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Traços 3

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ANO 1

Nº 3

AGOSTO/SET.

2021

ANDRÉA CARVALHO

Rio de Janeiro - RJ

Carioca, professora

de Língua Portuguesa

e Inglesa,

formada pela

UFRJ.

Por meio das publicações

"50 Dias Letivos" e "Falas

Brasileiras" conto capítulos

da história de muitos educadores

desse país.

UM DEDINHO DE PROSA

Consta em muitas gramáticas e livros

didáticos, de maneira muito discreta

e sem riqueza de exemplos, que

o sufixo –inho/a não serve só para

formar o diminutivo das palavras em português,

ou seja, indicar o tamanho dos seres ou

das coisas, percebe-se facilmente que, quando

se diz “fulano está vivinho da silva”, “aquela

mulherzinha fez um escândalo” ou “você é o

meu benzinho”, não nos referimos ao tamanho

ou à proporção do adjetivo/substantivo,

estamos sim acrescentando a ideia de intensificação,

pejoratividade e afetividade aos vocábulos

vivo, mulher e bem. Estar vivinho não

é simplesmente estar vivo, é estar surpreendentemente

vivo. Aquela mulherzinha é uma

pessoa desqualificada por algum motivo. E o

benzinho, se trocado por “meu bem”, pode

até ganhar uma conotação irônica, dependendo

da intencionalidade envolvida na escolha

de uma ou outra palavra.

Se você já desconfiava que, quando um atendente

lhe pede que aguarde “só um minutinho,

senhor”, é porque a espera será longa;

que o “jeitinho brasileiro” não se trata apenas

de uma pequena característica da nossa

cultura, mas quase uma regra de comportamento,

ou que um “rapaz bonitinho” pode

ser feio, mas arrumadinho, você está rondando

o âmago da questão. Certamente já usou

no seu cotidiano o grau diminutivo para atenuar

uma mentirinha, desprestigiar alguma

coisa ou até ironizar alguém. Isso porque as

possibilidades de emprego são inúmeras, estão

muito presentes nos nossos hábitos linguísticos

e variam de acordo com a intenção,

o efeito desejado ou a manifestação de uma

emoção do falante.

Esse poderoso recurso de linguagem está intimamente

ligado ao contexto. Por isso, cuidado

ao inserir o –inho/a deliberadamente no

final de uma palavra, pois você pode provocar

confusão ou ser mal interpretado. Se espera

ganhar um automóvel novinho, não diga

que vai ficar feliz com um carrinho novo, pois

pode ser que se decepcione com o presente.

Se vai se ausentar do trabalho, não fale que

vai dar só uma saidinha rapidinha. Seu chefe

pode ficar bravo. Ao sair para fazer umas

comprinhas, não retorne com dez sacolas, a

menos que seja você o titular do cartão de

crédito.

Esse emprego corriqueiro, esse modo de falar,

já provou que não tem muito compromisso

com a realidade dos fatos, mas ainda assim

pode produzir um efeito de sentido diverso do

pretendido e deixar o seu interlocutor, no mínimo,

descontente, mas só um bocadinho, ou

cadinho, à moda lusitana. O ideal é saber manejar

mais esse fantástico mecanismo da língua

portuguesa a seu favor e de acordo com a

intenção pretendida. E caso você perceba que

está usando pombinhos, vaquinha e peixinho

sem significar animais de tamanho pequeno,

é porque há ainda outros valores atribuídos

ao sufixo –inho/a, diferentes do que tratamos

até aqui. Mas isso fica para um próximo textinho…

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