Luis Washington Vita - Curso Independente de Filosofia
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to que “tem jus a um lugar cimeiro, ao lado <strong>de</strong> Verney, como lúcido e fervoroso representante<br />
do Iluminismo em Portugal”. Essa curiosa figura do Brasil colonial nasceu em<br />
São Paulo, on<strong>de</strong> viveu os primeiros onze anos <strong>de</strong> sua vida, tendo aqui aprendido, com<br />
os jesuítas a ler e a amar a leitura, a escrever e a amar as letras clássicas. E também aqui<br />
apren<strong>de</strong>u os rudimentos das Ciências Humanas e Divinas, que iriam ocupar toda a sua<br />
vida <strong>de</strong> misantropo e <strong>de</strong> meditativo, o que levou Cruz Costa a caracterizá-lo como “um<br />
moralista pessimista e <strong>de</strong>sencantado, assim uma espécie <strong>de</strong> ‘libertino’ ranzinza, vivendo<br />
em um meio fanático e beato”.<br />
Depois <strong>de</strong> transitar por Coimbra, on<strong>de</strong> se licenciou em Artes (<strong>de</strong>nominação <strong>de</strong><br />
estudos propedêuticos <strong>de</strong> <strong>Filosofia</strong>), partiu para Paris on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>dicou, <strong>de</strong> modo particular,<br />
ao estudo das Ciências Naturais, da Matemática e do Hebraico. Teve os mais famosos<br />
professores do tempo nessas matérias, tais como Godin, Grosse e Phourmond, participando,<br />
ao mesmo tempo, da gran<strong>de</strong> agitação <strong>de</strong> idéias que então se processava no<br />
mundo europeu. De sua lavra literária restam duas obras meritórias: Reflexões Sobre a<br />
Vaida<strong>de</strong> dos Homens (1752) e Problemas <strong>de</strong> Arquitetura Civil (publicado postumamente<br />
por iniciativa <strong>de</strong> seu filho Manuel Inácio em 1770).<br />
O que era a <strong>Filosofia</strong> no Brasil por essa época po<strong>de</strong> ser perfeitamente verificável<br />
graças a Eduardo Frieiro que em seu livro O Diabo na Livraria do Cônego, analisa o rol<br />
dos livros do padre inconfi<strong>de</strong>nte Luís Vieira da Silva, por sinal antigo professor <strong>de</strong> <strong>Filosofia</strong><br />
e, segundo Alberto Faria, “a maior ilustração colonial da época”. No auto <strong>de</strong> seqüestro<br />
da livraria do ilustre cônego, po<strong>de</strong>m ser encontradas várias obras <strong>de</strong> <strong>Filosofia</strong>,<br />
Metafísica e Lógica: a Summa theologica, <strong>de</strong> Santo Tomás <strong>de</strong> Aquino, a Philosophia<br />
peripatetica, <strong>de</strong> Mayr, os Elémentes <strong>de</strong> métaphysique, do jesuíta Du Phanjas, a Lógica,<br />
<strong>de</strong> Verney, as Disputationes metaphysicae, do jesuíta Silvestre Aranha, a Metaphysica e<br />
a Lógica, <strong>de</strong> Musschenbroeck, os Elementos Metafísicos, <strong>de</strong> Brescia, o Compendium<br />
philosophicum theologicum, <strong>de</strong> Manuel Inácio Coutinho e um manuscrito <strong>de</strong> “postilas<br />
<strong>de</strong> <strong>Filosofia</strong>”. E também obras afins da <strong>Filosofia</strong>, como os clássicos franceses, notadamente<br />
Voltaire, Bossuet, Montesquieu, Descartes (através <strong>de</strong> sua Geometria), a tradução<br />
francesa da História da dinastia dos Tudors, <strong>de</strong> Hume etc.<br />
Sem dúvida, a Colônia então vivia numa estupenda apatia espiritual. A educação<br />
pouco progredira e pior estava com a expulsão dos jesuítas. Os conhecimentos dos eclesiásticos<br />
limitavam-se, geralmente, a um mau latim, e o indivíduo feliz que reunia o<br />
conhecimento <strong>de</strong>ste e do francês, conforme afirma Armitage, era olhado como um gênio<br />
raro, digno <strong>de</strong> ser visto e ouvido. Ao contrário da América espanhola, que, conheceu<br />
muito cedo, mal se firmara a Conquista, a imprensa e o ensino universitário, não havia<br />
em todo o Brasil uma só tipografia, e a nossa Universida<strong>de</strong> data pouco mais <strong>de</strong> 30 anos...<br />
O quadro geral era esse, numa visão <strong>de</strong> conjunto. Mas havia, aqui e ali, pequenos<br />
núcleos <strong>de</strong> homens instruídos ou ávidos <strong>de</strong> instrução, mais ou menos contagiados<br />
do “furor <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r” e da “febre <strong>de</strong> inteligência”, que caracterizam a última meta<strong>de</strong><br />
do século XVIII, o por sinal chamado “século educador”. Claro está que as diligentes<br />
autorida<strong>de</strong>s coloniais opunham obstáculos à entrada <strong>de</strong> livros no Brasil, o que entretanto<br />
não impedia que tais escritos fossem lidos e até às vezes muito lidos, como comprovam<br />
as livrarias dos inconfi<strong>de</strong>ntes que atestam um índice <strong>de</strong> ilustração muito adiantado para<br />
o meio em que viviam.<br />
Nesse sentido, referindo-se ao atraso intelectual dos brasileiros em fins do século<br />
XVIII e princípios do seguinte, disse o historiador Armitage que “as Histórias da Grécia<br />
e Roma, o Contrato Social <strong>de</strong> Rousseau e alguns volumes dos escritos <strong>de</strong> Voltaire e do<br />
Aba<strong>de</strong> Reynal, que haviam escapado à vigilância das autorida<strong>de</strong>s, formavam as únicas<br />
fontes <strong>de</strong> instrução”. Comentando esse passo, diz Eduardo Frieiro: “Lia-se Rousseau,<br />
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