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– Boa noite de novo, Ana.<br />
– Boa noite.<br />
– Meu nome é Asclépio. Sou <strong>médico</strong> responsável pelo Pronto-Socorro. Você entendeu o que se<br />
passa com o Pedro?<br />
– Parece que é um ataque cardíaco.<br />
– É isso mesmo, ele está ten<strong>do</strong> um infarto <strong>do</strong> coração. É grave. Vamos tratar. Pode ficar ótimo.<br />
Mas você precisa saber que nesse momento ele está em risco de vida.<br />
Respira rápi<strong>do</strong>. Aperta os olhos como se não me enxergasse. Pede uma cadeira. A acomo<strong>do</strong>.<br />
– Preciso voltar para a sala para continuar o atendimento. Quer dizer alguma coisa?<br />
– Cuida bem dele. É a coisa mais importante <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> pra mim.<br />
Na sala, Pedro deita<strong>do</strong> na maca, cheio de eletro<strong>do</strong>s e cabos, monitoriza<strong>do</strong>, os materiais para uma<br />
eventual parada cardíaca to<strong>do</strong>s checa<strong>do</strong>s. O carrinho de parada faz um barulho: pi... pi... pi. Corre<br />
soro fisiológico na veia <strong>do</strong> braço direito. No esquer<strong>do</strong> corre o trombolítico.<br />
O medicamento começa a ser administra<strong>do</strong>. A pressão cai. Cai muito. Recebe soro. Pressão não<br />
sobe. Para o procedimento, desliga a bomba de infusão. Não normaliza. Mais soro. Pressão normal.<br />
O residente está suan<strong>do</strong> frio mas concentra<strong>do</strong>, dedica<strong>do</strong>, cuida de Pedro enquanto saio da sala,<br />
telefono para o Hospital de Cardiologia, solicito um cateterismo de urgência, somos atendi<strong>do</strong>s. Tem<br />
vaga. Preparar a transferência.<br />
Um colega se prontificou a conduzir o paciente até o outro hospital.<br />
Aviso a Ana que o quadro dele se agravou. Risco de vida imediato. Precisa transferir.<br />
Coloca Pedro na Ambulância UTI. Ele fica com muita falta de ar. Sai uma espuma cor de rosa<br />
pela boca. Edema agu<strong>do</strong> de pulmão. Ana se assusta, chora, pega a mão de Pedro. Retornam à<br />
emergência.<br />
Leandro intubou sem dificuldades, Pedro respira bem com auxílio de aparelho, o ventila<strong>do</strong>r<br />
mecânico. Volta à ambulância UTI. Para o cateterismo. Vai.<br />
Soube que o cateterismo ocorreu sem complicações e que não encontrou nenhuma obstrução! Ou<br />
seja, o infarto foi causa<strong>do</strong> por contração da artéria, que é causada por... cocaína!<br />
Retornou ao hospital, três dias na UTI, <strong>do</strong>is dias de enfermaria. Teve alta, estava recupera<strong>do</strong>.<br />
A partir de então to<strong>do</strong>s os problemas que tinha, desde uma <strong>do</strong>r de garganta até uma <strong>do</strong>r no dedão<br />
<strong>do</strong> pé ele achava que era infarto. Voltava ao hospital.<br />
Ontem cheguei ao hospital e ele estava lá de novo. Eu mesmo fui dar alta a ele.<br />
– Boa tarde Pedro.<br />
– Boa tarde <strong>do</strong>utor Asclépio.<br />
– Você está de alta! Não fique tão encana<strong>do</strong>. Você fez o cateterismo e não mostrou nenhum<br />
problema no coração. Se você não voltar a usar aquele negócio, não infarta mais tão ce<strong>do</strong>.<br />
– Obriga<strong>do</strong>, mas sabe que o gato escalda<strong>do</strong>...<br />
– Posso fazer uma pergunta. O que sua esposa achou de te ver aqui naquela situação?<br />
– Ela achou que eu fui bem atendi<strong>do</strong>, agradece a equipe. Mas ela ficou magoada com você. Triste.<br />
Eu falei pra ela relevar que era muito trabalho, mas sabe como é?<br />
– Ela achou que não cuidei bem de você?<br />
– Não, ela ficou triste porque falou lá na frente que eu estava morren<strong>do</strong>, você não acreditou na<br />
palavra dela, virou as costas e saiu andan<strong>do</strong>.<br />
E eu achan<strong>do</strong> que era a espuma cor de rosa.