Revista Ferroviária Setembro/Outubro - 2018
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Precisamos de bons projetos e rentabilidade também.<br />
Mas não adianta termos um projeto rentável se tivermos<br />
um governo que vai conduzir esse processo de PPP<br />
de uma forma tecnicamente ruim ou corrupta.<br />
RF – Quantos contratos de PPPs foram implementados no<br />
Brasil desde a promulgação da lei, em 2004, que trata especificamente<br />
sobre esse tema?<br />
SC – Temos no Brasil por volta de 110 contratos de PPPs<br />
assinados ou que vêm sendo implementados no país.<br />
RF – A Linha 4-Amarela, do Metrô de São Paulo, ficou conhecida<br />
como a primeira PPP do Brasil. De lá para cá, o país evoluiu<br />
em termos de legislação e modelo de contrato?<br />
SC – A Linha 4-Amarela foi um marco na história da PPP<br />
no Brasil. Trata-se de um contrato em que a participação<br />
privada ficou circunscrita apenas à operação da linha, já que<br />
a parte da construção foi feita dentro do modelo tradicional<br />
de compras públicas. Bom, primeiramente o que ganhamos<br />
ao longo do tempo foi conhecimento. O governo aprendeu<br />
como fazer, o governo aprendeu como controlar, e aí houve<br />
até muita polêmica no que diz respeito a excessos dos órgãos<br />
de controle, mas se aprendeu muita coisa por parte do<br />
governo e se aprendeu do lado do setor privado também. O<br />
que houve foi uma mudança de paradigma nesse período.<br />
Imagine só para uma construtora, que sai do paradigma de<br />
fazer obra por um preço fixo para o de prestar serviço de<br />
longo prazo, é preciso adaptar as estruturas. Então, o conhecimento<br />
vai sendo gerado e uma nova gama de arranjos<br />
com soluções cada vez mais criativas vão sendo criadas,<br />
sobretudo a questão do fundo garantidor, que é aquele que<br />
vai garantir a viabilidade do setor privado.<br />
RF – No setor ferroviário brasileiro, quais são os principais<br />
exemplos de PPPs?<br />
SC – No caso de Metrô de São Paulo, por exemplo, a primeira<br />
PPP de metrô que teve que foi a da Linha 4-Amarela.<br />
Em Salvador, temos um exemplo interessante de contrato,<br />
que cobre tanto a construção quanto a operação pelo ente<br />
privado. E aí a questão do aprendizado é importante, porque<br />
ao longo do tempo o governo aprende a colocar os incentivos<br />
adequados para o setor privado. Então, um incentivo<br />
interessante para a PPP do Metrô de Salvador foi a questão<br />
do governo começar a pagar contraprestação, ou seja,<br />
remunerar o ator privado pela construção, somente após a<br />
conclusão de um determinado trecho, que no caso de Salvador,<br />
foi quando o metrô chegasse até o Aeroporto. Somente<br />
depois que o metrô chegou ao aeroporto que as contraprestações<br />
começaram a ser pagas pelo estado. E, nesse caso,<br />
gerou um incentivo para que o ator privado não enrolasse a<br />
obra, entregasse as estações o mais rápido possível, e fizesse<br />
a obra o quanto antes para começar a receber. Acho que<br />
o governo está aprendendo como colocar os melhores incentivos<br />
para que o privado dê os seus melhores esforços, e<br />
esses melhores esforços sejam revertidos para a população.<br />
RF – E no caso da Linha 4-Amarela, foi uma PPP que onerou<br />
demais o setor público por conta dessa questão de o estado ter<br />
sido responsável por 100% dos custos das obras?<br />
SC – Você pode me perguntar, teria sido melhor o setor<br />
privado ter feito a construção para depois operar o sistema?<br />
Eu respondo que depende do apetite a risco do setor privado.<br />
Uma coisa é você fazer uma obra complexa com tempo<br />
e orçamento definidos. “Olha, você vai ter tanto aqui para<br />
gastar, se você gastar mais o problema é seu”, com uma<br />
solução de engenharia relativamente simples. O Metrô de<br />
Salvador é um metrô supersimples, basicamente, por ser de<br />
superfície. Não tem grandes túneis, as soluções de engenharia<br />
foram mais fáceis, no sentido de serem menos complexas.<br />
O Metrô de São Paulo tem escavação e uma série<br />
de questões que precisam ser avaliadas pelo setor privado<br />
por conta dos riscos envolvidos. Então, é uma equação que<br />
depende do apetite a risco do setor privado também.<br />
RF – Os riscos que envolvem obras metroferroviárias, de um<br />
modo geral, inibem a iniciativa privada para a concretização de<br />
uma eventual PPP?<br />
SC – Eu não me espantaria se a solução adotada por São<br />
Paulo naquela época, em 2004, tivesse sido pela construção<br />
do metrô da forma convencional. Mas também não me espanta<br />
o governo ter optado pela PPP, porque a construção<br />
da forma tradicional pode abrir espaço para escândalos de<br />
corrupção como o que vimos, inclusive, no próprio Metrô<br />
de São Paulo. Valeria a pena ter feito a construção? Valeria<br />
se o setor privado tivesse o apetite a risco de encarar o risco<br />
de fazer a construção. E aí tem que se pensar em tudo: se<br />
no meio do caminho encontra um sítio arqueológico, a rota<br />
precisaria ser desviada ou projeto modificado, e qual seria a<br />
divisão desse risco? Então esse tipo de questão precisa ser<br />
REVISTA FERROVIÁRIA | <strong>Setembro</strong>/<strong>Outubro</strong> DE <strong>2018</strong> 17