Concepção e imortalidade da alma em Platão ... - Mirabilia
Concepção e imortalidade da alma em Platão ... - Mirabilia
Concepção e imortalidade da alma em Platão ... - Mirabilia
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
COSTA, Ricardo <strong>da</strong> (coord.). <strong>Mirabilia</strong> 11<br />
T<strong>em</strong>po e Eterni<strong>da</strong>de na I<strong>da</strong>de Média<br />
Ti<strong>em</strong>po y Eterni<strong>da</strong>d en la E<strong>da</strong>d Media – Time and Eternity in the Middle Ages<br />
Jun-Dez 2010/ISSN 1676-5818<br />
Nota-se que não são os deuses que determinam o destino de ca<strong>da</strong> <strong>alma</strong>, mas é<br />
ca<strong>da</strong> um que escolhe o seu. <strong>Platão</strong> revoluciona e tira dos deuses e <strong>da</strong><br />
Necessi<strong>da</strong>de a responsabili<strong>da</strong>de sobre o destino <strong>da</strong>s <strong>alma</strong>s, tanto que os<br />
“paradigmas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>” não são determinados, mas recomen<strong>da</strong>dos às <strong>alma</strong>s. Eis<br />
a passag<strong>em</strong> que descreve a proposição e escolha dos destinos:<br />
Segui<strong>da</strong>mente, dispôs no solo, diante deles, os modelos de vi<strong>da</strong>s, <strong>em</strong> número<br />
muito mais elevado do que o dos presentes. Havia-os de to<strong>da</strong>s as espécies:<br />
vi<strong>da</strong>s de todos os animais, e b<strong>em</strong> assim de todos os seres humanos. [...] Ora,<br />
então, anunciou o mensageiro do além, o profeta falou deste modo: Mesmo<br />
para qu<strong>em</strong> vier <strong>em</strong> último lugar, se escolher com inteligência e viver<br />
honestamente, espera-o uma vi<strong>da</strong> apetecível e não desgraça<strong>da</strong>. N<strong>em</strong> o primeiro<br />
deixe de escolher com prudência, n<strong>em</strong> o último com corag<strong>em</strong>. 79<br />
O sentido desse relato está no fato de atribuir à <strong>alma</strong> a escolha do seu destino,<br />
de forma que as pressuposições de ca<strong>da</strong> indivíduo também pod<strong>em</strong> interferir<br />
na opção. Em segui<strong>da</strong>, o Ateniense apresenta alguns modelos de vi<strong>da</strong> e, após a<br />
mensag<strong>em</strong> do profeta, a escolha <strong>da</strong>s <strong>alma</strong>s e seus destinos, de forma que até<br />
<strong>alma</strong>s vin<strong>da</strong>s do céu deixavam-se levar por aparências de vi<strong>da</strong>s boas, além de<br />
relatar as escolhas de ilustres personagens. Na seqüência é narrado o fim do<br />
relato:<br />
Assim que to<strong>da</strong>s as <strong>alma</strong>s escolheram as suas vi<strong>da</strong>s, avançaram, pela ord<strong>em</strong> <strong>da</strong><br />
sorte que lhes coubera, para junto de Láquesis. Esta man<strong>da</strong>va a ca<strong>da</strong> uma o<br />
gênio que preferira para guar<strong>da</strong>r a sua vi<strong>da</strong> e fazer cumprir o que escolhera. [...]<br />
Quando já entardecia, acamparam junto do Rio Ameles, cuja água nenhum<br />
vaso pode conservar. To<strong>da</strong>s são força<strong>da</strong>s a beber uma certa quanti<strong>da</strong>de dessa<br />
água, mas aquelas a qu<strong>em</strong> a reflexão não salvaguar<strong>da</strong> beb<strong>em</strong> mais do que a<br />
medi<strong>da</strong>. Enquanto se bebe, esquece-se de tudo. 80<br />
Por fim, <strong>Platão</strong> relata que Er foi impedido de beber a água do rio do<br />
esquecimento e escreve que se deve buscar o alto a fim de alcançar a felici<strong>da</strong>de<br />
após a viag<strong>em</strong> de mil anos. A escolha depende do conhecimento <strong>da</strong>s <strong>alma</strong>s, ou<br />
seja, <strong>da</strong> filosofia, de forma que esta ciência salva <strong>em</strong> qualquer dos dois<br />
mundos, o que dá sentido a vi<strong>da</strong> no mundo sensível é o destino escatológico<br />
<strong>da</strong> <strong>alma</strong>, de forma que a vivência corpórea t<strong>em</strong> sentido somente <strong>em</strong> relação à<br />
ideal.<br />
Mas como se <strong>da</strong>ria a reencarnação e a existência <strong>da</strong> <strong>alma</strong> no mundo inteligível<br />
se a psyche fosse mortal? Aqui entra a centrali<strong>da</strong>de do probl<strong>em</strong>a acerca <strong>da</strong><br />
<strong>imortali<strong>da</strong>de</strong> <strong>da</strong> <strong>alma</strong>, que <strong>Platão</strong> apresentou especificamente no Fédon, mas<br />
79 Ibid<strong>em</strong>, p. 494-495.<br />
80 Ibid<strong>em</strong>, p. 499.<br />
41