O ORDOVÍCICO DO NE DE PORTUGAL: DE MATERIAIS QUASE "AZÓICOS" A MUITO PROMISSORES PARA APALEONTOLOGIA. – NOTA PRELIMINARArtur Abreu Sá > Departamento <strong>de</strong> Geologia, Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Trás-os-Montes e Alto Douro, Ap. 1013,5001-911 Vila Real, Portugal. asa@utad.ptRESUMOOs trabalhos recentemente <strong>de</strong>senvolvidos nos afloramentos do Ordovícico da Zona Centro-Ibérica no NE<strong>de</strong> Portugal trouxeram à luz um novo conjunto <strong>de</strong> conhecimentos litológicos, paleontológicos e bioestratigráficosque modificam por completo o estatuto <strong>de</strong> terra incognita que até agora lhes era conferido.A nova realida<strong>de</strong> coloca <strong>de</strong>finitivamente o conhecimento <strong>de</strong>stes materiais em igualda<strong>de</strong> com o <strong>de</strong> outrasbacias ordovícicas do âmbito paleogeográfico Norte-Gondwânico.ABSTRACTRecent work carried out on the Central-Iberian Zone Ordovician outcrops of Northeastern Portugal bringsto light a new set of knowledge on lithology, paleontology and biostratigraphy that completely modifies thestatus of terra incognita that this region has had up to now. The new reality <strong>de</strong>finitively places the knowledgeabout the Ordovician materials of this region on an equal footing with other sedimentary basins fromNorth-Gondwanian paleogeographic domain.1. INTRODUÇÃOOs materiais <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> ordovícica afloram extensamente na região NE <strong>de</strong> Portugal, enquadrados na partesetentrional Zona Centro-Ibérica (Fig. 1). Apesar disso, têm sido assaz referenciados como locais comregisto paleontológico escasso e não raras vezes pouco fiável, facto que ao longo dos tempos tem conferidoa esta região o estatuto <strong>de</strong> terra incognita. O estudo geológico pormenorizado <strong>de</strong>sta região, marcadoin<strong>de</strong>levelmente pelo trabalho <strong>de</strong> Ribeiro (1974), <strong>de</strong>monstrou que as ásperas serranias transmontanasguardavam um segredo <strong>de</strong> colisão <strong>de</strong> placas tectónicas, que teria <strong>de</strong>formado <strong>de</strong> tal maneira a maioria dosmateriais potencialmente fossilíferos, que os restos paleontológicos teriam <strong>de</strong>saparecido <strong>de</strong>vido ao significativograu <strong>de</strong> metamorfismo sofrido então por essas rochas. Este facto, quase sempre mascarado <strong>de</strong>dogma, justificaria por si só as ambiguida<strong>de</strong>s cronoestratigráficas patentes em muitos dos trabalhos efectuadosnestes materiais, como se po<strong>de</strong> constatar nas sínteses sobre o Ordovícico <strong>de</strong> Portugal elaboradospor Romano (1982), Hammann et al. (1982) e Oliveira et al. (1992), on<strong>de</strong> as correlações estabelecidaspara o Ordovícico do NE <strong>de</strong> Portugal se baseiam fundamentalmente em critérios <strong>de</strong> natureza litoestratigráfica<strong>de</strong> muito baixa resolução. A realização recente <strong>de</strong> trabalhos <strong>de</strong> campo e laboratório, com vista àobtenção <strong>de</strong> novos dados estratigráficos, paleontológicos e bioestratigráficos, revelou no entanto quenesta região aflora um conjunto <strong>de</strong> litologias fossilíferas correlacionáveis, <strong>de</strong> uma forma bastante precisa,com outras áreas afim do SW europeu.17
FIG. 1 – AFLORAMENTOS ORDOVÍCICOS DA ZONA CENTRO-IBÉRICA NO NE DE PORTUGAL (ADAP. PEREIRA, 2000).2. A PALEONTOLOGIA DO ORDOVÍCICO DO NE DE PORTUGAL: PASSADO E PRESENTENo que concerne à Paleontologia do Ordovícico do NE <strong>de</strong> Portugal, a cultura geológica estabelece queapós as <strong>de</strong>scobertas <strong>de</strong> Delgado (1885, 1887, 1892, 1908), apenas algumas ocorrências pontuais, amaioria das vezes i<strong>de</strong>ntificadas apenas genericamente, introduziram alguma novida<strong>de</strong> a este respeito.Neste sentido, a Fig. 2 remete-nos para a realida<strong>de</strong> da produção científica relativa aos materiais ordovícicos<strong>de</strong>sta região, que numa análise preliminar nos levaria a pensar na existência <strong>de</strong> um conhecimento paleontológicoprofundo dos mesmos. Nada mais distante da realida<strong>de</strong>, pois se excluirmos os trabalhos <strong>de</strong>Delgado (1885, 1887, 1892, 1908), Teixeira (1974), Rebelo e Romano (1986), Gutiérrez-Marco et al.(1995), Coke e Gutiérrez-Marco (2001) e Sá et al. (2002, 2003), a generalida<strong>de</strong> das restantes referênciasrelativas a ocorrências paleontológicas originais encontra-se praticamente reduzida a simples relatos<strong>de</strong> achados, quase sempre sem precisar a localização dos mesmos.18FIG. 2 – PUBLICAÇÕES RELATIVAS AOS MATERIAIS ORDOVÍCICOS DA REGIÃO NE DE PORTUGAL.