois estes iriam buscar mão-de-obra nos
espaços culturais socialmente disponíveis. O teatro surge, nestas circunstâncias, como um pólo
privilegiado, na medida em que familiarizava alguns profissionais da TV com as técnicas de
dramaturgia. Os atores de teatro, mesmo os amadores cariocas, levaram para a TV uma bagagem
cultural que interessava aos donos das emissoras pois, além de valorizarem sua programação com
bons espetáculos de teleteatro, atraíam o telespectador que podia ver, no vídeo, um elenco em que
sobressaíam aqueles bons atores que atuavam nos palcos. A coexistência de representantes da
chamada “alta cultura” e de setores da arte popular num mesmo canal, traça um perfil característico
da programação de TV carioca como relata a atriz Fernanda Montenegro:
Neste caldeirão da TV Tupi do Rio de Janeiro se juntaram todas as influências e
todas as escolas de dramaturgia e de atuação que existiam no país. Então você
tinha o Teatro Universitário, o Teatro do Estudante, a Praça Tiradentes, pessoas
de circo, os comediantes da Cinelândia e ainda os musicais, aquele mundo dos
cômicos e boates famosas, as grandes girls do Carlos Machado... Havia muitos
shows, muitíssimos bem feitos, do Silveira Sampaio, e aquilo fervia. Eu trabalhei
na TV com Colé, Grande Otelo, com Chocolate, trabalhei com comediantes (...)
Tô esquecendo gente (...) e os comediantes da Cinelândia, que faziam as
comédias de costume maravilhosamente (.. ) Eu devo à televisão o contato com
esse mundo efervescente de extraordinários atores, comediantes, girls,
dançarinos, vedetes de todo o tipo.(BRANDÃO, 2005, p.78)
Em São Paulo, o TV de Vanguarda, sob direção de Walter George Durst e Benjamin Cattan,
permaneceu mais de uma década no ar, apresentando ao público um repertório de clássicos
adaptados da dramaturgia.
Os trabalhos teatrais, feitos para a TV de forma cuidadosa, geralmente obtinham um censo
de poder e objetividade que compensavam as limitações técnicas. A opinião é unânime entre os
profissionais que participaram de teleteatros. George Schaeffer aponta interessante habilidade
própria da televisão de apoderar-se, com exuberância, da movimentação em cena dos atores,
dando ao telespectador o poder de sobrevoar dentro da cena, circulando por todos os lados como
uma abelha: “to catch that glowing, growing kind of performance you might see on stage if you were
a bumblebee around everywhere you wanted to be” (apud. ROSE, 1983, p.190). Era,
provavelmente, a vantagem da televisão ao traduzir o drama que se desenvolvia no proscênio, para
um ambiente mais limitado, o da pequena tela da TV.
Renato Ortiz lembra-nos que no cerne da indústria cultural há espaço para obras individuais
e “zonas de criação e talento no seio do conformismo estandardizado” (ORTIZ,1989, p.121). Já
Morin reitera ainda que nem a padronização existente no veículo eletrônico, nem a divisão do
trabalho são em si, obstáculos à “individualização da obra” (MORIN, 1997, p.31). Podemos
exemplificar com a obra teleteatral Vestido de Noiva, dirigida e adaptada da peça de Nelson
Rodrigues, pelo encenador paulista Antunes Filho, para a TV Cultura, em 1974 e reapresentada na
série Antunes Filho em Preto e Branco, em 2007.
12 Ver Cristina Brandão - O Grande Teatro Tupi do Rio de Janeiro. Juiz de Fora: UFJF/Opecom-2005