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A eficácia da lei penal e processual no tempo comporta grande ...

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A eficácia <strong>da</strong> <strong>lei</strong> <strong>penal</strong> e <strong>processual</strong> <strong>no</strong> <strong>tempo</strong> <strong>comporta</strong> <strong>grande</strong> estudo. No entanto, comonão é este, aparentemente, o objetivo, mas para sanar a dúvi<strong>da</strong>, sigo com este breve arcabouçojurídico.São dois os preceitos básicos para estabelecer-se a aplicabili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> <strong>lei</strong> <strong>penal</strong> ou<strong>processual</strong> com as i<strong>no</strong>vações supervenientes ao fato em exame. A primeira, faz-se necessária a analise<strong>da</strong> “vantagem/benefício” <strong>da</strong> <strong>no</strong>va regra, porquanto a segun<strong>da</strong> considerará apenas a vigência<strong>tempo</strong>ral. Explico.Paulo José <strong>da</strong> Costa Júnior, após a edição <strong>da</strong> Constituição de 1988, ao tratar do tema,sustenta que:A irretroativi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> <strong>lei</strong> <strong>penal</strong> incriminadora e a retroativi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> <strong>lei</strong> <strong>penal</strong> benéfica sãoprincípios constitucionais paralelos. E os princípios aceitos pela Magna Carta são dotadosde força vinculativa imediata, de cogente eficácia, impondo-se logo ao legisladorordinários 1 ”Quando se fala em <strong>no</strong>rmas de direito <strong>penal</strong>, analisa-se o conteúdo material do comandoe, salvo em benefício ao réu, esta não retroagirá. É o que estabelece tanto a Constituição Federal,quando o Código Penal:CF, art. 5º, XL - a <strong>lei</strong> <strong>penal</strong> não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.CP, art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que <strong>lei</strong> posterior deixa de considerar crime,cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais <strong>da</strong> sentença condenatória.Parágrafo único - A <strong>lei</strong> posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aosfatos anteriores, ain<strong>da</strong> que decididos por sentença condenatória transita<strong>da</strong> em julgadoJá em relação às <strong>no</strong>rmas de caráter <strong>processual</strong>, predomina o princípio tempus regit actum.Ou seja, regras de direito <strong>penal</strong> <strong>processual</strong> aplicam-se imediatamente após a sua publicação, sem1 COSTA JÚNIOR, Paulo José. Comentários ao Código Penal. Saraiva. p. 5.


que se invalide os atos já praticados. E foi o que aconteceu com as recentes alterações do Código deProcesso Penal, que estabeleceu <strong>no</strong>vo momento para, por exemplo, o interrogatório do réu.Desta forma, sobrevindo alteração <strong>processual</strong>, as regras processuais aplicar-se-ão <strong>da</strong>quelemomento em diante, ressalva<strong>da</strong>s as <strong>no</strong>rmas com intenso conteúdo <strong>penal</strong>, de<strong>no</strong>mina<strong>da</strong>s como mistas,com o que se impõe a retroativi<strong>da</strong>de em benefício ao réu.A exemplo, tem-se o art. 88, <strong>da</strong> Lei 9.099/95, que passou a exigir a representação para oscrimes de lesões corporais leves e culposas, afetando, desta forma, regras niti<strong>da</strong>mente de direito <strong>penal</strong>material (extinção <strong>da</strong> punibili<strong>da</strong>de – art. 107 do CP), com o que as vítimas, em processos eman<strong>da</strong>mento, tiveram de ser intima<strong>da</strong>s a representar criminalmente, demonstrando seu interesse <strong>no</strong>processo.Em tais situações, a doutrina sugere que se faça a mesma análise <strong>da</strong> Lei Penal Material,retroagindo a mais benigna e negando eficácia à mais gravosa. Vejamos:Normas mistas ou híbri<strong>da</strong> são aquelas que apresentam duplici<strong>da</strong>de de caráter, vale dizer,incorporam tanto um conteúdo <strong>processual</strong> quanto um conteúdo material. A relevânciadesta constatação repercute diretamente <strong>no</strong> aspecto relacionado à eficácia <strong>da</strong> <strong>lei</strong> <strong>no</strong><strong>tempo</strong>. Isto porque, detecta<strong>da</strong> a natureza mista <strong>no</strong> âmbito de um determinadoregramento, será inevitável, <strong>no</strong> aspecto relativo ao seu conteúdo material, oreconhecimento <strong>da</strong> retroativi<strong>da</strong>de em relação a atos já realizados ou decisões jáconsuma<strong>da</strong>s.(...)Nas primeiras, com efeito, a <strong>no</strong>rma possui uma determina<strong>da</strong> natureza (material ou<strong>processual</strong>), em que pese se encontre incorpora<strong>da</strong> a diploma de caráter distinto. É o caso,por exemplo, do direito de silêncio do réu em seu interrogatório, que, a despeito de suaprevisão <strong>no</strong> Código de Processo Penal (art. 186), possui caráter niti<strong>da</strong>mente assecutatóriode direitos (material).Já nas segun<strong>da</strong>s, a <strong>no</strong>rmas apresenta dupla natureza, vale dizer, material em umdetermina<strong>da</strong> parte e <strong>processual</strong> em outra. Como exemplo de disposição híbri<strong>da</strong>, cujainterpretação ain<strong>da</strong> hoje é objeto de impasse entre os tribunais pátrios, menciona-se o art.366 do CPP, modificado pela Lei 9.271/1996, dispondo que “se o acusado, citado por edital,não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazoprescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipa<strong>da</strong> <strong>da</strong>s provas considera<strong>da</strong>surgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, <strong>no</strong>s termos do disposto <strong>no</strong> art. 312”.Precitado artigo, como se vê, insere conteúdos distintos:- Conteúdo <strong>processual</strong> <strong>no</strong> aspecto em que determina a suspensão <strong>no</strong> processo aoréu, que, citado por edital, não compareceu ao interrogatório e nem <strong>no</strong>meou defensor.Neste enfoque, a carga é niti<strong>da</strong>mente <strong>processual</strong>, pois relativa ao fluxo procedimental.


- Conteúdo material <strong>no</strong> aspecto relativo à suspensão do prazo prescricional.Não há duvi<strong>da</strong>s de que aspectos pertinentes à prescrição possuem natureza material –tanto que regulado este instituto <strong>no</strong> âmbito do Código Penal, sendo lá previstas, também,as causas interruptivas (art. 117) e suspensivas (v.g., art. 116, I) do lapso prescricional.Considera<strong>da</strong>, pois, essa duplici<strong>da</strong>de de conteúdo inserta em uma mesma<strong>no</strong>rma, muitas dúvi<strong>da</strong>s surgiram quanto à possibili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> sua retroativi<strong>da</strong>de paraalcançar fatos anteriores à sua vigência. De uma forma geral, consolidou-se ajurisprudência que, <strong>no</strong> tocante ao aspecto <strong>processual</strong> (suspensão do processo), não cabe aretroativi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> <strong>no</strong>rma em face <strong>da</strong> regra tempus regit actum. Por outro lado,relativamente à suspensão do prazo prescricional, apesar de tratar de aspecto materialinserto à <strong>no</strong>rma, sua retroativi<strong>da</strong>de importaria em causar prejuízo ao réu, já que importa<strong>no</strong> estabelecimento <strong>da</strong> imprescritibili<strong>da</strong>de do crime enquanto não tomar o réuconhecimento formal <strong>da</strong> acusação 2 .Tanto o STF quanto o STJ manifestam-se <strong>no</strong> sentido que sendo uma <strong>no</strong>rma mista ouhíbri<strong>da</strong> (tiver conteúdo <strong>processual</strong> e material), deve-se examinar o seu conteúdo material. Assim,sendo uma <strong>no</strong>rma material mais gravosa, a <strong>no</strong>rma mista não retroagirá como um todo. Veja-se:1. RECURSO. Extraordinário. Pedido. Inconstitucionali<strong>da</strong>de do art. 411 do Código deProcesso Penal. Dispositivo revogado pela Lei n° 11.689/2008. Per<strong>da</strong> superveniente dointeresse recursal. Recurso prejudicado. O pedido <strong>da</strong> recorrente está prejudicado ante arevogação do art. 411, do Código de Processo Penal, pela Lei n° 11.689/2008, queintroduziu, <strong>no</strong> art. 415, <strong>no</strong>vas regras para a absolvição sumária <strong>no</strong>s processos <strong>da</strong>competência do Tribunal do Júri. 2. AÇÃO PENAL. Tribunal do Júri. Absolvição sumáriaimprópria. Revogação do art. 411, do Código de Processo Penal, pela Lei n° 11.689/2008.Retroativi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> <strong>lei</strong> mais benéfica. Concessão de habeas corpus de ofício. As <strong>no</strong>vasregras, mais benignas, aplicam-se retroativamente. Ordem concedi<strong>da</strong> para que o juízo de1º grau examine, à luz <strong>da</strong> <strong>no</strong>va re<strong>da</strong>ção, se estão presentes os requisitos para a absolviçãosumária, oportuniza<strong>da</strong> prévia manifestação <strong>da</strong> defesa.RE 602561/SP - SÃO PAULO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator(a): Min. CEZARPELUSO. Julgamento: 27/10/2009 Órgão Julgador: Segun<strong>da</strong> TurmaEMENTA: Lesões corporais: decadência, à falta de representação do ofendido, <strong>da</strong> ação<strong>penal</strong> condiciona<strong>da</strong>, conforme o art. 88 <strong>da</strong> L. 9.099, aplicável ao processo <strong>penal</strong> militar,segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal: superveniência <strong>da</strong> L. 9.839/99, que dispôsem contrário, mas não se aplica ao caso, <strong>no</strong> qual, afora a ultra-ativi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> <strong>lei</strong> anteriormais favorável, à <strong>lei</strong> posterior jamais se poderia emprestar retroativi<strong>da</strong>de máxima, demodo a desconstituir decadência já consuma<strong>da</strong>, antes <strong>da</strong> sua vigência.HC 80866 / SP - SÃO PAULO. HABEAS CORPUS. Relator(a): Min. SEPÚLVEDAPERTENCE. Julgamento: 12/06/2001 Órgão Julgador: Primeira Turma2 AVENA, Norberto. Processo Penal Esquematizado. Método. p. 42 e 43.


PENAL. HABEAS CORPUS. DELITO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. ROL AMPLIADOPELA LEI 10.259/2001. SENTENÇA PROFERIDA APÓS SUA EDIÇÃO. NORMAS DENATUREZA PENAL OU MISTA QUE BENEFICIAM OS PACIENTES. RETROATIVIDADE.ORDEM CONCEDIDA.1. A Lei 10.259/2001, por seu art. 2º, parágrafo único, ampliou o rol dos delitos de me<strong>no</strong>rpotencial ofensivo, elevando o teto <strong>da</strong> pena máxima abstratamente comina<strong>da</strong> ao delitopara 2 (dois) a<strong>no</strong>s, sendo omisso em relação a possíveis exceções, estendendo mais ain<strong>da</strong> oconceito de infração de me<strong>no</strong>r potencial ofensivo.2. No caso dos autos, os réus foram condenados pela prática do delito capitulado <strong>no</strong> art.256, parágrafo único, c/c 258, segun<strong>da</strong> parte, ambos do Código Penal, os quais prevêem apena máxima de 1 (um) a<strong>no</strong> e 6 (seis) meses de detenção, subsumindo-se, portanto, aoconceito de me<strong>no</strong>r potencial ofensivo <strong>no</strong>s termos postos pela Lei 10.259/2001.3. Tratando-se de <strong>lei</strong> <strong>penal</strong> mais benéfica, de natureza jurídica de direito material oumista, que possibilita aos pacientes a oportuni<strong>da</strong>de de se beneficiarem dos institutosdes<strong>penal</strong>izadores previstos na Lei 9.099/95, aplica-se aos fatos praticados anteriormente àsua entra<strong>da</strong> em vigor, consoante determina os arts.5º, inciso XL, <strong>da</strong> Constituição Federal e 2º, parágrafo único, do Código Penal. 4. Ordemconcedi<strong>da</strong> para anular a sentença condenatória e determinar que seja verifica<strong>da</strong> aincidência <strong>da</strong>s regras pertinentes às infrações penais de me<strong>no</strong>r potencial ofensivo,<strong>no</strong>ta<strong>da</strong>mente quanto ao disposto <strong>no</strong> art. 76 <strong>da</strong> Lei 9.099/95.HC 55064/SP. HABEAS CORPUS 2006/0037120-4. Relator(a) Ministro ARNALDOESTEVES LIMA (1128) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA. Data do Julgamento09/05/2006. Data <strong>da</strong> Publicação/Fonte DJ 29/05/2006 p. 283 REVFOR vol. 387 p. 437.Pois bem, feitas estas ressalvas, passemos à questão de fundo. No caso narrado, emparticular, o problema cingir-se-á quanto à aplicabili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> majorante prevista <strong>no</strong> art. 9º <strong>da</strong> Lei8.072/90. Defini<strong>da</strong> a sua incidência, ou não, solvi<strong>da</strong> estará a celeuma.O dissídio jurisprudencial e doutrinário atinente à questão sempre foi, e ain<strong>da</strong> é, evidente.Em linhas gerais, os que defendiam 3 o afastamento <strong>da</strong> causa de aumento de pena, alicerçavam-seem dois pilares, a saber:(i) considerar a presunção de violência prevista <strong>no</strong> art. 224 do Código Penal paraconfigurar o estupro ou atentado violento ao pudor e depois utilizar o elemento complementarconstitutivo do tipo para incidir como causa de aumento de pena configuraria bis in idem; e,3 GOMES, Luiz Flávio. Presunção de Violência <strong>no</strong>s Crimes Sexuais. RT. p. 148/149; PRUDENTE, Neemias Moretti.Considerações Críticas Acerca <strong>da</strong>s Disposições Gerais relativas aos Crimes de Estupro e Atentado Violento aoPudor. Revista IOB. 52 – Out-Nov/2008. p. 91; CUNHA. Rogério Sanchez. Direito Penal Parte Especial. RT. 3ª ed.p. 256.


(ii) a forma como disposta e redigi<strong>da</strong> a reprimen<strong>da</strong> legal, utilizando a partícula “e”’, aocontrário <strong>da</strong> forma tradicionalmente emprega<strong>da</strong> <strong>no</strong> meio jurídico por seu operadores (combinadocom), seria meio mais rebuscado de expressar a mesma coisa, também haja vista que as demaishipóteses que resultam <strong>no</strong> aumento de pena estão consubstancia<strong>da</strong>s em casos de lesões graves oumortes, o que reforçaria tal entendimento.O segundo argumento é facilmente refutado, pois interpretando-se teleologicamente a<strong>no</strong>rma insculpi<strong>da</strong> (punir mais severamente os indivíduos que infligirem a <strong>lei</strong> nas hipóteses de vítimaselenca<strong>da</strong>s <strong>no</strong> art. 224 do CP) <strong>no</strong>ta-se que o objetivo foi punir tanto na forma simples do crime,quanto na qualifica<strong>da</strong> (art. 223), respeitando o limite de 30 a<strong>no</strong>s.Entretanto, a primeira tese suscita<strong>da</strong> ganhou força, sedimentando-se <strong>no</strong> Superior Tribunalde Justiça, que passou a torná-la incidente somente quando perpetrado com violência real, emaparente desarmonia com o Pretório Excelso. Dito de outra forma, reconhecia-se a majorantequando fosse utiliza<strong>da</strong> a violência ou grave ameaça para perfectibilizar o tipo <strong>penal</strong> de estupro ougrave ameaça e a presunção de violência para exasperar a pena.Neste sentido:PENAL. RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO. AUMENTO PREVISTO NO ART. 9º DA LEI Nº8.072/90. VIOLÊNCIA REAL E GRAVE AMEAÇA. INCIDÊNCIA. SUPERVENIÊNCIA DA LEINº 12.015/2009.I - Esta Corte firmou orientação de que a majorante inserta <strong>no</strong> art. 9º <strong>da</strong> Lei nº 8.072/90,<strong>no</strong>s casos de presunção de violência, consistiria em afronta ao princípio ne bis in idem.Entretanto, tratando-se de hipótese de violência real ou grave ameaça perpetra<strong>da</strong> contracriança, seria aplicável a referi<strong>da</strong> causa de aumento. (Precedentes).II - Com a superveniência <strong>da</strong> Lei nº 12.015/2009 restou revoga<strong>da</strong> a majorante prevista <strong>no</strong>art. 9º <strong>da</strong> Lei dos Crimes Hediondos, não sendo mais admissível a sua aplicação para fatosposteriores à sua edição. Não obstante, remanesce a maior reprovabili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> conduta,pois a matéria passou a ser regula<strong>da</strong> <strong>no</strong> art. 217-A do CP, que trata do estupro devulnerável, <strong>no</strong> qual a reprimen<strong>da</strong> prevista revela-se mais rigorosa do que a do crime deestupro (art. 213 do CP).III - Tratando-se de fato anterior, cometido contra me<strong>no</strong>r de 14 a<strong>no</strong>s e com emprego deviolência ou grave ameaça, deve retroagir o <strong>no</strong>vo comando <strong>no</strong>rmativo (art. 217-A) por semostrar mais benéfico ao acusado, ex vi do art. 2º, parágrafo único, do CP.Recurso parcialmente provido.


(REsp 1102005/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 29/09/2009,DJe 19/10/2009)RECURSO ESPECIAL. PENAL. ESTUPRO SIMPLES COM VIOLÊNCIA PRESUMIDA. CRIMEHEDIONDO. FIXAÇÃO DE REGIME INTEGRALMENTE FECHADO. IMPOSSIBILIDADE.MAJORANTE PREVISTA NO ART. 9º DA LEI 8.072/90. NÃO INCIDÊNCIA. INEXISTÊNCIADE LESÃO CORPORAL GRAVE OU MORTE. PRINCÍPIO DO NE BIS IN IDEM.1 - O crime de estupro, ain<strong>da</strong> que praticado em sua forma simples ou com violênciapresumi<strong>da</strong>, caracteriza-se como crime hediondo.2 - Diante <strong>da</strong> declaração <strong>da</strong> inconstitucionali<strong>da</strong>de do § 1º do art. 2º, com a re<strong>da</strong>ção <strong>da</strong><strong>da</strong>pela Lei n. 8.072/90, perfeitamente possível, aos condenados por crimes hediondos ouequiparados, a fixação de quaisquer dos regimes prisionais legalmente previstos, devendoa <strong>no</strong>va re<strong>da</strong>ção conferi<strong>da</strong> ao citado dispositivo legal pela Lei 11.464/07 atingir somente oscasos posteriores à sua entra<strong>da</strong> em vigor.3 - Incabível a incidência <strong>da</strong> majorante prevista <strong>no</strong> art. 9º <strong>da</strong> Lei 8.072/90 aos crimes deestupro ou atentado violento ao pudor se não sobrevier o resultado lesão corporal denatureza grave ou morte, sob pena de ofensa ao princípio do ne bis in idem, uma vez quea presunção de violência apresenta-se como elemento constitutivo do tipo <strong>penal</strong>, 4 -Recurso parcialmente provido apenas para reconhecer a hediondez do delito tipificado <strong>no</strong>caput do art. 213 do Código Penal.(REsp 1006522/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 16/06/2009,DJe 03/08/2009)A tese é atraente, sobretudo razoável. Tanto o é que a doutrina, em <strong>grande</strong> parte,curvou-se ao argumento. To<strong>da</strong>via, em sintonia com o Supremo Tribunal Federal, Nucci bemsustentou que:Preceitua o art. 9º <strong>da</strong> Lei 8.072/90 haver um aumento de metade <strong>da</strong> pena para quemcometer determinados crimes hediondos contra as pessoas enumera<strong>da</strong>s <strong>no</strong> art. 224 doCódigo Penal. O art. 224 serviu apenas de referência para o legislador indicar quando areprovação ao ato deve severamente considera<strong>da</strong>, agravando-se a pena. Assim, quemestuprava me<strong>no</strong>s de 14 a<strong>no</strong>s tem a pena aumenta<strong>da</strong> <strong>da</strong> metade. Surgiu, então, oposicionamento <strong>da</strong>queles que viram nessa disposição do art. 9º um bis in idem, quandohouvesse a hipótese do art. 224, ou seja, se a i<strong>da</strong>de <strong>da</strong> vítima fosse leva<strong>da</strong> em conta paratipificar o crime de estupro (violência presumi<strong>da</strong>), não poderia <strong>no</strong>vamente ser leva<strong>da</strong> emconsideração para aumentar a pena. Em <strong>no</strong>sso entendimento, houve somente a utilizaçãode um mecanismo remissivo para tratar de causa de aumento de pena. O fato de apessoa não poder consentir vali<strong>da</strong>mente, permitindo a tipificação do delito de estupro ouatentado violento ao pudor, não elimina outra conseqüência distinta, que é o crime sexualter-se consumado contra vítima me<strong>no</strong>r de 14 a<strong>no</strong>s. Assim, cremos perfeitamente possível a


consideração <strong>da</strong> i<strong>da</strong>de tanto para tipificar o delito sexual violento (arts. 213 e 214, CP),como para aumentar a pena 4 .E neste compasso:EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOALDE DEFENSOR DATIVO PARA APRESENTAÇÃO DE CONTRARRAZÕES. ART. 370, § 4º,DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO TEMPUS REGITACTUM. ESTUPRO. CRIME HEDIONDO. VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS. PRESUNÇÃO DEVIOLÊNCIA. APLICAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO ART. 9º DALEI 8.072/1990. ORDEM DENEGADA. I - A intimação do defensor <strong>da</strong>tivo paraapresentação de contrarrazões ao recurso especial ocorreu em <strong>da</strong>ta anterior à publicação<strong>da</strong> Lei 9.271/1996, o que, pela aplicação do princípio do tempus regit actum, exclui aobrigatorie<strong>da</strong>de <strong>da</strong> intimação pessoal do defensor <strong>da</strong>tivo.II - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme <strong>no</strong> sentido de que o crime deestupro, tanto na sua forma simples como na qualifica<strong>da</strong> é crime hediondo. Precedentes.III - Não há bis in idem <strong>no</strong> fato de a i<strong>da</strong>de <strong>da</strong> vítima ser leva<strong>da</strong> em conta paratipificar o crime de estupro pela violência presumi<strong>da</strong> <strong>no</strong>s termos do art. 224 doCódigo Penal e também como causa de aumento de pena consoante dispõe oart. 9º <strong>da</strong> Lei 8.072/1990.IV - Inexistindo nuli<strong>da</strong>de ou ilegali<strong>da</strong>de flagrante a ser sana<strong>da</strong>, não se pode admitir ohabeas corpus como sucedâneo de revisão criminal, ante a verificação do trânsito emjulgado do acórdão que tor<strong>no</strong>u definitiva a condenação.V - Ordem denega<strong>da</strong>.(HC 97788, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em25/05/2010, DJe-116 DIVULG 24-06-2010 PUBLIC 25-06-2010 EMENT VOL-02407-02 PP-00403)EMENTA: HABEAS CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. VIOLÊNCIAPRESUMIDA. VÍTIMA MENOR DE QUATORZE ANOS. ACRÉSCIMO DA PENA EM FACEDA INCIDÊNCIA DO ART. 9º DA LEI Nº 8.072/90. ALEGADA OCORRÊNCIA DE BIS INIDEM. REDUÇÃO CONCERNENTE À SEMI-IMPUTABILIDADE DO PACIENTE. FALTA DEFUNDAMENTAÇÃO. Ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal considerama não-ocorrência de bis in idem <strong>no</strong> reconhecimento <strong>da</strong> causa de aumento doart. 9º <strong>da</strong> Lei nº 8.072/90, em face de ser a vítima me<strong>no</strong>r de quatorze a<strong>no</strong>s,<strong>no</strong>s crimes de estupro e atentado violento ao pudor tipificado pela violênciapresumi<strong>da</strong> (art. 224, alínea a, do Código Penal). Ausência de fun<strong>da</strong>mentação nasentença condenatória quanto ao fator de redução <strong>da</strong> pena resultante do art. 26 doCódigo Penal, em face <strong>da</strong> semi-imputabili<strong>da</strong>de do paciente. Habeas corpus deferido emparte.4 NUCCI, Guilherme Souza. Leis Penais e Processuais Penais. RT. 2ª ed. p.612.


(HC 76004, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Primeira Turma, julgado em 19/05/1998, DJ21-08-1998 PP-00002 EMENT VOL-01919-01 PP-00050).Portanto, considerando que, além de pôr fim ao impasse, a <strong>no</strong>va pena corporalculmina<strong>da</strong> ao delito abstratamente é mais benéfica, pois antes com a incidência <strong>da</strong> causa deaumento de pena ficaria entre 09 e 15 a<strong>no</strong>s, e agora, entre 08 e 15 a<strong>no</strong>s. Logo, sobreveio alteraçãolegislativa (<strong>no</strong>vatio legis in mellius), modificando <strong>no</strong>rma de direito material mais favorável ao réu,esta deve ser imediatamente aplica<strong>da</strong>.Já em relação à causa de aumento de pena para os casos de ser o crime praticado porascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ouempregador <strong>da</strong> vítima ou por qualquer outro título tem autori<strong>da</strong>de sobre ela, não há qualquerimproprie<strong>da</strong>de na culminação <strong>da</strong> majorante para o caso em comento.Primus porque o texto legal foi incrementado com as alterações trazi<strong>da</strong>s com a Lei11.106/2005 (antes dos fatos portanto), não havendo que se falar <strong>no</strong>vatio legis in pejus; a duas, tendoem vista que, além de tio <strong>da</strong> vítima, naquele momento, exercia autori<strong>da</strong>de sobre ela, ficandoresponsável, ain<strong>da</strong> que <strong>tempo</strong>rariamente, sobre seus atos, e tendo obrigação de cui<strong>da</strong>do, proteção evigilância. Se já é repugnante o ato praticado por pessoa estranha ao seu convívio, quem dirá poraquele de quem se espera <strong>lei</strong>to protetivo.Neste <strong>no</strong>rte, a lição de Rogério Sanches Cunha:A segun<strong>da</strong> causa de aumento diz respeito ao parentesco entre a vítima e o agente, bemcomo a outras relação pessoais existente entre eles. Justifica-se o agravamento <strong>da</strong> penaem razão <strong>da</strong> maior reprovação moral <strong>da</strong> conduta, em que o agente abusa <strong>da</strong>s relaçõesfamiliares, de intimi<strong>da</strong>de ou de confiança quem mantém com a vítima. A existência dessacausa de aumento afasta a possibili<strong>da</strong>de de aplicação <strong>da</strong>s agravantes genérias previstas<strong>no</strong> art. 61, II, e, f e g, do CP, sob pena de se incorrer em claro bis in idem 5 .Em igual diapasão, calham as lições de Mirabete:O fato configura uma maior ofensa à digni<strong>da</strong>de sexual <strong>da</strong> vítima e acarreta maioralarma social, sendo um abusa de relação doméstica ou de situações de intimi<strong>da</strong>de ouconfiança. Com a inclusão do cônjuge, e do companheiro, <strong>no</strong> inciso II do art. 226, tor<strong>no</strong>u-seevidente a possibili<strong>da</strong>de de configuração do crime de estupro quando praticado pelo5 CUNHA, Rogério Sanches. Rogério Sanches Cunha. Direito Penal Parte Especial. RT. 3ªed. p. 266.


marido <strong>da</strong> vítima, questão que era objeto de controvérsia na doutrina e na jurisprudência(item 22.1.4). Abrange a <strong>lei</strong>, também, qualquer pessoa que, pelos títulos mencionados <strong>no</strong>dispositivo ou quaisquer outros, tem autori<strong>da</strong>de, de direito ou de fato, sobre a vítima. Já sereconheceu a qualificadora, <strong>no</strong> caso do agente amásio <strong>da</strong> mãe <strong>da</strong> vítima, do sogro comrelação à <strong>no</strong>ra etc 6 .Quanto à natureza <strong>da</strong> ação, direito <strong>processual</strong>, configurando-se condição deprocedibili<strong>da</strong>de, em face do conteúdo misto que reveste sua classificação e que importaria emafetação material (extinção <strong>da</strong> punibili<strong>da</strong>de – art. 107 do CP), antes ação priva<strong>da</strong> ou condiciona<strong>da</strong> àrepresentação e agora pública incondiciona<strong>da</strong>, sugerimos que sejam observa<strong>da</strong>s as disposições <strong>da</strong> <strong>lei</strong>anterior, ou seja, junte-se atestado de pobreza e a representação, evitando-se, assim, futura arguiçãode nuli<strong>da</strong>de e decadência do direito de representação.Por fim, quanto à descrição dos fatos, não haverá maiores problemas. Podes descrever <strong>da</strong>seguinte forma:“Em <strong>da</strong>ta não suficientemente esclareci<strong>da</strong> <strong>no</strong>s autos, porém entre março de 2009 e janeirode 2010, o acusado XXXXXXXXX, na quali<strong>da</strong>de de tio e responsável <strong>da</strong> vítima XXXXXXXXXXXXX, deforma continua<strong>da</strong> (ver quantos fatos foram perpetrados) praticou ato libidi<strong>no</strong>so consistente emXXXXXXXXXX, contra me<strong>no</strong>r de 14 a<strong>no</strong>s à época dos fatos.Ao agir, o acusado............................ (descrever os fatos)”.6 MIRABETE, Julio Fabbrini e FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. Atlas. Vol II. 27ª ed. p. 427.

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