O QUINZE Rachel de Queiroz Edição integral ... - OpenDrive
O QUINZE Rachel de Queiroz Edição integral ... - OpenDrive
O QUINZE Rachel de Queiroz Edição integral ... - OpenDrive
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
o - animal e a or<strong>de</strong>m do dinheiro para o Zacarias da Feira. Chico Bento<br />
saiu já com escuro.<br />
Lentamente o balançava<br />
- trote largo do cavalo.<br />
Ia e vinha na larga sela <strong>de</strong> campo, <strong>de</strong> arção redondo e gran<strong>de</strong>s capas<br />
bordadas.<br />
Pensava na troca. Umas reses tão famosas! Por um babau velho e<br />
cinquenta mil-réis <strong>de</strong><br />
volta! o que é a gente estar na <strong>de</strong>sgraça...<br />
Entrando na sala <strong>de</strong> jantar, Vicente encontrou todos à mesa.<br />
O Major indagou do negócio e o rapaz principiou a contar o que tinha<br />
feito.<br />
Dona Idalina o interrompeu:<br />
- Mas, criatura <strong>de</strong> Deus, o que é que você vai fazer com mais gado? Acha<br />
pouco o que já<br />
está no trato? Vicente parou <strong>de</strong> machucar o mugunzá:<br />
- Ora, mamãe, o pobre morrendo <strong>de</strong> precisão! Além disso, é gado <strong>de</strong> raça,<br />
filho do Hereford<br />
velho das Aroeiras... Garanto que escapa tudo...<br />
O Major, mexendo o café, aprovou:<br />
- Gadão bom... famoso... Conheço muito. Fez bem, meu filho. Escapa!<br />
5.<br />
Agora, ao Chico Bento, como único recurso, só restava arribar.<br />
Sem legume, sem serviço, sem meios <strong>de</strong> nenhuma espécie, não havia <strong>de</strong><br />
ficar morrendo <strong>de</strong><br />
fome, enquanto a seca durasse.<br />
Depois, o mundo é gran<strong>de</strong> e no Amazonas sempre há borracha...<br />
Alta noite, na camarinha fechada que uma lamparina moribunda alumiava<br />
mal, combinou<br />
com a mulher o plano <strong>de</strong> partida.<br />
Ela ouvia chorando, enxugando na varanda encarnada da re<strong>de</strong>, os olhos<br />
cegos <strong>de</strong> lágrimas.<br />
Chico Bento, na confiança do seu sonho, procurou animá-la, contando-lhe<br />
os mil casos <strong>de</strong><br />
retirantes enriquecidos no Norte.<br />
A voz lenta e cansada vibrava, erguia-se, parecia outra, abarcando<br />
projetos e ambições. E a<br />
imaginação esperançosa aplanava as estradas difíceis, esquecia<br />
sauda<strong>de</strong>s, fome e angústias,<br />
penetrava na sombra ver<strong>de</strong> do Amazonas, vencia a natureza bruta,<br />
dominava as feras e as<br />
visagens, fazia <strong>de</strong>le rico e vencedor.<br />
Cordulína ouvia, e abria o coração àquela esperança; mas correndo os<br />
olhos pelas pare<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> taipa, pelo canto on<strong>de</strong><br />
na redinha remendada o filho pequenino dormia, novamente sentiu um<br />
aperto <strong>de</strong> sauda<strong>de</strong>, e<br />
lastimou-se:<br />
- Mas, Chico, eu tenho tanta pena da minha barraquinha! On<strong>de</strong> é que a<br />
gente vai viver, por esse<br />
mundão <strong>de</strong> meu Deus?<br />
A voz dolente do vaqueiro novamente se ergueu em consolações e<br />
promessas:<br />
- Em todo pé <strong>de</strong> pau há um galho mo<strong>de</strong> a gente armar a tipóia... E com<br />
umas noites assim limpas até