O vermelho e o negro: raça e gênero na universidade brasileira
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por sexo: em geral, carreiras mais masculi<strong>na</strong>s têm uma participação menor de pretos e<br />
pardos e carreiras mais femini<strong>na</strong>s, uma participação maior desses grupos. Este texto<br />
então confirma achados de estudos recentes que têm apontado para a segmentação<br />
desse mercado universitário tanto para as mulheres [Bourdieu (1999)] quanto para os<br />
<strong>negro</strong>s [Teixeira(1998), Queiroz (2000) e Guimarães e Prandi (2001)].<br />
O aumento da escolaridade femini<strong>na</strong> e o de pretos e pardos seguiram linhas<br />
temporais muito semelhantes com um mesmo padrão de seleção social e<br />
hierarquização nos moldes dos determi<strong>na</strong>ntes socioeconômicos constatados por<br />
Ribeiro e Klein (1982) nos anos 1980. O que se conclui é que sim, existe uma certa<br />
coincidência entre os caminhos de acesso das mulheres e dos grupos de cor/<strong>raça</strong><br />
menos privilegiados. Essas observações são consistentes também com o fato de o<br />
maior avanço <strong>na</strong>s últimas décadas ter sido mais expressivo entre as mulheres pretas e<br />
pardas do que entre os homens do mesmo grupo racial.<br />
Algumas carreiras são exceções para essa regra, tanto entre as mais femini<strong>na</strong>s<br />
como no outro extremo, entre as mais masculi<strong>na</strong>s. Entre as mais femini<strong>na</strong>s, a maior<br />
inserção relativa de pretos e pardos se dá em Enfermagem, Geografia e História.<br />
Entre as mais masculi<strong>na</strong>s esta maior inserção se dá <strong>na</strong>s carreiras de Teologia e militar.<br />
É interessante notar que essas duas carreiras não se enquadram dentro da cadeia<br />
produtiva capitalista stricto sensu, mas dentro do mercado de bens simbólicos.<br />
Geografia e História são carreiras voltadas para o ensino e, portanto, seguem a mesma<br />
lógica do mercado de bens simbólicos, com a vantagem adicio<strong>na</strong>l de terem uma<br />
clientela cativa, o alu<strong>na</strong>do, por oposição a profissões liberais <strong>na</strong>s quais a clientela<br />
precisa ser conquistada.<br />
Os caminhos que representam exceções para os homens pretos e pardos são os<br />
mesmos considerados por Julien Sorel <strong>na</strong> obra de Stendhal O <strong>vermelho</strong> (carreira<br />
militar — Defesa Nacio<strong>na</strong>l) e o <strong>negro</strong> (carreira eclesiástica — Teologia):<br />
“Julien não passava, talvez, uma hora do seu dia sem dizer-se que Bo<strong>na</strong>parte,<br />
tenente obscuro e sem fortu<strong>na</strong>, fizera-se o senhor do mundo com sua espada. (...)<br />
Quando Bo<strong>na</strong>parte fez que falassem dele, a França tinha medo de ser invadida; o<br />
mérito militar era necessário e estava em moda. Hoje, vemos padres de quarenta anos<br />
com rendimentos anuais de cem mil francos, isto é, três vezes mais que os famosos<br />
generais da divisão de Napoleão. Eles precisam de pessoas que os apóiem. (...)Preciso<br />
ser Padre” [Stendhal (2002, p. 34-35)].<br />
36 texto para discussão | 1052 | out 2004