0 - Gulbenkian Música - Fundação Calouste Gulbenkian
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ABERTURAS, INTERMEZZI E DANÇAS TEATRAIS<br />
DO BARROCO FRANCÊS<br />
O dealbar do século XVII trouxe consigo o<br />
nascimento da Ópera, indelevelmente marcado<br />
pela fértil tradição italiana dos interlúdios músicodramáticos<br />
de temática pastoral, alegórica ou<br />
mitológica, que desempenhavam uma função de<br />
entretenimento no decurso das peças teatrais.<br />
Usufruindo de uma grande popularidade desde a<br />
Renascença, os intermezzi incorporavam, a par<br />
com o discurso falado, o canto e a música instrumental,<br />
o que esteve na origem da constituição de<br />
uma vasta produção musical, associada à esfera<br />
teatral e constituída por madrigais, motetes, ballets,<br />
aberturas e danças instrumentais, a qual é, em<br />
parte, objecto do presente programa. Os exemplos<br />
mais antigos são da autoria de Giulio Abondante<br />
(fl. 1546-1587) e Jacomo de Gorzanis (ca.1520ca.1579),<br />
dois destacados representantes da literatura<br />
para o alaúde em Itália nos meados do século<br />
XVI.<br />
Muito embora a música desempenhasse um<br />
papel autónomo e desligado da acção dramática,<br />
no seio dos intermezzi, foi a sua convivência<br />
estreita com a palavra e com a representação de<br />
emoções o fundamento embrionário da Ópera.<br />
Contando-se entre os mais célebres intermezzi,<br />
encontram-se os seis que foram apresentados em<br />
Florença no ano de 1589, por ocasião do casamento<br />
do Duque Ferdinando de Medici com D.<br />
Cristina de Lorena. Para a realização do espectáculo,<br />
emoldurado por cenários sumptuosos e dispendiosa<br />
maquinaria de palco, contribuíram algumas<br />
das personalidades mais destacadas do<br />
panorama literário e artístico da época, como o<br />
mecenas Giovanni Bardi (1534-1612), responsável<br />
pela elaboração dos textos, em conjunto com<br />
Ottavio Rinuccini e Laura Guidiccioni, e os compositores<br />
Christofano Malvezzi (†1599), e Luca<br />
Marenzio (ca. 1553-1599). Estes últimos, distintos<br />
representantes do Madrigal maneirista, escreveram<br />
a maior parte da música que contou ainda<br />
com colaborações pontuais de Jacopo Peri (1561-<br />
XIX Jornadas <strong>Gulbenkian</strong> de Mús ica Antiga [ 50 ]<br />
1633), Antonio Archilei (ca. 1550-1612),<br />
Giovanni Bardi, Giulio Caccini (ca. 1548-1618) e<br />
do supervisor musical do evento, Emilio Cavalieri<br />
(ca.1550-1602). Do vasto leque de géneros abordados<br />
ao longo dos seis intermezzi, que vão desde<br />
a canção solística de contornos ornamentados,<br />
acompanhada pelo chitarrone, aos imponentes<br />
madrigais policorais, em que participam sessenta<br />
cantores e pelo menos vinte e quatro instrumentos,<br />
fazem parte as sinfonias instrumentais, das<br />
quais serão ouvidos exemplos da autoria de<br />
Malvezzi e Marenzio. Estas obras destinavam-se a<br />
introduzir um intermedio ou a acompanhar a<br />
mudança de cenário, sendo executadas por conjuntos<br />
extremamente diversificados, constituídos,<br />
entre outros instrumentos, por flautas, cornetas,<br />
sacabuxas, violinos, violas da gamba, mandoras,<br />
alaúdes, guitarras e saltérios, segundo a prática<br />
renascentista. O uso desta instrumentária viria<br />
ainda a reflectir-se nas primeiras óperas, muito<br />
particularmente no O r f e o de Claudio Monteverdi<br />
(1567-1643), estreado em Mântua, a 24 de<br />
Fevereiro de 1607, de onde provém a Sinfonia<br />
M o r e s c a . Ao longo das mais de três décadas que<br />
decorreram entre a composição das primeiras<br />
óperas de Monteverdi e do que constitui o<br />
corolário da sua produção dramática, surgido a<br />
partir de 1640, a corrente impulsionadora do<br />
“dramma per musica” deslocou-se de Florença<br />
para Roma, com o protagonismo crescente de<br />
compositores como Domenico Mazzocchi (1592-<br />
1665), Stefano Landi (ca. 1586-1639) e Luigi<br />
Rossi (1598-1653), ao mesmo tempo que as inovações<br />
estilísticas italianas se estendiam a toda a<br />
Europa. Rossi contribuiu significativamente para a<br />
projecção do idioma italiano fora de Itália, e a sua<br />
ópera O r f e o (1647), foi apresentada com grande<br />
sucesso na corte francesa a convite do primeiroministro<br />
Jules Mazarin. Apesar de contestada<br />
pelos racionalistas da tradição clássica francesa, a<br />
música italiana teve reflexos duradouros na pro-