Fazendo Gênero 8 – Corpo, Violência E Poder
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<strong>Fazendo</strong> <strong>Gênero</strong> 8 - <strong>Corpo</strong>, <strong>Violência</strong> e <strong>Poder</strong><br />
Florianópolis, de 25 a 28 de agosto de 2008<br />
<strong>Gênero</strong>: uma categoria para entender a produção de identidades infantis consumidoras<br />
Mariangela Momo (ULBRA)<br />
<strong>Gênero</strong>; Consumo; Identidade infantil consumidora<br />
ST 44 - Questões de gênero na produção cultural para crianças: literatura, filmes, desenhos, sites,<br />
publicidade e outros artefatos culturais<br />
Muitos autores, entre eles, Zygmunt Bauman, têm argumentado que vivemos em uma<br />
sociedade do consumo. Isso não quer dizer que o consumo não tenha existido e tido sua importância<br />
em outras sociedades, como bem coloca Bauman (1999): “[...] todos os seres humanos, ou melhor,<br />
todas as criaturas vivas ‘consomem’ desde tempos imemoriais” (p.87). A diferença é que,<br />
efetivamente, a nossa sociedade se organiza em torno do consumo. Se, na sociedade industrial da<br />
modernidade, o valor estava na capacidade de produção, na contemporaneidade, o valor está na<br />
capacidade de consumo. O mundo de hoje engaja seus membros na sociedade em função de sua<br />
condição de consumidor.<br />
Em relação à infância, cada vez mais, nos últimos anos, tem se intensificado a produção de<br />
bens e serviços de consumo a ela direcionados. Proliferam escolas especializadas em atividades<br />
esportivas, artísticas e tecnológicas, bem como uma gama de artefatos e serviços na área da<br />
alimentação, do vestuário, do entretenimento, da estética, da saúde e da tecnologia endereçados às<br />
crianças. Em uma sociedade do consumo, a infância passa a ser posicionada e produzida como um<br />
poderoso segmento do mercado consumidor. Campos e Souza (2002) consideram que a infância, na<br />
contemporaneidade, muda seu lugar social, deixando de ser inapta, incompleta, para ser<br />
consumidora, transformando sobremaneira sua forma de inserção no mundo. Bauman (2007)<br />
argumenta que, na atualidade, a sacralidade da infância é refundada não sobre a inocência, mas<br />
sobre a capacidade de escolha. E essa capacidade é tanto produzida e utilizada pelo marketing<br />
quanto reconhecida e solicitada pelos pais. Nos Estados Unidos, afirma Schor (2004), atualmente,<br />
as crianças são o epicentro da cultura de consumo, e suas opiniões moldam as estratégias de<br />
marketing. “As crianças tornaram-se condutoras do mercado de consumo para dentro dos lares, o<br />
elo entre os anunciantes e a bolsa da família” (p. 11). Segundo essa autora, as crianças são as<br />
primeiras a adotar e utilizar as novas tecnologias, conhecem e se envolvem com a mídia eletrônica<br />
(televisão, Internet, videogames, cinema, etc.) e têm influência na escolha de produtos e marcas que<br />
serão consumidos pela família.<br />
Preocupada com o impacto do consumo na vida das crianças, Schor (2004) desenvolveu<br />
um estudo − divulgado em seu livro Born to buy (Nascido para comprar), que se tornou um best-
seller − que evidencia a invasão do consumo na vida dos infantis. Ela acompanhou o trabalho<br />
realizado por grandes corporações e pôde constatar que as crianças norte-americanas de oito meses<br />
já reconhecem logos; as de um ano já assistem a Teletubies e comem McDonald’s; antes de dois<br />
anos, pedem produtos pelo nome da marca; aos três e três anos e meio, começam a acreditar que as<br />
marcas comunicam suas qualidades pessoais (dizer se elas são espertas, por exemplo); na escola<br />
inicial, já evocam mais de seiscentas marcas e acumulam uma quantidade de setenta brinquedos<br />
novos por ano; e, aos seis/sete anos, as meninas pedem a última moda, pintam as unhas e cantam<br />
músicas pop (SCHOR, 2004).<br />
Essas discussões apontam para o fato de que uma sociedade de consumo acaba por<br />
produzir outros jeitos de ser criança, em que as ações se dão em relação à produção de<br />
consumidores. Devido à centralidade que o consumo vem assumindo na vida dos infantis, este<br />
artigo objetiva problematizar e evidenciar algumas relações entre gênero e consumo na constituição<br />
de identidades infantis consumidoras. Entendendo-se que a constituição dos gêneros não é linear e<br />
não apresenta uma regularidade é relevante pensar sobre como o consumo opera articulado ao<br />
gênero, convocando as crianças para o consumo.<br />
Para a realização das análises, são considerados artefatos <strong>–</strong> como o Homem-Aranha, as<br />
Meninas Superpoderosas e pulseiras de silicone <strong>–</strong> que circularam nas escolas pesquisadas de 2004 a<br />
2007 e vinte edições, de 2007 e 2008, da revista Recreio, publicada no Brasil pela Editora Abril<br />
desde 1969. A escolha dessa revista deve-se ao fato de que, na biblioteca de uma das escolas<br />
pesquisadas, havia um acervo dessa publicação que constantemente era alvo de disputas e brigas<br />
por parte das crianças. A pesquisa (MOMO, 2007), desenvolvida em três escolas públicas da cidade<br />
de Porto Alegre-RS e em uma escola de educação infantil sem fins lucrativos na mesma cidade,<br />
teve o intuito de realizar uma das leituras possíveis sobre a infância contemporânea, evidenciando<br />
como ela tem sido produzida, formatada e fabricada pela mídia e pelo consumo. Durante a pesquisa,<br />
observou-se, nas escolas estudadas, um modo de ser criança que procura incansavelmente inscrever-<br />
se na cultura globalmente reconhecida e fazer parte de uma comunidade de consumidores de<br />
artefatos em voga na mídia do momento.<br />
Canclini (1999) argumenta que as identidades, no mundo contemporâneo, cada vez mais se<br />
organizam por meio do consumo. Quando consumimos, selecionamos e combinamos significados,<br />
possibilitando que identidades e códigos sejam produzidos. Pode-se dizer que, ao consumir<br />
produtos, consumimos também determinadas identidades. Para este artigo, interessa evidenciar que<br />
modos de ser menino e de ser menina estão sendo consumidos pelos sujeitos infantis no mundo<br />
contemporâneo. Ressalto que o consumo pode ser entendido não apenas como o consumo de bens<br />
materiais, mas também e principalmente como o consumo de significados que promovem desejos e<br />
processos de identificação.<br />
2
<strong>Gênero</strong> e consumo infantil<br />
Ao analisar a influência das mercadorias, no caso, brinquedos, no processo de construção<br />
do gênero, Wills (1995) argumenta que a maioria das lojas de brinquedos está organizada de modo<br />
a manter “[...] a distinção rígida dos sexos segundo diretrizes específicas: Barbies, My Little Ponies<br />
e She-Ras num corredor; He-Man, Transformers Thunder-Cats em outro” (WILLS, 1995, p. 36).<br />
Em relação ao consumo, são muito comuns os investimentos no sentido de promover/explorar as<br />
diferenças relativas aos gêneros. Ellsworth (2001) fala-nos sobre como os filmes são produzidos<br />
para serem endereçados para determinados segmentos da população. Eu tomo como demonstração<br />
disso um filme que circulou pelas escolas pesquisadas, o filme infantil Os Incríveis, que pretendia<br />
“atingir” os meninos, acionando sua energia para o consumo. Segundo a reportagem intitulada<br />
Testosterona X Princesas, o filme tinha endereço certo: os meninos.<br />
[...] a Disney quer mudar uma velha tendência: seus brinquedos e filmes costumam<br />
fazer mais sucesso entre as meninas do que meninos. Por isso, o estúdio está<br />
canalizando todos os seus superpoderes no lançamento de Os Incríveis [...]. O novo<br />
desenho é uma aposta na “energia da testosterona”, como definiu o presidente<br />
Michael Eisner. Ou seja, voltar a atrair os garotos aos cinemas e às lojas. Como fez<br />
Toy Story (ZERO HORA, 10 nov. 2004, p. 22).<br />
Considerando que o gênero é construído de forma relacional, nas relações que se<br />
estabelecem entre o masculino e o feminino (e entre masculino e masculino; feminino e feminino)<br />
(SCOTT, 1995), pode-se dizer que a classificação de artefatos como sendo de meninos ou de<br />
meninas acaba por regular e normatizar as identidades de gênero. No filme Os Incríveis, o<br />
personagem Flecha era um menino ágil, flexível e inteligente, remetendo-nos para a leitura de que<br />
ser menino, possuir testosterona, como diz a reportagem, é ter determinadas características, e não<br />
outras. Os “superpoderes” utilizados pelo estúdio para que o filme fosse consumido por meninos<br />
disseram respeito a colocar em evidência, nos personagens masculinos do filme, força, virilidade e<br />
autoridade <strong>–</strong> segundo Sabat (1999), símbolos culturais dominantes <strong>–</strong> em detrimento de fragilidade,<br />
sensibilidade e delicadeza, características consideradas femininas. Em relação à revista Recreio, nos<br />
números analisados, os sentidos que são produzidos pelas narrativas e imagens das revistas, o modo<br />
de vestir dos personagens masculinos e femininos e seus comportamentos também acabam por<br />
regular o que seria próprio de meninos e o que seria próprio de meninas. Mais do que isso, os<br />
anúncios publicitários encontrados na revista utilizam o que seria “desejável”, em relação ao<br />
masculino e ao feminino, para convocar meninos e meninas ao consumo:<br />
O material escolar do Ben 10 é o dispositivo que vai fazer de você o menino mais<br />
corajoso da escola. (RECREIO, 31 dez. 2007, segunda capa)<br />
3
Aqueça seus motores e acelere com a Hot Wheels direto para a Pbkids brinquedos!<br />
(RECREIO, 13 mar. 2008, p. 15)<br />
Cadernos Foroni. Quem é campeão usa! (RECREIO, 34 jan. 2008, segunda capa)<br />
Fique forte como um tourinho! Nova barra de cereais Nutrinho. (RECREIO, 20<br />
dez. 2007, p. 2)<br />
Chiclete Barbie mostra seus encantos. (RECREIO, 20 dez. 2007, segunda capa)<br />
Sandálias da Xuxa, você calça e ajuda a preservar nossa natureza. (RECREIO, 20<br />
dez. 2007, p. 17)<br />
Canta comigo! Aperte a barriguinha dela que ela canta para você. (RECREIO, 27<br />
set. 2007, segunda capa)<br />
A publicidade, nas páginas da revista, ao mesmo tempo em que convoca meninos e<br />
meninas para o consumo, atribuindo-lhes determinadas atitudes, comportamentos e características,<br />
também produzem determinados modos de ser menino e de ser menina. No caso do material escolar<br />
do Ben 10 (desenho animado televisivo cujo personagem principal é um menino), em nenhum<br />
momento se diz que uma menina pode utilizá-lo e sentir-se, então, a menina mais corajosa da<br />
escola, o que nos remete a pensar que as meninas devem ser protegidas, jamais se sentirem<br />
corajosas. Da mesma forma, os produtos da Xuxa, que trazem um discurso “ecológico”, não são<br />
sugeridos para meninos, afinal, preocupar-se com o nosso planeta, nossa “casa”, deve mesmo ser<br />
coisa de menina. Se você consome biscoitos Trakinas, é um menino esperto e “levado”; se consumir<br />
uma barra de cereal, poderá ficar forte como um touro; e se usa o caderno do Homem-Aranha, é<br />
porque é ágil e gosta de aventura. As meninas devem usar a sandália da Xuxa para ajudar a proteger<br />
o planeta, devem querer viver felizes como as personagens princesas da Disney, que estampam<br />
mochilas, e, ao mascar os chicletes da Barbie, poderão mostrar os seus encantos.<br />
O modo como a revista articula a convocação para o consumo diz respeito à composição<br />
de uma espécie de rede constituída pelo cruzamento das marcas, uma das características da<br />
mercantilização da infância discutidas por Linn (2006). Esse cruzamento de marcas é produtivo na<br />
medida em que se pode articular uma “marca de menina” (por exemplo, Meninas Superpoderosas)<br />
com uma “marca de menino” (por exemplo, Homem-Aranha) para abranger meninos e meninas e<br />
vender os produtos desejados. No caso dos refrigerantes da Schincariol, ficou evidente, em 2007,<br />
que “o refrigerante Mini Schin” era o patrocinador dos “brindes” oferecidos pela revista. Em cada<br />
revista, havia uma história em quadrinhos diretamente relacionada ao brinde. No final da história,<br />
sempre estava uma propaganda do refrigerante associada aos desenhos animados da Cartoon<br />
Network (com personagens masculinos e femininos). Tal refrigerante ocupava grande parte dos<br />
espaços destinados à propaganda nas páginas da revista, que, durante o ano de 2007, trouxe ainda<br />
uma seção que sugeria a construção de um brinquedo relacionado ao slogan “Planeta Mini Schin”,<br />
4
série Bichos Brasileiros. Para executar a tarefa sugerida, era preciso adquirir uma ou duas garrafas<br />
do refrigerante; além disso, a revista sugeria que se acessasse o site da Mini Schin para informações<br />
sobre como o brinquedo poderia ser montado.<br />
No caso das escolas estudadas, também foi muito freqüente a distinção dos gêneros por<br />
meio do consumo de determinados ícones e artefatos. O gênero, como diz Scott (1995), “[...] não<br />
apenas faz referência ao significado da oposição homem/mulher; ele também o estabelece” (p. 92).<br />
Nas escolas, os corpos de crianças e jovens estampavam personagens que pareciam ser direcionados<br />
para grupos de meninas e outros para grupos de meninos. Meninos usavam tênis do Seninha e<br />
camisetas do Homem-Aranha e jogavam Beyblade. Os significados que são construídos em torno<br />
desses ícones, principalmente por meio da mídia, dizem respeito a força, aventura, velocidade,<br />
agilidade, coragem, poder, etc. Já as meninas mostravam acessórios, roupas e calçados da Barbie,<br />
da Hello Kitty, das Meninas Superpoderosas, com colorido que ressaltava o rosa e o brilho. É um<br />
modo de compor o corpo que expressa e valoriza o cultivo da beleza, recorrendo a consagradas<br />
“marcas” ou signos associados ao feminino.<br />
“Flexibilizando” o gênero na produção de consumidores<br />
Como já disse, entendo que a constituição dos gêneros não é linear, nem apresenta uma<br />
regularidade, assim como não é finalizada ou completada em um dado momento (MEYER, 2003).<br />
Desse modo, pode-se dizer que os corpos são generificados, entre outros elementos, pelas marcas<br />
que a cultura neles inscreve. Tais marcas são produzidas pelas condições históricas, sociais e<br />
culturais de cada época. Nas cortes européias do século XVII e XVIII, por exemplo, alguns corpos,<br />
inclusive masculinos, eram marcados por riquezas (perucas, jóias, etc.), buscando a identificação<br />
com a aristocracia (SANT’ANNA, 2002). Já na contemporaneidade, temos a indústria da moda<br />
atuando na produção de marcas − entre elas, marcas de gênero − para os corpos. Os investimentos<br />
em “marcas” que podem, de alguma forma, “dissolver” as fronteiras de gênero são mais lucrativos e<br />
interessantes porque podem atingir um número bem maior de consumidores. Costa (2007c) assinala<br />
que, por um desses fenômenos inexplicáveis do endereçamento, a novela Rebeldes, inicialmente<br />
destinada ao público adolescente, atraiu também as crianças. Isto é, constituiu-se um produto que,<br />
de certa forma, foi capaz de dissolver as fronteiras de idade e ampliar a gama de consumidores.<br />
Em relação aos alunos e alunas das escolas estudadas, seus corpos são compostos, como já<br />
referi, em sua grande maioria, por artefatos que promovem a identificação com o masculino ou com<br />
o feminino. Ao mesmo tempo, as infinitas possibilidades de consumo que o mundo contemporâneo<br />
oferece começam a promover a utilização, pelo gênero oposto, de artefatos que eram<br />
eminentemente pertencentes a um gênero (por exemplo, anéis para meninas, agora também usados<br />
por meninos), produzindo outros significados, seja para os artefatos, seja para quem os usa. Parece<br />
5
que a utilização de artefatos e práticas que eram eminentemente tidas como do gênero feminino<br />
passam a ser apropriadas pelos meninos das escolas estudadas justamente no intuito de se<br />
diferenciarem de outros meninos e de se inscreverem em uma cultura global. Essa prática acaba<br />
também, em alguma medida, por borrar as fronteiras entre os gêneros. Meninos que usam anéis em<br />
vários dedos e tornozeleiras e que pintam as unhas e o cabelo produzem uma forma de ser menino<br />
em que as preocupações e os cuidados com o corpo são centrais. De certa maneira, esses meninos<br />
estão em “sintonia” com um mundo no qual a centralidade do consumo se organiza em torno da<br />
estética, da beleza, do estilo e da visibilidade.<br />
No final do ano de 2005, a “onda”, a moda do momento era usar pulseirinhas de silicone<br />
coloridas. Tanto meninas quanto meninos, de várias idades, portavam várias pulseiras nos braços e<br />
tornozelos. Essa “febre” caracterizou-se pela grande quantidade de pulseiras que cada indivíduo<br />
portava. O fato de meninos e meninas usarem essas pulseirinhas indistintamente causou<br />
estranhamento por parte de professores. Uma professora, inclusive, reclamou: “Já não bastavam os<br />
anéis, brincos e piercings, agora os guris vão começar a usar pulseiras também!” Parece-me que a<br />
busca por prazer, pela fruição, por fazer parte do mundo das visibilidades acaba, de certa forma,<br />
fazendo com que a demarcação permanente e vigilante do gênero deixe, em alguma medida, de ser<br />
central. Um exemplo disso seria o caso das meninas que utilizam produtos direcionados a meninos,<br />
compondo seu visual com a roupa da Hello Kitty e o caderno do Batman, ou o de um dos meninos,<br />
que usava o cabelo com franjas, liso e comprido até a cintura e que afirmou que até não se<br />
importava em ser confundido com uma menina, mas que ficava irritadíssimo quando alguém<br />
puxava ou arrancava seu cabelo.<br />
Retomo o uso das pulseirinhas de silicone, cujos usos distintos que as crianças e jovens<br />
faziam delas, por vezes, contribuíam para desestabilizar o binarismo masculino/feminino e, por<br />
outras, acabava por reforçá-lo. Cohen (2000) diz que “o difícil projeto de construir e manter as<br />
identidades de gênero provoca uma série de respostas ansiosas por toda a cultura [...]” (p. 35). Em<br />
muitos casos, os usos que meninos e meninas faziam das pulseiras eram muito semelhantes, mas,<br />
em muitos outros, eram bem distintos e diretamente relacionados à identificação de gênero. Por<br />
exemplo, as meninas trançavam as pulseirinhas, fazendo cintos para colocar em seus quadris, e os<br />
meninos as trançavam para que se tornassem chaveiros. As pulseirinhas eram comercializadas em<br />
pacotes fechados, e muitos meninos acabavam comprando pacotes que continham pulseirinhas cor-<br />
de-rosa. Muitos deles usavam também as pulseiras cor-de-rosa, argumentando que isso os tornava<br />
igual aos outros meninos: “todos os guris estão usando”, diziam eles. Outros diziam que usavam as<br />
cor-de-rosa porque achavam legal, fashion. Também havia os que trocavam as pulseiras rosa por<br />
outras cores, argumentando que a cor rosa não era parte do gênero ao qual pertenciam: “eu não sou<br />
menina para usar rosa”.<br />
6
Cabe considerar ainda que, para Louro (2001), as identidades de gênero seriam as formas<br />
pelas quais os sujeitos se identificariam histórica e socialmente como masculinos e femininos.<br />
Penso que as configurações de uma sociedade do consumo, ao mesmo tempo em que têm reforçado<br />
as identidades de gênero, valorizando o masculino e desqualificando o feminino, também colocam<br />
em circulação outras possibilidades de identificação com o intuito de invocar e produzir o maior<br />
número possível de consumidores, inclusive, de consumidores infantis.<br />
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