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MARCAS QUE DEMARCAM - Repositório do ISCTE-IUL

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Por último, com o desenvolvimento da modernidade, os indivíduos tendem a<br />

conceptualizar-se como separa<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s outros, operação onde o corpo assume o papel de<br />

configuração material e perceptiva aos senti<strong>do</strong>s <strong>do</strong> próprio e <strong>do</strong>s que o rodeiam. A<br />

individualização <strong>do</strong> corpo repousa ainda sobre uma dinâmica colectiva de maior<br />

consciencialização e responsabilização de cada indivíduo sobre o seu próprio corpo,<br />

estruturan<strong>do</strong> uma nova economia psíquica que tende ao controlo íntimo das emoções, das<br />

maneiras e das aparências. Este é, um <strong>do</strong>s principais traços que marcam a cultura somática<br />

contemporânea, demarcan<strong>do</strong> a novidade da actual civilização <strong>do</strong> corpo relativamente ao<br />

passa<strong>do</strong>. Mas detenhamo-nos com mais minúcia sobre cada uma destas condições de<br />

emergência da hiper-visibilidade contemporânea <strong>do</strong> corpo.<br />

1.2. Socialização, racionalização e poderes coloniza<strong>do</strong>res <strong>do</strong> corpo<br />

O que vem ocorren<strong>do</strong> com o corpo pode ser compreendi<strong>do</strong> à luz <strong>do</strong> processo que Giddens<br />

designa de socialização da natureza (1995 [1990]), expressão que alude ao facto de certos<br />

fenómenos anteriormente ti<strong>do</strong>s como da<strong>do</strong>s da natureza serem, nas condições inauguradas pela<br />

modernidade, socialmente coloniza<strong>do</strong>s e reflexivamente projecta<strong>do</strong>s pelas suas instâncias de<br />

poder e de contra-poder, emancipan<strong>do</strong>-se progressivamente de uma aparente condição “natural”<br />

à medida que vão sen<strong>do</strong> constituí<strong>do</strong>s objecto de discussão, decisão e intervenção humana,<br />

sujeito a revisões constantes. Ora, o corpo, desde o século das Luzes, vem sen<strong>do</strong> efectivamente<br />

sujeito a um processo dessa natureza, gradualmente coloniza<strong>do</strong> pela ciência, medicina e,<br />

fundamentalmente, pela lógica capitalista de produção.<br />

Com a ascensão social da burguesia, emancipada <strong>do</strong> poder feudal, o corpo submerge na<br />

actividade de produção capitalista, vin<strong>do</strong> a ser instituí<strong>do</strong> como merca<strong>do</strong>ria, propriedade individual<br />

e privada com um destaca<strong>do</strong> valor de troca que começa por ser sobretu<strong>do</strong> cinética. Capitaliza<strong>do</strong><br />

enquanto instrumento de produção 14, como ferramenta produtora de força de trabalho, importa<br />

ao novo estabelecimento que o corpo seja racionaliza<strong>do</strong>, através <strong>do</strong> respectivo conhecimento,<br />

vigilância e disciplina, no senti<strong>do</strong> da promoção da sua máxima eficiência e rentabilidade laboral<br />

(Tucherman, 1999:138; Turner, 1997). Vai ser este o modelo de corporeidade imposto pela<br />

burguesia aos seus <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>s, corpos enérgicos e aliena<strong>do</strong>s que se trocam por um salário.<br />

14 Capitalização que é total no caso da figura <strong>do</strong> escravo, simplesmente considera<strong>do</strong> um corpo-ferramenta (Neves,<br />

2004:67), sem qualquer valor de troca, apenas com valor de uso.<br />

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