Lina Bo Bardi e a Fábrica da Pompéia: relações entre pensamento crítico, projeto e apropriação da arquitetura
Escola da Cidade Trabalho de Curso Graduação em Arquitetura e Urbanismo Aluna: Gabriela Fuganholi Silva Orientador: Cesar Shundi Iwamizu Banca avaliadora: André Vainer e Marina Grinover
Escola da Cidade
Trabalho de Curso
Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Aluna: Gabriela Fuganholi Silva
Orientador: Cesar Shundi Iwamizu
Banca avaliadora: André Vainer e Marina Grinover
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34 CAPÍTULO 1 LINA BO BARDI - O PENSAMENTO CRÍTICO 35
a produção de Lina Bo Bardi, especificamente, está na convicção
de que seu pensamento possui algo a mais. Como hipótese
deste trabalho, podemos dizer que a arquiteta tenha
apresentado em seu discurso e intenções alguns conceitos
muito à frente de seu tempo, e que podem ser utilizados no
desenvolvimento de várias problemáticas atuais – e, quem
sabe, ser o ponto de partida de novos debates.
Avant la lettre, 16 diferentemente dos demais conceituadores
da arquitetura moderna brasileira, Lina sustentou a ideia que
hoje nomeamos como decolonialidade. 17 Muito antes da palavra
surgir e ser uma busca real de arquitetos pós-modernos,
a arquiteta se empenhava em propor uma arquitetura que
retomasse a cultura popular e primitiva, ao invés da proposta
da volta ao colonial como propôs Lucio Costa e muitos outros
arquitetos.
Também podemos destacar o pioneirismo de Lina Bo Bardi
na intervenção ao patrimônio arquitetônico. Ao analisarmos
especificamente o projeto do SESC Pompeia, que abordaremos
detalhadamente ao longo deste trabalho, percebemos
que seu pensamento vanguardista possibilitou a preservação
de uma estrutura industrial que nem sequer era considerada
passível de preservação para seus contemporâneos – Estado,
população ou arquitetos. Sua formação e vivência em Roma
permitiu que suas ideias sobre preservação e patrimônio fossem
bastante sólidas, mas não a ponto de serem inquestionáveis
pela arquiteta. Ao pensar a Fábrica da Pompéia sob
a chave da preservação, ela considerou como patrimônio o
material – a estrutura hennebiqueana de concreto e tijolos –
e o imaterial – a vivência social e cultural das pessoas que já
ocupavam a fábrica – ali presentes.
E assim, foi capaz de projetar sobre parte da história, utilizando
princípios que ultrapassam a lógica da preservação pela
não utilização ou imobilização. Totalmente consciente das dificuldades
brasileiras – que não permitiriam que a preservação
do patrimônio arquitetônico fosse uma prioridade –, Lina
sabia que o caminho mais fácil para manter viva aquela arquitetura
seria através do recondicionamento do espaço, adequando
seu uso para as necessidades do momento. E para
manter viva toda a vitalidade que encontrou ao visitar a fábrica
– este momento será melhor abordado no decorrer deste
texto –, tomou como caminho a menor intervenção possível.
Os dois caminhos se justificavam, um pelo outro.
Dessa forma, visto todas as dificuldades que atualmente encontramos
para a preservação do patrimônio arquitetônico
brasileiro, a volta à Lina mostra-se necessária. A breve história
deste país – quando comparado aos países europeus,
criadores dos mais diversos conceitos sobre este assunto e
que realizam a preservação de sua história exitosamente –
necessita de princípios próprios, adequados às especificidades
da história deste local, mas também à realidade, virtudes
e dificuldades aqui encontradas.
16 Avant la lettre – antes da letra, em tradução literal – , expressão
em francês empregada para assinalar o uso anacrônico de uma ideia,
conceito.
17 Decoloniality, em inglês, termo cunhado pela primeira vez em 2005 por
Nelson Maldonado-Torres, filósofo Porto-riquenho.