1 relações entre a construção imagética de “i died for ... - Unesp
1 relações entre a construção imagética de “i died for ... - Unesp
1 relações entre a construção imagética de “i died for ... - Unesp
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
ANAIS DO X SEL – SEMINÁRIO DE ESTUDOS LITERÁRIOS: “Cultura e Representação”<br />
Além disso, a palavra kinsmen, utilizada no verso 9 do poema original, sugere essa oposição<br />
feminino/masculino porque se refere especificamente a um membro da família que seja<br />
masculino. Assim, confinada neste i<strong>de</strong>al feminino, sem autonomia ou po<strong>de</strong>res, o “anjo<br />
doméstico” se assemelha a um objeto <strong>de</strong> arte a ser contemplado, sem vida própria e, portanto,<br />
morto para e pela beleza.<br />
Nesse sentido, o que po<strong>de</strong>ria sugerir a equivalência <strong>entre</strong> beleza e verda<strong>de</strong><br />
estabelecida pelo interlocutor do eu-lírico nos versos 7 e 8? Por um lado, essa equivalência<br />
parece afirmar que, se os dois conceitos são iguais, a obediência ao i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> beleza e a busca<br />
por atingi-lo são legítimos, mas, por outro lado, po<strong>de</strong>mos enten<strong>de</strong>r que, sendo iguais, os limites<br />
<strong>entre</strong> um e outro e, portanto, <strong>entre</strong> o feminino em sua obediência e o masculino em sua<br />
dominação, estão <strong>de</strong>sfeitos.<br />
Uma segunda leitura do mesmo poema nos leva a relacionar a beleza, causa da morte<br />
do eu-lírico, com a busca pela perfeição estética em arte. É preciso abrir um parêntese e<br />
relembrar que a <strong>for</strong>mação <strong>de</strong> Emily Dickinson e sua produção literária se <strong>de</strong>ram durante o<br />
Romantismo, mas a poeta é consi<strong>de</strong>rada uma precursora da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> poética em vista <strong>de</strong><br />
suas inovações rítmicas, métricas e temáticas. Entretanto, como se sabe, a poeta produziu seus<br />
mais <strong>de</strong> 1.700 poemas estando reclusa, por sua própria vonta<strong>de</strong>, na casa <strong>de</strong> seu pai. Desse<br />
modo, Dickinson “morreu” para a socieda<strong>de</strong> em favor <strong>de</strong> sua arte, escolhendo o confinamento<br />
para chegar à liberda<strong>de</strong> poética. O eu-lírico reflete, por conseguinte, essa busca do artista pela<br />
perfeição estética, ainda que isso o leve à morte, vista aqui como metá<strong>for</strong>a do árduo trabalho<br />
que uma composição artística exige.<br />
Diante <strong>de</strong>ssa proposta <strong>de</strong> leitura, a equivalência <strong>entre</strong> beleza e verda<strong>de</strong> agora assume<br />
novos significados. É possível afirmar, por exemplo, que nem tudo o que consi<strong>de</strong>ramos belo em<br />
arte correspon<strong>de</strong> à realida<strong>de</strong>, mas a afirmação no poema <strong>de</strong> que beleza e verda<strong>de</strong> se referem ao<br />
mesmo conceito parece reconhecer e justificar a busca do artista por seu i<strong>de</strong>al estético. Por<br />
outro lado, po<strong>de</strong>mos relacionar, <strong>de</strong> maneira bem geral, beleza com poesia, por seu trabalho<br />
estético com a palavra, e verda<strong>de</strong> com prosa, por sua objetivida<strong>de</strong> e linearida<strong>de</strong>. Nesse caso,<br />
teríamos a i<strong>de</strong>ntificação <strong>entre</strong> os dois conceitos como um rompimento dos limites <strong>entre</strong> esses<br />
gêneros, que é um traço da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> literária e que se evi<strong>de</strong>ncia, por exemplo, na inserção<br />
do diálogo, nos versos livres e também no caráter narrativo do poema.<br />
A imagem do confinamento se faz visível para o leitor ao associarmos, portanto, a<br />
situação <strong>de</strong>scrita no poema e vivenciada pelo eu-lírico (texto) com o contexto social e literário<br />
8