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E<br />
m geral, quando determinada nação tem<br />
um grande governante, este se transforma<br />
no arquétipo de seu povo.<br />
Primeiramente, porque a situação em que a arquetipia<br />
aparece de modo mais claro é, com efeito, a de chefe<br />
de Estado. Em segundo lugar, porque uma das características<br />
fundamentais de todo líder insigne é o fato de<br />
ele ser a pessoa por excelência na qual seus conterrâneos<br />
se sentem refletidos. Aquele que, pela sua simples<br />
presença aos olhos do país, faz com que este tenha a<br />
concretização de seus próprios ideais de perfeição e<br />
queira realizá-los, reconhecendo no dirigente o seu modelo.<br />
A recusa ao arquétipo pode<br />
gerar a decadência de sua nação<br />
Muitas vezes, a heróica virtude de um chefe de Estado não é<br />
suficiente para evitar que um povo se extravie pelas tortuosas<br />
sendas da decadência. Exemplo: São Luís IX, cujo neto, Filipe<br />
o Belo, foi uma das remotas causas da Revolução Francesa.<br />
Muitas vezes, porém, um povo não corresponde ao<br />
valor de seus máximos expoentes. Então sucede que a<br />
pessoa à frente de sua nação é um ótimo soberano, mas<br />
exerce suas funções na indiferença e no descaso públicos.<br />
Ele se sacrifica pelo bem-estar de seus governados,<br />
funda universidades, hospitais, propicia a formação de<br />
diversas e extraordinárias instituições, etc., e... não lhe<br />
dão importância. Como resultado dessa infidelidade,<br />
Deus, por punição, pode permitir que tal povo perca<br />
paulatinamente a pujança que o fez reluzir no concerto<br />
das nações.<br />
Não são raros os exemplos nesse sentido. Um deles<br />
permanece gravado na História pelo incomparável estro<br />
de Camões. Ao se referir a uma “austera, apagada e<br />
vil tristeza”, o poeta cantava, sozinho e contristado, a<br />
moribunda grandeza de um Portugal que recebera da<br />
Providência o gênio, a coragem e, sobretudo, a têmpera<br />
varonil para realizar tantos e tão celebrados “cristãos<br />
atrevimentos”. Ao menos naquele momento, os dias de<br />
glórias iam conhecendo seu fim. E Camões lavrou em<br />
versos imortais o triunfo e o crepúsculo de um Portugal<br />
que já não tinha ouvidos para apreciar o cântico dele.<br />
Austera, apagada e vil tristeza...<br />
Engano é pensar que, diante de um povo em crise,<br />
bastaria surgir um bom dirigente, digamos mesmo um<br />
líder santo, para reerguê-lo. A santidade de um soberano<br />
nem sempre é suficiente para, em qualquer circunstância,<br />
regenerar sua nação. Haveria nisto uma espécie<br />
de automatismo que as coisas sobrenaturais não comportam.<br />
Exemplo paradigmático é o de São Luís, Rei de França.<br />
Arquétipo de seu povo, ele foi avô, nada mais nada<br />
menos, do que de Filipe o Belo, um monarca péssimo.<br />
Segundo muitos visos históricos, este último esteve implicado<br />
no crime de Guilherme de Plaisance e Luís Nogaret,<br />
que atentaram contra o Papa Bonifácio VIII. O<br />
Pontífice, então em Agnani, não quis ceder às pressões<br />
do rei francês a respeito de assuntos internos da Igreja<br />
na França. Era seu direito e seu dever não transigir. Ao<br />
perceber que o Pontífice não estava disposto a capitular,<br />
um dos enviados de Filipe o esbofeteou. O Papa não se<br />
mexeu, e manteve fixo seu olhar no Crucificado que tinha<br />
sobre sua mesa. Atitude digna e sensata, pois aqueles<br />
celerados o podiam matar ali mesmo.<br />
Esse episódio é característico do reinado de Filipe o<br />
Belo, que deu início ao absolutismo na França, com todas<br />
as suas infaustas conseqüências. Quer dizer, uma<br />
das remotas causas da Revolução Francesa foi o neto de<br />
São Luís IX.<br />
Nessa linha, caso também frisante é o de São Fernando,<br />
Rei de Castela. Soberano vitorioso contra os mouros,<br />
teve ele um filho e sucessor, Afonso X, o Sábio, que<br />
não seguiu as virtuosas pegadas do pai e esteve na origem<br />
de todo o Humanismo e de toda a penetração prérenascentista<br />
na Espanha.<br />
Não se pense, portanto, que o santo é uma espécie de<br />
coringa que vence sempre, ou uma panacéia que cura<br />
todos os males.<br />
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