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PROBLEMAS NA PRODUÇÃO DO TEXTO JURÍDICO

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<strong>PROBLEMAS</strong> <strong>NA</strong> <strong>PRODUÇÃO</strong> <strong>DO</strong> <strong>TEXTO</strong> <strong>JURÍDICO</strong><br />

Vícios de Linguagem, Redundância e Ambiguidade<br />

Jorge da Silva Junior – Mestre em Letras e Ciências Humanas<br />

(www.profjorge.com.br)<br />

Como se sabe, a maior dificuldade para quase todos os brasileiros, no que<br />

tange a linguagem, é a produção de textos escritos: não é qualquer um que tem<br />

competência para desenvolver, às vezes, um texto simples como um aviso ou um<br />

bilhete. A Língua Portuguesa é considerada uma das mais difíceis do mundo e está aí<br />

o grande problema em lidar com ela. Porém, o linguista Noam Chomsky acredita que<br />

já nascemos com uma gramática interna que não nos permite cometer erros bárbaros<br />

que dificultam a comunicação. Para ele, por exemplo, uma criança que teve pouco<br />

contato com a Língua poderia cometer erros do tipo “mamãe, fazi totô”, porém, nunca<br />

cometeria erros do tipo: “Totô, fazi mamãe. O autor afirma que a criança nunca teve<br />

um professor de gramática dizendo como ele deveria usar o vocativo, o verbo<br />

transitivo direto e o objeto direto, mas a criança não comete esse tipo de erro. Então,<br />

como se percebe, o primeiro exemplo, apesar dos desvios, é de total compreensão,<br />

enquanto em relação ao segundo, a informação descamba para uma incoerência. É<br />

claro que só podemos relacionar as teorias do autor à comunicação oral, porque na<br />

comunicação escrita, encontramos desvios que deturpam por completo aquilo que se<br />

consideram enunciação.<br />

De qualquer forma, sabemos que para alguém que pretende utilizar a Língua<br />

apenas como meio de comunicação comum (coloquialismos, conversas cotidianas) as<br />

regras gramaticais não são de todo importante. Segundo o Linguista Ferdnand<br />

Saussure “O objetivo prioritário da Língua de qualquer nação é simplesmente<br />

estabelecer comunicação”. Porém para aqueles que de forma escrita ou oral têm como<br />

objetivo convencer ou persuadir 1 alguém, o conhecimento gramatical e textual é<br />

1 Segundo Perelman, é justamente pela análise dos diversos tipos de auditório possíveis que poderemos tomar<br />

posição quanto à distinção clássica entre convencimento e persuasão, no âmbito da qual se concebem os meios de<br />

convencer como racionais, logo, dirigidos ao entendimento e os meios de persuasão como irracionais, actuando<br />

directamente sobre a vontade. A persuasão seria pois a consequência natural de uma acção sobre a vontade<br />

(irracional) e o convencimento, o resultado ou efeito do acto de convencer (racional). Mas se, como sugere<br />

Perelman, analisarmos a questão pela óptica dos diversos meios de obter a adesão das mentes, forçoso será<br />

constatar que esta última é normalmente conseguida “por uma diversidade de procedimentos de prova que não<br />

podem reduzir-se nem aos meios utilizados em lógica formal nem à simples sugestão”. É o caso da educação, dos<br />

juízos de valor, das normas e de muitos outros domínios onde se julga impossível recorrer apenas aos meios de<br />

prova “puramente” racionais. Além disso, afigura-se igualmente muito problemática a possibilidade de determinar à<br />

partida quais os meios de prova convincentes e aqueles que o não são, segundo se dirijam ao entendimento ou à<br />

vontade, pois que, como se sabe, o homem não é constituído por faculdades completamente separadas. Acresce que


imprescindível. Essa imprescindibilidade pode ser direcionada para os profissionais<br />

da área do Direito, Administração, Comunicação Social, entre outros. Assim, para<br />

qualquer indivíduo que pretende, por meio da língua, não só comunicar, mas<br />

convencer alguém sobre alguma coisa, o estudo apurado das definições sobre<br />

textualidade e gramaticalidade é de extrema importância. Neste material, pretendemos<br />

abordar os principais problemas da produção de texto jurídico e argumentativo de<br />

uma forma geral, trabalhando tópicos como: vícios de linguagem, redundância e<br />

ambiguidade.<br />

1. VÍCIOS DE LINGUAGEM<br />

Segundo o autor e professor Evanildo Bechara, os vícios de linguagem são<br />

definidos como: “Solecismo que seria, segundo o autor um erro estrutural (ou<br />

sintático) que abrange "a concordância, a regência, a colocação e a má<br />

estruturação dos termos na oração que a torna incompreensível ou imprecisa a<br />

enunciação". Bem, nesse caso, não só a falta de compreensão é definida como uma<br />

espécie de vício de linguagem, mas sim a construção problemática do enunciado no<br />

que tange a gramaticalidade. Deve-se imaginar que o receptor de sua mensagem é um<br />

profundo conhecedor de gramática, assim como são praticamente todos os advogados<br />

e, qualquer falha gramatical, acarretaria na falta de valoração do seu enunciado<br />

fazendo com que o mesmo perdesse peso argumentativo; ora, como acreditar em uma<br />

pessoa que não sabe que não se pode colocar vírgula entre o sujeito e o predicado? É<br />

importante comentar que um enunciado claro, objetivo coerente e correto já é por si<br />

só o início de uma boa argumentação.<br />

Achamos por bem, apresentar alguns verbos e suas acepções neste tópico antes<br />

de darmos continuidade aos próximos comentários. Assim, segue que, segundo o<br />

linguista Adalberto J. Kazpary (1990: 60) alguns verbos são de extrema importância<br />

para a vida de quem lida com o Direito. Alguns desses verbos seguem abaixo:<br />

1. Arguir<br />

a) A defesa arguiu a sentença de injusta em suas razões de Apelação.<br />

b) A Contestação arguiu a incompetência do juiz para conhecer do pedido.<br />

“Aquele que argumenta não se dirige ao que consideramos como faculdades, como a razão, as emoções, a vontade.<br />

O orador dirige-se ao homem todo...”. Daí que a distinção entre persuasão e convencimento, quando centrada nos<br />

índices de confiabilidade e validação inerentes ao par racional/irracional, pareça nada poder vir a acrescentar à<br />

compreensão do acto retórico. (...)


c) O juiz arguiu, exaustivamente, a testemunha.<br />

Nos exemplos, o verbo arguir assume diferentes significados. No item "a", tem<br />

o sentido de acusar, tachar de, construindo-se como objeto direto e indireto (emprego<br />

da preposição de). Já o item "b" cuida das acepções alegar, apresentar como defesa<br />

alguma coisa (o sentido sempre guarda a idéia de oposição, podendo ser empregado<br />

quer como transitivo direto, quer como transitivo direto e indireto). Finalmente, o<br />

item "c" aponta o sentido de interrogar, inquirir, que aparece com a construção<br />

transitiva direta, podendo, ainda, representar a idéia de indagar alguém sobre alguma<br />

coisa.<br />

2. Carecer<br />

a) O autor carece de interesse para agir.<br />

b) A acusação carece de provas mais contundentes.<br />

No item "a", carecer significa ter falta de, enquanto o item "b" emprega o verbo<br />

para indicar a idéia de necessitar de, precisar de. Quanto ao emprego do verbo<br />

carecer, vale citar os Comentários à polêmica entre Rui Barbosa e Carneiro Ribeiro<br />

do preclaro mestre Artur de Almeida Tôrres (1959, p. 45) que registram as<br />

controvérsias em torno do verbo, em razão de Rui, no art. 18 do Projeto, ter proposto<br />

a substituição do verbo carecer, que assim figurava:<br />

"Carecem de aprovação do Governo Federal os estatutos ou compromissos de<br />

sociedades etc."<br />

Advertia o "Águia de Haia", que o verbo carecer só poderia ser usado em seu<br />

sentido originário, ou seja, não ter alguma coisa, ou dela ter falta. Por sua vez,<br />

Carneiro Ribeiro, em suas Ligeiras observações, lembrou que o sentido do verbo<br />

carecer não se limitava ao que lhe fora dado pelos clássicos antigos, admitindo o<br />

sentido de precisar ou de necessitar, abonando-se em exemplos de Vieira e Castilho<br />

Antônio. O implacável Rui, no entanto, vociferou em sua Réplica que não ignorava a<br />

existência deste sentido, "mas - acrescenta - são casos ainda mal abonados pelo uso<br />

geral da língua, desde os seus primeiros tempos até hoje".<br />

3. Implicar


a) A inércia da defesa implica a revelia do réu.<br />

b) Em suas Alegações Finais, a defesa alegou que a vítima sempre implicou com o<br />

réu.<br />

c) Conforme sobejamente demonstrado nos autos, o réu implicou-se em tráfico de<br />

entorpecentes.<br />

Atente-se às diferentes regências e sentidos do verbo implicar. No item "a",<br />

implicar significa acarretar, devendo ser repelida a preposição em virtude da<br />

transitividade direta do verbo nesta acepção. O item "b" exemplifica o sentido de "ter<br />

implicância", que é regido pela preposição com, não devendo ser empregado como<br />

pronominal, forma exclusiva do sentido constante do item "c", usado na acepção de<br />

envolver-se em.<br />

4. Preferir<br />

a) Na concorrência de vários pretendentes à remição, o que pode oferecer o maior<br />

preço preferirá.<br />

b) O credor cuja condição deriva de documento ou título de garantia prefere entre os<br />

quirografários.<br />

c) O crédito real prefere ao pessoal em qualquer espécie.<br />

d) A defesa preferiu alegar a legítima defesa a negar a autoria do crime.<br />

O verbo preferir é intransitivo no sentido de ter primazia, como se vê no item<br />

"a", emprego encontrado no art. 789 CPC, admitindo, ainda, as construções preferir<br />

entre e preferir a, itens "b" e "c", no mesmo sentido. Já o item "d" cuida do sentido de<br />

dar preferência, querer antes. Neste caso, há sempre a obrigatoriedade de colocar os<br />

elementos comparados sendo errônea a construção do tipo "Prefiro Direito<br />

Tributário", porque é preciso esclarecer em relação a que ocorre tal preferência. Vale<br />

lembrar ainda, que o sentido do verbo preferir "querer antes" repele advérbio de<br />

intensidade do tipo muito mais, porque seria um pleonasmo indesejável; também a<br />

forma a que é preferível à construção do que, cada vez mais frequente na linguagem<br />

jurídica.<br />

5. Ter


Consoante a gramática clássica, há diferença semântica do verbo ter se<br />

modificado pelas expressões de / que. Assim, ter que significa uma ação pretendida,<br />

mas não absolutamente necessária.<br />

O advogado tem que visitar seu cliente na prisão.<br />

Há um compromisso que não é absolutamente necessário.<br />

Todavia, ter de implica necessidade imperativa<br />

O advogado tem de visitar seu cliente na prisão.<br />

Verbos, como os listados acima, caso forem empregados com regência<br />

incorreta, acarreta em vício de linguagem tendo como principal problema a falta de<br />

clareza na maioria das vezes. Porém, além desses, Bechara define outros dois tipos de<br />

vícios: Barbarismo – que seria o erro no emprego de uma palavra e isso “Inclui o<br />

erro de pronúncia (ortoépia), de prosódia, de ortografia, de flexões, de significado, de<br />

palavras inexistentes na língua, de formação irregular de palavras”. Devido ao<br />

latinismo ainda muito utilizado no meio jurídico, muitos profissionais aplicam de<br />

forma errônea; esses erros revelam falta de domínio da língua: escrever frustar em<br />

lugar de frustrar, meretíssimo por meritíssimo, omissídio por homicídio, estrupo no<br />

lugar de estupro pode não ser perdoável na maioria dos casos.<br />

Para fechar esses básicos aspectos becharianos, o Estrangeirismo segundo o<br />

autor “seria o emprego de palavras expressões e construções alheias ao idioma que a<br />

ele chegam por empréstimos tomados de outra língua". A aceitabilidade de um termo<br />

estrangeiro em outro idioma é questão complexa, dependendo de diversos aspectos,<br />

como a existência ou não de termo correspondente na língua (necessidade de<br />

importação), o tipo e a destinação do texto em que o termo estrangeiro é usado, assim<br />

como concepções ideológico-culturais pessoais do produtor/leitor do texto. Logo,<br />

quando o estrangeirismo não é de domínio público, não se aconselha o seu uso.<br />

Construindo um diálogo entre autores, para o gramático Napoleão Mendes de<br />

Almeida, mais direcionado ao âmbito jurídico, alguns casos observados nos textos<br />

forenses decorrem de desatenção, merecendo destaque os derivados de vícios de<br />

linguagem, que "são palavras ou construções, que deturpam, desvirtuam ou<br />

dificultam a manifestação do pensamento". O autor, além dos casos definidos por<br />

Bechara, destaca os seguintes: arcaísmo - palavras ou expressões antiquadas, fora de


uso -, que soam ininteligíveis ao ouvido comum, às vezes levando o discurso ao<br />

ridículo, como utilizar heréu em lugar de herdeiro. Assim, palavras como:<br />

Outrossim (também), Quiçá (talvez), À guisa de (à maneira de), Magote (grande<br />

quantidade) devem ser evitadas.<br />

Um outro tipo de vício, o preciosismo, segundo o autor, segue na mesma<br />

linha, pois se constitui no requinte exagerado no falar e no escrever, empregando<br />

palavras não usuais, extravagantes. Caracteriza-se pelo desvio do padrão normal da<br />

linguagem, que foge à naturalidade do discurso, apresentando-se muito mais como um<br />

exibicionismo linguístico, de difícil compreensão, quando não cai nos desvãos do<br />

pedantismo. Uma das mais fortes razões que levam pessoas que se dedicam a outras<br />

atividades a acusarem de pedantismo os profissionais do direito. Há ainda, segundo<br />

Celso Cunha a cacofonia: junção de duas ou mais palavras que tem por consequência<br />

um som “estranho” na produção, principalmente, oral do enunciado. Como exemplo<br />

de cacofoinia, podemos citar casos clássicos como: A requerente recebeu o dinheiro<br />

como herdeira que é. Ou ainda, Antes do réu morar na cidade, vivia a tocar gado no<br />

sertão pernambucano.<br />

Partindo-se do princípio que o objetivo principal da língua é estabelecer<br />

comunicação, muitos gramáticos criticam, no âmbito jurídico, o chamado jargão ou<br />

juridiquês. Para Napoleão Mendes, por exemplo, vocabulário técnico não é o mesmo<br />

que jargão jurídico. O autor define da seguinte forma:<br />

O jargão é o conjunto de palavras próprias de uma profissão, mas que<br />

não constitui técnica. Ele é pedante, em geral arcaico, empolado e<br />

sem conteúdo: dizer "data vênia" é jargão; dizer "ingressar" em vez<br />

de "entrar" é jargão; dizer "nosocômio" em lugar de "hospital" é<br />

jargão; dizer que o fugitivo saiu em "desabalada carreira", ou que<br />

"claudica" em vez de "mancar", ou que "urge destacar a importância<br />

disto ou daquilo" é muito comum na seara jurídica, mas nada tem de<br />

técnico. Mero jargão.<br />

O autor acrescenta ainda mais um exemplo e comentários dizendo,<br />

[...] que o d. Juízo de V.Exa. omitiu-se acerca do que deveria se<br />

pronunciar, d.m.v., como se sustenta nas razões que se seguem:[...]<br />

O que será “d. Juízo de V.Exa”? Será que é uma homenagem à<br />

inteligência do juiz? Como disse Shakespeare – “Há mais coisas<br />

entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia”. Ademais,<br />

ninguém sabe informar, de fato, o que seja “D.M.V.”. Por


curiosidade, apenas para verificar, indaguei o que seria a possível<br />

sigla para alguns juízes – nem eles mesmos sabem. Quem dirá então<br />

o cidadão comum. Isso não é linguagem jurídica, mas é pura e<br />

simplesmente ERRO de língua portuguesa.<br />

No tocante a isso, o ministro Edson Vidigal, do Superior Tribunal de Justiça,<br />

[...] compara o “juridiquês” ao latim em missa, acobertando um<br />

mistério que amplia a distância entre a fé e o religioso; do mesmo<br />

modo, entre o cidadão e a lei. Ou seja, o uso da linguagem rebuscada,<br />

incompreensível para a maioria, seria também uma maneira de<br />

demonstração de poder e de manutenção do monopólio do<br />

conhecimento. (apud ALVARENGA, 2005)<br />

Assim, em alguns casos, pode-se afirmar que o juridiquês não é só o uso de<br />

arcaísmos, palavras rebuscadas, neologismos, latinismos e o uso inadequado da língua<br />

portuguesa, mas também contribui para falta de compreensão do enunciado. A<br />

ambiguidade é dos principais problemas encontrados em praticamente todos os tipos<br />

de texto. Antes de entrarmos no tópico ambiguidade, é importante analisarmos alguns<br />

enunciados que apresentam problemas de produção.<br />

2. AMBIGUIDADES<br />

Segundo o professor Marcelo Rosenthal, Ambiguidade “ocorre sempre que<br />

uma palavra admite duas ou mais leituras. Como ocorre nos enunciados abaixo:<br />

O julgamento do professor será amanhã.<br />

(não se sabe se o professor julgará ou será julgado).<br />

A menina assistiu ao incêndio do apartamento.<br />

(não se sabe se a menina estava na rua e viu um apartamento pegando fogo ou se a<br />

menina estava no apartamento e via qualquer outro lugar sendo incendiado.)<br />

O profissional do Direito, conquanto a ciência jurídica busque a univocidade em<br />

sua terminologia, convive com um sem-número de palavras polissêmicas e essa é uma<br />

das principais causas da ambiguidade em alguns enunciados.<br />

Exemplo clássico é o termo Justiça que tanto exprime a vontade de dar a cada um o<br />

que é seu, quanto significa as regras em lei previstas, e, ainda, o aparelhamento


político-jurídico destinado à aplicação da norma do caso concreto. Damião diz que,<br />

O vocábulo Justiça (do latim Justitia) provém de ius, jus que, por sua<br />

vez, é oriundo do sânscrito iu, cuja idéia expressava proteção,<br />

vínculo ou ordem. No Direito Romano, ojus não se identificava com<br />

a lex (lei), mas estendeu-se ao vocábulo direito em português, diritto<br />

em italiano, derecho em espanhol, droit em francês e recht em<br />

alemão, contaminando o sentido da aplicação da lei, porque ela busca<br />

o justo, tanto quanto o Direito procura pela Justiça. Inadequados são,<br />

pois, adjetivos comumente empregados nos fechos das peças<br />

processuais, e. g., lídima Justiça, porque só ocorre a aplicação da<br />

Justiça quando se declaram direitos devidos ao titular e a punição de<br />

quem não os respeita, sendo ela, desta sorte, sempre legítima. (P. 62)<br />

Outro exemplo de polissemia jurídica é a palavra agravo (do latim<br />

aggravare) com acepção de afrontar, ofender. Como corolário deste sentido, cabe<br />

desagravo ao ofendido, reparando-lhe a injúria feita. Na linguagem processual,<br />

porém, agravar é recurso interposto contra decisão interlocutória ou mesmo definitiva<br />

(neste último caso, quando não se decidiu sobre o mérito) que, por sua natureza, exige<br />

do agravante ser parte no feito. O desagravo, na hipótese, indica que o recurso foi<br />

provido, com o desfazimento do gravame praticado pelo juiz a quo.<br />

Analisemos os seguintes exemplos:<br />

a) A OAB desagravou o advogado Paulo Bernardes que, ao reclamar do<br />

impedimento a ele imposto de assistir ao Interrogatório do Réu, em causa patrocinada<br />

por um seu colega, recebeu do magistrado ordem de prisão.<br />

b) O réu agravou da decisão denegatória de pedido de acareação de<br />

testemunhas, formulado pela defesa na fase do art. 499 do CPp,em razão de<br />

declarações contraditórias prejudiciais ao conhecimento da verdade.<br />

Assim, entende-se por polissemia as várias possibilidades de interpretação<br />

para uma só palavra dependendo do contexto em que essa mesma é inserida.<br />

Bechara (p.568) diz que “devemos evitar as palavras que denotam mesma<br />

semântica das preposições que as acompanham.”


Ela conviveu com seu cônjuge durante vinte anos.<br />

Deveríamos incluir mais uma informação no documento.<br />

Concordo com as informações apresentadas até o momento.<br />

3. HOMÔNIMOS E PARÔNIMOS<br />

Muitas vezes temos dúvidas no uso de vocábulos distintos provocadas pela<br />

semelhança ou mesmo igualdade de pronúncia ou de grafia entre eles. É o caso dos<br />

fenômenos designados como “homonímia” e “paronímia”.<br />

A homonímia é a designação geral para os casos em que palavras de sentidos<br />

diferentes têm a mesma grafia (os homônimos homógrafos) ou a mesma pronúncia<br />

(os homônimos homófonos). Os homógrafos podem coincidir ou não na pronúncia,<br />

como nos exemplos: quarto (aposento) e quarto (ordinal), manga (fruta) e manga (de<br />

camisa), em que temos pronúncia idêntica; e apelo (pedido) e apelo (com e aberto, 1a<br />

pes. do sing. do pres. do ind. do verbo apelar), consolo (alívio) e consolo (com o<br />

aberto), 1a pes. do sing. do pres. do ind. do verbo consolar), com pronúncia diferente.<br />

Os homógrafos de idêntica pronúncia diferenciam-se pelo contexto em que são<br />

empregados. Não há dúvida, por exemplo, quanto ao emprego da palavra são nos três<br />

sentidos: a) verbo ser, 3a pes. do pl. do pres. do ind., b) saudável e c) santo.<br />

Palavras de grafia diferente e de pronúncia igual (homófonos) geram dúvidas<br />

ortográficas. Caso, por exemplo, de acento/assento, coser/cozer, dos prefixos ante-<br />

/anti-, etc. Aqui o contexto não é suficiente para resolver o problema, pois sabemos o<br />

sentido; a dúvida é de letra(s). Sempre que houver incerteza, consulte algum<br />

dicionário ou manual de ortografia.<br />

Já o termo paronímia designa o fenômeno que ocorre com palavras semelhantes<br />

(mas não idênticas) quanto à grafia ou à pronúncia. É fonte de muitas dúvidas, como<br />

entre descrição (ato de descrever) e discrição (qualidade de discreto), retificar<br />

(corrigir) e ratificar (confirmar).<br />

Como não interessa aqui aprofundar a discussão teórica da matéria,<br />

restringimo-nos a uma lista de palavras que com mais freqüência provocam dúvidas<br />

na elaboração de textos oficiais, com o cuidado de agregá-las em pares ou pequenos<br />

grupos formais.


Listamos a seguir algumas paronímias:<br />

Absolver: inocentar, relevar da culpa imputada: O júri absolveu o réu.<br />

Absorver: embeber em si, esgotar: O solo absorveu lentamente a água da chuva.<br />

Acerca de: sobre, a respeito de: No discurso, o Prefeito falou acerca de seus planos.<br />

A cerca de: a uma distância aproximada de: O anexo fica a cerca de trinta metros do<br />

prédio principal. Estamos a cerca de três meses das eleições.<br />

Há cerca de: faz aproximadamente (tanto tempo): Há cerca de um ano, tratamos de<br />

caso idêntico; existem aproximadamente: Há cerca de mil títulos no catálogo.<br />

Afim: que apresenta afinidade, semelhança, relação (de parentesco): Se o assunto era<br />

afim, por que não foi tratado no mesmo parágrafo?<br />

A fim de: para, com a finalidade de, com o fito de: O projeto foi encaminhado com<br />

quinze dias de antecedência a fim de permitir a necessária reflexão sobre sua<br />

pertinência.<br />

Aleatório: casual, fortuito, acidental.<br />

Alheatório: que alheia, alienante, que desvia ou perturba.<br />

Ao encontro de: para junto de; favorável a: Foi ao encontro dos colegas. O projeto<br />

veio ao encontro dos anseios dos trabalhadores.<br />

De encontro a: contra; em prejuízo de: O carro foi de encontro a um muro. O<br />

governo não apoiou a medida, pois vinha de encontro aos interesses dos menores.<br />

Aresto: acórdão, caso jurídico julgado: Neste caso, o aresto é irrecorrível.<br />

Arresto: apreensão judicial, embargo: Os bens do traficante preso foram todos<br />

arrestados.<br />

Atuar: agir, pôr em ação; pressionar.<br />

Autuar: lavrar um auto; processar.<br />

Auferir: obter, receber: Auferir lucros, vantagens.


Aferir: avaliar, cotejar, medir, conferir: Aferir valores, resultados.<br />

Cível: relativo à jurisdição dos tribunais civis.<br />

Civil: relativo ao cidadão; cortês, polido (daí civilidade); não militar nem eclesiástico.<br />

Contravenção: trangressão ou infração a normas estabelecidas.<br />

Contraversão: versão contrária, inversão.<br />

Descriminar: absolver de crime, tirar a culpa de.<br />

Discriminar: separar, discernir.<br />

Estância: lugar onde se está, morada, recinto.<br />

Instância: solicitação, pedido, rogo; foro, jurisdição, juízo.<br />

Judicial: que tem origem no Poder Judiciário ou que perante ele se realiza.<br />

Judiciário: relativo ao direito processual ou à organização da Justiça.<br />

Magistrado: juiz, desembargador, ministro.<br />

Magistral: relativo a mestre (latim: magister); perfeito, completo, exemplar.<br />

Subentender: perceber o que não estava claramente exposto; supor.<br />

Subintender: exercer a função de subintendente, dirigir.<br />

Subtender: estender por baixo.<br />

Algumas expressões de uso controverso<br />

Em sede de - O significado desta expressão, que hoje vem sendo largamente<br />

usada, é "em matéria de" ou "no âmbito de" ou ainda " na esfera de". São comuns<br />

frases assim:<br />

"A pendência, vista em sede de mandado de segurança, não poderia ser apreciada."<br />

Logo tal expressão é traduzida por "em matéria de mandado de segurança" ou,<br />

no segundo exemplo, "no âmbito de habeas corpus". Porém, há muitas críticas e<br />

restrições ao uso de "em sede de". O professor José Maria da Costa, autor do


elíssimo livro Manual de Redação Profissional (Millennium, 2002), registra que o<br />

desembargador Geraldo Arruda, também autor de obras jurídicas, dirigindo-se a uma<br />

turma de novos juízes observou que "o vício de linguagem penetra na redação das<br />

sentenças pela via erudita, que violenta a sintaxe vernácula. Exemplo disso é a<br />

locução em sede de (...)." (P. 533).<br />

A razão da crítica contra o uso da expressão deve-se ao fato de que a mesma -<br />

que vem do italiano "in sede di" - recebeu indevidamente tradução por semelhança da<br />

forma, quando o sentido a ser traduzido para a Língua Portuguesa deveria ser<br />

"durante", "no momento de", "no âmbito de", "em matéria de" etc. e não literalmente<br />

"em sede de" que, em nossa idioma, traduz idéia de local, prédio, assento, cadeira etc.<br />

É cediço - O adjetivo cediço é empregado, no sentido jurídico, figuradamente,<br />

indicando "aquilo que é sabido por todos". Ilustrando: " É cediço que o pedido de<br />

reconsideração não possui o condão de suspender o prazo para a interposição do<br />

agravo." Tal palavra, no entanto, possui outros sentidos, como: estragado,<br />

desagradável, velho, antigo etc.<br />

Reiteram-se as provas protestadas - Expressão que equivocadamente<br />

aparece nos textos jurídicos. Trata-se de erro que deve ser evitado, pois, como ensina<br />

o advogado Eliasar Rosa, autor da consagrada obra Linguagem Jurídica, " a prova não<br />

é protestada . A parte é que protesta pela prova, isto é, manifesta que pretende fazer a<br />

prova; requer a realização da prova".<br />

Portanto a expressão provas protestadas é errônea. O correto é escrever-se:<br />

reitera-se o protesto das provas indicadas ou reitera-se o pedido de provas por que<br />

se protestou. E o mestre Eliasar Rosa colheu exemplo, com esse erro, na redação de<br />

um acórdão: "A fls., foi proferido despacho saneador, e a fls., na falta de iniciativa das<br />

partes quantos às provas periciais protestadas". (p. 332).<br />

Conjunções e locuções conjuntivas - O uso de impropriedades prejudica por<br />

demais a boa técnica linguística, principalmente em se tratando do emprego de "eis<br />

que", "de vez que", "posto que" ou mesmo "vez que" no lugar de "pois", "porque",<br />

"porquanto", "pois que", "visto que", "uma vez que". Essas e outras invenções viciam<br />

a linguagem culta, isto é, adulteram o Português escorreito e induzem muitos juristas,


os quais aprenderam a escrever pela prática, a incidir, inconscientemente, em erros<br />

grosseiros. As quatro locuções conjuntivas recém citadas são utilizadas largamente no<br />

cotidiano forense, denotando causalidade. Uma evidente defecção linguística,<br />

portanto. Em relação ao primeiro termo, o "eis que", concorda-se em gênero, número<br />

e grau com MOTA, quem, ao se perguntar qual seria o lucro da Língua Portuguesa<br />

com tal "modernismo", respondeu sem titubear: "Nada. A mim me (sic) soa como<br />

prurido de simples novidade por novidade, cheirando a infantilidade ou pedantismo".<br />

E continua sua crítica dizendo: "'Eis que' por 'visto que' é locução disparatada que<br />

gera ambiguidade quase fatalmente. Sempre que a encontro, tenho de voltar resto<br />

atrás e reler o que vinha lendo, para concatenar as idéias".<br />

4. REDUNDÂNCIA<br />

Redundância é a repetição desnecessária de palavras ou expressões dentro de<br />

uma frase ou texto. Para evitar que isso aconteça, em primeiro lugar, é importante que<br />

organizar as ideias e os objetivos que o levam a escrever. Quando o pensamento está<br />

organizado, fica mais fácil estruturar o texto. Um bom modo de fazer isso é traçar um<br />

esquema, um rascunho, para visualizar aquilo que é fundamental para a sua<br />

comunicação. Depois de escrever as ideias a respeito do assunto, deve-se reler o que<br />

foi escrito para verificar entre outras se não houve repetição de palavras ou<br />

expressões. É preciso retirar as palavras supérfluas a fim de sintetizar as informações<br />

e não comprometer a qualidade do texto. A repetição ou redundância pode ser usada<br />

como um recurso estilístico, mas há casos em que é necessário evitá-la, para que o<br />

texto não fique deselegante, inadequado e monótono.<br />

Abaixo listamos alguns exemplos de redundância:<br />

Comprove com provas concretas que a rápida descida para baixo nos tenha<br />

causado problemas.<br />

As expressões sublinhadas são consideradas redundâncias porque repetem a<br />

ideia de palavras já existentes na frase:


Até o dia de hoje aquele simpático vendedor ainda não compareceu à<br />

gerência daquela renomada seguradora para apresentar todos os documentos que<br />

lhe foram solicitados pelos atuais gerentes.<br />

Reescrevendo-se esta frase, retirando os elementos supérfluos teríamos:<br />

Aquele vendedor ainda não compareceu à gerencia daquela seguradora para<br />

apresentar os documentos solicitados.<br />

<strong>TEXTO</strong> PARA DEBATE<br />

Falta de clareza em textos faz juiz pular parágrafos<br />

http://www.conjur.com.br/2010-mar-31/falta-clareza-textos-juridicos-faz-juiz-<br />

estafado-pular-paragrafos<br />

Por Pedro Leal Fonseca<br />

"Há duas coisas erradas com quase todos os textos jurídicos. Uma é o estilo. A outra<br />

é o conteúdo." - Fred Rodell (1)<br />

Em 1999, o governo inglês deu ao Lord Woolf of Barnes a seguinte tarefa:<br />

estudar o sistema jurídico daquele país e propor reformas que promovessem o acesso<br />

à Justiça. Em seu relatório, conhecido como The Woolf Report, o lorde inglês<br />

constatou, dentre outros problemas, que os operadores do direito na Grã-Bretanha<br />

ainda se utilizavam de uma linguagem ultrapassada, rebuscada demais e de difícil<br />

compreensão.<br />

O relatório contribuiu para que se intensificasse a campanha pelo uso do Plain<br />

English (inglês claro, em contraposição ao legalese que poderia ser traduzido como<br />

juridiquês), que tem propostas bastante objetivas: prioridade às frases curtas e diretas;<br />

abandono do uso do latim; palavras técnicas devem ser substituídas por outras de uso<br />

comum e compreensão geral; palavras arcaicas e redundantes também devem ser<br />

abolidas. Uma série de documentos oficiais foram revistos para adequá-los a uma<br />

linguagem mais simples. Expressões antes corriqueiras em documentos jurídicos,<br />

como herein, hereof, aforementioned já são menos frequentes. Termos jurídicos


sedimentados como "null and void", que pode ser substituído simplesmente por null<br />

(nulo), tiveram o seu uso questionado e revisto.<br />

A Inglaterra levou tão a sério o plain english que, hoje, há uma diferença<br />

substancial entre documentos jurídicos britânicos e norte-americanos (nos EUA,<br />

juristas ainda são mais presos à linguagem rebuscada e a termos técnicos, embora a<br />

campanha pela simplificação esteja em voga também por lá). Os juízes e advogados<br />

ingleses, embora continuem ostentando as suas perucas brancas, passaram a se<br />

preocupar em ser compreendidos por todos.<br />

No Brasil, a situação é bem diferente. Expressões redundantes como "nulo de<br />

pleno direito" e "pessoa humana" passam desapercebidas da maioria. Apesar da<br />

"Campanha pela Simplificação do Juridiquês" promovida pela Associação dos<br />

Magistrados Brasileiros em 2005, e das recentes declarações do ministro Carlos Ayres<br />

Britto (Supremo Tribunal Federal) por uma linguagem "mais clara, curta e direta", o<br />

uso de um português simples em documentos jurídicos ainda é um sonho distante.<br />

Muito distante, aliás. A linguagem de sentenças judiciais e mais ainda de<br />

petições é, em geral, sofrível. Advogados empregam recursos estilísticos repetitivos e<br />

duvidosos, como se, de outro modo, não pudessem convencer o magistrado do direito<br />

do seu cliente. Difícil percorrer uma petição e não se deparar com termos como "com<br />

efeito", "não obstante", "senão vejamos" ou "indigitada". Recorre-se de decisões<br />

judiciais denominando-as de "v. acórdão": o "v" significa venerando, que, conforme o<br />

dicionário Houaiss, quer dizer "que merece ser acatado". Será mesmo esse o objetivo?<br />

Não se sabe o que se está a escrever, mas isso não importa: a linguagem das<br />

petições é transmitida pelos advogados aos estagiários, que transmitirão aos seus<br />

futuros estagiários, e assim, perpetuarão uma repetição burra de expressões que,<br />

muitas vezes, não significam nada. Ou alguém poderá dar um exemplo em que "com<br />

efeito" é, de fato, necessário? Expressões bizarras como "ferir de morte", "de outro<br />

bordo", "noutro giro" e "mesmo diapasão" também fazem parte deste universo<br />

vocabular pitoresco, a só tempo pobre e pedante.<br />

O compromisso com a clareza (tão necessária ao convencimento) parece não<br />

existir por parte de muitos. Ao nos depararmos com frases longas e truncadas, que<br />

dificultam a leitura, temos duas opções: pular a frase e partir para a próxima ou voltar,<br />

reler e tentar compreender. O que faria um juiz estafado, depois de um dia inteiro de


audiências e com vários pleitos para apreciar? Arrisco-me a dizer que, salvo raras<br />

exceções, qualquer um de nós pularia a frase complicada sem maiores cerimônias.<br />

Advogados internos em empresas enfrentam, por vezes, uma tarefa delicada: a<br />

de revisar o trabalho de escritórios de advocacia terceirizados. Não se pode<br />

simplesmente sair cortando tudo (afinal, a vaidade é traço característico de quase<br />

todos nós advogados). Recentemente, deparei-me com esse problema. Trago o<br />

exemplo ao leitor:<br />

"Por tudo o que restou até aqui exposto, considerada a legislação tributária<br />

de regência, e tendo em vista o atual panorama da jurisprudência aplicável à<br />

hipótese em foco, fica claro que a embargante realmente merece ver inteiramente<br />

cancelada, nesses autos de embargos contra execução fiscal, a insustentável e<br />

inaceitável exigência de ICMS objeto da malsinada CDA aqui guerreada pela<br />

empresa".<br />

Confesso: ao ler o parágrafo, fiquei tentado a pular para o próximo, mesmo<br />

sem compreender muito bem o que havia sido dito. Resisti, reli e convido-lhes agora a<br />

um exercício de clareza:<br />

"Pelo que foi aqui exposto, considerada a legislação tributária, e tendo em<br />

vista a jurisprudência aplicável à hipótese, fica claro que a embargante merece ver<br />

cancelada a exigência de ICMS objeto da CDA aqui combatida".<br />

O exercício não é mais dos fáceis no dia a dia, já que estamos habituados ao<br />

uso dos "malsinados" cacoetes. Muitas vezes, sequer nos damos conta do uso de<br />

palavras inúteis como aquelas apresentadas no parágrafo acima. A clareza, contudo,<br />

não tenho dúvidas, é uma virtude que precisa ser valorizada.<br />

Tive a oportunidade de conversar com um jornalista, que me explicava a razão<br />

por que se esforçava para ser direto e construir um texto agradável: "o leitor acabou<br />

de acordar, está com sono, recebe o jornal em sua casa, e tem que ler rápido antes de<br />

ir ao trabalho. Preciso respeitá-lo". E nós? Será que respeitamos os nossos leitores,<br />

juízes com milhares de processos para julgar, estafa física e condições de trabalho<br />

muitas vezes precárias?


Volto ao exemplo do jornalista, que, como nós advogados, tem como<br />

instrumento primordial de trabalho a palavra. A Folha de S. Paulo publica, há vários<br />

anos, um "Manual de Redação" (2) a fim de padronizar a linguagem e o estilo<br />

adotados por seus profissionais. O Manual da Folha, que prega o tempo todo a clareza<br />

e a objetividade, dá a seguinte lição sobre os "cacoetes de linguagem":<br />

"Evite expressões pobres de valor informativo e, portanto, dispensáveis em<br />

textos noticiosos: antes de mais nada, ao mesmo tempo, pelo contrário, por outro<br />

lado, por sua vez, via de regra, com direito a, até porque. Dispense também<br />

modismos ou chavões que vulgarizam o texto jornalístico. Corte ou substitua essas<br />

expressões, sempre que for possível, em textos noticiosos".<br />

Em outra passagem, o jornal recomenda aos seus colaboradores: "Escolha a<br />

palavra mais simples e a expressão mais direta e clara possível, sem deixar de ser fiel<br />

à norma culta, evitando erros gramaticais, gíria, vulgaridade e deselegância.<br />

Escolha a palavra mais simples e a expressão mais direta e clara possível, sem tornar<br />

o texto impreciso. Palavras difíceis e construções rebuscadas dificultam a<br />

comunicação e tornam o texto pedante: 'Ele não sabe quanto gastou na compra' é<br />

melhor que 'Ele não dispõe dos custos exatos da transação comercial'".<br />

Desconheço se as grandes bancas de advocacia brasileiras já produzem um<br />

"Manual de Redação" como este para padronizar o estilo e a linguagem a ser utilizada<br />

pelos seus profissionais. Embora acredite que esta seja uma tendência mercadológica,<br />

talvez ainda não seja prática comum por representar uma afronta à vaidade intelectual<br />

dos advogados, tão cheios de "fulcros", "espeques" e outros salamaleques. Se for para<br />

valorizar a objetividade e a clareza, porém, eu apoio.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Gramática Metódica da Língua Portuguesa (44.<br />

ed., São Paulo: Saraiva, 1999, p. 506),<br />

CHOMSKY, Noam. Linguagem e mente: pensamentos atuais sobre antigos<br />

problemas. Tradução Lúcia Lobato. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998.<br />

DAMIÃO, Regina Toledo e HENRIQUES, Antônio. Curso de português jurídico.<br />

São Paulo: Atlas, 1986.<br />

FARACO & MOURA. Gramática. São Paulo: Ática, 1999.<br />

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa.<br />

Rio de Janeiro, 1986.<br />

GARCIA, Othon M. Comunicação em prosa moderna. 20. ed. Rio de Janeiro: FGV,<br />

2001.<br />

KASPARY, Adalberto J. (1990), O verbo na linguagem jurídica - acepções e regimes<br />

ROSA, Eliasar. Linguagem Jurídica, "a prova não é protestada<br />

SAUSSURE, F. de. Curso de Lingüística Geral. Tradução Antônio Chelini,<br />

José Paulo Paes, Isidoro Blikstein. 25.ed. São Paulo: Cultrix, 1999.

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