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Revista Curinga Edição 11

Revista Laboratorial do Curso de Graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto.

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CURINGA | EDIÇÃO <strong>11</strong><br />

Ética x Arbítrio<br />

Por séculos o ‘abreviar a vida’ vêm sendo discutido.<br />

Na filosofia encontramos posições contrárias em referência a<br />

“morte boa”, como era considerado o suicídio para muitos filósofos<br />

gregos e romanos. Nietzsche considerava a idéia do suicídio<br />

um poderoso consolo “ela ajuda a passar mais de uma noite<br />

ruim”. Já Hipócrates, conhecido como pai da medicina ocidental<br />

condenava a prática da eutanásia.“Mesmo instado, não darei<br />

droga mortífera nem a aconselharei; também não darei pessário<br />

abortivo às mulheres”.<br />

A polêmica que cerca a eutanásia é motivada pelo incompreendido,<br />

a morte sempre foi cercada de mistério e a vida cultuada<br />

como um direito indissolúvel. Quando o desejo pela morte é justificado<br />

por fins de compaixão, piedade ou alívio, acaba por ir à<br />

contramão do natural, que é a luta por sobrevivência.<br />

“Acredito que vivemos em uma era onde há uma supervalorização<br />

da vida. As pessoas são obrigadas a viver sobre qualquer<br />

circunstância. A eutanásia voluntária é um ato de solidariedade<br />

sem dúvida, uma atitude altruísta”, diz Gabriel Lage, filósofo e<br />

professor do Sistema de Educação Profissional em Itabira (MG).<br />

O conflito ético não se resume às discussões somente no<br />

âmbito da filosofia. Na religião, principalmente no Catolicismo,<br />

a eutanásia efervesce as discussões. A Conferência Nacional dos<br />

Bispos do Brasil lançou em 2008, a Campanha da Fraternidade<br />

“Escolhe, pois a vida” evidenciando o posicionamento desfavorável<br />

da Igreja Católica em relação à eutanásia.<br />

Em uma cena memorável do filme espanhol Mar Adentro,<br />

vencedor do Oscar (2005) por melhor filme estrangeiro, um padre<br />

tenta convencer Ramón a desistir da idéia de morrer. O personagem<br />

justifica este desejo dizendo “que uma vida que impede<br />

a liberdade não é vida”. A cena explicita o quanto é delicada<br />

a decisão pela morte.<br />

Em países como a Holanda, Bélgica e Luxemburgo o cidadão<br />

pode registrar legalmente o desejo pela morte nos casos em que<br />

o prognóstico seja fatal e os meios de continuação terapêutica<br />

não resultem em benefício ao doente. Mas, e quando a família<br />

toma a decisão pelo paciente? É comum casos de acidentes ou<br />

vítimas de maus súbitos que não tiveram tempo de expressar o<br />

desejo pela interrupção da vida e a família então assume a responsabilidade<br />

de decidir pelo paciente.<br />

E é nessa transferência de responsabilidade que está a maior<br />

polêmica de todas: decidir pela morte de alguém que não tem<br />

condições de expressar o desejo de continuar vivendo, mesmo<br />

que em sofrimento e artificialmente.<br />

Por amor<br />

Rebeca Wright, 21, tinha 16 anos quando o tio, após um<br />

traumatismo craniano devido a uma queda, entrou em estado<br />

vegetativo. Desde então, a família nunca mais foi a mesma. Tiveram<br />

que mudar toda a rotina e revezarem nos cuidados ao tio.<br />

“Ele ficou durante alguns meses no hospital e depois foi levado<br />

para casa, mas após seis anos ainda não acordou. Tivemos que<br />

contratar uma enfermeira, mas como enfermeira em tempo integral<br />

é muito caro, os irmãos tiveram que aprender a cuidar da<br />

alimentação, higiene, para revezar com ela”<br />

Rebeca diz que a família é constantemente questionada sobre<br />

manter o tio vivo mesmo com prognóstico negativo de reação.<br />

A resposta, segundo ela, é simples “a esperança de que um<br />

dia ele vai voltar a sorrir”.<br />

Sorrir! É o sorriso de Ramón, no filme Mar Adentro que comove<br />

a advogada vivida por Belén Rueda a ajuda a vencer nos<br />

tribunais e obter o direito de morrer. Indagado pela advogada<br />

sobre o porquê de sorrir tanto ele responde: ”Aprendi a chorar<br />

com sorrisos”. A dualidade presente na frase nos leva a reflexão<br />

do quanto ainda é complexa a discussão sobre eutanásia,<br />

deixando muitos sem respostas para a pergunta “qual o limite<br />

entre um ato solidário e o homicídio”?<br />

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CURINGA | EDIÇÃO <strong>11</strong>

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