O TEATRO LIBERTÁRIO DE SYLVIA ORTHOF - UEM
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Neste diálogo Sylvia Orthof discute a medicina, a hipocondria e a automedicação.<br />
A mãe acha que só do nome do remédio ser difícil já ajuda a curar, ela tem<br />
mania de remédio, diz que leva vários na bolsa, ela medica o filho por conta própria e<br />
há ainda o nonsense de dizer que acredita mais em bulas do que em remédio.<br />
E a ação da peça aumenta quando Zé Vagão desmaia, Locomotiva pede socorro<br />
e entra em cena Jubilosa. Pelo nome já se pode depreender que seja uma figura insólita.<br />
Na descrição da personagem a autora diz: “É quase uma bruxa, mas deve ser irônica;<br />
nada tem a ver com maldade, com bruxa antiga de histórias de fadas” (p. 19).<br />
Com a entrada de Jubilosa o conflito entre autoridade/liberdade se torna mais<br />
acirrado e outras questões também fazem o jogo teatral.<br />
JUBILOSA – Precisa de alguma coisa? Posso atrapalhar um<br />
pouquinho? Adoro atrapalhar! Hi! Hi! Hi!<br />
LOCOMOTIVA – Meu filho desmaiou! Acho que dei<br />
remédio demais ou de menos, ou então fui enganada pela<br />
bula! Bula mentirosa, sem-vergonha, cretina!<br />
JUBILOSA – Ele desmaiou, é? Hi! Hi! Hi!<br />
LOCOMOTIVA – Enguiçou, coitadinho. No meio desta<br />
estrada da vida... Sem amigos, sem parentes, sem esperança!<br />
Sem rádio, sem televisão, sem telégrafo, sem ambulância,<br />
sem esperança. Píííííííííí´! (fala em compasso de tango; as<br />
duas dançam frenéticas)<br />
JUBILOSA – Calma, calma! Em momentos de aflição a<br />
gente não deve perder a calma! É o que dizem... Será que a<br />
gente só deve perder a calma em momentos calmos? Nunca<br />
entendi direito essas coisas... (p. 20)<br />
Jubilosa vem mesmo para questionar, para desestabilizar, para subverter e não<br />
perde nenhuma oportunidade. Ela diz que veio para atrapalhar, que adora atrapalhar e a<br />
Locomotiva nem percebe, age normalmente como se a outra tivesse dito que estava ali<br />
para ajudar. Ditos consagrados como “em momentos de aflição não se deve perder a<br />
calma” também são questionados com ironia e perspicácia. E em outro momento da<br />
cena:<br />
LOCOMOTIVA – Meu filho desmaiou e a senhora fica aí<br />
rindo! A senhora está rindo da minha desgraça, é?<br />
JUBILOSA – Eu me divirto com a desgraça dos outros... Sou<br />
sincera, ora! Os outros se divertem, mas fingem que não se<br />
divertem. Eu, me divirto! Hi, hi, hi! (pg. 21)<br />
A personagem vai ao imaginário infantil com sua irreverência. Toda<br />
criança levada faz artes e se diverte com a “desgraça” alheia. Assim,<br />
a autora leva a criança a contextualizar situações hipotéticas. E a cena<br />
continua quando Locomotiva resolve reagir e contra-atacar:<br />
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