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Página 2 A VOZ DO VALE De 25 a 31 de agosto de 2019<br />

José Carlos Santos Peres José Carlos Santos Peres Gustavo Mazzola - *<br />

FRANJA RETÓRICA<br />

A questão colocada ao debate pode carregar<br />

certo conteúdo, mas nos nossos parlamentos – e<br />

aí o colunista inclui a Câmara local – o entorno da<br />

fala quase sempre compromete todo o organismo.<br />

Muita conversa mole para dar sustentação ao que<br />

de fato interessa. Desconversam, tergiversam...<br />

Muito do que se discute – fiquemos com a nossa<br />

Câmara – tem o peso de uma pluma solta ao vento.<br />

A franja do conteúdo é retórica, no que tal condição<br />

tem de vazio. Pirotecnia!<br />

Tão vazia que se compara a intrigas daquelas<br />

lavadeiras batendo roupas à margem de um rio;<br />

nas conversas de comadres dividindo janelas, e<br />

homens embebedados à sombra do nada fazer cuidando<br />

de questões filosóficas.<br />

A verdade é que, no interior, e por aqui não fugimos<br />

à regra, damos muito espaço às diatribes<br />

semanais da Câmara. Carência de fatos fundamentais<br />

à vida cotidiana da urbe, talvez. Não deveríamos<br />

“para as rotativas”.<br />

Tomemos como exemplo os grandes jornais: o<br />

leitor, por acaso, encontra numa Folha de São Paulo<br />

ou no Estadão ou no Globo noticiários oriundos<br />

das Câmaras Municipais de São Paulo ou do Rio<br />

de Janeiro?<br />

Nem das Assembleias Legislativas... Pouco se<br />

sabe das Casas. No rádio, alguma coisa, que esse<br />

meio é muito voltado às comunidades, e sabe trabalhar<br />

o mundo da dona Maria e do “seo” José. Na<br />

mídia impressa nada se lê do que acontece numa<br />

Câmara Municipal de um grande centro.<br />

A questão nuclear não é a de “limar” o noticiário<br />

da Câmara, mas, sim, o de não dar guarida às diatribes,<br />

ao mise-en-scène, as futricas e intrigas que<br />

“as Donas do Pedaço” produzem.<br />

Cuidar de relevâncias, apenas, até porque, convenhamos,<br />

de prático, em qualquer uma das sessões,<br />

uma folha pautada de 20 linhas dá conta.<br />

Os chamados comunicadores, embarcamos:<br />

damos muito espaço ao que acontece na Câmara<br />

quando, na Câmara, de prático pouca coisa<br />

acontece que “eles”, os filósofos de botequins e<br />

ideólogos de causas toxicas estão mais preocupados<br />

em jogar para a arquibancada ou se armarem<br />

em estratégias partidárias visando sempre a<br />

próxima eleição.<br />

Poesia<br />

Santos Peres<br />

O TEMPO<br />

A trilha da mata<br />

Desencurva o rio<br />

Dependurando o vento<br />

Nos braços das araucárias<br />

O menino busca o cavalo do tempo<br />

Saltando encostas entre jequitibás<br />

Colhendo no peito a aragem das tardes<br />

Alargando o horizonte no olhar.<br />

A trilha da mata<br />

Do lado de lá...<br />

E o menino bebe o rio<br />

Num salto<br />

é uma publicação semanal da Editora Vieira Aires Ltda<br />

CNPJ: 07.421.264/0001-68 - Inscr. Municipal 18.833<br />

Registrado sob o Livro “A” - Registro Civil de pessoa jurídica e no Livro<br />

“B-01” - Registro de Jornais, Oficinas Impressoras, Empresas de Radiofusão<br />

e Agências de Notícias, sob o n° de ordem 11 (onze).<br />

Fone: (014) 3733-6706 | E-mail: avozdovale@avozdovale.com.br<br />

Site: www.avozdovale.com.br<br />

REDAÇÃO: Rua Alagoas, 2001 - CEP 18700-010 - Avaré/SP<br />

DIRETOR RESP.: NATALINO VENÂNCIO AIRES FILHO<br />

Os artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus<br />

autores e não expressam necessariamente a nossa opinião<br />

CIRCULAÇÃO: Avaré, Águas de Santa Bárbara, Arandu, Cerqueira<br />

César, Holambra II, Iaras, Itaí, Itatinga e Paranapanema.<br />

CARGA MUNICIPAL<br />

O governo estadual projeta mudanças no ensino<br />

fundamental. No caso, transferir aos municípios todas<br />

as escolas estaduais dos anos iniciais da educação.<br />

São alunos do primeiro ao quinto ano.<br />

O processo de municipalização do ensino teve inicio<br />

nos anos 90. Aliás, vários outros setores administrativos<br />

controlados pelo Estado foram transferidos<br />

aos municípios a partir de então, partindo do princípio<br />

de que as cidades que vivenciam os problemas<br />

têm maior capacidade operacional e de interpretação<br />

para resolver as pendências.<br />

A Secretaria Estadual da Educação defende que<br />

a reorganização permitiria uma gestão mais racional<br />

dos recursos humanos e maior foco do estado nos<br />

anos finais do ensino fundamental e no ensino médio.<br />

Os gestores municipais demonstram alguma preocupação<br />

com o processo, temem assumir uma responsabilidade<br />

maior, principalmente na condução do processo se não<br />

houver uma boa orientação do governo e estrutura para<br />

que a transição aconteça de maneira segura.<br />

Por enquanto, estando o projeto em fase inicial, ainda<br />

no terreno da discussão, não se tem um cenário claro.<br />

Mas há opiniões de especialistas que entendem ser<br />

a medida pensada pelo governo como positiva.<br />

A professora da FGV especialista em gestão da educação,<br />

Cláudia Costin, por exemplo, disse à Folha de<br />

São Paulo que aprova a municipalização principalmente<br />

por trazer racionalidade à gestão e diz que ela já deveria<br />

ter sido concluída há muito tempo em São Paulo.<br />

Costin toca num viés importante: a medida não exime<br />

o governo do papel de articulação com os municípios,<br />

para apoiar a formação de professores e a disseminação<br />

de estratégias efetivas de aprendizagem<br />

nos anos iniciais da escolarização.<br />

Argumento também interessante é o do Secretário<br />

da Educação, Rossieli Soares: “ o perfil dos anos iniciais<br />

do ensino fundamental se aproxima mais do da<br />

educação infantil, já a cargo dos municípios, do que<br />

dos anos finais. Um dos motivos é que esta é a etapa<br />

em que é concluída a alfabetização”.<br />

O que se espera é que o Estado continue presente,<br />

mesmo com a municipalização de mais essa<br />

etapa do ensino. Os prefeitos têm problemas demais<br />

para resolver e não podem arcar com responsabilidades<br />

maiores que suas possibilidades. O importante<br />

é discutir mais, ouvir os especialistas e só<br />

depois tomar a decisão.<br />

José Carlos Santos Peres<br />

E DAÍ?<br />

Os palmeirenses ficamos de cabeça quente<br />

após mais um tropeço na Libertadores. Não me incluo,<br />

porém, aos dramáticos que estão vendo terra<br />

arrasada com a situação.<br />

O Palmeiras caiu; não jogou bem ou o quanto<br />

poderia diante do Grêmio. Mas também não foi dominado<br />

ou se mostrou acovardado como dizem alguns<br />

críticos.<br />

No Sul, quando do primeiro jogo, poderia ter feito<br />

um placar maior e agora no Pacaembu teve a classificação<br />

nos pés do Willians em duas oportunidades.<br />

Coisas de jogo, uma bola na trave faz muita diferença.<br />

É isso: se uma daquelas bolas entra, os Casagrandes<br />

da vida estariam com outro discurso.<br />

A torcida pressiona pedindo a cabeça do Mattos<br />

e do Galiotte. Talvez estejam com saudados do<br />

Mustafá.<br />

Não é legal perder quando se disputa uma classificação<br />

à fase final; pior quando se tem de lutar para não<br />

cair, e essa era a nossa sina até muito recentemente.<br />

Não gosto do jeito de jogar do Palmeiras, logo, não<br />

aprovo os métodos do Felipão. Mas entendo que não<br />

é o momento de se pensar em troca, até porque não<br />

há um Tite, Jesus ou Renato dando sopa.<br />

Com relação a jogadores, há alguns que podem<br />

e devem ser negociados, até para sobrar dinheiro<br />

para ser investido em outras contratações. Nada de<br />

limpeza, de debandada. É preciso racionalizar, e<br />

começar a aproveitar os meninos da base, como o<br />

Grêmio faz, com sucesso.<br />

O Corinthians avança... Acho que o Cássio já fez<br />

por merecer uma estátua na Arena. Impressionante<br />

como o goleiro grande se transforma em grande goleiro<br />

em jogos decisivos. Não é mesmo Weverton?<br />

LETRAS, UMA PAIXÃO<br />

SEM LIMITES<br />

Naquela tarde, sem o carro que estava com minha<br />

mulher, subi, como de costume, pela porta da<br />

frente do 242, o ônibus do Jardim Aurélia, que me<br />

deixaria bem perto de casa. Embaixo do braço, levava<br />

dois livros de Jodi Picoult, atualmente, a minha<br />

escritora favorita.<br />

Qual não foi a grande surpresa quando o motorista<br />

me perguntou o que tinha ali de boa leitura.<br />

Mostrei-lhe o que trazia e... ele me revelou que conhecia<br />

Jodi e, também, gostava dela. Já havia lido<br />

outras obras da escritora.<br />

Antes que o veículo partisse, entabulamos um<br />

rápido e descontraído diálogo, conversa que terminou<br />

com a minha sugestão de que lesse “A menina<br />

de vidro”, um de seus trabalhos mais tocantes.<br />

- Não deixe de ler. É um depoimento emocionante<br />

de uma mãe que cuida de sua filha com Osteogênese<br />

Incompleta, uma doença rara que torna os ossos extremamente<br />

frágeis. Dedica a ela a sua própria vida.<br />

Essa é uma verdade cristalina: ler e escrever<br />

não é propriedade só de alguns, especialmente<br />

dos mais letrados, detentores de conhecimentos<br />

profundos das letras e da vida. Pessoas simples,<br />

como aquele humilde motorista de ônibus, também<br />

têm o sagrado direito de se deleitarem com uma obra<br />

de literatura, inclusive debruçando-se sobre uma folha<br />

de papel ou, quando possível, um teclado de computador,<br />

registrando o que vai pela sua alma.<br />

É a história de Miguel Vicente, de 77 anos, morador<br />

da pequena Itápolis, próxima a Campinas: semianalfabeto,<br />

sempre quis ser escritor. Cultiva, ainda<br />

hoje, uma literatura de homem do campo, simples e<br />

rica, que encanta todos que conhecem a sua obra.<br />

Escreveu “Memórias de um analfabeto”, livro que foi<br />

mostrado, durante uma entrevista no último dia 14<br />

deste mês, no jornal “Cidade” da EPTV.<br />

Um outro bom exemplo disso é a história de<br />

Helena, mãe da famosa dupla José de Camargo<br />

e Luciano, livro que ela escreveu à mão,<br />

compondo o seu “Simplesmente Helena” e formatado<br />

por Carolina Kotscho. Um modo simples<br />

e humano de escrever: grande parte da<br />

sua história resume um Brasil sobre o qual, por<br />

preconceito ou descaso, há poucos registros<br />

documentais. Uma parte dessa saga acabou<br />

virando um filme, “Os dois filhos de Francisco”,<br />

com a trajetória de sucesso da dupla famosa.<br />

E a Literatura de Cordel? Um gênero literário popular<br />

nordestino escrito na forma rimada, originado<br />

em relatos orais e, depois, impresso em folhetos. O<br />

nome tem origem na forma como, tradicionalmente,<br />

são expostos para venda: pendurados em cordas,<br />

cordéis ou barbantes. Em setembro do ano passado,<br />

o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico<br />

Nacional reconheceu a Literatura de Cordel como<br />

patrimônio cultural imaterial do Brasil.<br />

Numa aventura mais ousada, poderíamos retroceder<br />

com esse tema até meados da década de<br />

quarenta, quando se revelou para o mundo o trabalho<br />

de uma menina judia, Anne Frank, que, entre<br />

12 de junho de 1942 e 1º. de agosto de 1944,<br />

deixou registrado, num diário escrito a mão durante<br />

a Segunda Guerra Mundial, seus momentos vivenciados<br />

quando confinada num esconderijo. Ocultava-se<br />

dos alemães, juntamente com sua família,<br />

durante a ocupação nazista nos Países Baixos.<br />

O “Diário de Anne Frank” foi publicado em mais<br />

de quarenta países e traduzido em mais de setenta<br />

idiomas. A obra vendeu trinta e cinco milhões de<br />

cópias, dezesseis milhões só no Brasil.<br />

Muitas vezes, quando passo pela Onze de Agosto,<br />

ali no começo da Campos Salles, sempre vejo,<br />

apoiando-se na parte inferior do grande monumento<br />

ao ex-presidente do Brasil, uma criatura de vestes<br />

rotas, cabelos e barbas grandes, um verdadeiro<br />

andarilho. Notei, várias vezes, que ele sempre está<br />

escrevendo afoita e desastradamente em folhas<br />

avulsas de papel. Um dia, resolvi conhecer de perto<br />

no que tanto trabalhava. Cheguei até ele e vi que<br />

rabiscava as folhas de alto a baixo. Perguntei:<br />

- O que você está escrevendo aí, meu senhor?<br />

- A história da minha vida - respondeu o homem.<br />

- Mas só tem rabiscos!<br />

- Pois é. Essa é a minha vida: só rabiscos!<br />

( Gustavo Mazzola é jornalista - mazzola@sigmanet.com.br<br />

).

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