a ler o ensaio - ensaios sobre literatura do medo
a ler o ensaio - ensaios sobre literatura do medo
a ler o ensaio - ensaios sobre literatura do medo
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
<strong>do</strong>r, a ameaça de morte e seus deriva<strong>do</strong>s serem sensações mais significativas que o<br />
próprio prazer.<br />
Neste senti<strong>do</strong>, as narrativas de horror que tratam dessas sensações<br />
provenientes <strong>do</strong> desconheci<strong>do</strong> encontram-‐se em um patamar superior em relação<br />
àquelas que englobam apenas os assuntos relaciona<strong>do</strong>s à violência física, exatamente<br />
porque remetem a elementos <strong>sobre</strong>naturais e trabalham com o que ele chama de<br />
“me<strong>do</strong> cósmico”, ou seja, o me<strong>do</strong> como resulta<strong>do</strong> da percepção da possibilidade da<br />
ação de algo situa<strong>do</strong> fora <strong>do</strong> universo das explicações naturais.<br />
Podemos dizer, então, que o “me<strong>do</strong> cósmico” só seria possível frente à<br />
apresentação <strong>do</strong> insólito, ou mesmo <strong>do</strong> inverossímil. Neste senti<strong>do</strong>, a verossimilhança<br />
estaria, aqui, a serviço apenas da construção <strong>do</strong> universo comum ao mun<strong>do</strong> real e<br />
racionalmente compreensível. Estan<strong>do</strong> estabelecidas essas relações de coerências<br />
materiais, entra em cena o elemento inexplicável como instrumento de provocação da<br />
hesitação. Esse fenômeno é o que Tzvetan To<strong>do</strong>rov chama de fantástico.<br />
Somos assim transporta<strong>do</strong>s ao âmago <strong>do</strong><br />
fantástico. Num mun<strong>do</strong> que é exatamente o nosso, aquele<br />
que conhecemos, sem diabos, sílfides nem vampiros,<br />
produz-‐se um acontecimento que não pode ser explica<strong>do</strong><br />
pelas leis deste mesmo mun<strong>do</strong> familiar. Aquele que o<br />
percebe deve optar por uma das duas soluções possíveis;<br />
ou se trata de uma ilusão <strong>do</strong>s senti<strong>do</strong>s, de um produto da<br />
imaginação e nesse caso as leis <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> continuam a ser<br />
o que são; ou então o acontecimento realmente ocorreu, é<br />
parte integrante da realidade, mas nesse caso esta<br />
realidade é regida por leis desconhecidas para nós. Ou o<br />
diabo é uma ilusão, um ser imaginário; ou então existe<br />
realmente, exatamente como os outros seres vivos: com a<br />
ressalva de que raramente o encontramos.(TODOROV,<br />
2007, p. 30-‐31)<br />
Obviamente que, ao mencionar as reflexões de To<strong>do</strong>rov a respeito da noção de<br />
fantástico, realça-‐se a ideia da centralização <strong>do</strong> valor da obra no seu aspecto receptivo,<br />
uma vez que o princípio da hesitação pressupõe a atuação de um leitor, ou melhor, de<br />
uma função de leitor, o que reforça a natureza não especificamente literária <strong>do</strong><br />
processo de hesitação. No entanto, deve-‐se considerar o fato de que essa mesma<br />
4