Hibridismo e mediação cultural no Brasil: os três tempos midiáticos em
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cujo projeto estético aponta para o resgate da herança <strong>cultural</strong> ibérico-brasileira,<br />
presentes <strong>no</strong>s rituais e festas populares religi<strong>os</strong><strong>os</strong> ou profa<strong>no</strong>s que r<strong>em</strong>ontam à<br />
tradição espetacular do teatro europeu medieval e moder<strong>no</strong> (commedia dell’arte,<br />
século de ouro espanhol, teatro elizabeta<strong>no</strong>), e que por uma série de fatores<br />
históric<strong>os</strong>, de longa duração e conjunturais, se expressa também nas<br />
manifestações populares do Nordeste brasileiro, <strong>em</strong> um movimento de<br />
trasmigração e reelaboração permanente de estruturas e procediment<strong>os</strong><br />
espetaculares e performátic<strong>os</strong> <strong>no</strong> contexto desse ambiente <strong>cultural</strong>. (SANTINI,<br />
2005, p. 63)<br />
Ou seja, “O Auto da Compadecida” pode ser encarado como uma tentativa de síntese desta<br />
tradição brasileira herdada d<strong>os</strong> colonizadores europeus, mas ao mesmo t<strong>em</strong>po recheada de outras<br />
referências, adquiridas durante <strong>os</strong> cinco sécul<strong>os</strong> de existência da “comunidade imaginada” (HALL,<br />
2000) chamada <strong>Brasil</strong>.<br />
Na graf<strong>os</strong>fera, segunda era midiática, o objeto gerado pela máquina é múltiplo, não<br />
cabendo mais pensarm<strong>os</strong> qual é o original, como na fotografia e <strong>no</strong> cin<strong>em</strong>a. As duas versões<br />
cin<strong>em</strong>atográficas da obra de Aria<strong>no</strong> Suassuna encaixam-se neste momento da evolução histórica<br />
da percepção humana. A peça vira filme pela primeira vez <strong>em</strong> 1969, com o título de “A<br />
compadecida”. A direção de George Jonas e roteiro feito por Aria<strong>no</strong> Suassuna <strong>em</strong> colaboração com<br />
o diretor defin<strong>em</strong> as características de uma obra que carrega para a tela pr<strong>em</strong>issas da montag<strong>em</strong><br />
teatral. O filme está imbuído de um espírito de psicodelia, com figuri<strong>no</strong>s que trabalham<br />
conceitualmente a passag<strong>em</strong> do campo para a cidade. O caminho do diretor de<strong>no</strong>ta um cin<strong>em</strong>a<br />
ainda com a história ligada a<strong>os</strong> núcle<strong>os</strong> tribais, localista, apesar da mensag<strong>em</strong> midiática da indústria<br />
<strong>cultural</strong>.<br />
Em 1987, <strong>os</strong> trapalhões transformam o “Auto” <strong>no</strong> filme “Os trapalhões <strong>no</strong> Auto da<br />
Compadecida”. Desta vez, a história ganha um tom da comédia pastelão, baseada <strong>no</strong> tipo de humor<br />
que levou o quarteto ao sucesso na televisão. Até então, nas duas adaptações <strong>os</strong> diretores e<br />
roteiristas mantiveram o palhaço, o narrador, figura que funciona como caráter da mistura entre <strong>os</strong><br />
gêner<strong>os</strong> dramático e épico na definição da dramaturgia do “Auto”.<br />
É com a chegada da TV que v<strong>em</strong><strong>os</strong> a passag<strong>em</strong> para a era do visual, a vide<strong>os</strong>fera. Inicia-se<br />
uma fase onde as imagens são transmitidas à distância, ao vivo, imediatas ao acontecimento.<br />
Diferente do cin<strong>em</strong>a, não encontram<strong>os</strong> vestígi<strong>os</strong> n<strong>em</strong> marcas legíveis da existência de imagens <strong>no</strong><br />
suporte magnético das fitas de vídeo, as imagens da vide<strong>os</strong>fera são somente processo. Não existe<br />
mais necessariamente a captura, inscrição ou reprodução da realidade. Acreditam<strong>os</strong> na hipótese de<br />
que a versão do “Auto da compadecida” para a televisão, realizada pelo diretor Guel Arraes <strong>em</strong><br />
1999, é da ord<strong>em</strong> da vide<strong>os</strong>fera, um produto híbrido.<br />
O caráter híbrido<br />
A dicotomia próprio/alheio perde o sentido na cont<strong>em</strong>poraneidade. As identidades<br />
nacionais, forjadas a partir das políticas públicas que privilegiaram a difusão da idéia de nação como<br />
algo unificado, sofreram um processo de fratura frente à globalização. No t<strong>em</strong>po da<br />
internacionalização, a partir das grandes navegações do século XV, as nações se abriram para<br />
produção de outr<strong>os</strong> países e culturas. Mas a maior parte d<strong>os</strong> bens era produzida na própria<br />
sociedade <strong>em</strong> que se vivia. Já na globalização, as <strong>em</strong>presas fragmentam o processo de produção,<br />
fabricando cada parte <strong>no</strong>s países onde o custo é me<strong>no</strong>r.<br />
Os objet<strong>os</strong> perd<strong>em</strong> relação de fidelidade com <strong>os</strong> territóri<strong>os</strong> originári<strong>os</strong>. A cultura é<br />
um processo de montag<strong>em</strong> multinacional, uma articulação flexível das partes,