Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
OPINIÃO<br />
Crise, Resiliência e<br />
Arquipélago<br />
Há crise mas também há<br />
séculos de História. É<br />
essa mesma História que<br />
denuncia os erros que persistem. É<br />
essa extraordinária marca que sustenta<br />
os sonhos que se levantam…<br />
E assim, enquanto o rapaz rejubilava<br />
interiormente, diferentes mensagens,<br />
oriundas das diversas Ilhas<br />
do Atlântico Norte (situadas perto<br />
da Europa e do Norte de África<br />
- as Ilhas da Macaronésia) iam sendo<br />
trazidas por Mantas e por Francelhos,<br />
por Fura-Bardos e por Corujas…<br />
Um espectáculo extraordinário,<br />
ao qual se rendeu o imenso céu:<br />
«Ajudem a preservar a Madeira,<br />
os Açores, Cabo Verde e as Canárias!».<br />
Foi nessa altura que um som<br />
fervoroso, proveniente de aplausos,<br />
ecoou, sem pressas, no ar. O rapaz –<br />
símbolo do Futuro - permaneceu no<br />
lugar, enquanto a assistência se acotovelava<br />
junto ao local de saída, já<br />
que o espaço da reunião fora demarcado<br />
por urzes da Madeira: - Então<br />
é isso! A noção de Macaronésia surgiu<br />
no início do século XIX, devido<br />
às semelhanças botânicas existentes<br />
nestes Arquipélagos! Olhou<br />
para os tufos de nuvem que passeavam<br />
no céu. - Vamos lá a ver se não<br />
me esqueço...estas Ilhas surgiram<br />
todas na Época Terciária e as espécies<br />
vegetais nelas existentes extinguiram-se<br />
na Europa, durante a<br />
Época Glaciar... Que interessante!<br />
O céu, muito azul, parecia sorrir-<br />
-lhe. - A sua origem está relaciona-<br />
Um espectáculo<br />
extraordinário, ao<br />
qual se rendeu o<br />
imenso céu: «Ajudem<br />
a preservar a Madeira,<br />
os Açores, Cabo Verde<br />
e as Canárias!». Foi<br />
nessa altura que<br />
um som fervoroso,<br />
proveniente de<br />
aplausos, ecoou, sem<br />
pressas, no ar.<br />
da com a formação e expansão do<br />
Oceano Atlântico, já que... Uma gaivota<br />
parecia ouvi-lo e fez paragem<br />
lá em cima, bem longe do mar, mesmo<br />
a uns 3 metros dele. Aproximou-<br />
-se mais meio metro e começou a<br />
piscar-lhe um dos dois olhos redondos.<br />
O pequeno adulto prosseguiu:<br />
- O início da história natural da<br />
Madeira ter-se-á iniciado há cerca<br />
de 200 milhões de anos! A gaivota<br />
esboçou um sorriso no bico peculiar.<br />
Estava praticamente a um só metro<br />
de distância: - E toda esta paisagem<br />
magnífica se deve a 2 factores:<br />
o vulcanismo e a erosão! - Ah! Não<br />
me posso esquecer de que o basalto<br />
é a rocha a partir da qual a Ilha<br />
emergiu, durante o Período Cretáceo,<br />
precisamente aquele que terminou<br />
quando os dinossauros foram<br />
extintos, há 65 milhões de anos! A<br />
ave, branca como a espuma do mar,<br />
insistiu: - Na Madeira, o vulcanismo<br />
construiu o que a erosão destrói!<br />
O rapaz não viu nos olhos em círculo,<br />
pelo menos em algumas das aves,<br />
qualquer vontade de lhe fazerem<br />
mal e deixou-se levar pelas asas de<br />
gaivota, percorrendo a Ilha e o mar,<br />
vencendo o vento, embarcando em<br />
nova e deliciosa aventura. Passado<br />
muito tempo, vá-se lá saber porquê,<br />
sentiu no corpo a presença, ondulante<br />
e áspera, das areias: - Vês?! Estás<br />
numa Ilha diferente. Eu até gosto de<br />
ti, miúdo! - Miúdo, eu?! - Sim, és<br />
um rapaz! Simpático, é certo, mas<br />
bem pesado! - Gordo, eu?!... As gaivotas<br />
foram passear na areia húmida,<br />
deixando-o a resmungar sozinho.<br />
- Não fiques contra elas que são tuas<br />
Amigas! - Quem é você, agora?! -<br />
Eu sou a rocha base do Porto Santo:<br />
sabes o meu nome?! - Por que razão<br />
haveria de saber? Não a conheço<br />
de lado nenhum! - Pois foi por isso<br />
que as encantadoras gaivotas aqui<br />
te trouxeram! - Como?! - Sim! Foi<br />
para conheceres - um pouco mais- a<br />
Ilha Dourada. Acalmou e as gaivotas<br />
regressaram, fazendo um círculo<br />
à sua volta. Na areia, o sol repousava<br />
e muitas estrelinhas piscavam.<br />
O rapaz deixou-se embalar, como<br />
um barquinho nas ondas. Estava<br />
na mais antiga Ilha do Arquipélago,<br />
erguida como taça desde o Oceano,<br />
há 15... 14... 13,5... milhões...de<br />
anos! Avistou ao longe as primeiras<br />
erupções vulcânicas, isto há 18 ou<br />
19 milhões... - Recuei até ao Mioceno,<br />
um dos Períodos da Era Terciária!<br />
O Porto Santo brindou-o com<br />
a Sua História mais remota, até<br />
que a actividade vulcânica se finou,<br />
há 8 milhões de anos do presente.<br />
O basalto despediu-se, oferecendo-<br />
-lhe um pedaço do seu corpo: - Quero<br />
ser a tua primeira pedrinha, para<br />
te lembrares de mim e da minha<br />
Ilha. E, assim, sem negar a crise, se<br />
cimentou a esperança. Onde? Neste<br />
Arquipélago onde se sabe que o passado<br />
já não se repete e o Futuro, por<br />
vezes, parece um vazio. No entanto,<br />
esse Futuro, que podemos moldar, já<br />
acontece amanhã… ><br />
António Castro<br />
Professor e Escritor<br />
8<br />
saber | NOVEMbro | 2018