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Interpretando o espaço na literatura de temática ... - ppgel/ileel/ufu

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Revista Eletrônica <strong>de</strong> Ciências Huma<strong>na</strong>s, Letras e Artes<br />

<strong>de</strong>scritos, se comparados com as <strong>de</strong>mais <strong>na</strong>rrativas da obra, <strong>de</strong>ixando sugestivamente pistas que<br />

são associadas ao <strong>espaço</strong> da vivência da relação homoerótica dos perso<strong>na</strong>gens, como discutimos<br />

adiante.<br />

Em Esquema F, os perso<strong>na</strong>gens (um homem e um garoto) encontram-se num <strong>espaço</strong><br />

fechado e escondido do olhar do pai do menino, que representa a repressão, os valores morais<br />

que impe<strong>de</strong>m o garoto <strong>de</strong> “travar-se” com seu objeto <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejo, o falo (SOUZA, 2007, p. 391).<br />

Diante <strong>de</strong>sse temor, o homem se reveste do papel do pai e or<strong>de</strong><strong>na</strong> que o “molequinho gostoso”<br />

(p. 74) o obe<strong>de</strong>ça, “<strong>de</strong>scendo sua boca ao pau <strong>de</strong>le” (p.74) e, assim, <strong>na</strong>quele ambiente, inicia o<br />

enlace <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> uma relação aparentemente pedófila:<br />

No <strong>espaço</strong> mais apertado daquela loja, no fundo, bem ao fundo, numa sala escura,<br />

um pouco vazia, um pouco suja, um pouco úmida. Numa sala no fim daquela loja,<br />

como vias <strong>de</strong> <strong>de</strong>spejo, como acesso a expulsão <strong>de</strong> <strong>de</strong>tritos Ele e ele. Ambos<br />

<strong>na</strong>vegando um barco cujo <strong>de</strong>stino era um porto <strong>de</strong> sujeira. (SILVA, 2006, p. 76)<br />

Nesse contexto, o “caráter” espacial parece <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>r a relação homoerótica que ali se<br />

<strong>de</strong>senvolve. O ambiente caracterizado como sujo e vazio permite a interpretação <strong>de</strong> que a<br />

relação entre ambos recebe esse mesmo atributo negativo, “um porto <strong>de</strong> sujeira”. Após a relação<br />

sexual, o estado da sala também é <strong>de</strong>scrito negativamente pelo <strong>na</strong>rrador: “No chão, uma porção<br />

<strong>de</strong> bosta misturada a sangue e sêmen. O cheiro <strong>de</strong> merda já impreg<strong>na</strong>va o ar daquele ambiente<br />

[...]” (SILVA, 2006, p. 79). Em seguida, o homem e o menino são flagrados pelo pai do último; o<br />

primeiro foge, <strong>de</strong>ixando pai e filho em uma situação embaraçosa. Essa última <strong>de</strong>scrição é<br />

semelhante à <strong>de</strong> O segredo <strong>de</strong> Brokeback Mountain (2006), quando é <strong>na</strong>rrado o estado do<br />

quarto <strong>de</strong> motel, após o reencontro amoroso dos dois vaqueiros: “O quarto fedia a sêmen,<br />

fumaça, suor e uísque [...]” (PROULX, 2006, p. 30).<br />

Espaço recluso também é <strong>de</strong>scrito em Esquema N. Dotado <strong>de</strong> a<strong>na</strong>colutos, o texto conta<br />

<strong>de</strong> um rapaz que ao chegar a um bar é ligeiramente conduzido pelo balconista, por força do<br />

<strong>de</strong>sejo, ao banheiro do estabelecimento, um ambiente sujo:<br />

[...] bem lá <strong>de</strong>ntro havia um banheiro imundo o vaso sanitário estava saturado <strong>de</strong><br />

merda esborrotava <strong>na</strong>quela catinga imunda <strong>de</strong> muitos cus cagões que por ali<br />

tinham cagado o mijo dos bêbados corria solto pelo chão já manchado <strong>de</strong> cálcio<br />

petrificado sal e branco sob o líquido amarelecido e podre que escorria dos poços<br />

<strong>de</strong> uri<strong>na</strong>s que se acumulavam ali [...] (SILVA, 2006, p. 94-5)<br />

Naquele lugar, o eu-<strong>na</strong>rrador envolve-se em <strong>de</strong>sejos com o homem, que é tão sujo<br />

quanto o ambiente que parece <strong>de</strong>negrir a perso<strong>na</strong>gem, mas ao mesmo tempo “contribuía para<br />

tudo dar certo” (SILVA, 2006, p. 95). A relação se dá entre a dicotomia sexo/amor, sujo/limpo.<br />

Os elementos paisagísticos parecem realmente afirmar que além <strong>de</strong> caracterizar aquele encontro<br />

como proibido e secreto também o adjetiva como sujo, assim como o ambiente no qual ele<br />

ocorre, engendrando um discurso preconceituoso, bastante visível no cotidiano <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>s<br />

ainda remanescentes dos i<strong>de</strong>ais heterossexuais e machistas como a brasileira: o <strong>de</strong> que a relação<br />

gay é “suja”, porque pecaminosa ou anti<strong>na</strong>tural.<br />

De todas as histórias, é em ...Crime perfeito não <strong>de</strong>ixa suspeito que o <strong>espaço</strong> adquire<br />

projeção mais relevante, não servindo ape<strong>na</strong>s para situar o exercício do sexo entre as<br />

A MARgem - Estudos, Uberlândia - MG, ano 2, n. 3, p. 45-55, jan./jun. 2009<br />

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