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Fichamento Antenor Madruga GRECO FILHO ... - Rogatoria

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<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 1<br />

<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>, Vicente. Homologação de Sentença Estrangeira. São Paulo: Saraiva,<br />

1978. (174p).<br />

Tese ao concurso de livre-docência de Direito Processual Civil, na Faculdade de<br />

Direito da Universidade de São Paulo.<br />

1 Ao focalizar e escolher o tema ―Homologação de Sentença Estrangeira‖ para um<br />

estudo mais aprofundado, fiz a mesma pergunta já feita por LUIGI CONDORELLI a<br />

respeito do interesse em escrever sobre o assunto, tendo em vista o grande número<br />

de artigos, tratados monografias etc., existentes. Perguntei-me, também, qual o real<br />

interesse do assunto para o Direito Processual.<br />

Da mesma forma que o autor italiano referido encontrou justificativa para um novo<br />

estudo na escassez de trabalhos conceituais sobre o reconhecimento da sentença<br />

estrangeira, que tem sido estudado mais sob o seu aspecto normativo específico de<br />

cada país do que sistemático, também encontrei resposta afirmativa para ambas as<br />

perguntas que me assaltaram.<br />

De fato, se o tema que nos preocupa tem sido vastamente focalizado na literatura<br />

jurídica estrangeira, a qual, como é óbvio, o analisa dentro de sua estrutura jurídica,<br />

o mesmo não podemos dizer da literatura brasileira, que encerra apenas algumas<br />

monografias específicas.<br />

Os tratadistas do processo enfrentam [2] o assunto sem a amplitude desejada,<br />

aceitando, em geral, as afirmações dos grandes mestres estrangeiros,<br />

independentemente de revisão crítica em função dos princípios que regem nosso<br />

ordenamento normativo.<br />

Por outro lado, a homologação de sentença estrangeira tem sido indiferentemente<br />

tratada por autores e nos compêndios de Direito Processual e de Direito<br />

Internacional Privado, o que traz uma evidente confusão de princípios e,<br />

consequentemente, constantes incoerências sistemáticas. É certo que, na aplicação,<br />

o Direito encerra uma unidade fundamental, não se limitando aos eventuais ramos<br />

didáticos, mas algo que tenda a realizar-se, como bem diz WILHELM SAUER (1)<br />

(…)<br />

2 A divisão em ramos do Direito, porém, além do relevante aspecto didático, traz<br />

também o benefício da formulação de princípios, dos quais deve decorrer um<br />

sistema coerente. Daí concluir-se que a ambivalência do tema (como de processo e<br />

de Direito Internacional Privado) contribuiu para a indefinição principiológica,<br />

gerando, como adiante procurar-se-á demonstrar, incongruências legislativas,<br />

doutrinárias e jurisprudenciais. E a indefinição de princípios gera desvios na<br />

aplicação.<br />

(1)<br />

Obs. Em 1978 o Professor Vicente Greco Filho, da Faculdade de Direito da Universidade de São<br />

Paulo, na publicação de sua tese para o concurso de livre-docência em direito processual,<br />

justificava a escolha do tema ―Homologação de Sentença Estrangeira‖ pela escassez de<br />

trabalhos conceituais que estudassem esse tema mais sob seu aspecto sistemático que sob o<br />

conteúdo normativo específico de cada país e, também, pela ―ambivalência do tema‖ (como<br />

Filosofia Juridica Y Social, Labor, 1933, pág. 224. [n.a.]<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 2<br />

de processo e de direito internacional privado). Ambivalência que, segundo Greco Filho,<br />

teria como causa uma ―evidente confusão de princípios‖ e como efeito ―incongruências<br />

legislativas, doutrinárias e jurisprudenciais‖, geradoras de ―desvios na aplicação‖.<br />

Procuramos demonstrar neste trabalho que essas incongruências legislativas, doutrinárias e<br />

jurisprudenciais ainda permanecem, mais de vinte e cinco anos após o trabalho do Professor<br />

Greco Filho, e que o tema ainda carece de visão sistemática, a qual tentamos ajudar a<br />

construir com as conclusões de nossa pesquisa.<br />

A primeira evidência de que a homologação de sentenças estrangeiras é vista de modo não<br />

sistemático se demonstra ao estudá-la isoladamente, fora do contexto da cooperação jurídica<br />

internacional.<br />

7 As mesmas razões que justificam a aplicação extraterritorial da lei estrangeira<br />

sustentam o reconhecimento das sentenças alienígenas, ambas como formas de<br />

aplicação, direta e indireta, respectivamente, do Direito estrangeiro. No primeiro<br />

caso, de aplicação direta, invoca-se a disposição de uma lei estrangeira como<br />

devendo regular determinada relação jurídica. No segundo caso, de aplicação<br />

indireta, já não se invoca uma disposição de lei, mas a sentença que decidiu a<br />

questão noutro estado. O Direito estrangeiro, nesse caso, apresenta-se não como<br />

disposição geral, mas como norma já aplicada a uma hipótese concreta pelo poder<br />

judicial.<br />

Obs. A maior parte da doutrina trata do problema da eficácia das decisões jurisdicionais<br />

estrangeiras a partir tão somente da perspectiva da homologação de sentenças cíveis, de<br />

interesses de partes privadas, e não sob a ótica da cooperação internacional, de interesse do<br />

Estado estrangeiro. Ou seja, o que em geral se estuda é como as pessoas podem fazer valer as<br />

decisões estrangeiras que lhes interessam e não como uma jurisdição, limitada em seu espaço<br />

territorial mas não em sua competência internacional, pode fazer com que ordens de seus<br />

juízes, essenciais para a administração da justiça e da paz em sua sociedade, tenham eficácia<br />

sobre pessoas e coisas que se encontram sob o alcance físico de outra jurisdição.<br />

O professor Vicente Greco Filho e os autores que referencia, tendo como parâmetro um<br />

direito informado por outra realidade fática, são exemplos dessa doutrina que busca nos<br />

interesses privados diretos o fundamento para a cooperação jurisdicional entre Estados,<br />

posicionando-os como alheios aos interesses do Estado ou, quando muito, apenas<br />

indiretamente associados à soberania. Talvez a única exceção nesse grupo seja MARNOCO<br />

E SOUZA que, ainda em 1888, observava a que ―cada Estado deve harmonizar a própria<br />

conservação às condições de existência dos outros … para a garantia das relações sociais<br />

entre os povos e para a realização do direito em todas as manifestações‖ e complementava<br />

que “isto só se pode conseguir pelo instituto extraterritorial das sentenças que visa a este<br />

fim, sancionando a justiça dos estados estrangeiros‖.<br />

Atualmente, a correta compreensão da eficácia da decisão judicial estrangeira necessita que<br />

se a observe sob a perspectiva mais ampla de cooperação entre jurisdições. Ou, como<br />

sugerimos nesta tese, de complementaridade entre jurisdições, tendo como pressuposto<br />

essencial a constatação de que a característica global das sociedades atuais, ainda<br />

juridicamente vinculadas a Estados soberanos, produz fatos e ameaças sociais<br />

transjurisdicionais suficientes para comprometer a eficácia do poder jurisdicional e a própria<br />

justificação do Estado como a organização suprema e independente de pacificação social. O<br />

controle desses fatos e ameaças e transjurisdicionais pelos próprios Estados, essencial para a<br />

efetividade suas funções soberanas, não existirá no mundo de hoje sem que as jurisdições se<br />

complementem por estreita cooperação.<br />

Assim, a cooperação jurídica internacional não mais se justifica apenas pelo interesse das<br />

partes ou por cortesia entre Estados. Paradoxalmente, a eficácia interna de decisões judiciais<br />

estrangeiras, antes vista como uma potencial ameaça à soberania e, portanto, mantida sob<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


(…)<br />

<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 3<br />

rígidos controles de exequatur, se apresenta hoje como essencial à efetividade das funções<br />

soberanas.<br />

O fenômeno tecnológico-social por muitos denominado ―globalização‖ provocou a<br />

incidência de outras razões constitucionais para a cooperação jurídica internacional. Se antes<br />

podia se interpretar que a Constituição Federal determinava que o Estado estabelecesse<br />

relações internacionais para a cooperação entre os povos com o objetivo de contribuir para o<br />

progresso da humanidade, atualmente essas relações internacionais se impõem para a<br />

preservação da sociedade brasileira e efetividade de suas funções e instituições. O sistema<br />

público de solução de controvérsias, a promoção dos interesses individuais, coletivos e<br />

difusos, a prevenção e combate ao crime, a segurança pública, a defesa de nossas fronteiras,<br />

enfim a nossa soberania, depende cada vez mais da cooperação jurídica internacional.<br />

Teremos acesso à cooperação de outros Estados na mesma medida que a prestarmos. Assim,<br />

se para receber cooperação precisamos prestá-la e se concordamos em considerá-la como<br />

essencial à soberania, logo devemos concluir pela existência de um princípio constitucional<br />

que determina a ampla cooperação e se traduz na interpretação das normas internas no<br />

sentido de privilegiar a cooperação.<br />

Certamente o sistema de cooperação jurídica internacional não se limita ao princípio<br />

constitucional da ampla cooperação, sendo constituído por outros princípios e regras que o<br />

conformam e delimitam. Passamos a estudá-los.<br />

7 As exigências de fato resultantes da convivência internacional, porém, impuseram<br />

justificativas para o reconhecimento [8] de julgados estrangeiros em certas<br />

condições, não mais, é claro, sob o fundamento da unidade do Direito Romano<br />

comum, mas, segundo uma nova concepção, em virtude da comitas gentium.…<br />

(…) A doutrina da comitas gentium, como é evidente, tem apenas valor históricoe não<br />

poderia resistir por muito tempo como fundamentadora da aplicação extraterritorial<br />

de lei ou sentenças de outros países. A noção de cortesia internacional, além de<br />

vaga, variável e incerta, como afirma MANORCO e SOUZA (2) , não é conceito jurídico<br />

ou filosófico que possa sustentar um sistema.<br />

(…)<br />

9 Como explica HAROLDO VALLADÃO (3) , afastando-se do territorialismo e da comitas<br />

gentium estatutários, do Direito rigoroso da soberania levando à aplicação exclusiva<br />

do Direito nacional, do princípio da lex fori de WAECHTER, SAVIGNY mostrou que o<br />

aumento das relações entre os diversos povos impõe a renúncia àquele princípio da<br />

exclusividade e adoção do princípio contrário, ou seja, que se tende à reciprocidade<br />

… na apreciação das relações jurídicas perante a justiça entre os estrangeiros e os<br />

nacionais, a fim de estabelecer uma igualdade reclamada pelo interesse dos povos e<br />

dos indivíduos.<br />

(…)<br />

9 A posição de [MARNOCO E SOUZA] é declaradamente sociologista, concebendo as<br />

relações internacionais como um organismo, revelado pela especulação de caráter<br />

(2)<br />

MANORCO E SOUZA, José Ferreira. Execução Extraterritorial das Sentenças Cíveis e Comerciais,<br />

Coimbra, 1898, pp. 40 [n.a]<br />

(3)<br />

Direito Internacional Privado, Freitas Bastos, 1971, pág. 115. [n.a.]<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 4<br />

puramente histórico. Sendo cada Estado um órgão do super-organismo<br />

internacional, deve harmonizar a própria conservação às condições de existência<br />

dos outros. ―A cooperação dos Estados como órgãos da do super-organismo<br />

internacional exige que eles contribuam para a administração [10] da justiça no<br />

mundo, para a garantia das relações sociais entre os povos e para a realização do<br />

direito em todas as manifestações. Ora, isto só se pode conseguir pelo instituto<br />

extraterritorial das sentenças que visa a este fim, sancionando a justiça dos estados<br />

estrangeiros‖.<br />

10 Entre os autores brasileiros, OSCAR DA CUNHA (4) preocupa-se mais com os aspectos<br />

técnicos do problema da homologação, mas atribui-lhe dupla finalidade: a de solver<br />

e amparar as relações privadas que o julgado homologando tente a regular e a de<br />

respeitar a ordem pública e a soberania do Estado homologador.<br />

12 Nesse plano, transportando os conceitos para o tema que nos preocupa, podemos<br />

dizer, seguramente, que o fundamento filosófico do instituto da homologação ou<br />

reconhecimento da sentença estrangeira é, em última análise, a proteção dos valores<br />

da pessoa humana, a qual, como dissemos, paira acima do próprio Estado, não<br />

difere em função da nacionalidade ou domicílio.<br />

(…)<br />

16 Tão amplas têm sido as investigações a respeito, que preferem alguns autores<br />

apresentam classificações dos diversos sistemas, agrupando as legislações segundo<br />

determinadas notas características.<br />

SERPA LOPES (5) , citando HENRY COCK, classifica os sistemas legislativos em face<br />

do problema da sentença estrangeira da seguinte forma:<br />

1º) Sistema da recusa à execução dos julgados estrangeiros, segundo o qual<br />

desconhece-se o processo de homologação ou de exequatur.…<br />

17 2º) Sistema de revisão absoluta, … segundo o qual, no processo de exequatur, se<br />

reexamina inclusive o mérito da decisão estrangeira, substituindo a nova decisão<br />

pela estrangeira.<br />

(4)<br />

3º) Sistema de controle ilimitado: é possível o exame do mérito da decisão<br />

estrangeira, mas para o fim de admiti-la ou rejeitá-la.…<br />

4º) Sistema de controle limitado, segundo o qual o julgado estrangeiro é submetido<br />

a um controle em determinado pontos.<br />

Este último é o adotado tradicionalmente pelo Direito brasileiro, chamado também<br />

sistema da ―delibação‖, ligado à tradição italiana, afastando-se da alemã no que se<br />

refere à dispensa da reciprocidade.<br />

MACHADO VILELA (6) distinguiu cinco sistemas: 1) o do completo desconhecimento<br />

das sentenças estrangeiras; 2) o da sentença-prova; 3) o da reciprocidade; 4) o da<br />

revisão do mérito e 5) o da delibação ou homologação.<br />

A Homologação da Sentença Estrangeira e o Direito Judiciário Civil Brasileiro, Rio de Janeiro, 1933, pp 11<br />

e 49. [n.a]<br />

(5)<br />

(6)<br />

Comentários à Lei de Introdução ao Código Civil. Freitas Bastos, 1959, vol. III, p. 196. [n.a.]<br />

O Direito Internacional Privado no Código Civil Brasileiro, Coimbra, 1821, pp. 496/507 [n.a.]<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 5<br />

AMÍLCAR DE CASTRO (7) , após enumerar alguns países que recusam execução às<br />

sentenças estrangeiras e explicar que a reciprocidade não constitui um sistema de<br />

exequatur, mas sim condição adaptável aos sistemas mais diversos, agrupa as<br />

legislações [18] da seguinte forma: a) o sistema da vontade arbitrária; o da common<br />

law; c) o da sentença considerara apenas como meio de prova; d) o da revisão da<br />

sentença e apreciação do mérito, e e) o da delibação ou da norma autônoma. …<br />

18 … Finalmente, esclarece AMÍLCAR DE CASTRO que o único sistema correto e<br />

aceitável na atualidade é o da delibação, introduzido pelo Código de Processo Civil<br />

Italiano de 1865, que dispões, em seu art. 941, que a força executória das sentenças<br />

estrangeiras é dada pelo tribunal de apelação em cuja jurisdição devam ser<br />

executadas.<br />

SENTIS MELENDO (8) classifica os sistemas de exequatur em dois grandes ramos: o<br />

dos que a concessão é feita pelo executivo, também chamado sistema<br />

administrativo, e o judicial, em que o exame é feito pelos tribunais.<br />

JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA (9) , apresentando critério diferente, reduz os<br />

sistemas a dois: o que recusa à decisão estrangeira ―eficácia própria das sentenças<br />

como tais‖, e o que [19] reconhece à decisão estrangeira ―eficácia propriamente<br />

sentencial‖, incluindo-se no primeiro os sistemas da recusa ao reconhecimento e o<br />

da aceitação da aceitação da sentença como simples meio de prova e, no seguindo, o<br />

da revisão e da delibação. Quanto ao sistema da reciprocidade, na mesma linha de<br />

AMÍLCAR DE CASTRO, afirma não ser um sistema próprio, mas compatível com os<br />

diversos sistemas. ROGÉRIO LAURIA TUCCI (10) expõe os cinco sistemas já acima<br />

aludidos, incluindo o da reciprocidade, e dá notícia da posição de JOSÉ CARLOS<br />

BARBOSA MOREIRA.<br />

19 A classificação dos sistemas, que tem por finalidade a ordenação do pensamento,<br />

impõe-nos, também, a análise de algumas legislações específicas e do Direito<br />

convencional, a fim de que se possa extrair a moderna tendência do instituto,<br />

valioso elemento interpretativo para a definição de seus contornos em face da atual<br />

sistemática brasileira.<br />

(7)<br />

(8)<br />

(9)<br />

(10)<br />

(11)<br />

Obs. Procuramos, também, com a nossa pesquisa atualizar o que o professor Vicente Greco Filho<br />

chamou de ―moderna tendência do instituto‖. É evidente que essa tendência sofreu fortes<br />

influências nos últimos 30 anos. Esperamos poder retratá-la com a maior atualidade possível,<br />

tendo em conta as dificuldades que o professor Greco Filho apontou (11) , amenizadas pela<br />

pesquisa financiada pelo Instituto Max-Planck para o Direito Internacional Privado e pelo<br />

acesso à sua formidável biblioteca.<br />

Das Execuções das Sentenças Estrangeiras no Brasil, Belo Horizonte, 1939, pp. 97 a 106 .<br />

La Sentencia Extranjera, EJEA, 1958, págs. 123 a 126.<br />

Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 1974, vol. V, pp. 59-60 [n.a.]<br />

Curso de Direito Processual Civil. Bushatsky, 1976, vol. II, págs. 160-161 [n.a.]<br />

―É preciso levar em conta as dificuldades do estudo de direito comparado. Em nosso país, nem mesmo nós,<br />

estudiosos do Direito, temos sempre segurança quanto à legislação em vigor, problema que evidentemente intensifica-se<br />

na análise de outras legislações, que conhecemos pelos textos frios dos códigos ou por obras doutrinárias nem sempre<br />

perfeitamente atualizadas. Mesmo os grandes autores estão sujeitos aos perigos dessa investigação.…‖ <strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>,<br />

Op. cit. nota de rodapé n° 9, p. 19.<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 6<br />

37 Nas Ordenações do Reino, que vigoraram no Brasil da época colonial ao I Império,<br />

por força da Lei de 20 de outubro de 1823, não houve tratamento específico a<br />

respeito da homologação de atos jurisdicionais estrangeiros.<br />

Ensina MANORCO E SOUZA, aliás que mesmo a doutrina portuguesa do século XVIII<br />

negava a possibilidade de cumprimento de cartas de sentença de outros reinos.<br />

Também o relgulamento n° 737, nosso primeiro diploma processual civil, foi<br />

omisso.<br />

38 A verdadeira disciplina legal do instituto surgiu quando a lei n° 2.615, de 4 de<br />

agosto de 1875 , em seu artigo 6º, § 2º, autorizou a regulamentação da execução das<br />

sentenças estrangeiras, o que foi efetivamente feito através do Decreto n° 6.982, de<br />

27 de julho de 1878, que o Cons. LAFAYETTE RODRIGUES PEREIRA submeteu à<br />

rubrica do Imperador. O diploma é verdadeira obra-prima do gênio jurídico<br />

brasileiro, deixando traçadas, desde então, as linhas básicas do instituto em grau de<br />

desenvolvimento ainda hoje não atingido por muitas das legislações dos povos<br />

civilizados… Ademais, o Decreto n° 6.982 enfrentou e resolveu relevantíssimas<br />

questões de Direito que, na atualidade, permanecem obscuras em virtude da<br />

omissão dos textos vigentes que regem a matéria.<br />

O Decreto n° 6.982 não se dirigiu diretamente ao processo de homologação, mas<br />

regulou a execução das sentenças cíveis ou comerciais estrangeiras, estabelecendo<br />

no art. 1º que aquelas somente poderiam ser executadas no Brasil se concorressem<br />

os seguintes requisitos: ―§ 1º Que a nação, a que pertencem os Juízes ou Tribunaes,<br />

admita o princípio da reciprocidade. §2º Que venham revestidas das formalidades<br />

externas necessarias para tornal-as executorias, segundo a legislação do respectivo<br />

Estado. §3º Que tenham passado em julgado; §4º Que estejam devidamente<br />

authenticadas pelo Consul brazileiro, § 5º Que sejam acompanhadas da traducção<br />

em vulgar por interprete juramentado‖.<br />

Apesar de não haver disposição expressa, o sistema adotado foi o da delibação, uma<br />

vez que entre os requisitos para a execução não ficou estabelecida da revisão do<br />

mérito ou da justiça ou injustiça da decisão, respeitando-se portanto, desde então a<br />

sentença como tal. Reservou-se, porém, no art. 2º, como limites à execução, a<br />

possível contrariedade à soberania nacional, ―como si, por exemplo, subtrahissem<br />

algum brazileiro [39] à competência dos Tribunaes do Império‖, às leis<br />

rigorosamente obrigatórias, fundadas em motivos de ordem pública, ―como são as<br />

que vedam a instituição da alma e das corporações de mão-morta por herdeiras‖, às<br />

que regulam a organização da propriedade territorial ―como s~ao as que prohibem o<br />

estabelecimento de morgados e vínculos, a inalienabilidade perpétua‖e às leis de<br />

moral, ―como si a sentença consagrar a polygamia ou convenções reprovadas‖.<br />

Obs. É interessante destacar que Brasil saiu de uma posição de vanguarda, quando em 1878<br />

inaugurou sua legislação permissiva da homologação de sentenças estrangeiras, aderindo ao<br />

sistema de controle limitado, para assumir a interpretação retógrada atual.<br />

O Decreto 6.982/1878 dirige-se às sentenças cíveis e comerciais, no claro interesse de<br />

executar decisões já transitadas em julgado. Assim prossegue a legislação brasileira até hoje.<br />

Qual o escopo de se exigir o trânsito em julgado das decisões estrangeiras? É certamente<br />

resguardar o interesse de terceiros, que poderiam ser prejudicados por uma alteração<br />

posterior não conhecida da decisão estrangeira, e, em certa medida, da própria jurisdição<br />

com que se coopera, assegurando a eficácia do seu pronunciamento definitivo. Por outro<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 7<br />

lado, não são apenas as decisões transitadas em julgado que podem ser executadas. Decisões<br />

que ainda não transitaram em julgado são também exeqüíveis, admitindo-se a possibilidade<br />

de recursos não suspensivos. A eficácia imediata de tais decisões pode ser, para o interesse<br />

privado ou de jurisdição estrangeira, tão essencial ou até mesmo condicional à eficácia após<br />

o trânsito em julgado. Portanto, as razões que animam o Estado a prestar — e a receber —<br />

a cooperação jurisdicional estrangeira não diferem em razão do trânsito em julgado da<br />

decisão a conferir eficácia. O que importa saber é se a decisão que se pretende fazer valer<br />

noutras jurisdições é eficaz na origem.<br />

O requisito do trânsito em julgado é um requisito de proteção justificável para as decisões<br />

terminativas, que ensejam execução definitiva. Todavia, para a execução provisória ou para<br />

medidas de urgência ou cautelares, torna-se um obstáculo instransponível. Traduz-se, quando<br />

exigido em decisões exeqüíveis mas não transitadas em julgado, com um requisito<br />

inviabilizador da cooperação.<br />

Alguns advogam que tratados internacionais, como o Protocolo de Medidas Cautelares do<br />

Mercosul, ou reformas legislativas seriam necessários para permitir que o Brasil passe a<br />

cooperar com outras jurisdições dando eficácia às suas medidas urgentes e cautelares. Nada<br />

mais incoerente com a correta interpretação sistemática e teleológica do direito em vigor.<br />

39 No sistema do Decreto n° 6.982, a sentença, cuja execução se pretendia, deveria ser<br />

apresentada ao juiz competente para a execução (art. 3º), recebendo deste o<br />

―cumpra-se‖, desde que presentes os requisitos …, procedendo-se , em seguida à<br />

execução segundo as regras vigentes no Império para as sentenças nacionais. Após a<br />

penhora, nas ações pessoais, e entrega da coisa, nas ações reais, poderia o executado<br />

opor embargos à sentença, fundados na matéria dos arts. 1º e 2º, de nulidade e<br />

infringentes (12) . Se procedentes os embargos, a sentença estrangeira seria declarada<br />

inexeqüível (art. 8º).<br />

(…)<br />

Obs. O sistema do Decreto 6.982 parece já ter consagrado à época o sistema do controle posterior.<br />

Ver nota 4, pág. 39, de Vicente Greco Filho.<br />

40 Nota de Rodapé n° 5: AMÍLCAR DE CASTRO (p. 108), afirma que os Decretos ns. 6892 e<br />

7.777 foram atrasados em relação à época em que apareceram, uma vez que, em<br />

1863, já havia sido publicada a obra de Pimenta Bueno, a demonstrar que na<br />

reciprocidade não se pode fundar o Direito Internacional Privado e já se conheciam<br />

as regras de delibação traçadas pelo Código de Processo Civil italiano, em 1865, e,<br />

portanto, não se explicaria como o exequatur pudesse ficar no arbítrio do governo,<br />

uma vez que as partes não tinham recurso contra a sua concessão ou denegação.<br />

Concordamos com o ilustre autor no que se refere à reciprocidade, mas não se<br />

pode esquecer que tal requisito, justamente considerado retrógrado pela moderna<br />

doutrina, ainda hoje está presente em muitas legislações de países de legislação<br />

considerada avançada. Ademais, o sistema do Decreto n° 6.982 poderia ser<br />

considerado dos mais internacionalistas do mundo, inclusive em relação ao vigente<br />

no Brasil, porquanto deferia ao próprio juiz da execução, com recurso previsto em<br />

lei, a decisão sobre o ―cumpra-se‖ em caráter incidental, independentemente do<br />

processo formal de homologação.<br />

(12)<br />

Os embargos infringentes e de nulidade poderiam ser opostos contra qualquer sentença, sendo matérias típicas à<br />

sentença estrangeira apenas as do arts. 1º e 2º. É importante marcar a observação de que a sentença estrangeira era<br />

apresentada diretamente à execução e somente depois da penhora ou depósito da coisa é que se admitiam embargos à<br />

execução, inclusive quanto à matéria relativa ao ―cumpra-se‖<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


(…)<br />

<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 8<br />

40 Se falha pode ser apontada no sistema do Decreto n° 6.892, é a referente ao<br />

requisito da reciprocidade, obrigando o juiz, no caso de dúvida, a consultar o<br />

Governo através do Ministério da Justiça, para esclarecimento. De qualquer forma,<br />

porém, o sistema do ―cumpra-se‖ representou a instituição de um juízo de<br />

delibação, de caráter incidental à própria execução, com conteúdo delibatório,<br />

eminentemente jurisdicional.<br />

(13)<br />

O requisito da reciprocidade, cuja falta representaria a negativa à execução, dois<br />

anos mais tarde, através do Decreto n° 7.777, de 27 de julho de 1880, recebeu um<br />

abrandamento podendo sua falta ser suprida por um exequatur do Governo. Não se<br />

trata, como já se disse (13) de um duplo sistema, mas [41] de uma possibilidade e<br />

mais para a exeqüibilidade no caso de falta de reciprocidade. Nesta hipótese, o<br />

exequatur de natureza administrativa, concedido por razões de oportunidade e<br />

conveniência, ou por liberalidade, abria as portas à execução para sentenças<br />

inexeqüíveis, nos termos do Decreto 6.982. Não se pode dizer, evidentemente, que a<br />

exigência do exequatur seja cientificamente perfeita, mas representou um avanço<br />

em relação ao diploma anterior, que simplesmente vedava a execução a sentenças<br />

de países que não executavam sentenças brasileiras.<br />

Obs. Vicente Greco Filho concorda com Almícar de Castro na crítica ao sistema de exequatur<br />

administrativo estabelecido pelo Decreto n° 7.777/1880. Para Amílcar de Castro, ―na<br />

reciprocidade não se pode fundar o direito internacional privado‖ e ―não se explicaria como<br />

o exequatur pudesse ficar no arbítrio do governo, uma vez que as partes não tinham recurso<br />

contra a sua concessão ou denegação‖. Para Greco Filho, não se pode dizer,<br />

―evidentemente‖, que a exigência do exequatur [administrativo] seja ―cientificamente<br />

perfeita‖.<br />

A interpretação do exequatur administrativo inaugurado pelo Decreto 7.777 dada por Greco<br />

Filho, apoiado em Amílcar de Castro e, também, em José Amazonas, está, ao nosso ver,<br />

parcialmente correta. É certo que não se tratava de um duplo sistema, mas de uma alternativa<br />

para que o Estado brasileiro pudesse dar eficácia a decisões estrangeiras proferidas por<br />

jurisdições que não executavam decisões brasileiras. E essa alternativa estava ao arbítrio do<br />

governo. A divergência está no papel desse exequatur administrativo ou, seja, da decisão de<br />

dispensar o tratamento recíproco nas hipóteses de reconhecimento de decisões estrangeiras.<br />

O ponto de vista de que o Direito Internacional Privado não pode se fundar na reciprocidade<br />

é aceitável se incluído neste ramo do direito apenas o conflito de leis, mas questionável<br />

quando se o estende à eficácia das decisões judiciais estrangeiras. No primeiro caso, do<br />

conflito de leis, a lei estrangeira é aplicada no interesse exclusivo das relações entre partes<br />

privadas, com o escopo de promover o melhor funcionamento do sistema interno de solução<br />

de controvérsias, sem qualquer reflexo direto nas relações internacionais, bastando o controle<br />

jurisdicional da ordem pública para que os interesses nacionais sejam preservados. Ou seja, a<br />

aplicação ou o afastamento da lei de um determinado Estado estrangeiro não interferem nas<br />

relações entre esse Estado e o Estado do foro competente.<br />

Diferentemente, o reconhecimento de decisões estrangeiras é ato de cooperação<br />

internacional, essencial para o funcionamento do sistema de solução de controvérsias,<br />

aplicação da lei e pacificação social no Estado estrangeiro. Como se demonstrou, sem<br />

cooperação internacional, especialmente nos tempos atuais, reduz-se a eficácia da própria<br />

jurisdição estrangeira. Não se trata, quando se concede ou denega exequatur, do interesse<br />

V. JOSÉ AMAZONAS, Da Execução das Sentenças Estrangeiras. São Paulo, 1940, pág 59. [n.a.].<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


(…)<br />

<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 9<br />

exclusivo das partes ou de aplicar a lei que melhor se presta a solucionar a controvérsias, no<br />

interesse da própria jurisdição do foro, mas também do interesse do Estado estrangeiro.<br />

Certamente esse interesse público estrangeiro será menos sensível quando a decisão<br />

estrangeira dispuser sobre interesses eminentemente privados, especialmente nas hipóteses<br />

em que comumente o reconhecimento é requerido diretamente pela parte interessada, pelo<br />

procedimento de homologação de sentenças estrangeiras ou a sentença é automaticamente<br />

reconhecida, independente de homologação. Esse interesse será mais sensível quando a força<br />

interna para da sentença estrangeira houver sido solicitada pelo próprio Estado estrangeiro,<br />

geralmente por carta rogatória, para garantir interesse público, especialmente nos casos de<br />

direito penal ou direito público.<br />

Todavia, mesmo nas hipóteses em que a sentença estrangeira versa sobre conflitos<br />

eminentemente privados, a sua concessão ou denegação podem ter reflexos nas relações<br />

internacionais. Foi o que aconteceu na reação de diversos Estados à antiga posição da França<br />

na aplicação do sistema de revisão [CITAÇÕES A RESPEITO]. A posição da França em<br />

permitir a revisão o mérito de todas as decisões estrangeiras levou a Alemanha — que em<br />

regra aplicava o sistema do controle formal e da ordem púbica — a dar à França o mesmo<br />

tratamento que dela recebia. A reação internacional levou a França a passar ao sistema de<br />

controle.<br />

O tratamento da reciprocidade no reconhecimento das decisões estrangeiras somente pode<br />

ser bem compreendido, portanto, se o intérprete tiver a perspectiva da teoria geral da<br />

cooperação internacional. Não se pode interpretá-lo nos mesmos limites e circunstâncias do<br />

conflito de leis, porque informado por outros princípios.<br />

41 Instaurada a República, o decreto n° 848, de 11 de outubro de 1890, que organizou<br />

a Justiça Federal, não tratou da execução se sentenças estrangeiras, mantendo-se,<br />

portanto, em vigor, o Decreto n° 6.892, com o aditamento do Decreto n° 7.777.<br />

(…)<br />

Posteriormente, a Lei n° 221, de 20 de novembro de 1894, cuja ementa foi<br />

―completa a organização da Justiça Federal da República, veio a regular<br />

expressamente o assunto, de maneira incompleta, porém, de modo que<br />

permaneceram, ainda, em vigor, as disposições do Decreto n° 6.892 que não foram<br />

expressamente contrariadas.<br />

A grande inovação da Lei n° 221 foi a instituição do juízo formal de homologação<br />

de sentenças estrangeira, mais próximo do sistema italiano, de competência do<br />

Supremo Tribunal Federal.<br />

A matéria foi integralmente tratada no §4º do art. 12 da lei, que assim dispôs:<br />

―§4º. As rogatorias emanadas de autoridades extrangeira serão cumpridas somente<br />

depois que obtiverem o exequatur do Governo Federal, sendo exclusivamente<br />

competente o juiz seccional do Estado, onde tiverem de ser executadas as<br />

diligências deprecadas. As cartas de sentença, porém, de tribunaes extrangeiros, não<br />

serão exeqüíveis sem prévia homologação [42] do Supremo Tribunal Federal com<br />

audiência das partes e do procurador-geral da Republica, salvo si outra cousa estiver<br />

estipulada em tratado. (…)‖.<br />

43 Observa-se, pois, que o sistema do exequatur administrativo foi reservado para as<br />

rogatórias emanadas de autoridades estrangeiras, ficando as cartas de sentença<br />

submetidas a prévia homologação pelo Supremo Tribunal, como atividade<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 10<br />

tipicamente jurisdicional, ressalvando-se, porém, a existência de tratado que<br />

dispusesse de maneira diversa.<br />

A Lei n° 221 preocupou-se diretamente em regular o procedimento da<br />

homologação, mas, ao dispor sobre os fundamentos possíveis à oposição à<br />

homologação, a contrario sensu definiu os requisitos para a homologação.<br />

Desapareceu a exigência de reciprocidade e ficou expressamente consignada a<br />

proibição da produção de provas sobre o fundo da questão julgada. Estavam, pois,<br />

definidos os contornos, inclusive terminológicos, do instituto como vigora, em<br />

linhas gerais, até hoje, suscitando o diploma, porém, grave controvérsia, relativa à<br />

competência para homologação.<br />

Obs. Note-se aqui a confusão terminológica. O sistema permanece como sistema de exequatur,<br />

sob a modalidade ―controle‖. O exequatur, no sistema em que se introduziu a Lei 221, era<br />

visto como ato de dispensa de reciprocidade, fazendo sentido limitá-lo aos requerimentos de<br />

execução de sentenças no interesse direto de Estados estrangeiros, ao tempo que essa<br />

dispensa expressa deixava de ser requisito do procedimento que a lei inaugurava: o da<br />

homologação de sentenças estrangeiras. O nome dado a esse procedimento deveria ter se<br />

restrito ao que se propôs: conferir às partes privadas interessadas uma ação (processo)<br />

judicial para dar eficácia a sentenças estrangeiras. Ao estendê-lo à condição de gênero de<br />

todos os procedimentos de homologação de sentenças estrangeiras, o termo ―homologação‖<br />

atraiu para o limitado procedimento que representava todo e qualquer reconhecimento de<br />

decisão estrangeira, mesmo quando estas não se restringiam ao âmbito privado e não tinham<br />

ali um lugar lógico.<br />

43 A Constituição de 1891, ao arrolar, em seu art. 59, a competência do Supremo<br />

Tribunal Federal, não fez referência à homologação de sentenças estrangeiras,<br />

como, aliás não podia deixar de ser, uma vez que o sistema do Decreto n° 6.892 era<br />

o do ―cumpra-se‖ pelo próprio juiz da execução, aparecendo tal competência da<br />

Corte Suprema exatamente na Lei n° 221, de 1894<br />

(…)<br />

44 A omissão não foi sanada na Emenda Constitucional de 5 de setembro de 1926,<br />

encontrando disciplina definitiva apenas na Constituição de 1934 que, em seu art.<br />

76, I, g, dispôs como competência da Corte Suprema a ―extradição de criminosos<br />

requisitadas por outras nações e a homologação de sentenças estrangeiras‖.<br />

Igualmente desapareceu o exequatur administrativo das cartas rogatórias, passado à<br />

competência do Presidente da Corte Suprema (art. 77).<br />

Obs. Considerando-se que o sentido que o ―exequatur administrativo‖ possuía era,<br />

exclusivamente, o de autorizar o reconhecimento de decisões estrangeiras proferidas por<br />

países que não reconheciam decisões brasileiras, não se pode dizer que tenha desaparecido<br />

completamente. Desapareceu o requisito de exigência de reciprocidade (―exequatur<br />

administrativo‖) do processo de exequatur judicial. Não desapareceu, contudo, do âmbito<br />

das relações internacionais, pois se traduz em direito do qual o Estado é sujeito, por força das<br />

normas de direito internacional público, e pode que pode ser oposto por qualquer a Estado<br />

estrangeiro, consideradas as razões de oportunidade e conveniência das relações<br />

internacionais. Em outras palavras, a reciprocidade deixou de ser um requisito a ser<br />

verificado na casuística do foro, no rito do processo, no caso concreto, mas que pode ainda<br />

ser aplicado pelo Estado no âmbito das relações internacionais.<br />

O governo não pode, desde a Constituição de 1934, aplicar a reciprocidade apenas a um caso<br />

concreto de reconhecimento de decisões judiciais estrangeiras, mas poderá fazê-lo no âmbito<br />

das relações internacionais, a todos as decisões provenientes de uma determinada jurisdição.<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 11<br />

Essa reciprocidade genérica seria aplicada por decreto do Presidente da República, por força<br />

da autorização que lhe confere o artigo X da Constituição.<br />

Ou seja, o Governo não participa, no regime legal atual, da discussão sobre o mérito das<br />

decisões estrangeiras a serem homologadas. Contudo, não perdeu o comando das relações<br />

internacionais.<br />

44 É de se notar, porém, que a Consolidação das Leis referentes à Justiça Federal,<br />

aprovada pelo Decreto n° 3.084, de 5 de novembro de 1898, fundindo o texto da<br />

Constituição e o da Lei n° 221, relacionou, entre as competências do Supremo (art.<br />

9º, h), ―inclusive as homologações das cartas de sentença de tribunais estrangeiros<br />

para serem exeqüíveis na República‖, como decorrência da atribuição constante no<br />

art. 59, I, d, da Constituição de 1891, que declarava competir ao Supremo o<br />

julgamento ―dos litígios e reclamações entre nações estrangeiras e a União ou os<br />

Estados‖.<br />

Obs. O fundamento que a Consolidação das Leis da Justiça Federal, aprovada pelo Decreto n°<br />

3.084, de 5 de novembro de 1898, encontrou para incluir na competência do STF as<br />

homologações de cartas de sentenças de tribunais estrangeiros estava, segundo <strong>GRECO</strong><br />

<strong>FILHO</strong>, na interpretação do dispositivo da Constituição vigente (1891) que atribuía ao STF<br />

competência para o julgamento dos litígios entre a União e nações estrangeiras. Essa<br />

interpretação demonstra, por um lado, que a homologação de sentenças estrangeiras,<br />

diferente da aplicação de lei estrangeira, tem um conteúdo ao menos potencial de conflito<br />

com Estados estrangeiros. Por outro lado, mostra-se inequívoca, pois o conflito que cabe à<br />

jurisdição interna resolver entre entes da Federação e Estados estrangeiros são aqueles<br />

fundados no direito interno e não no direito internacional público, que devem ser submetidos<br />

a sistema solução de controvérsias diverso dos poderes judiciários de cada um dos Estados<br />

conflitantes.<br />

47 Com a elaboração do Código Civil, a respectiva Lei de Introdução, Lei n° 3.071, de<br />

1º de janeiro de 1916, não alterou a sistemática vigente, estabelecendo apenas em<br />

seu art. 16: ―As sentenças dos Tribunais estrangeiros serão exeqüíveis no Brasil,<br />

mediante as condições que a lei brasileira fixar‖. Ficaram mantidas, portanto, as<br />

disposições da consolidação concretizada pelo Decreto n° 3.084, de 1898.<br />

A unificação da competência para legislar sobre Direito Processual de 1934<br />

consumou-se através do Código de Processo Civil de 18 de setembro de 1939,<br />

baixado pelo Decreto-lei n° 1.608, o qual também dispôs sobre homologação de<br />

sentença estrangeira, uma vez que não mais seria compatível a subsistência da de<br />

normas para a antiga Justiça Federal. A disciplina, constante dos arts. 785 a 796,<br />

não se afastou [48] muito do sistema da consolidação de 1898, mantendo, em linhas<br />

gerais, as disposições relativas às sentenças de falência, omitindo, porém, o<br />

tratamento a ser dado às sentenças não homologadas e os efeitos das sentenças de<br />

partilha e das meramente declaratórias. O sistema da delibação, porém, permaneceu<br />

íntegro.<br />

48 A 4 de setembro de 1942, o Decreto-lei n° 4.657, que entrou em vigor a 24 de<br />

outubro de 1942, por força do disposto no Decreto-lei n° 4.707, de 17 de setembro<br />

de 1942, promulgou nova Lei de Introdução ao Código Civil, a qual repetiu, em seu<br />

art. 15 , os requisitos básicos para a homologação, voltando a esclarecer, no<br />

parágrafo único, que não dependeriam de homologação as sentenças meramente<br />

declaratórias do estado das pessoas. Entendia a doutrina serem os requisitos da Lei<br />

de Introdução e os do Código de Processo Civil, cumulativos, mesmo porque não<br />

conflitantes.<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 12<br />

49 As Constituições Federais de 1937 9arrt. 101, I, f), de 1946 (art. 101, I, g), de 1967<br />

(art. 114, I, g) mantiveram a competência do Supremo Tribunal Federal para a<br />

homologação de sentenças estrangeiras.<br />

O novo Código de Processo Civil, Lei n° 5.869, de 11 de janeiro de 1973, e que<br />

entrou em vigor em 1º de janeiro de 1974, preferiu delegar a disciplina do assunto<br />

ao Supremo Tribunal Federal, através de seu regimento interno, estabelecendo em<br />

apenas dois artigos (arts. 483 e 484): ―A sentença proferida por tribunal estrangeiro<br />

não terá eficácia no Brasil senão depois de homologada pelo Supremo Tribunal<br />

Federal. Parágrafo único. A homologação obedecerá ao que dispuser o regimento<br />

interno do Supremo Tribunal Federal‖. E ―A execução far-se-á por carta de sentença<br />

extraída dos [49] autos da homologação e obedecerá às regras estabelecidas para a<br />

execução da sentença nacional da mesma natureza.‖ (14)<br />

49 O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, em seus arts. 210 a 217, em seu<br />

conteúdo, representa uma fusão da disciplina constante anteriormente da Lei de<br />

Introdução e do Código de Processo Civil de 1939, tendo sofrido apenas uma<br />

adaptação decorrente da Emenda Constitucional n° 7, de 13 de abril de 1977, que<br />

atribui ao Presidente do Supremo a competência para a homologação, retirando-a do<br />

tribunal pleno. (15)<br />

(14)<br />

Obs. É preciso verificar a constitucionalidade das normas do regimento interno do STF e, hoje, do<br />

STJ, sobre questões que não sejam simples procedimentos. Pode o regimento interno do<br />

tribunal dispor sobre as hipóteses em que o exequatur deve ou não ser concedido?<br />

Entendemos que a competência dos tribunais limita-se, pela Constituição de 1988, à divisão<br />

interna dos trabalhos e aos procedimentos internos. Não lhes cabe legislar sobre processo em<br />

sentido estrito. VERIFICAR ESTA AFIRMAÇÃO<br />

No que diz respeito à homologação de sentenças estrangeiras e à concessão de exequatur em<br />

cartas rogatórias, a Constituição havia, antes da Reforma do Judiciário de 2004, Emenda n°<br />

X, no art. 102, h, estabelecido expressamente autorização para que o regimento conferisse ao<br />

presidente do STF essa competência. Contudo, a Emenda Constitucional n° X, ao passar<br />

essa competência para o STJ, suprimiu a autorização expressa para que fosse delegada ao<br />

presidente. Isso significa que o STJ não pode, por seu regimento interno, conferir<br />

competência ao seu presidente, nos mesmos moldes que fazia o regimento do STF?<br />

―O Anteprojeto de Código de Processo Civil, de atuoria do Prof. ALFREDO BUZAID, tratou amplamente da<br />

matéria, com perfeita coerência com os institutos relacionados. ROBERTO ROSAS e PAULO CEZAR ARAGÃO,<br />

Comentários ao Código de Processo Civil, Revista dos Tribunais, 1975, pág. 145, atribuem a omissão do Código<br />

vigente à competência anômala do Supremo Tribunal Federal para legislar sobre processo, estabelecida pelo art. 120,<br />

parágrafo único, c, nos feitos de sua competência originária ou de recurso. Todavia, parece-nos que o texto<br />

constitucional usou, no caso, o termo “processo” especialmente como “procedimento”, não excluindo, portanto, a<br />

competência da lei de disciplinar, se o quisesse, os casos e requisitos para a homologação, que, aliás, são o mérito<br />

e condições da ação de homologação, bem como os efeitos da sentença antes e depois de homologada. Se<br />

entendermos que o art. 120, parágrafo único, c, da Constituição Federal, utilizou o termo ―processo‖ em sentido próprio<br />

e amplo, deveria o Regimento Interno ter disciplinado, também, os casos de ação rescisória de seus acórdãos, a fiança<br />

nos processos criminais originários etc. É certo que, na prática, as normas de processo e procedimento se interrelacionam,<br />

tanto que, no caso específico do Regimento Interno do Supremo, não há caso específico do<br />

Regimento Interno do Supremo, há casos evidentes de disposições que não são de mero procedimento. Não<br />

queremos dizer com isso que o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal seja inconstitucional, mesmo<br />

porque o referido parágrafo único fala em “processo” e, portanto, estabelece uma autorização ampla. Insistimos,<br />

apenas, em que o estatuto processual poderia ter enfrentado a matéria quanto aos requisitos para homologação e<br />

efeitos da sentença.‖ [n.a.]<br />

(15)<br />

A competência do pleno era estabelecida pelo próprio Regimento Interno, uma vez que não era reservada como<br />

de sua competência exclusiva pelo texto constitucional (art. 120, parágrafo único, a). Com a Emenda Constitucional n°<br />

7, tornou-se obrigatória a competência do Presidente.<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 13<br />

Entendemos que, no âmbito da distribuição interna de trabalhos no STJ, questão de<br />

procedimento, há uma autorização constitucional (OU SERIA DO CPC, VER QUAL A<br />

FONTE DOS REGIMENTOS INTERNOS) implícita para essa delegação de competência.<br />

Porém, é o Regimento interno do STF somente passou a atribuir competência ao seu<br />

presidente depois da Emenda Constitucional n° 7 (ao texto de 1967/1969), retirando-a do<br />

pleno, conforme lembro <strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>.<br />

49 Entre o Código de Processo Civil vigente, que se refere à sentença estrangeira<br />

também como título executivo judicial depois de homologada (art. 584, IV), e o<br />

Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal há, porém, uma divergência<br />

importantíssima e que merecerá, mais adiante, outros comentários. O Regimento<br />

Interno, conforme tradição do Direito brasileiro que se depreende da exposição<br />

acima, estabelece que as sentenças estrangeiras para serem exeqüíveis no Brasil<br />

precisam da prévia homologação; O Código de Processo Civil preceitua que não<br />

terá eficácia no Brasil a sentença estrangeira não homologada.<br />

Será a divergência meramente terminológica? Ou quis o legislador estender a<br />

necessidade de homologação para a produção, no Brasil, de qualquer dos efeitos da<br />

sentença, independentemente de execução?<br />

Obs. Mais uma vez a falta de uma teoria geral da cooperação internacional leva a essas questões.<br />

Em primeiro lugar, se alguma dúvida existe, deveria ser restrita às questões cíveis, cuja<br />

homologação é de interesse exclusivo de partes privadas. Não deveria ser estendida às<br />

decisões cuja eficácia é de interesse direto de Estados estrangeiros, como, mesmo no âmbito<br />

cível, são as decisões interlocutórias ordinatórias do processo. De qualquer modo, o conceito<br />

de ―homologação de sentenças estrangeiras‖ no direito brasileiro é reservado às decisões<br />

―homologáveis‖. Ora, se a decisão não depende de homologação, não deveria a discussão ter<br />

levado ao fim do reconhecimento, independente de homologação, das sentenças estrangeiras<br />

que dipõem sobre o estado das pessoas. (REESCREVER)<br />

52 O tema ―homologação ou reconhecimento de sentença estrangeira‖ situa-se dentro<br />

do tema mais amplo ―Direito Processual Civil Internacional‖, que igualmente tem<br />

encontrado na doutrina tratamento dicotômico, ora como parte do Direito<br />

Internacional Privado, ora como parte do Direito Processual Civil.<br />

(…)<br />

Já se encontra bem assentada a distinção do Direito Processual Civil Internacional<br />

com o chamado Direito Internacional Processual, ramificação do Direito<br />

Internacional Público, que regula a atuação dos tribunais e cortes internacionais de<br />

justiça. O Direito Processual Civil Internacional é ramo do Direito Interno e<br />

Procuraremos Fixá-lo como processual ou internacional privado segundo a<br />

definição de seu objeto, sendo dispensável sua confrontação com o Direito<br />

Internacional Processual, bem conceituado na doutrina<br />

54 …É importante distinguir o Direito Processual Civil Internacional do Direito<br />

Internacional Privado, mas a sua separação desse ramo do Direito vincula-o, como<br />

adiante procuraremos demonstrar, inevitavelmente, ao Direito Processual.<br />

(…)<br />

55 Importante é a diferenciação [do Direito Processual Civil Internacional<br />

relativamente ao Direito Internacional Privado. Este tem por objeto a solução dos<br />

conflitos de leis possivelmente aplicáveis a um fato anormal…<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


(…)<br />

<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 14<br />

Esse conceito, que é aceito também pela doutrina brasileira de Direito Internacional<br />

Privado, é suficiente para distingui-lo do chamado Direito Processual Civil<br />

Internacional.<br />

55 O fato anormal, que suscita o problema de Direito Internacional Privado, não tem<br />

―aspectos processuais‖, como declara a definição de Miguel de Ângulo. O que<br />

acontece é que [56] o processo não desconhece a relação de Direito Material<br />

discutida …<br />

(…)<br />

56 O legislador processual, portanto, leva em conta o Direito material ou a lide,<br />

inclusive quando esta é um fato anormal, sem que isso acarrete confusão entre o<br />

processo e seu conteúdo. Podemos, então, dizer que entre direito Processual e o<br />

Direito Internacional Privado existe a mesma relação que entre este último e o<br />

Direito aplicável à solução da lide anormal. Da mesma forma que não se<br />

confundem o Direito Internacional Privado e o Direito material que o primeiro<br />

manda aplicar, assim também não se confundem o direito Processual (ainda [57] que<br />

modificado) com o Direito Internacional Privado, atuante quando submetida a juízo<br />

uma lide anormal.<br />

57 O Direito Processual Civil Internacional, por conseguinte, é verdadeiro Direito<br />

Processual, porque regula a atuação da jurisdição, o exercício da ação e respectivas<br />

formas diante de um fato também relevante para o Direito Internacional Privado.<br />

(…)<br />

Poderíamos, então, definir o Direito Processual Civil Internacional: ―É a parte do<br />

Direito Processual Civil que disciplina, através de normas especiais, a solução das<br />

lides em que há, pelo menos, um elemento estrangeiro relevante para o processo‖.<br />

58 Fixado, pois, que o Direito Processual Civil Internacional é parte do Direito<br />

Processual Civil, seus temas também devem ser tratados dentro da sistemática<br />

processual: a competência internacional, a litispendência internacional, a cautio<br />

judicatu solvi, a ação extraterritorial de alimentos e a homologação de sentenças<br />

estrangeiras.<br />

Obs. A questão de inserir o problema do tema da homologação ou reconhecimento das decisões<br />

estrangeira no Direito Internacional Privado ou no Direito Processual é meramente<br />

acadêmica e não tem qualquer efeito sobre a determinação do regime jurídico aplicável às<br />

decisões estrangeiras. O que importa, é saber que efeito as decisões estrangeiras têm no<br />

espaço jurisdicional brasileira. Solução a que não se chegará — como até hoje não se chegou<br />

— se o problema não for visto a partir de uma teoria geral própria, que combine os conceitos<br />

e princípios tanto do direito internacional privado, como do direito processual civil e,<br />

também, do direito internacional público, do direito processual penal, do direito<br />

constitucional e do direito administrativo.<br />

Veja-se, por exemplo, o problema da linha jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal que<br />

não admite conceder eficácia interna às decisões judiciais estrangeiras que, no âmbito do<br />

processo penal, determinam a quebra de sigilo bancário em contas localizadas no Brasil. O<br />

STF não nega essa quebra porque seria inconstitucional dar eficácia a decisões estrangeiras<br />

que determinam quebra de sigilo bancário no Brasil, mas porque entende que as cartas<br />

rogatórias não podem ter efeito executório. Mas admite que a quebra de sigilo bancário seja<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 15<br />

solicitada pelo procedimento da ação de homologação de sentenças estrangeiras ou mesmo<br />

por rogatória, se no âmbito de tratado internacional que assim disponha (CR 7.154 /95).<br />

Nesse exemplo, o STF decide sobre a eficácia de decisões estrangeiras proferidas no âmbito<br />

de processo penal, informado por princípios construídos para a solução de controvérsias<br />

entre partes privadas (processo civil), invocando conceitos próprios do direito internacional<br />

privado, como ordem pública internacional, sem atentar para as normas e princípios que<br />

informam as relações entre os Estados (direito internacional público) ou para os fundamentos<br />

constitucionais da cooperação internacional (direito constitucional).<br />

O Supremo não fecha as portas da cooperação judiciária passiva às chamadas ―medidas<br />

executórias‖, apenas as condiciona à ―prévia homologação, na jurisdição brasileira, da<br />

sentença estrangeira que as tenham determinado‖. Assim, aparentemente, bastaria que<br />

autoridade judiciária estrangeira interessada, por exemplo, na obtenção de dados bancários<br />

no Brasil, solicitasse a homologação de sua própria decisão em vez de optar pelo envio de<br />

uma carta rogatória.<br />

Ocorre que o procedimento previsto nos artigos 215 a 224 do Regimento Interno do<br />

Supremo Tribunal Federal como ―Homologação de Sentença Estrangeira‖ somente se presta,<br />

por seus próprios requisitos, à homologação de sentenças estrangeiras terminativas,<br />

especialmente de natureza cível, num litígio entre partes privadas. Basta ver que o artigo<br />

217do Regimento Interno estabelece como indispensáveis à homologação a citação das<br />

partes e o trânsito em julgado da sentença a ser homologada, requisitos obviamente<br />

incompatíveis com as características das decisões judiciais ex parte – sem a oitiva da parte<br />

interessada – como a quebra de sigilos legais ou o congelamento de bens.<br />

Ademais, conforme o artigo 218 do mesmo regimento, a homologação ali prevista aproximase<br />

de uma verdadeira ação de homologação em que a ―parte interessada‖ deve provocar o<br />

juízo de delibação do STF por meio de ―petição inicial‖, cabendo ao Presidente, após a<br />

autuação da petição e dos documentos, ―mandar citar o requerido para, em quinze dias,<br />

contestar o pedido‖ (art. 220), não sendo, por óbvio, procedimento destinado a prestar<br />

cooperação jurisdicional a Estados estrangeiro mas sim para satisfazer interesses privados.<br />

Não faz sentido se exigir que a autoridade judiciária estrangeira, cuja prestação jurisdicional<br />

reclama a adoção de ―medidas executórias‖ liminares no Brasil, apresentar ―petição inicial‖<br />

no STF e seguir o procedimento denominado no regimento interno de ―Homologação de<br />

Sentenças Estrangeiras‖.<br />

As autoridades judiciárias de países distintos se comunicam, em regra, por epístolas<br />

denominadas ―cartas rogatórias‖. Se uma autoridade judiciária necessita, para cumprir sua<br />

função, que atos processuais sejam realizados fora de sua jurisdição, sejam atos ordinatórios,<br />

uma produção de provas ou medidas assecuratórias, recorrerá à carta rogatória. Por meio<br />

deste instrumento, rogará a cooperação internacional.<br />

Não se deveria confundir a situação em que se pede, via rogatória, a homologação de<br />

sentença estrangeira que soluciona conflito entre partes privadas – quando poder-se-ia<br />

compreender, não sem reservas, a jurisprudência do STF – com a hipótese onde a autoridade<br />

judiciária estrangeira roga o reconhecimento de uma decisão que, sem a oitiva do<br />

interessado, determina a quebra de sigilo bancário. Neste caso, a exigência do procedimento<br />

de homologação de sentença previsto nos artigos 215 a 224 do Regimento Interno<br />

corresponderia à denegação indireta da cooperação, como de fato acontece.<br />

O problema da jurisprudência do STF está na utilização isolada de conceitos e institutos de<br />

direito processual civil e direito internacional privado clássico em toda e qualquer hipótese<br />

de reconhecimento de decisões estrangeiras, sem ter em conta as orientações de outros ramos<br />

do direito. Os institutos, conceitos e problemas da cooperação internacional, como ―carta<br />

rogatória‖, ―reconhecimento de decisões estrangeiras‖ e outros, não podem ser isoladamente<br />

compreendidos pela investigação estanque de um determinado ramo do direito ou pela<br />

perspectiva apenas do interesse das partes. Por isso propomos analisá-los a partir de uma<br />

teoria geral da cooperação internacional.<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 16<br />

61 A determinação da posição sistemática de um instituto tem também uma finalidade<br />

prática. Determina o método de estudo e, também, os contornos de seus conceitos.<br />

Assim, mesmo os autores de Direito Processual, quando se estuda a homologação<br />

de sentença estrangeira tem sido dada muita importância ao conceito de soberania,<br />

da qual, evidentemente, decorre a jurisdição. Aliás, historicamente falando, como<br />

vimos, a época de afirmação da soberania determinou exatamente a repulsa ao<br />

instituto da homologação de sentença estrangeira.<br />

Não se quer dizer, de forma alguma, que o conceito de soberania não implique o<br />

tema, contudo não se pode permitir que os valores que aquela preserva obnubilem<br />

os contornos do instituto que devem ser formados à vista dos princípios do<br />

processo. [62] Para o Direito internacional, a soberania é um conceito a ser<br />

construído; para o Direito Processual é um dado, como é o reconhecimento da<br />

soberania dos outros Estados. A partir daí deve seguir o raciocínio do jurista do<br />

processo, abstendo-se da reformulação crítica da soberania e cuidando para a carga<br />

emotiva do conceito não interfira na fixação dos contornos do instituto.<br />

62 Finalmente, sendo matéria de Direito Processual, deve a homologação de sentença<br />

estrangeira ser estudada como ação, suas condições, seu objeto e como processo,<br />

seus pressupostos, seu procedimento, seus efeitos.<br />

(16)<br />

Obs. O Professor Greco Filho propõe isolar do objeto de estudo (eficácia das decisões judiciais<br />

estrangeiras) os conceitos alheios ao direito processual. Embora reconheça, por exemplo, que<br />

o conceito de soberania tem implicação sobre o tema, sugere que o intérprete não enfrente a<br />

questão da soberania, tomando-a apenas como um dado, mas não permitindo que os valores<br />

que esse conceito encerra ―obnubilem‖ os contornos do objeto de estudo. Enfim, recomenda<br />

que o problema da homologação de sentença estrangeira deve ser analisado apenas nos<br />

limites do direito processual: ―Finalmente, sendo matéria de Direito Processual, deve a<br />

homologação de sentença estrangeira ser estudada como ação, suas condições, seu objeto e<br />

como processo, seus pressupostos, seu procedimento, seus efeitos‖ (16) .<br />

Esse método, embora útil para resolver muitas das dificuldades existentes no tema, mostra-se<br />

insuficiente para dar ao intérprete os instrumentos teóricos necessários ao reconhecimento ou<br />

não de eficácia à decisão estrangeira. Ou seja, o trabalho da doutrina deve ser o de entregar<br />

ao aplicador do direito os fundamentos necessários para que o pleito de reconhecimento de<br />

uma decisão estrangeiro seja tido como legal ou errado. E para a solução do caso concreto, o<br />

corte metodológico delimitado na matéria de direito processual civil são claramente<br />

insuficientes, assim como também seria a delimitação na matéria de direito internacional<br />

privado. Como deve decidir o juiz ou tribunal quando tiver que julgar pedido de<br />

homologação de sentença estrangeira, contestada com fundamento na violação da soberania<br />

ou da ordem pública? Qual deve ser o efeito de uma sentença penal estrangeira que decreta<br />

o perdimento de bens e sua homologação é requerida pelo juízo prolator por meio de carta<br />

rogatória? A carta rogatória deve ser conceituada apenas sob a ótica do direito processual<br />

interno ou também é categoria do direito internacional e instrumento das relações<br />

internacionais?<br />

Ainda que o Direito Processual Civil tenha muito a contribuir, esse ramo do conhecimento<br />

jurídico não tem todas as respostas para o problema do reconhecimento de decisões judiciais<br />

estrangeiras. O diagnóstico problema com conceitos exclusivos do direito processual civil<br />

está na base da confusão doutrinária que induziu a jurisprudência STF a dar ao pedidos de<br />

reconhecimento de decisões, formulados diretamente pelos juízos estrangeiros que a<br />

prolataram, o mesmo tratamento das homologações solicitadas no interesse de particulares.<br />

Homologação de Sentença Estrangeira. Op. cit. p. 62.<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 17<br />

A exata compreensão do problema da eficácia das decisões estrangeiras somente pode ser<br />

compreendido no âmbito de uma teoria geral da cooperação internacional que possa conciliar<br />

em uma explicação lógica e sistemática todas as percepções do problema.<br />

77 GEORGETTE NACARATO NAZO concluiu pela impossibilidade de alegação de<br />

litispendência internacional no juízo de delibação, admitindo, apenas, a de coisa<br />

julgada …<br />

(…)<br />

ARRUDA ALVIM, também, afirma que nosso País não empresta relevância à<br />

litispendência internacional, apesar de admiti-la quando decorra de tratado<br />

regularmente firmado.<br />

78 Os argumentos, todavia, dos que não aceitam a exceção ou objeção não são<br />

suficientes para convencer-nos teoricamente. Uma vez que uma sentença<br />

estrangeira seja homologável e, portanto, exeqüível no Brasil, porque não<br />

reconhecer a existência de processo em andamento que alcançaria o mesmo<br />

resultado? Se a jurisdição estrangeira, sob determinadas condições, é reconhecida<br />

como conclusiva a respeito de determinada causa, pela mesma razão reconhecida<br />

deve ser a existência de lide pendente para os efeitos de alegação da exceção. Se a<br />

litispendência no Direito interno tem por finalidade impedir o desgaste processual<br />

desnecessário e também o escândalo de decisões contraditórias, os mesmos<br />

fundamentos valem para o Direito internacional.<br />

83 Convém… dar ao art. 90 do Código de Processo Civil interpretação estrita, como<br />

uma opção teritorialista que pode ser, como vimos, inconveniente, mas que deve ser<br />

respeitada em seus termos devido à sua força de lei.<br />

85 no juízo de homologação de sentença estrangeira, é possível a alegação do art. 90<br />

como impeditivo da homologação se o processo no Brasil iniciou antes do trânsito<br />

em julgado da sentença estrangeira porque esta não foi legitimamente editada por<br />

força do mesmo art. 90;<br />

no juízo de homologação de sentença estrangeira, só é possível a alegação de coisa<br />

julgada no Brasil, impeditiva da homologação, se o processo no Brasil iniciou antes<br />

do trânsito em julgado da sentença estrangeira;<br />

Nas [duas] hipóteses [acima], se o processo no Brasil iniciou depois do trânsito em<br />

jujlgado da sentença estrangeira, esta pode ser homologada.<br />

85 - Nota de rodapé n° 27: As [três] conclusões acima… dependem de fundamentação<br />

desenvolvida no capítulo em que se trata da natureza e efeitos da sentença<br />

estrangeira antes da homologação… Os temas competência internacional,<br />

litispendência internacional e homologação de sentença estrangeira acham-se de tal<br />

forma relacionados, formando um sistema único, que é difícil, senão impossível,<br />

tratar de um sem firmar posição quanto aos outros.<br />

87 Para os sistemas de recusa de homologação, a sentença estrangeira é um mero fato e<br />

apenas um fato a ser levado em [88] consideração, ou não, em eventual processo de<br />

causa idêntica, não tendo, portanto, nenhuma relevância jurisdicional. (17)<br />

(17)<br />

O mesmo ocorre para os sistemas em que a sentença tem valor probatório. [n.a.]<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 18<br />

88 Para os sistemas de revisão de mérito, ou revisão absoluta, bem como para todos os<br />

que exigem a reciprocidade, a sentença estrangeira já é considerada ato jurisdicional<br />

mas de eficácia mínima, uma vez que condicionado , quanto ao conteúdo e forma, à<br />

edição de outra sentença nacional em substituição, ou de aceitação, que revigora<br />

integralmente o ato estrangeiro. No que se refere aos sistemas que exigem a<br />

reciprocidade, sua inclusão torna o instituto verdadeiramente anômalo, uma vez que<br />

introduz na apreciação jurisdicional um elemento muitas vezes administrativo, qual<br />

seja a vontade dos Estados intervenientes. Daí, já se ter dito que o requisito da<br />

reciprocidade é retrógrado e incompatível com o instituto da homologação de<br />

sentenças estrangeiras.<br />

Obs. A reciprocidade como elemento da cooperação não pode ser considerado retrógrado. Ver<br />

sobre isso o que já escrevemos. De qualquer modo, a sua presença não altera a natureza<br />

jurídica da sentença.<br />

88 Para o chamado sistema da revisão parcial ou da delibação, como vimos introduzido<br />

legislativamente pelo Código de Processo Civil italiano de 1865, a sentença<br />

estrangeira é respeitada como tal, tendo, portanto, a natureza jurídica de sentença,<br />

ato jurisdicional ou, no dizer de CARNELUTTI, o mestre tão rico em novas<br />

contribuições à ciência do processo, um equivalente jurisdicional. (18)<br />

89 Em face desses condicionantes [da soberania e da jurisdição], que fazem nascer o<br />

chamado princípio da efetividade, segundo o qual só deve atuar a jurisdição sobre<br />

as causas em que será possível ao Estado fazer valer sua decisão, surge a<br />

autodelimitação da atuação do poder jurisdicional, através das regras chamadas de<br />

competência internacional. Abstratamente, seria possível a cada país estabelecer sua<br />

jurisdição a todas as causas do mundo, mas, como disse AMÍLCAR DE CASTRO, isso<br />

seria ―vã exibição de força‖.<br />

89 A autodelimitação da competência, como se vê, decorrente da força dos fatos, traz<br />

como conseqüência impostergável e imediata a aceitação lógica de que há lides que<br />

estão submetidas ao poder jurisdicional do Estado de que se trata, mas que estão<br />

submetidas a algum poder jurisdicional, decorrente de uma soberania de igual<br />

dignidade. Tal aceitação, porém, importa, necessariamente, no reconhecimento de<br />

que os atos jurisdicionais de outros países são tão eficazes quanto os próprios,<br />

cabendo, apenas, ao Estado que se vê diante deles examinar: se emanou de uma<br />

soberania; se esta soberania é competente; se é ato jurisdicional, incluído, aqui, o<br />

exame dos requisitos essenciais do processo que gera a sentença, como, por<br />

exemplo, a citação válida; e se não invade a própria soberania e os princípios<br />

essenciais que consagra como a ordem pública e os bons costumes.<br />

90 Qualquer exigência que não se enquadre em algum desses princípios significa<br />

desconhecer, ainda que parcialmente, uma soberania alheia sobre a decisão de<br />

causas que nem sequer foram previstas como da própria competência, o que seria<br />

absurdo.<br />

(18)<br />

O sistema da delibação, portanto, decorre diretamente do reconhecimento de que há<br />

outras soberanias de igual dignidade, mas esse reconhecimento não se renova ou<br />

não se repete no momento da homologação da sentença estrangeira, servindo-lhe,<br />

Sistema di Diritto Processuale Civile¸CEDAM, 1936, pp. 154 e segts. [n.a.]<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 19<br />

apenas de substrato lógico e jurídico. Sob o aspecto processual, a admissão da<br />

existência de soberania de igual dignidade fez-se no momento da autodelimitação<br />

da competência interna, que condiciona inexoravelmente o problema da<br />

homologação ou reconhecimento das sentenças estrangeiras.<br />

Esta é a premissa nuclear do tema. O ato soberano foi o da autodelimitação da<br />

competência, que poderia ter sido mais ou menos amplo, aliado ao ato do<br />

reconhecimento de um outro país como soberano, não cabendo, em hipótese<br />

alguma, no momento da homologação de sentença estrangeira, o reexame daquela<br />

soberania. Por isso mesmo, a homologação de sentença estrangeira é providência<br />

jurisdicional e não administrativa.<br />

A homologação de sentença estrangeira é ato de soberania enquanto maniefestação<br />

de um dos poderes da nação, mas não faz o reexame nem da própria, nem da alheia<br />

soberanias. O ato da homologação, pode-se dizer, é vinculado, no sentido de que<br />

fica sujeito às condições preestabelecidas na lei, como, aliás, toda a atividade<br />

jurisdicional.<br />

Obs. O Professor Greco Filho parte de uma premissa equivocada para chegar à conclusão de que<br />

homologação de sentenças estrangeiras é um ato eminentemente jurisdicional, sobre o qual<br />

não incide considerações ―administrativas‖ de imposição da soberania nas relações<br />

internacionais. Segundo ele, no momento que o Estado delimitou sua jurisdição pela<br />

definição de uma competência internacional para sua autoridade judiciária e, por outro lado,<br />

reconheceu determinado Estado estrangeiro, as decisões por este proferidas, fora do espaço<br />

da competência internacional fixada pelo Estado do foro, devem ser reconhecidas no campo<br />

exclusivamente jurídico, sob pena de se estar negando a dignidade da soberania alheia.<br />

A premissa equivocada está em justificar a homologação das decisões estrangeiras no<br />

respeito à soberania que as proferiu. E, consequentemente, que a denegação de soberania<br />

pode ser creditada ao desrespeito à soberania alheia. Nessa linha, entende o eminente<br />

professor que os atos jurisdicionais de outros países são, no âmbito que lhe reconhece a<br />

competência internacional do Estado do foro, tão eficazes quanto os deste, sendo cabível<br />

apenas o controle de delibação.<br />

O fundamento da homologação de sentenças estrangeira não está no reconhecimento da<br />

dignidade da soberania estrangeira. Ou seja, a soberania não tem como corolário necessário a<br />

extensão da eficácia de suas decisões sobre o território de outros Estados soberanos, de<br />

forma que uma eventual negativa de homologação, fora das hipóteses de controle, implicaria<br />

numa violação àquela soberania.<br />

A execução forçada de uma decisão judicial é ato de soberania e não pode ser efeito<br />

necessário de decisões jurisdicionais proferidas por tribunais estrangeiros, como reconhece o<br />

próprio professor Greco Filho ao condicionar a homologação a algum sistema de controle.<br />

Isso não significa que o Estado não possa se obrigar com outros Estados, por força do direito<br />

internacional público, a homologar as decisões que advierem daquele Estado. Também pode<br />

o Estado se obrigar unilateralmente, por força de lei interna, a reconhecer decisões proferidas<br />

por jurisdições estrangeiras. Todavia, em ambas as situações, o fundamento da homologação<br />

ou da não homologação estaria na lei interna ou no tratado internacional, não no<br />

reconhecimento da soberania do Estado estrangeiro.<br />

Em outras palavras, se a lei brasileira, unilateralmente, determinar o reconhecimento das<br />

decisões estrangeiras independentemente de tratado ou reciprocidade de tratamento, o sujeito<br />

desse direito seria o particular mas não o Estado estrangeiro. Nesta limitada hipótese, ter-seia<br />

a homologação de sentenças estrangeiras fora do âmbito da cooperação jurídica<br />

internacional, com status semelhante ao da lei estrangeira aplicada por força do direito<br />

internacional privado. O Estado, nessa hipótese, não estaria cooperando com o Estado<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 20<br />

estrangeiro, mas sim aprimorando seu próprio sistema de solução de controvérsias em favor<br />

do particular, com o mesmo fundamento com que admite a aplicação da lei estrangeira.<br />

Lida sobre outro ponto de vista, a determinação legal interna que obriga o Estado a<br />

reconhecer independentemente de tratamento recíproco decisões judiciais estrangeiras<br />

mostra-se uma opção política em favor dos interesses privados, ainda que em detrimentos<br />

dos recursos de poder do Estado nas suas relações com Estados estrangeiro.<br />

Quanto, todavia, o Estado o Estado estrangeiro é o interessado na cooperação jurídica, seja<br />

do Poder Judiciário, em medidas judiciais, ou do Poder Executivo, nas medidas que<br />

dispensem pronunciamento judicial ou que possam ser resolvidas por assistência direta,<br />

pensamos que não há como eliminar o elemento da reciprocidade sem ferir a norma<br />

constitucional e a própria soberania do país. O entendimento contrário seria o mesmo que<br />

estabelecer estender sobre o território nacional a soberania alheia. Note-se que a previsão<br />

em tratado estabelece, per se, a obrigação de reciprocidade.<br />

93 …A autodelimitação da competência internacional e adoção do sistema da<br />

delibação implica a afirmação de que a sentença estrangeira, nas áreas da respectiva<br />

competência, são verdadeiras sentenças, emanadas de poder jurisdicional de<br />

soberania de igual dignidade. São sentenças, porém, cuja produção de efeitos, por<br />

razões de ordem pública, soberania interna e justiça, ficam sujeitas a uma condição,<br />

qual seja, um juízo de reconhecimento ou homologação.<br />

Obs. As sentenças estrangeiras são ―verdadeiras sentenças‖ mesmo fora das áreas que o direito<br />

interno lhes reconhece competência, justamente porque emanam de poder jurisdicional de<br />

soberania de igual dignidade. O direito interno pode negar eficácia à sentença estrangeira,<br />

seja porque não reconhece a jurisdição da soberania prolatora, seja por razões de soberania,<br />

ordem pública ou ―justiça‖. É para tanto soberano. Mas em nenhuma hipótese pode o direito<br />

interno transformar uma sentença estrangeira em ―falsa sentença‖.<br />

A sentença estrangeira é sempre verdadeira e existe como pronunciamento de uma soberania.<br />

Contudo, o Estado do foro é soberano para reconhecer a essa sentença estrangeira a mesma<br />

força ou o mesmo lugar (homologar) de uma sentença interna. Se homologada, a sentença<br />

estrangeira deve ser executada como tal, ou seja, como uma sentença estrangeira com força<br />

interna. A decisão de homologação, portanto, não é constitutiva, mas sim declaratória.’<br />

Ver tb. Págs. 105/106 de Greco Filho.<br />

99 Sem querermos avançar no amplo e difícil tema da natureza e conteúdo da<br />

jurisdição e da coisa julgada, queremos trazer à colação os ensinamentos do mestre<br />

CELSO NEVES (19) que preleciona: ―Ao realizar a aplicação da lei ao fato, o juiz<br />

define o comando concreto que regula o caso controvertido. Exauridos os meios que<br />

o processo põe à disposição dos litigantes, para garantir que a decisão seja exata,<br />

adquire ela a autoridade de coisa julgada, tornando-se legalmente indiscutível.<br />

Encerra-se, aí, o primeiro momento da atividade jurisdicional, no plano do processo<br />

de cognição. Resolvido o problema da certeza do direito, continua em aberto o<br />

problema de sua realização prática que, ou se dá voluntariamente, pela submissão<br />

do obrigado ao comando emergente da decisão, ou pode ser obtida, coercitivamente,<br />

através da execução forçada.‖ E também: ―a sentença constitutiva efetua essa<br />

aproximação (da atividade jurisdicional de cognição e da atividade jurisdicional<br />

executória) eliminando a dualidade processual ação-execução, porque os efeitos<br />

jurídicos pretendidos, no caso do acolhimento da ação, podem ser, desde logo,<br />

realizados‖.<br />

(19)<br />

Coisa Julgada Civil,E. RT, 1971, pp 449 e segts. [n.a.]<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


(…)<br />

<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 21<br />

101 O ato de reconhecimento de existência, portanto, é meramente declaratório, porque<br />

simplesmente elimina a certeza subjetiva que pode haver quanto à existência da<br />

sentença estrangeira, fenômeno que pode ocorrer também com sentenças nacionais.<br />

102 Ao processo de homologação, desde que não lhe compete a atribuição de<br />

existência, compete a constituição da eficácia executiva para a ordem jurídica<br />

brasileira, entendida aquela em sentido amplo. Isto é, a que legitima a execução<br />

forçada e a que vem inserida na própria sentença quando constitutiva.<br />

Contra a nossa tese encontra-se a letra da lei, o art. 483 do Código de Processo<br />

Civil,. que aparentemente condiciona toda a eficácia à prévia homologação, assim<br />

sustentando comentaristas do novo estatuto processual.<br />

105 Em conclusão temos que:<br />

106 a) a sentença estrangeira antes de homologada é verdadeira sentença, não<br />

dependendo de ação, no Brasil, para o reconhecimento de sua existência e de sua<br />

eficácia, no que se refere ao conteúdo declaratório de certeza;<br />

b) a homologação de sentença estrangeira é ação constitutiva, exigível para a<br />

produção do efeito executivo, em sentido amplo, da sentença no Brasil.<br />

Dessas duas conclusões fundamentais resultam as seguintes conseqüências:<br />

1) O efeito de coisa julgada, em si mesmo, não depende de homologação , podendo<br />

ser objeto, a qualquer tempo, de cognição incidental ou preliminar.<br />

2) É possível a argüição de coisa julgada, se sentença estrangeira, mesmo não<br />

homologada, transitou em julgado anteriormente, como, por exemplo, no caso de<br />

reiteração de ação já definitivamente decidida pela improcedência no exterior.<br />

3) O reconhecimento da existência, que é declaratório, tem como requisitos os<br />

mesmos exigidos para a homologação.<br />

Obs. Embora a proposta de Greco Filho no sentido de que o efeito de coisa julgada no Brasil não<br />

depende de homologação, mas apenas a eficácia executiva das sentenças estrangeiras pode<br />

ser alcançado mas não no sistema de controle em que toda a eficácia – e não apenas a parte<br />

executiva, depende de homologação. O problema desta nossa interpretação está em como<br />

conciliar a desnecessidade de homologação das sentenças que declaram o Estado das<br />

pessoas. Seria preciso, penso, que o direito interno ou o tratado internacional determinasse<br />

esse efeito, estabelecendo um reconhecimento independentemente do sistema de exequatur.<br />

O exequatur das decisões estrangeiras não outorga nada, apenas declara.<br />

110 Estando presentes todos os requisitos, declara-se que a sentença estrangeira existe<br />

como sentença. No caso negativo, que não existe como sentença. O mesmo ocorre<br />

no processo de homologação, que encerra, porém, algo, mais, o pedido e<br />

deferimento, quando for o caso, da eficácia executiva para o Brasil.<br />

(…)<br />

Obs. Como acima dissemos, a instância de exequatur não tem o condão de declarar que a sentença<br />

não existe como sentença!<br />

110 As palavras m,ais claras a respeito da natureza jurídica do processo de homologação<br />

foram escritas por LIEBMAN em L’Azione per la Delibazione delle Sentenze<br />

Straniere, apesar de insistir o mestre em não dar nenhum efeito à sentença antes de<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 22<br />

homolgoada. Prevalecem, porém, como perfeitos seus [111] ensinamentos no que se<br />

refere à vinculação ou ao relacionamento entre a sentença de homologação e a<br />

sentenças homologada. Esclarece LIEBMAN que ―l’azione diretta a ottenere la<br />

delibazione di uma sentenza straniera ha dunque per oggeto l’accertamento que essa<br />

possiede tutti e requisiti voluti della legge perchèesssa possa operare in Italia: il<br />

risultato a cui tende è l’integrazione della sua efficacia per parificarla ad una<br />

sentenza italiana. E poichè l’effeto voluto non può conseguirsi che in virtù della<br />

sentenza di delibazione, questa può definirsi una sentenza constitutiva.‖<br />

111 Formulava, assim, Liebman a doutrina de que a sentença de delibação cumpre a<br />

conditio juris a que fica sujeita a sentença estrangeira para a produção de efeitos na<br />

ordem jurídica nacional, o que explica, com grande simplicidade, porque os efeitos<br />

conexos à validade da sentença estrangeiras retroagem ao momento em que esta se<br />

tornou eficaz em seu país de origem, conforme, aliás, reconhece a jurisprudência do<br />

nosso Supremo Tribunal Federal<br />

Obs. O debate sobre a natureza jurídica da decisão de homologação, se declaratória ou<br />

constitutiva, perde importância na medida em que as correntes ambas reconhecem efeitos ex<br />

tunc à sentença estrangeira.<br />

155 Além de outras conclusões também constantes do texto, sustentadas e<br />

desenvolvidas no curso da exposição, desejamos destacar os seguintes:<br />

1) a ação de homologação de sentença estrangeira é de natureza constitutiva,<br />

admitindo para a ordem jurídica brasileira os efeitos executivos (em sentido amplo)<br />

das decisões emanadas de outros países;<br />

2) a eficácia declarativa de certeza e a coisa julgada são pressupostos da ação de<br />

homologação, que tem como objeto uma sentença estrangeira, e, portanto, não são<br />

outorgadas pela ação de homologação;<br />

3) o art. 483 do Código de Processo Civil não alterou a tradição do Direito<br />

brasileiro, devendo ser entendido como impondo a homologação para a produção da<br />

eficácia executiva (em sentido amplo) à sentença estrangeira no Brasil.<br />

4) é admissível a objeção de coisa julgada, impeditiva de processo idêntico no<br />

Brasil, fundada em sentença estrangeira independentemente de homologação.<br />

156 5) o reconhecimento da existência de uma sentença estrangeira é declaratório e pode<br />

ser feito por qualquer juiz, em qualquer grau de jurisdição, realizando operação<br />

lógica na análoga à do Supremo Tribunal Federal na ação de homologação;<br />

(…)<br />

(…)<br />

8) são homologáveis as sentenças finais proferidas em processo cautelar.<br />

12) a fixação da competência internacional brasileira decorre de ato unilateral,<br />

devendo entender-se como incompetente o poder jurisdicional estrangeiro, para fins<br />

do n° II do art. 212 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal nos casos<br />

seguintes: a) se a ação se insere entre os casos de competência exclusiva da<br />

autoridade judiciária brasileira segundo o art. 89 do Código de Processo Civil; b)<br />

quando não houver nenhuma conexão, de caráter objetivo ou subjetivo, da lide com<br />

o país prolator da sentença.<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>


<strong>GRECO</strong> <strong>FILHO</strong>. Homologação de Sentença Estrangeira p. 23<br />

<strong>Fichamento</strong> <strong>Antenor</strong> <strong>Madruga</strong>

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