Linguagem e sentido na Educação Infantil: uma ... - TV Brasil
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infantis e, a cada dia, o número de crian-<br />
ças vivendo em absoluta pobreza aumenta<br />
e não se consegue tirá-las das situações de<br />
risco e violência; discutem-se os direitos da<br />
criança, mas não se criam condições para as<br />
suas garantias. E assim se continua olhan-<br />
do a criança como o futuro do mundo, num<br />
presente de opressão.<br />
Para Sarmento (In: Delgado e Muller, 2006,<br />
p.19) “a criança está no ‘entre-lugar’ de <strong>uma</strong><br />
condição geracio<strong>na</strong>l em transformação,<br />
combi<strong>na</strong>ndo em cada momento concreto<br />
um passado e um futuro que se fundem, por<br />
vezes de forma caótica e através de impul-<br />
sos contraditórios”. Nesta perspectiva, não<br />
cabe mais pensar a criança em preparação<br />
para o futuro, mas como um lugar de fusão<br />
de tempos – um entre-lugar. O que significa<br />
problematizar o seu lugar <strong>na</strong> sociedade e as<br />
relações que se estabelecem entre adultos e<br />
crianças. A ideia de entre-lugar destaca a im-<br />
portância do presente e do que faz <strong>sentido</strong><br />
para as crianças hoje, à qualidade das inte-<br />
rações que se estabelecem no aqui e agora.<br />
Bartolomeu traz memórias de <strong>uma</strong> mãe<br />
sensível às especificidades das crianças, que<br />
brincava com os filhos, seja para encurtar<br />
caminhos, correndo <strong>na</strong> frente; seja fazendo<br />
biscoitos, assando as formas dadas pelas<br />
crianças. Assim, num domingo entediado, a<br />
mãe inventa de pintar as galinhas para ima-<br />
gi<strong>na</strong>r castelos, <strong>na</strong> falta de carne faz do arroz<br />
com ovo e chuchu a bandeira do <strong>Brasil</strong>:<br />
Com anili<strong>na</strong> para doces a mãe coloria as<br />
águas do tanque, <strong>uma</strong> cor de cada vez,<br />
e mergulhava as alvas galinhas legornes<br />
em banho colorido: azul, verde, amare-<br />
lo, vermelho, roxo. Em pouco tempo o<br />
quintal, como por milagre, era pátio de<br />
castelo, povoado de aves-legornes ago-<br />
ra raras-desenhadas em livro de fadas.<br />
Ficava tudo encantamento. Não havia<br />
livro, mesmo aqueles vindos de muito<br />
longe, com histórias mais bonitas do<br />
que as que a mãe sabia fazer. Não era<br />
difícil para Antônio imagi<strong>na</strong>r-se príncipe<br />
e filho de mágicos (Queirós, 2004, p. 52).<br />
Foi assim brincando que ela ensinou os<br />
meninos a fazer e a comer a Bandeira<br />
Nacio<strong>na</strong>l, quando faltava carne. Ela ser-<br />
via pratos com chuchu verdinho – afoga-<br />
do com água de mi<strong>na</strong> – arroz e mais ovo<br />
frito, enquanto recomendava: está no<br />
prato o verde das montanhas. Se mistu-<br />
rar o arroz e a gema, vira ouro. O prato<br />
é esmaltado de azul. Está tudo pronto.<br />
(...) Então aquela bandeira fria passava<br />
a ser a coisa mais saborosa de todas as<br />
comidas. Saber e comer eram coisas jun-<br />
tas (Queirós, 2004, p. 57-58).<br />
A mãe que ficou <strong>na</strong> memória do menino é a<br />
que entra <strong>na</strong> brincadeira e brinca também,<br />
a mãe molhada da chuva que se deixou mo-<br />
lhar. Os episódios ressaltam o lugar ativo,<br />
participativo, do adulto em interação com<br />
as crianças; evidenciam a entrega do adul-<br />
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