21.03.2023 Views

Gambiólogos 2.0

Livro-catálogo da exposição "Gambiólogos 2.0: a gambiarra nos tempos do digital". Realizada na Galeria Oi Futuro - Belo Horizonte/MG, entre junho e agosto de 2014. Curadoria: Fred Paulino. Textos: Giselle Beiguelman, Juliana Gontijo, Raquel Rennó. Realização: Gambiologia

Livro-catálogo da exposição "Gambiólogos 2.0: a gambiarra nos tempos do digital". Realizada na Galeria Oi Futuro - Belo Horizonte/MG, entre junho e agosto de 2014. Curadoria: Fred Paulino. Textos: Giselle Beiguelman, Juliana Gontijo, Raquel Rennó. Realização: Gambiologia

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

de peças de celulares desmontados, que parece

fadado a viver em um zoológico futurístico e

apocalíptico; Bambozzi apresenta uma máquinaorganismo

de grandes dimensões, com engrenagens

mecânicas que remetem aos primórdios da

industrialização e que deglute celulares, pois já

não sabemos mais onde descartá-los; Zaven Paré

transforma uma banal coleção de meccanos em

belos ornamentos indígenas; Sara Ramo, artista

que “investiga o momento em que os objetos

param de fazer sentido na vida das pessoas para

criar situações em que a calma e a ordem se

perdem” 2 , problematiza, em duas obras, nosso

vínculo com o que é afetivo e o que é descartável;

e, finalmente, Bispo do Rosário brinda-nos com

"painéis de apetrechos" que contêm não só

matéria coletada, mas o peso de toda uma vida.

O artista gambiólogo acumula objetos por apreço

estético com todas as épocas e cria obras respondendo

à pergunta: “o que eu posso fazer com isso?”.

As coisas inúteis, quando deslocadas do lugar

de origem, ganham múltiplos sentidos e valor.

Terceiro. A aceitação (ou não) da influência da

cultura popular e do artesanato no campo das

artes plásticas.

A história da arte mostra-nos uma relação

ambígua com os saberes populares. Por um lado,

as origens dos termos “arte” e “artesão” – do latim

ars – são comuns e remetem aos “preceitos para

execução de qualquer coisa” ou aos processos

relacionados a um “ofício manual” 3 . Mais que

isso, o conhecimento das culturas primitivas,

desde sempre, tem sido alimento para artistas

de diversas gerações e origens. Trabalhos

de caráter artesanal evidenciam o status de

peça única, fator que contribui para a maior

valorização das obras. Mas, por outro lado, a

apresentação da arte popular é frequentemente

limitada a espaços ou eventos segmentados, não

integrados ao chamado “contemporâneo”, possuindo,

inclusive, rótulos específicos, como naïf

e frequentemente confundidos com o kitsch.

Suponho que os processos criativos gambiológicos

tensionam essa relação, por se articularem

com estratégias essencialmente populares em

um contexto inédito, em que as linguagens eletrônicas

e a tecnologia digital são cada vez mais

acessíveis. Os trabalhos de gambiologia estão

integrados às práticas contemporâneas, mas esboçam

um frescor e uma espontaneidade muitas

vezes mais evidentes nas criações anônimas

que nos círculos artísticos mais reconhecidos 4 .

A participação dos artistas-artesãos Mauro Alvim

e Lúcio Bittencourt, escultores do aço que apresentam

obras não figurativas extremamente

expressivas, é, dessa maneira, importantíssima

para o conjunto da mostra.

As obras expostas, no entanto, propõem aproximações

e distanciamentos entre esses três

eixos, de forma quase caótica. A instalação em

progresso do Coletivo Gambiologia, disposta

em uma galeria anexa à exposição, talvez seja

o que melhor resume tais contaminações e, não

por acaso, encerra esta publicação. Na caótica

oficina de Jean Baptiste Gambièrre, instalação

que nunca estará pronta, há rastros de tudo o

que foi falado até aqui e mais um pouco.

Diferentemente da primeira edição, a montagem

da “Gambiólogos 2.0” deu-se em um espaço expositivo

mais tradicional, a Galeria Oi Futuro BH,

14

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!