ARTIGO *Pio Guerra O fim da “PICADOFOBIA” O s romanos chamavam seus cavalos com andamento marchado, não trotador, de “gradarious” ou “ambulatos”, pela lateralização de alguns andamentos, enquanto os trotadores diagonais eram chamados de “acussator” ou “cruciatos”, sendo bem menos valorizados. As várias raças de cavalos de marcha picada, de todo o mundo, tiveram origem em duas fontes: coloniais ou hispânicos e as do tipo inglês. A escritora americana Brenda Imus afirmava, já em 1996, que “os cavalos de marcha (andamento não diagonalizado) representavam o segmento da indústria do cavalo que mais crescia nos Estados Unidos, atingindo a taxa média de 25% ao ano. O número de animais novos registrados naquele país mostrava crescimento superior a 33% dos Passos Finos, entre 1990 e 1993, enquanto os Missouri Fox Trotters e os de Passo Peruano aumentaram 20% e os Tennessee Walkers chegaram perto de 300 mil registrados e são, hoje, mais de 400 mil animais”. Lamentavelmente, não conseguimos números atualizados dessa evolução americana. Ao mesmo tempo, em 2000, percebia-se um forte desconhecimento e desprezo, aqui no Brasil, pela marcha picada. Matéria divulgada em publicação oficial do Mangalarga <strong><strong>Marcha</strong>dor</strong> classificava a marcha picada como um desequilíbrio do animal, que precisava ser banido de nossas criações. O termo “marcha picada” foi até retirado do padrão racial por um longo período. Nesse espaço, não só deixaram de se registrar inúmeros indivíduos de qualidade, como foram inibidas todas as tentativas de uma seleção criteriosa, via criadores nas fazendas, ou via provas oficiais, que deixaram de ser realizadas. Cabe destacar, no entanto, que o mercado desses animais, mesmo com tantas dificuldades, continuava crescendo em todo o País, principalmente pelo número, cada vez maior, de usuários de cavalos para o lazer equestre. Com a reintrodução oficial da “marcha picada” pelo Ministério da Agricultura, em 2002, e com o novo regulamento de provas, já com a “picada”, retomou-se o interesse dos criadores e técnicos, que passaram a se envolver, aos poucos, com o aperfeiçoamento desses marchadores. Felizmente esse cenário mudou. A Associação Brasileira dos Criadores de Cavalo Mangalarga <strong><strong>Marcha</strong>dor</strong> (ABCCMM), com a tradicional habilidade mineira, promoveu o valioso retorno às origens da raça. No mais, o cavalheirismo esperado na relação entre os companheiros criadores foi acomodando todos os gostos. As provas do MM “de picada”, reiniciadas pelo então presidente, Nelson Boechat, em 2004, somadas à visão dos presidentes que o sucederam, só têm contribuído para o crescimento regular e continuado da raça. Mais do que isso, para o seu reencontro com o maior diferencial do nosso cavalo, que é a boa marcha: cômoda, equilibrada, avante e absolutamente genuína, patrimônio do Mangalarga <strong><strong>Marcha</strong>dor</strong>. Hoje, não há mais espaço para os cavaleiros rudes em sua montada, nem para animais amassados, encartados, aprisionados em andamentos que não o seu natural, de “marcha batida” ou “picada”. Os dois tipos de marchadores aprimoram, cada vez mais, os seus andamentos, oferecendo ao mundo do cavalo um animal de grandes qualidades. Não é fácil consolidar esses avanços. Os cavaleiros precisam conhecer profundamente a psicologia do seu cavalo, suas vocações e limites, além de compreendê-lo e admirá-lo, a ponto de, com paciência, alcançarem perfeito domínio sobre as particularidades de cada um. A prática da não violência e do bem-estar animal deve reger todas as técnicas de adestramento e uso de seus animais. Os genuínos marchadores, oriundos de seus ancestrais mais autênticos, sem parentes trotados ou de seleções que negligenciaram a preocupação com o bom andamento, farão a grande diferença. Também na “marcha picada” se buscam esses animais. Refinados, de bom porte, articulados, “pero” sem perder a ternura de seus movimentos e a comodidade de sua troca equilibrada de apoios, com altivez e energia. Aqueles que, hoje, assimilam toda essa evolução, com real entusiasmo, colocam o MM entre os melhores para o lazer da equitação e fazem justiça ao importante papel que a recriação da “marcha picada” teve dentro da raça. Produzir animais de maneira regular e continuada, que possam atender ao cada dia mais exigente mercado nacional e internacional é, agora, o desafio de todos nós, criadores. O cavalo vencedor, que vemos hoje nas competições, já não tem quase o que corrigir. Cabe a nós aperfeiçoar a compreensão sobre cada indivíduo apresentado, seu equilíbrio emocional e mental, na busca por uma interação, cada vez maior, entre o cavalo e o seu ginete. * Agrônomo e Criador de MM de <strong>Marcha</strong> <strong>Picada</strong> Melhor Criador Expositor do Brasil em 2007 e 2009 Melhor Expositor do Brasil em 2010 68 | <strong>TOP</strong><strong><strong>Marcha</strong>dor</strong> • <strong>Marcha</strong> <strong>Picada</strong>
Hebreu do Círculo D