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Revista Dr Plinio 012

Março de 1999

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E<br />

m geral, quando determinada nação tem<br />

um grande governante, este se transforma<br />

no arquétipo de seu povo.<br />

Primeiramente, porque a situação em que a arquetipia<br />

aparece de modo mais claro é, com efeito, a de chefe<br />

de Estado. Em segundo lugar, porque uma das características<br />

fundamentais de todo líder insigne é o fato de<br />

ele ser a pessoa por excelência na qual seus conterrâneos<br />

se sentem refletidos. Aquele que, pela sua simples<br />

presença aos olhos do país, faz com que este tenha a<br />

concretização de seus próprios ideais de perfeição e<br />

queira realizá-los, reconhecendo no dirigente o seu modelo.<br />

A recusa ao arquétipo pode<br />

gerar a decadência de sua nação<br />

Muitas vezes, a heróica virtude de um chefe de Estado não é<br />

suficiente para evitar que um povo se extravie pelas tortuosas<br />

sendas da decadência. Exemplo: São Luís IX, cujo neto, Filipe<br />

o Belo, foi uma das remotas causas da Revolução Francesa.<br />

Muitas vezes, porém, um povo não corresponde ao<br />

valor de seus máximos expoentes. Então sucede que a<br />

pessoa à frente de sua nação é um ótimo soberano, mas<br />

exerce suas funções na indiferença e no descaso públicos.<br />

Ele se sacrifica pelo bem-estar de seus governados,<br />

funda universidades, hospitais, propicia a formação de<br />

diversas e extraordinárias instituições, etc., e... não lhe<br />

dão importância. Como resultado dessa infidelidade,<br />

Deus, por punição, pode permitir que tal povo perca<br />

paulatinamente a pujança que o fez reluzir no concerto<br />

das nações.<br />

Não são raros os exemplos nesse sentido. Um deles<br />

permanece gravado na História pelo incomparável estro<br />

de Camões. Ao se referir a uma “austera, apagada e<br />

vil tristeza”, o poeta cantava, sozinho e contristado, a<br />

moribunda grandeza de um Portugal que recebera da<br />

Providência o gênio, a coragem e, sobretudo, a têmpera<br />

varonil para realizar tantos e tão celebrados “cristãos<br />

atrevimentos”. Ao menos naquele momento, os dias de<br />

glórias iam conhecendo seu fim. E Camões lavrou em<br />

versos imortais o triunfo e o crepúsculo de um Portugal<br />

que já não tinha ouvidos para apreciar o cântico dele.<br />

Austera, apagada e vil tristeza...<br />

Engano é pensar que, diante de um povo em crise,<br />

bastaria surgir um bom dirigente, digamos mesmo um<br />

líder santo, para reerguê-lo. A santidade de um soberano<br />

nem sempre é suficiente para, em qualquer circunstância,<br />

regenerar sua nação. Haveria nisto uma espécie<br />

de automatismo que as coisas sobrenaturais não comportam.<br />

Exemplo paradigmático é o de São Luís, Rei de França.<br />

Arquétipo de seu povo, ele foi avô, nada mais nada<br />

menos, do que de Filipe o Belo, um monarca péssimo.<br />

Segundo muitos visos históricos, este último esteve implicado<br />

no crime de Guilherme de Plaisance e Luís Nogaret,<br />

que atentaram contra o Papa Bonifácio VIII. O<br />

Pontífice, então em Agnani, não quis ceder às pressões<br />

do rei francês a respeito de assuntos internos da Igreja<br />

na França. Era seu direito e seu dever não transigir. Ao<br />

perceber que o Pontífice não estava disposto a capitular,<br />

um dos enviados de Filipe o esbofeteou. O Papa não se<br />

mexeu, e manteve fixo seu olhar no Crucificado que tinha<br />

sobre sua mesa. Atitude digna e sensata, pois aqueles<br />

celerados o podiam matar ali mesmo.<br />

Esse episódio é característico do reinado de Filipe o<br />

Belo, que deu início ao absolutismo na França, com todas<br />

as suas infaustas conseqüências. Quer dizer, uma<br />

das remotas causas da Revolução Francesa foi o neto de<br />

São Luís IX.<br />

Nessa linha, caso também frisante é o de São Fernando,<br />

Rei de Castela. Soberano vitorioso contra os mouros,<br />

teve ele um filho e sucessor, Afonso X, o Sábio, que<br />

não seguiu as virtuosas pegadas do pai e esteve na origem<br />

de todo o Humanismo e de toda a penetração prérenascentista<br />

na Espanha.<br />

Não se pense, portanto, que o santo é uma espécie de<br />

coringa que vence sempre, ou uma panacéia que cura<br />

todos os males.<br />

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