You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Onde estava sua família? Seu companheiro?<br />
Não se sabia!<br />
Foi admitida desacompanhada. Só.<br />
– Bom dia Menina, vamos conversar?<br />
– Eu estou com <strong>do</strong>r aqui embaixo! Muita! Ai! Me<strong>do</strong>!<br />
Pega minha mão. Me<strong>do</strong>.<br />
Menina estava com as mãos geladas. Pulso bem fino. Pressão baixa. Sete por quatro. Dor forte no<br />
ab<strong>do</strong>me inferior. Observo uma mancha de sangue em sua calça. Cresce. Excêntrica. Faz um quasecírculo<br />
vermelho debaixo da pelve, da cintura até as coxas.<br />
– O que aconteceu?<br />
Menina não respondeu. A levei até à emergência, chamei a enfermeira e o <strong>médico</strong>. Começaram a<br />
dar soro na veia. Chamaram o anestesista.<br />
Menina não acordava.<br />
Chegou o anestesista. Compenetra<strong>do</strong>. Intubou a paciente, e a colocou para respirar com aqueles<br />
aparelhos, ventila<strong>do</strong>res mecânicos. Pediu sangue para transfundir, três concentra<strong>do</strong>s de hemácias.<br />
Sangue<br />
Eu fui para a Sala de Operação junto com a equipe. O <strong>médico</strong> plantonista me orientou a me lavar,<br />
e vestir a paramentação. Eu ajudaria na cirurgia.<br />
Peguei a escovinha com sabão degermante, aquele que mata bactérias hospitalares. Escovava–me<br />
em frente à grande pia de inox: de<strong>do</strong> por de<strong>do</strong>. Já não estava muito bem. Angústia. Tinha i<strong>do</strong> para o<br />
CO feliz, para ajudar nos partos. Meu primeiro procedimento seria uma curetagem?<br />
Chego à sala. Vejo o obstetra falan<strong>do</strong> com o anestesista. Seria uma histerectomia, to<strong>do</strong> o útero<br />
retira<strong>do</strong>. Menina estava com uma hemorragia muito grave. Tentara provocar um aborto com uma<br />
agulha de crochê. Acabou perfuran<strong>do</strong> o útero. Ficaria estéril ou morreria.<br />
Enquanto vestia o grande avental verde e o par de luvas estéreis eu tremia. Estava com vontade de<br />
chorar. Mas tinha que encarar! Concluiria o curso em pouco tempo. Teria que dar conta de outras<br />
situações como essa.<br />
Apresento-me em campo. De prontidão para o procedimento. Dói.<br />
Vi o obstetra falar pro anestesista na minha frente, na frente da equipe toda:<br />
– É nisso que dá! Essas meninas são um ban<strong>do</strong> de vacas, saem dan<strong>do</strong> que nem cachorra pra<br />
qualquer um que encontram na rua, engravidam, depois abortam e vem pra cá nessas condições. E a<br />
gente que salve!<br />
Senti enjoo. Quase vomitei. Tive cólica que retorceu meu ventre. Senti como se estivesse<br />
sangran<strong>do</strong>. Mas minha menstruação só desceria em uma semana. Relógio. Déjà vu.<br />
Comecei a tremer, meu coração acelerou, minhas mãos começaram a formigar e eu comecei a<br />
chorar ali mesmo. Chorava, soluçava, quase engasgava.<br />
A enfermeira se solidarizou. Abraçou-me, levou-me até o vestiário.<br />
Eu continuava choran<strong>do</strong>.<br />
Tirei minha roupa, observei meu corpo nu no espelho. Feminina. Não estava menstruada!<br />
Liguei o chuveiro, enquanto a água me afagava, lembrei como se fosse ontem de quan<strong>do</strong> eu tinha<br />
quinze anos.<br />
Eu tinha um namora<strong>do</strong>, com ele descobri o prazer <strong>do</strong> sexo a <strong>do</strong>is, a me sentir desejada. Gozo.<br />
Após três meses de namoro retiramos a camisinha. Aprendemos a fazer a tabelinha e confiávamos